Peter Wolf (Edit.)
Unido
com o Pai
Textos escolhidos do P. José Kentenich
Título original:
Mit dem Vater verbunden
Editor:
Peter Wolf
Tradução:
Manuel Ribeiro Alves
2
Índice
Prólogo à Edição Portuguesa
4
Prefácio
6
Introdução
7
Serviço materno paterno a cada um individualmente
15
Em sincero amor
18
Vinculação pessoal de José Engling ao seu Director Espiritual
21
Vinculação espiritual mútua
25
Entrelaçamento de destino da Família com o Fundador
31
A génese do Jardim de Maria
34
No seguimento do Fundador
40
A Mãe de Deus e a corrente do Pai
43
Luta à volta do “terceiro ponto de contacto”
46
Importância da experiência do Pai
49
Girar em torno do Pai
53
Renascer do Pai
56
Ternura de todo o Movimento pelo Pai
61
Em indissolúvel solidariedade
66
Nova imagem do Pai e da criança como fruto do tempo de Milwaukee
69
Dádiva da nova imagem de comunidade
74
Deus Pai como meta da Aliança de Amor
78
Visão dum Reino universal do Pai
82
Fonte
86
Fontes
89
3
Prólogo à edição portuguesa
Nesta hora em que, por todos os continentes, a Família de Schoenstatt inicia o triénio preparatório
para a celebração, a 18 de Outubro de 2014, do Jubileu dos 100 anos da nossa Fundação, acaba de
surgir a publicação de uma colectânea de textos do P. José Kentenich que muito contribuirão para
a compreensão dos insondáveis desígnios da Divina Providência para a Obra de Schoenstatt no
seio da Igreja, nesta passagem de milénio. O título desta obra “Mit dem Vater verbunden”, em
português, “Unido com o Pai”, editada por Mons. Peter Wolf na Editora alemã Schoenstatt-Verlag
a 4 de Outubro de 2010, dia da morte, em 1918, do primeiro herói da geração fundadora de
Schoenstatt, José Engling, sugere a importância da Mensagem de Schoenstatt para o homem do
nosso tempo, vítima das “heresias antropológicas”, características da pós-modernidade, cujas
consequências devastadoras o Fundador de Schoenstatt, profeticamente, não se cansava de
denunciar, apontando o segredo da sua solução.
“Abfall ist Zerfall”1, isto é, “afastamento é destruição”: sempre que se afasta de Deus, o homem
entra num processo de auto-destruição, que o torna um factor de destruição mais poderoso que a
bomba atómica, afirmava J. Kentenich, apontando o remédio para este mal que, desde meados do
séc. XIX, não cessa de se abater sobre o Ocidente, não poupando a própria Igreja, berço daquele
Homem Novo que, renascido pelo Baptismo, Deus quer implantar na terra visando uma nova
ordem social. Ao contemplar na pessoa da Imaculada o paradigma do Homem Novo que Deus Pai
não deixa de querer para a humanidade, como muitas vezes acentuava, o P. Kentenich afirma: O
que o demónio destruiu com Eva, quer Deus a partir de Schoenstatt reconstruir com Maria: o
homem paradisíaco.2 Com efeito, continua J. Kentenich, Maria Imaculada é aquele pedacinho de
Paraíso que, mantido intacto, acena a cada um de nós para o plano que desde toda a eternidade o
Criador mantém incólume em relação a cada um daqueles que Ele criou à sua imagem e
semelhança.
Maria é aquele “signum magnum”3, grande sinal, que apareceu no céu a iluminar o caminho da
humanidade, em cada homem. A Cheia de Graça, como Mãe predilecta de Deus Filho, é a filha
1
Cf. Pater Josef Kentenich, Grundriss einer neuzeitlichen Pädagogik für den Katholischen Erzieher, Schönstatt –Verlag,
1971, p. 161.
2
NT.: Esta expressão ouviu-a eu mesmo, a 23.6.1967, dos lábios do P. Kentenich, aquando do meu encontro com ele,
na Casa de Formação das Irmãs de Maria, no Monte Schoenstatt.
3
Cf, Ap 12,1.
4
predilecta de Deus Pai e a Esposa do Espírito Santo. A Aliança de Amor com Maria abre hoje ao
homem o caminho para a sua auto-realização que passa pelo cultivo do ser-de-relação que o
habita, como imagem viva de Deus, e que, no seguimento de Jesus, como Maria, o desafia ao
encontro consigo mesmo, dinamismo por onde passa o processo da sua auto-santificação,
mergulhando-o na participação na vida trinitária de relação, que no Pai tem a sua fonte e o seu
ponto culminante: “Heimwärts zum Vater geht unser Weg”4. Rumo ao Céu, não se cansa de
proclamar J. Kentenich, eis o rumo da vida do homem à face da terra, chamado a fazer a sua
peregrinação em direcção ao Coração do Pai que, pelo seu Verbo, tudo criou por amor, através do
amor e para o amor.
Verdadeiro profeta para o homem do nosso tempo e dos séculos futuros, a partir do íntimo seio
da Igreja, J. Kentenich desafia os homens a darem-se as mãos na promoção de uma autêntica
revolução cultural, em ordem a uma autêntica cultura da Aliança, pela qual incontornavelmente
passa a salvação do homem, em cuja plenitude de vida reside a glória de Deus, como no séc. II não
se cansava de afirmar S. Ireneu.
Alegrando-nos com a boa notícia da Beatificação do Papa João Paulo II, verdadeiro irmão no
Espírito de José Kentenich, no próximo dia 1 de Maio, apraz-nos dedicar esta tradução portuguesa
ao nosso querido Papa Bento XVI que, tão fielmente, segue as peugadas do seu santo predecessor
no amor à Igreja e à promoção dos direitos sagrados do homem, nesta hora dominada pelas
ameaças de consequências imprevisíveis de uma ditadura do relativismo,5 outra face da mesma
moeda das ditaduras ateístas que, desde o Continente Europeu e um pouco por toda a parte, se
tem avassaladoramente infiltrado.
Neste momento, não posso deixar de agradecer a Mons Peter Wolf por me confiar a tarefa da
tradução desta obra da língua alemã, assim como às Dras. Dulce Nogueira e Sandra Antunes, pelo
seu valioso contributo em ordem a uma maior fluidez da língua portuguesa na sua leitura,
tornando-a mais saborosa, sobretudo para a nossa Família de Schoenstatt, nos países lusófonos.
Schoenstatt em Braga, 20 de Janeiro de 2011
M. Ribeiro Alves
4
Esta expressão, que traduzida em português quer dizer “o nosso caminho aqui na terra é um caminho rumo ao Céu”,
está gravada no tapete, junto ao túmulo do P. Kentenich, a indicar o lugar exacto da sua morte a 15.9.1968.
5
NT.: Expressão muito acentuada pelo Papa Bento XVI, logo desde o início do seu pontificado.
5
Prefácio
Com grande alegria e imensa expectativa a Família internacional de Schoenstatt deu início, a 18 de
Outubro de 2010, a um período de três anos de preparação para o centenário da Fundação de
Schoenstatt, cujo jubileu se comemora a 18 de Outubro de 2014.
O dinamismo interno do triénio está marcado pelas correntes que a Conferência 2014 verificou na
Família de Schoenstatt Internacional e que hoje plasmam a vida da nossa Família. Nesta dinâmica
vislumbramos – com grande alegria e admiração – um paralelismo com os anos antecedentes à
época da Fundação em 18 de Outubro de 1914.
Foi com uma “corrente do Pai” que Schoenstatt começou. a geração fundadora gravitava à volta
do Padre Kentenich que nela despertava confiança, acreditou nele e por ele se deixou
entusiasmar, pelo sacrifício, pela sua ideia predilecta. A corrente do Santuário agarrou-a, depois,
profundamente, e impulsionou-a com missionário entusiasmo, para receber muitos como aliados
e abrir o Santuário como laboratório da cultura da Aliança, de círculos cada vez mais amplos.
Também é este o caminho em direcção a 2014.
A presente colecção de textos para a “corrente do Pai” realiza um desejo da Conferência 2014 por
um cultivo das correntes no âmbito do Movimento de Schoenstatt.
Como equipa 2014 agradecemos cordialmente a Mons. Dr. Peter Wolf, bem como ao Josef
Kentenich – Institut este precioso contributo para o primeiro ano do triénio para 2014.
Pelo Team 2014:
Padre José Maria García
Ir. M. Luciane Machens
6
Introdução
A 18 de Outubro de 2014 o Movimento de Schoenstatt celebra, em todo o mundo, 100 anos da
sua fundação. O começo do programa para este Jubileu consistiu numa jornada internacional. Em
Fevereiro de 2008 encontraram-se, em Schoenstatt, representantes da Família de Schoenstatt
internacional, vindos de 32 nações. No meio desta multiplicidade, de diferentes mentalidades e na
confusão de muitas línguas, eles experimentaram a alegria de terem um Pai e Fundador comum,
de estarem abrigados num Santuário comum, de terem uma paixão comum pelo apostolado e,
finalmente, de terem mesmo desejo de missão missionária. A partir da alegre consciência desta
união, através de tantas fronteiras, cresceu o desejo de percorrer, durante três anos, um caminho
comum rumo ao Jubileu de 2014.
Nas famílias de Schoenstatt latino-americanas estava especialmente presente uma forte
recordação que tinham experimentado muito positivamente no caminho para o ano jubilar de
2000, no tríplice passo do Ano de Cristo, do Ano do Espírito Santo e do Ano de Deus Pai. Por isso,
agora, a partir dos motivos fundamentais das três correntes citadas, com insistência manifestaram
interesse por um triénio a nível mundial no caminho para o Jubileu 2014.
O caminho comum devia começar com um “Ano da corrente do Pai,” que põe no centro o Padre
Kentenich que, como Fundador, está na génese do Movimento. Um primeiro sinal neste sentido
foi acordado e deliberado pela Presidência Geral: A viagem pelo mundo do Símbolo do Pai. Desde
o dia 8 de Julho de 2009 ele está no caminho e, entretanto, já visitou em vários continentes,
muitos Santuários e percorreu as primeiras estações importantes. Pelas informações, sempre de
novo, se sente que muitos se deixam impressionar por este símbolo e nele saúdam o Pai e
Fundador que, deste modo, visita e entra em contacto com cada Santuário e com o seu país.
O Ano da corrente do Pai abriu a 18 de Outubro de 2010 e durará até 18 de Outubro do próximo
ano. Como Presidente da Presidência Geral, o P. Henrich Walter, declarou solenemente aberto
este Ano numa celebração muito especial durante a Semana de Outubro, na véspera do dia 18 de
Outubro, no Santuário Original. Este acto pôde ser acompanhado através da internet em muitos
Santuários do mundo.
A pedido do grupo de trabalho 2014, a secção centro da Renânia do Josef-Kentenich-Institut está
disposta a reunir textos do Padre Kentenich que possam ajudar a organizar todo este ano a partir
de uma união particular ao Fundador. Os textos são escolhidos e reunidos de tal modo, que
acompanhem e realizem os passos interiores, tal como aconteceu com a união ao Fundador, que
7
foi crescendo ao longo da história do Movimento. A colectânea de textos e os pensamentos
introdutórios que os acompanham pretendem ser uma ajuda para reflectir e aprofundar a relação
progressiva ao Pai Fundador.
Quem atentamente acompanhar o período da fundação dar-se-á conta que o jovem Director
Espiritual Kentenich procura uma relação viva e cheia de confiança já com aqueles que lhe foram
confiados. Logo na sua primeira apresentação ele propõe um novo estilo no trato com os
estudantes, para os quais foi nomeado Director Espiritual: “Ponho-me inteiramente à vossa
disposição com tudo o que sou e tenho, meu saber e minha ignorância, meu poder e minha
impotência mas, sobretudo, com o meu coração.“ (José Kentenich, Acta de Pré-fundação).
Relativamente à organização, que neste contexto ele queria criar com eles, acrescentou: “Nós, não
eu. Pois sem o vosso consentimento nada, absolutamente nada, farei neste sentido.” Ele começa o
seu sacerdócio com uma total entrega, dando-se a si mesmo com toda a sua pessoa. Destes
primeiros tempos são-nos conhecidos textos do Ano Paulino, nos quais denota como se orienta
por S. Paulo. Põe-se à disposição dos alunos para o diálogo pessoal e muitos o escolhem como
guia e seu “Director Espiritual”, como nessa altura se dizia. Eles sabem que podem ir ter com ele
com todas as perguntas e inquietações.
P. Kentenich mantém contacto com eles inclusivamente no momento em que um, após outro, é
mobilizado para o serviço militar. Inúmeras cartas confirmam esta dedicação por todos os
interesses dos jovens, assumindo cada vez mais, a fisionomia própria dum pai e duma mãe.
Preocupa-se com os agasalhos e roupa interior quentes e fá-los chegar até aos seus jovens na
frente de batalha. Como um bom pai orienta-os nas suas crises e ajuda-os a aguentarem as duras
exigências da vida militar e a suportarem as desilusões que a acompanham.
Depois da guerra, trabalha afincadamente com os jovens soldados na edificação da Congregação
fazendo-os experimentar o quanto neles ele se apoia e com eles conta. E isto vai tão longe que, na
fundação da União Apostólica em Hoerde, ele mesmo não está presente, mas deixa os jovens agir
livremente.
Seguem-se os árduos anos da expansão da jovem Fundação para além dos muros do ginásio. As
primeiras mulheres em breve se associam ao jovem e atraente Movimento. Em 1926 o Padre
Kentenich arrisca o enorme passo da fundação das Irmãs de Maria. Nestes anos, o Fundador sente
mais ainda que, em torno dele, a “Família” cresce e ele é solicitado como “Pai”. São, ao mesmo
tempo, os anos de trabalho mais intenso com os Sacerdotes, não só orientando grandes Retiros,
mas dedicando-se também a cada um, individualmente, com suas perguntas e com seus
problemas.
8
A celebração das suas Bodas de Prata Sacerdotais (11.8.1935) pode ser apreciada como uma certa
pausa. Ou seja, segundo o seu próprio testemunho e a vivência da primeira geração, até este
ponto o Fundador teve muito cuidado em permanecer em segundo plano. A partir daí concorda
com a celebração do seu Jubileu e pode, por isso, alegrar-se. Na sua notável alocução, por ocasião
das Bodas de Prata Sacerdotais, fica bem claro quão forte é a comunhão interna no crescimento
da Fundação. Impressionante, dá ele próprio testemunho, de como todos os anos, num
permanente e íntimo contacto vivo, organizou o Movimento. Com imensa gratidão recorda do que
e de quem tomou o que na Fundação ficou incluído. Trata-se de um profundo e espiritual um no
outro que une Fundador e Fundação e que obteve visível fecundidade.
O próximo e decisivo passo no crescimento do sentido do um com o outro, entre o Fundador e a
Fundação, deu-se por ocasião da prisão em Coblença e Dachau. A 20 de Setembro de 1941 o P.
José Kentenich foi preso pela Gestapo. Como prisioneiro da Gestapo passou as primeiras quatro
semanas no cárcere da cadeia de Coblença, no quarteirão do Vogelsang e daí foi levado para a
prisão na Rua dos Carmelitas. Pouco depois, ficou claro que ameaçava o perigo de uma
transferência para o campo de concentração de Dachau. Esta situação despertou na Família das
Irmãs e nos Sacerdotes uma profunda solidariedade e elevado espírito de sacrifício para com o
Fundador. No meio da prisão e do cárcere ele sabia-se ele abrigado no Santuário e no coração de
pessoas nobres.
Pelo Natal de 1941, a partir da Fé Prática na Divina Providência, aproveitou para responder à carta
duma Irmã, escrita em linguagem de criança, com o pedido a “Jesus Menino” de trazer de volta à
Família, o Pai, de quem se sentia a falta. A superiora tinha feito chegar à cadeia esta carta ao
Fundador. Daí surgiu a grande corrente do “Jardim de Maria”. O Fundador pôs-se na situação da
carta ao Menino Jesus e, na pessoa do Menino Jesus, respondeu. Nesta carta formulou ele a sua,
entretanto amadurecida, convicção de que Deus uniu a sua libertação da prisão à aspiração da sua
Família espiritual. Esta aspiração dirigiu-a para o “cultivo do Jardim de Maria” que se tornou na
imagem do crescente Movimento. Sob esta imagem fortemente expressiva e em breve mais e
mais cheia, o sacrifício pelo Fundador iria, com o tempo, despertar forças extraordinárias no
sentido do entrelaçamento de destinos e da imolação pelo “Jardineiro” que, na pessoa do
Fundador, se encontrava na cadeia.
Por ocasião do 20 de Janeiro de 1942 os Sacerdotes responderam aos sinais do Fundador desde a
prisão com o chamado “acto de seguimento”: durante muitos anos despertou nos seus círculos
séria disposição para o sacrifício e entrelaçamento de destino com o Fundador. No tempo do
Nacional-socialismo estas duas correntes, feminina e masculina, foram primeiro separadas e
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limitadas às chamadas comunidades das Irmãs e dos Sacerdotes. Depois da libertação do campo
de concentração, pouco a pouco, o Fundador reuniu ambas as correntes. A Semana de Outubro de
1950 mostra que ele queria fazer chegar estas motivações espirituais a todo o Movimento. Ele
mesmo propiciava o olhar na vida crescida e queria assegurar para o futuro a profundidade e
seriedade da aspiração. Apostava num Schoenstatt, que se une em torno do Fundador como
Cabeça da Família e, da realidade desta relação, vive e age. Pelo caminho da Fé Prática na Divina
Providência ele estava convicto de que, perante o Movimento, tinha de assumir e viver a função
de Cabeça e de Pai. Para ele ficava claro, que a Fundação, tal como tinha crescido em torno dele e
do Santuário, tinha de apostar nesta concentração num Pai e nas forças elementares duma
solidariedade e pertença familiar. Nem todos o compreenderam nesta convicção e o
acompanharam no seu caminho. Muitos troçavam, falando de “falha na cabeça” que com ele
trouxera de Dachau. Até dentro dos círculos eclesiais havia a censura do “culto da pessoa” e o
receio perante uma excessiva dependência da sua pessoa. Neste sentido foi necessário que ele
entrasse na “na sombra”. Por decreto do Visitador, impõe-se-lhe, primeiramente, uma distância
cada vez maior da sua Fundação, especialmente das Irmãs de Maria. Finalmente, vem o exílio em
Milwaukee (EUA).
Pelas testemunhas dos anos posteriores se percebe que o Padre Kentenich, a partir da sua visão
de fé, muito reflectidamente, manteve e assumiu inteiramente a função como “Cabeça supra
temporal” e a sua posição como “Pai” na sua Fundação. Em inúmeros diálogos com as pessoas e a
partir da sua evolução espiritual, ele estava consciente e ciente da função que a ideia e a
experiência do Pai desempenham na evolução religiosa da pessoa. Era para ele uma convicção
assente de que o caminho para uma vinculação pessoal fecunda a Deus Pai passa, regra geral, pela
experiência do pai da terra.
No tempo seguinte, cresceu no interior do Movimento a consciência de que também há outras
grandes comunidades na Igreja, nas quais os Fundadores, como figuras paternais, asseguram a
unidade da sua Fundação e a espiritualidade comum. Nos Beneditinos, Franciscanos e Jesuítas, por
exemplo, há tradições claras acerca da forma como os seus Fundadores foram compreendidos e
tratados como pais. Se bem que nos anos do pós-guerra ainda não era prática, falar do “Pai
Fundador” ou, no diálogo com ele, tratá-lo como “Pai”, foi sendo, todavia, cada vez mais
entendido em paralelo com outras figuras de Fundadores. Para os membros do Movimento ele era
o “Senhor Padre”. O costume de o tratar como “Pai Fundador” ou simplesmente só como “Pai” ou
de, no diálogo pessoal, dirigir-se a ele com o “Pai”, só pouco a pouco se expandiu. Ele deixava, a
10
cada um, a espontaneidade do seu tratamento embora por isso não seria igual nas outras
comunidades.
No período das grandes viagens pelo mundo, possivelmente através da ponte linguística do
“Padre”, em Espanhol, e do “Father”, em Inglês, deu-se evolução do trato no sentido de “Pai”. Ele
mesmo dava importância a que isto só acontecesse, se para a pessoa tivesse sentido e a palavra
“Pai” para ela fosse realmente cheia de significado.
O tempo em Milwaukee revela-se, cada vez mais, como aquele em que o Padre Kentenich, longe
do seu querido Schoenstatt, e sem as grandes conferências e jornadas, se viu forçado a viver como
cura de almas, numa pequena comunidade de emigrantes alemães. Muitos ignoravam totalmente
que ele era um Fundador. Dedicava o seu tempo a cada um, em particular, e às famílias da sua
comunidade e do meio em torno do pequeno Santuário, que aí surgiu. A dedicação pessoal a cada
um em particular, como de há muito pertencia ao seu estilo pastoral, pôde amadurecer
totalmente. Tornou-se, para cada vez mais pessoas, num Pai, que as compreendia e acompanhava,
que paciente e compreensivamente as vinculava com Deus. Muitos se confessam agradecidos,
pois para eles ele se tornou num credível transparente de Deus, Pai de misericórdia.
Neste período do segundo cativeiro cresceu, em muitas partes da Família de Schoenstatt, um
movimento de intenso sacrifício, o que, na sua aspiração espiritual contribuiu imensamente para o
regresso e a reabilitação, aparentemente impossível, do Fundador. Como no tempo da prisão
nacional-socialista, também agora, no Movimento, a solidariedade e a experiência da paternidade
do Fundador floresciam. Ele não se deixou levar pelo protesto contra Roma nem se deixou
amargurar. Até ao fim, confiou na Mãe de Deus e na Aliança de Amor e viveu em silêncio a sua
paternidade no amor à Igreja, na responsabilidade pela sua querida Fundação.
Deste modo, após 14 anos de exílio, regressa em 1965 e torna-se plenamente Pai. Aqui está
alguém que fala de Deus Pai e d’Ele irradia algo como só poucos homens. Aqui está alguém como
Pai no meio da sua Família espiritual e a une, num tempo de grandes convulsões para a Igreja e
para o mundo. Aqui está um Pai que conduz a sua Fundação à altura do tempo e, por fim, lhe abre
o caminho para o futuro.
Três anos depois as suas forças esgotaram-se. Em 1968 morre após a sua primeira e única
celebração da Eucaristia na recém-inaugurada Igreja da Adoração, a um Domingo, que ao mesmo
tempo é o dia das sete Dores de Maria. Seguem-se dias inesquecíveis que tornam visível, como ele
se tinha tornado um Pai para inúmeras pessoas de diversas nações. As filas de pessoas, que se
dirigem para a sua urna, não querem terminar. Dia e noite, grupos e comunidades inteiras da sua
11
Fundação internacional velam os seus restos mortais. Todos querem, uma vez mais, colocar o seu
Pai no centro e prometer-lhe, para além da morte, fidelidade e seguimento.
Assim, a “corrente do Pai” não termina com a sua morte. O local, onde morreu e foi sepultado,
tornou-se, para inúmeras pessoas da sua Família, num lugar precioso onde sempre de novo
procuram a sua proximidade e com ele, sempre de novo, se encontram. Aí muitos cursos se
encontram e inúmeras pessoas experimentaram a sua presença e lhe prometeram a sua fidelidade
e seguimento filial. A Capela do Fundador, com seu túmulo, tornou-se num ponto de atracção
espiritual para as pessoas da sua Família internacional e para muitíssimas outras mais. Com efeito,
desde a sua morte, a sua proximidade é experimentada de outras formas diversas, como por
exemplo mediante o testemunho daqueles que o conheceram, pelos seus escritos, através de
fotos e símbolos e das inúmeras orações atendidas.
Em todo o mundo surgiram, entretanto, lugares que recordam o Padre Kentenich e a sua
mensagem. Foram edificados Centros de Schoenstatt, que têm o seu nome. Levantaram-se
memoriais de diversas espécies, com os quais as comunidades querem exprimir a sua vinculação
agradecida. Há estátuas do Pai de tamanho natural, junto das quais as pessoas procuram a sua
proximidade. Muitas casas trazem o seu nome e este ano surge em Roma a Domus Padre
Kentenich, que a Família de Schoenstatt juntamente com o Santuário - MATRI ECCLESIAE lhe
ofereceu pelo seu 80º aniversário natalício.
Possam os textos escolhidos vir a ser uma ajuda, para com o nosso Fundador, em direcção a 2014,
como grande Família Internacional viver o ano da “corrente do Pai e colocá-lo novamente no
centro, como nosso Pai.
Schoenstatt, 4 de Outubro de 2010
Peter Wolf
12
Eu me ponho assim
à vossa inteira disposição
com tudo
o que sou e tenho:
meu saber
e não saber,
minha capacidade
e incapacidade,
mas sobretudo
o meu coração.
José Kentenich 1912
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Uma carta do Fundador ao P. Menningen do ano 1953 permite um olhar penetrante no seu modo
de trabalho dos primeiros anos. O Padre Kentenich mostra como Schoenstatt, desde o começo, é o
resultado da dedicação inteiramente pessoal e profundamente paterna até ao “mais ínfimo
trabalho”. Ele vê o princípio da “corrente do Pai”, lançada já na fase do início da Fundação. O
Fundador quer praticar conscientemente este modelo de trabalho e ganhar e sensibilizar os seus
colaboradores para esta arte. Quem se quer comprometer co-responsavelmente pelo futuro de
Schoenstatt fará bem orientar-se por este estilo de trabalho do Fundador.
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Serviço materno paterno
a cada um individualmente
Se alguém quer ler nas almas o desejo e a vontade de Deus deve, então, continuamente manter
contacto cuidadoso com isso, deve saber abrir as almas, para ler aí dentro e, lentamente,
transferir o lido para toda a Família. Assim, e só assim, cresce a longo prazo, uma atmosfera
comunitária saudável e impregnada de Deus.
Mas a longo prazo isto não seria possível sem a dádiva duma paternidade muito profunda, que
tudo abrange. Duma paternidade que, a par do vigor profético, goza duma sensibilidade e duma
interioridade sumamente terna. …
Deixa que conte como Schoenstatt se formou, não só desde 1914, mas também desde 1919.
Depois que eu, através de algumas conferências, tinha aberto os corações e criado uma certa
atmosfera, a minha acção principal consistiu nisto: Estar à disposição dia e noite, para ajudar cada
um a resolver os problemas da sua alma, para os assistir na descoberta do Ideal Pessoal e do
Exame Particular, no esclarecimento das interrogações acerca da paixão dominante e na solução
dos complexos psíquicos, principalmente das neuroses obsessivas, que devido à guerra vieram à
superfície.
Agora compreendo que não é tarefa para qualquer um – por natureza não agrada ao homem –
neste incansável contacto materno ou paterno ano após ano esforçar-se por ínfimas
insignificâncias, ocupar-se delas – (mas não ligeiramente assim como quando alguém lê um jornal,
ou para satisfazer a sede de conhecimento ou a curiosidade do sensacional, mas com o fogo
interior, a emoção interior, como se a gente tivesse diante de si esta pessoa só e como se a gente
tivesse responsabilidade por esta pessoa só) – isto é aquilo a que eu chamo paternidade e
maternidade criadora, que não só conhece uma distância respeitosa, mas também uma
proximidade animada de amor, que está disposta a dar tudo pelos discípulos. Não basta colocar à
disposição deles capacidades e talentos, mas também oferecer por eles descanso e sono e por eles
gastar a última quantidadezinha de força. “Um amor maior, ninguém tem senão aquele, que dá a
vida pelos seus amigos”.
A finalidade pode parecer consideravelmente grande e pouco acessível. Mas nós não queremos
esquecer que, pelos vistos, segundo a história da Família, a Mãe de Deus quer desde o seu
Santuário fazer surgir e crescer uma “corrente do Pai”. Assim se pode compreender, por que
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motivo surgiu desde o estrangeiro um Movimento que se quer apresentar junto da Santa Sé por
causa da introdução duma festa do Pai.
Nós não podemos fundar de novo a Família através de grandes discursos inflamados ou de registo
de massas … Dito de outro modo, queremos orientar-nos de novo pela tradição da nossa Família.
Então, os nossos dirigentes têm que ser confessores agraciados e orientadores de almas, que
servem desinteressadamente, investindo toda a força corporal e anímica. De novo, eles têm de
fazer o pequeno trabalho insignificante e, sobretudo, ano após ano, cultivar e manter
profundamente vivo o contacto espiritual com uma elite escolhida.
Este é o caminho, pelo qual outrora discretamente nos tornámos Família. Este é o método, pelo
qual se tornou realidade e cresceu o Um com o Outro, Um no Outro e Um para o Outro espiritual e
se assegurou o Um com o Outro no Deus vivo.
Segundo a minha convicção, só deste modo podemos edificar novamente Schoenstatt; de modo
semelhante, como nós de tal modo o conseguimos – ao lado da mobilização de toda a realidade
sobrenatural – para criar um mundo novo, em que desde a raiz é superado o espírito bolchevista,
ou no qual a verdadeira liberdade dos filhos de Deus pode ser colhida como maduro e o mais
maduro fruto da Aliança de Amor.
De: J. Kentenich, Brief an P. Alex Menningen, Milwaukee 9.12.1953
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Um exemplar testemunho do cuidado paterno do jovem Director Espiritual perante um dos
primeiros congregados é a carta de 2.3. 1917 a José Engling, na caserna, em Hagenau. O Padre
Kentenich aproveita, com respeito, a abertura filial e com a sua carta verifica exactamente a sua
situação. Nela faz propostas e promessas que deixam liberdade a José e, a partir da experiência
das suas próprias fraquezas, encaminha-o para se confiar totalmente à Mãe de Deus. Aconselha-o
sobre a situação do grupo e dá-lhe perguntas para reflectir, sem invadir a sua decisão. José pode
confiar, pois o seu Director Espiritual acolheu e compreendeu o seu esforço pelo grupo. Ele pode
estar certo, que o seu Director Espiritual se interessa bem pessoalmente por ele e por ele reza no
Santuário. Assim ele pode interiorizar profundamente, que o Director Espiritual o ama com sincero
amor.
17
Em sincero amor
Schoenstatt, 2 de Março de 1917
Meu estimado jovem amigo!
A tua estimada carta de 25 de Fevereiro chegou ontem. Muito obrigado, bem como por todas as
outras notícias sobre a tua vida interior que, desde a tua despedida, me enviaste. Pode às vezes
esta tua fidelidade e filial abertura tornar-se custosa para ti, visto que eu, intencionalmente, não
te respondia. Agora podes apreciar melhor as circunstâncias exteriores e as tuas transformações e
hesitações interiores. A olhos vistos intensifica-se também a necessidade de cuidadosa ofensiva. E
assim deveria ser esta a altura de tornar fecundas as experiências feitas até agora, em ordem a um
novo aspirar às alturas.
Com este intuito, eis algumas indicações. Agora, mais do que nunca, reconheces os teus próprios
defeitos e debilidade. Este é o terreno mais propício para uma entrega filial sem reservas à nossa
Mãe celeste: ‘Mãe, vês o teu pobre, débil filho. Por si mesmo, ele nada pode. Toma-me
inteiramente em teus calorosos braços, pede perdão a Jesus para mim … e depois estende-me a
tua mão. Contigo quero viver, sofrer, morrer, combater e trabalhar … Tu minha Mãe – e eu teu
filho …’
Se depois tu, consequentemente, neste sentido te educas (e isso de certeza não será difícil para ti,
para isso a nossa Mãe celeste já arrebatou suficientemente o teu coração), a partir da tua
evolução até agora deves tomar consciência de que a vantagem é muito superior à desvantagem.
E eu creio que a tua Mãezinha tem o mesmo desígnio contigo. Aposta depressa essencialmente
nisto e, de novo, vai tudo correr bem. Primeiro deves aprender em teoria e na prática a repetires
do mais íntimo do coração: Ecce ancilla Domini (Eis a escrava do Senhor) – só depois segue o hino
de louvor: Et exaltavit humiles (e exaltou os humildes).
Passando a um outro assunto: Seria disciplina demasiado rigorosa em toda a tua auto-educação
se, de vez em quando, enviasses as tuas anotações, contanto que não entres em conflito com o
serviço de censura? Eu podia, nesse caso, oferecer sempre expressamente o teu Exame Particular,
etc. e entregar as tuas intenções à nossa MTA no Santuário.
Um terceiro ponto: a vossa distribuição de grupos não é demasiado exterior e superficial? Com
efeito o objectivo deve ser a ligação de íntimos e verdadeiros laços de amizade. O coração deve
encontrar-se com o coração, senão não se pode chegar a uma mútua força moral e exigência
18
íntima. Quer-me parecer que o princípio normativo para a distribuição tenha sido a proximidade e
pertença física à companhia mais próxima. Em todo o caso, uma verificação da situação não pode
fazer mal.
Talvez também já tenha chegado à tua consciência, o quanto as nossas organizações da
Congregação estão em sintonia com a natureza humana. Cada desvio essencial vinga-se
amargamente. É com certeza louvável que o senhor Capelão vos faça conferências expressamente
para vós. Contudo, isso não basta, a vossa actividade não é devidamente estimulada. Isto é uma
desvantagem muitíssimo grande e, com certeza, também a razão pela qual vós não vos aproximais
de um modo mais profundamente íntimo uns dos outros. Deste modo o senhor Capelão consegue,
assim, o contrário daquilo que pretende e destrói mais do que aproveita. Tem sido perturbador na
evolução orgânica dos vossos esforços e teve como efeito a intervenção do Ir. Stielers. Tu sabes,
como eu neste aspecto fui sempre cuidadosa e meticulosamente discreto. Sem dúvida que muita
coisa vai então mais devagar, mas o que é feito fica também então planta realmente arraigada.
Pois vós agora deveis contar com o que existe. Ainda assim a tua tarefa devia ser, com inteligência
e tacto, eliminar as influências por ti reconhecidas como nefastas ou torná-las o mais possível
ineficazes. Tu já aprendeste isto como Prefeito. Contudo, o que não se pode mudar, tem de se
aguentar com paciência.
Às outras ideias da tua estimada carta vai responder-te Struth. Entretanto, cordiais saudações e
bênção sacerdotal, em verdadeiro amor,
J. Kentenich
J. Kentenich, Carta a José Engling de 2.3.1917
19
Nas crónicas do tempo de Milwaukee, o Fundador, reflectindo com olhar retrospectivo sobre a
história da Fundação encontra-se uma passagem que queria conservar para o futuro: a partir da
relação de José Engling com o seu Director Espiritual confirma, e pretende demonstrar a
fecundidade da “Paternitas” (paternidade). Aí ele mostra como Schoenstatt, desde o começo,
cresceu através de uma relação paternal para com o Fundador e, como já no tempo da Fundação,
se dava transferência de vida e havia fecundidade.
Na vinculação pessoal de José Engling a ele, como Director Espiritual, o Fundador vê alicerçado e
praticado aquilo que posteriormente pela “corrente do Pai” entra de modo reflexivo na
consciência da Família de Schoenstatt. Aí identifica ele o fundamento decisivo para o futuro da
Família de Schoenstatt.
20
Vinculação pessoal de José Engling
ao seu Director Espiritual.
A mesma ordem de ideias essenciais, que em contacto com a capacidade de José Engling em se
inflamar pelo Ideal de Schoenstatt recebemos, vamos encontrar, - mesmo que sob outra forma –
desde que, e na medida em que, nos esforçarmos por alcançar um conhecimento mais profundo
da causa segunda (junto do amor a Maria), do seu inabalável espírito heróico de sacrifício pela
missão de Schoenstatt. Trata-se da sua vinculação pessoal à Cabeça da Família, isto é, ao seu
Director Espiritual e Fundador da Obra. A fecundidade desta vinculação pessoal na vida de José
Engling pode bem traduzir-se pelo termo «transferência de vida».
Como a experiência ensina, todo o amor nobre conhece este processo criador. No nosso caso,
trata-se no sentido do nosso conjunto de questões, da convicção acerca da missão de Schoenstatt
e da sua fundamentação sobre a Cabeça da Família. Ambas foram transferidas para José, segundo
as conhecidas e comprovadas leis – recorde-se só a lei da transmissão orgânica e da transferência
orgânica. Impulsos inabaláveis lançaram profundas raízes em sua alma. São muitas as provas disto.
Em princípio pode e deve-se de antemão sustentar o seguinte: Tudo o que nestas folhas como
confissão pessoal e seu fundamento assentei, no seu núcleo facilmente se encontra também nas
anotações pessoais de José Engling.
Resumindo, deve-se assinalar que, a partir das anotações pessoais de José, resulta naturalmente a
resposta à candente pergunta: o que é que até 1919 estimulou a geração fundadora a entregar-se
com idealismo heróico pela realização da missão de Schoenstatt? Não é preciso expressamente
referir de novo, que a atitude genial de José só lentamente e de modo gradual se comunicou ao
Movimento de então. Não se pode enfim calar a importância para toda a Obra, desde o princípio,
de que se reveste a Paternitas sem reservas, reconhecida e já aqui esboçada. Não é nenhum
exagero, se ousarmos dizer: sem o seu reconhecimento e sem o seu pleno desenvolvimento a
Obra não teria atingido o estádio inicial. Seja-me permitido, por isso recordar o princípio de
Salústio: omne regnum … (cada reino manter-se-á com os meios, com que foi fundado).
Nem toda a Paternitas conduz a um tal objectivo glorioso. É preciso ser uma Paternitas, que se
impõe a si mesma o máximo de exigências e se esforça por viver constantemente o Ideal que
proclama, de modo a que ele se veja vivamente reflectido neste espelho; uma Paternitas que está
à vontade tanto no Céu como na terra, que irradia por conseguinte, ao mesmo tempo, a
proximidade de Deus e da vida; uma Paternitas, que não brinca com os que a seguem, não cede às
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suas inclinações e paixões, antes toma cada um muito a sério, lhe confidencia algo e, corajosa e
audazmente, o eleva consigo para o mais elevado cume da montanha, para uma maior
proximidade de Deus.
De: J. Kentenich, Crónicas para o arquivo, Milwaukee 1957
22
P. José Kentenich com José Engling
23
No ano 1935 ocorria o Jubileu das Bodas de Prata Sacerdotais do nosso Fundador. Ele mantiverase sempre em segundo plano e em regra evitando ser fotografado. Para muitos, foi pelos vistos,
uma admiração o facto de ele aceitar o convite para esta festa de estilo maior. Na verdade, ele
aproveita este Jubileu, para tornar mais consciente no Movimento a união profunda com ele e de
uns com os outros. O Fundador dá aos seus a perceber, que eles juntos são uma Família e ele com
grande gratidão sabe-se unido a eles. Dá a entender de forma vital, que também ele lhes agradece
muito e na sua memória está vivo, quem contribuiu alguma coisa para o todo. Esta conferência
das Bodas de Prata revela um íntimo contacto mútuo, no qual ele descobre a fecundidade da
comunidade espiritual que em torno dele cresceu. Por outro lado, o Fundador, torna consciente
esta atmosfera familiar com vista às dificuldades que se esperam advindas do terceiro Reich. Vale
a pena prestar atenção a este “um com o outro”, como nesta palestra vem à luz.
24
Vinculação espiritual
mútua
… Mas em agradecimento, devo dizer uma palavra de agradecimento também aos vivos. Penso,
sobretudo, nos que, ao longo destes 25 anos, ou duma grande parte destes anos, aliaram o seu
destino de vida ao meu. Uma vez mais devo dizer: procurem actualmente uma segunda
comunidade que seja assim espírito do espírito e carne da carne de cada um dos seus membros
como a nossa! Ou estarei a exagerar? Será esta uma estratégia, estarei só a procurar sacudir e
transferir tudo o que em si é desagradável? Não, a minha convicção é esta: o que toda a Obra
chegou a ser é igualmente obra vossa, assim como é obra minha. Eu não sei por onde devo
começar. Visto que toda a celebração tem já carácter mais de festa, mais familiar, não tomarão a
mal se eu falar na primeira pessoa, como aliás estou acostumado.
Ouçam, por favor e examinem: pensem em todos os responsáveis da Família; na geração mais
antiga e intermédia; nos Sacerdotes de Schoenstatt; nas Senhoras; nas Irmãs de Maria. À maior
parte – talvez com uma única excepção – o destino de todos esteve entrelaçado com o meu
durante décadas. Não me engano e até explico: a sua vocação para Schoenstatt está, claramente,
quase sempre ligada com um primeiro encontro pessoal. Ficar-lhes-ia grato, se quisessem verificar
tais afirmações, pois estou muito empenhado em que, interiormente, nos sintamos a crescer uns
com os outros, como o Deus Trino desde a eternidade assim o quis. “Quod Deus iunxit, homo non
separet” (O que Deus uniu, não separe o homem).
E a fidelidade mútua torna-se tanto mais profunda, quanto mais vigorosamente, quanto mais
claramente vemos como, o bom Deus, uniu de modo singular os destinos dos homens uns com os
outros. Sim, onde e quando aconteceram pois estes encontros? Seria falta de tacto nesta sessão
solene, tirar o véu de tanta coisa tão misteriosa.
Quando penso na primeira geração, em todos aqueles que agora directamente colaboram comigo,
é natural que a sua filialidade encontrou uma resposta na minha vida de homem, e toda a sua vida
ficou unida ao meu pensar e querer.
Quando também penso na primeira geração dos nossos Sacerdotes de Schoenstatt ou nas nossas
Irmãs, eu sei, na maior parte das vezes, que o primeiro conhecimento provinha duma jornada ou
duma conversação pessoal. E eu creio que podia a cada um, ainda em pormenor, indicar: Aí
começou a Graça a actuar, aí se estabeleceu o mútuo contacto, e a partir daí a relação mútua
tornou-se extraordinariamente fecunda. Sim, minha querida Família de Schoenstatt, assim tem
sido a regra: depois este primeiro contacto tornou-se, de um modo particular, profundamente
25
eficiente e vivo. A Obra imensa, diante da qual nós agora estamos admirados, cresceu a partir
deste trabalho pessoal comunitário, coeso, espiritual.
Levam-me vocês a mal, se um dia procuro esboçar resumidamente a vossa parte nesta Obra?
Devo então primeiro confessar-lhes: Vós próprios tivestes uma influência extraordinariamente
forte no meu próprio progresso pessoal. É verdade, o que há pouco por brincadeira foi atirado, o
que no seu tempo um dos nossos respondia – é um sôfrego pelas nossas conferências, que corre
atrás de cada encontro e com todos os meios entende apanhar -, quando eu um dia dizia, as
conferências não poderem ser transmitidas: “Ele sabe tudo só de nós.”
O livro que eu li é o livro do tempo, o livro da vida, o livro da vossa alma. Não me tivésseis aberto,
assim, sem reserva, a vossa alma e então a maioria das realizações espirituais nunca chegariam a
ser descobertas. Isto não está escrito nos livros. E tem razão, também, uma das nossas Irmãs de
Maria, quando ela há um par de dias era da opinião: “Porque estivemos tão fortemente apoiadas
em Si, despertou-se tanta coisa que, provavelmente, sem isso não seria despertada. “ Se o
primeiro se refere mais ao conhecimento espiritual, assim o segundo mais ao desenvolvimento
das capacidades do coração.
Ontem à noite, um dos nossos antigos recordava-me como outrora quando eles estavam na
guerra, tivera já um coração cálido. Assim, furtivamente, eu tinha tido que cuidar de todo o tipo de
pequenas coisas, pôr um capacete, um colete, etc. É verdade, para a nossa juventude de então,
tive de deixar atear em mim muita calidez de coração. Mas este desenvolvimento continuou
através de todas as pessoas que o bom Deus me ofereceu e me apresentaram as suas exigências.
Se querem saber onde se encontra o segredo de uma fecundidade quase excessiva, então posso
dizer-lhes: Encontra-se nesta profunda união espiritual mútua. E quando antes foi feita a
pergunta: “De onde vem, pois, esta riqueza do coração e do espírito?”, posso dizer-lhes: Um
homem, que ama, que colocou o seu amor no coração de Deus, em certa medida participa na
imensa riqueza do amor de Deus. E quando algo nos empobrece, então isto é o amor, a oferta da
calidez do coração.
E vós, todos os que me apresentastes exigências – ora em voz alta, ora em silêncio -, podem a si
mesmos dizer: sem o senhor eu não seria pessoalmente nada do que eu hoje sou. Não devem
subestimar este ponto, esta sequência de pensamento. Outra vez: Se querem conhecer a fonte da
riqueza em espírito e coração, aqui têm esta fonte! E eu desejo que o bom Deus, e peço para que
Ele dê às gerações futuras muitas ocasiões, para, em silêncio, em segundo plano, servir aos
homens, como eu o pude fazer. A maior riqueza flui de volta sobre aquele que se esforça por
colocar toda a sua força ao serviço das almas.
26
Mas isto só não basta. Aquilo que eu pude ler nas vossas almas, isso me deu quase sempre
orientação para os respectivos objectivos parciais a que aspirávamos. Investigando criticamente,
um historiador objectivo pode mais tarde, atestar que ao longo destes 25 anos, a minha tarefa
primária consistiu no cultivo dos grandes objectivos e no consciente manter-me nestes objectivos.
Mas cada um dos objectivos parciais, que deviam ser realizados, o manter-se, o acentuar destes
objectivos parciais e a luta esclarecida pela realização, isto, minha querida Família de Schoenstatt,
é o caminho estreito impensável sem vós. E aqui começa o encadeamento da acção e da vontade,
da vida e do amor. Todas estas coisas vivem ainda tanto em mim que, na maioria dos casos, lhes
posso dizer: isto e isto é daquele e daquele; isto é um pedaço da vida da sua alma; isto é um
pedaço da vida das suas almas; isto é a misteriosa fonte da nossa profunda comunidade. Sabem
que, geralmente, eu não tive tempo nenhum para coisas sociais e apesar disso, a fidelidade nunca
vacilava, e foi precisamente por isso, porque a vinculação espiritual repousava sobre um tão sólido
fundamento.
Comunidade significa harmonia dos corações. E quando se pode dizer, a família é excelente
através da profunda comunidade íntima de cada um dos seus membros isso, em grande parte, se
deve, porque a maioria investiu o seu melhor em favor de toda a Família. Assim, eu posso pedir a
cada um de todos vós, a confessar-se uma vez sincera e humildemente – ou se não o sabem, estou
com todo gosto preparado para dizer-lhes, em particular, o que está vivo na Família através do
sangue do seu próprio coração.
Se querem ser-me agradecidos por alguma coisa, então só há uma: de facto, eu esforcei-me em
captar tudo o que em vós estava em génese, para em vós edificar uma via, e depois, se isso, em
alguma medida, também pudesse viver na comunidade, declarar também isso, respectivamente,
como princípio. Assim eu lhes podia dizer quem outrora foi o líder do nosso movimento
missionário. Sim, como mestre-de-obras eu edifiquei cada um. E onde eu sabia, que algo saudável
estava em génese, eu me retirava inteiramente, porque sabia que isso já ía crescer.
Eu podia também dizer-lhes quem eram os líderes quando foi fundada a Organização Externa.
Notem bem, isto é verosímil e declaradamente vossa respectiva Obra, através da vossa
colaboração, através da vossa acção e apesar de todo o aparato de guerra é a congregatio
militaris, que foi trazida para o tempo de paz. Aqui têm vocês um exemplo clássico:
propositadamente eu não fui a Hoerde, pois estava bem certo daquilo que depois surgiu. Tudo
estava, de facto, preparado porque cada alma lentamente tinha crescido na grande Obra.
Minha querida Família de Schoenstatt! Permitam-me que agradecido, remeta para vocês com
alegria os hinos de acção de graças, que entoaram. Eu sei que desta forma muito geral esboço
27
aquilo que a mim, pessoalmente, me move. Podia entoar um hino de louvor a todos os que, no
que foi dito, não foram directamente referidos. Penso agora em todos inclusivamente na geração
jovem, em vós todos, que através do enriquecimento do Capital de Graças foram, sempre de novo,
os garantes da Família. Se, desde o princípio o meu Ideal era: em toda a Família eu nada faço sem
os meus colaboradores, então sei que este pensamento penetra todos os meus actos. Os outros
órgãos, com os quais eu não tenho contacto, actuam também segundo o mesmo princípio: “Nada
sem nós!”
A eternidade um dia irá mostrar, como as mais pequenas e mais discretas almas da nossa Família
doaram bens sem conta. Sem a sua vida heróica de sacrifício e de oração não seria pensável a
Família com o seu espírito, como ele hoje é. Sim, nada sem elas! Eu não sei a quem principalmente
me devo ainda referir!
De: J. Kentenich, Conferência por ocasião do jubileu das Bodas de Prata
Sacerdotais, Schoenstatt 11.8.1935
28
O livro, que eu li,
é o livro do tempo,
o livro da vida,
o livro da sua alma.
Não me tivessem aberto,
sem reserva, a sua alma,
a maior parte das realizações
nunca chegariam a ser descobertas.
Pelos livros não se pode ler nada.
José Kentenich, 1935
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Na primavera de 1952 o Padre Kentenich orienta um terciado de quatro semanas para os seus
irmãos Palotinos, em Santa Maria /Brasil. Numa conferência, procura fazer-lhes compreender o
seu pensar e agir face ao perigo do campo de concentração de Dachau. Fica-se com isto muito
claramente em presença da sua atitude sobrenatural, a partir da qual ele abraçou a decisão de 20
de Janeiro de 1942. Ele pressupõe que aos olhos de Deus ele constitui, com o seu séquito, uma
Família. Nesta visão de fé ele confia na realidade do Sobrenatural, na realidade da Aliança de
Amor e do entrelaçamento dos destinos dos membros entre si.
Sem este fundo não compreenderemos o nosso Pai. Para ele, não se trata de um acto
particularmente heróico. Ele quer abrir-nos os olhos para esta profunda dimensão do nosso Um
com o Outro na nossa Família espiritual que, em torno dele e com ele chegámos a ser.
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Entrelaçamento de destino da Família
com o Fundador
Sob o ponto de vista sobrenatural nós somos uma verdadeira Família, eu e o meu séquito e o meu
séquito e eu. Se estamos nos planos de Deus como uma verdadeira família, então também o nosso
destino está entrelaçado uns com os outros, e sobrenaturalmente entrelaçado uns com os outros.
Ou seja: O que o meu séquito, em sacrifícios, por mim oferece, é uma realidade, é por mim
verdadeiramente aceite, e produz efeito, também faz efeito. E vice-versa: Os sacrifícios, que
ofereço pela Família, são um meio muito mais valioso para salvar a Família do que se tivesse toda
a Gestapo do meu lado.
Entendem a atitude sobrenatural extraordinariamente forte? Eu não quero nenhuns meios
naturais para ficar livre; em toda a linha eu não quero ter nem médicos nem Gestapo! – Dito de
passagem, as Irmãs tinham subornado também a Gestapo. Ouçam, como elas foram longe: elas
foram mesmo até Hitler e Himmler. Então eu disse: Não quero isto; eu não quero os meios
naturais. Nós selámos uma Aliança de Amor com a Mãe de Deus, e ela é uma realidade. E se nós
cumprimos a condição, viver agora a Inscriptio por outros, é este então o meio, pelo qual eu quero
ficar livre.
Tenho a impressão, que disse isto claramente. – Estão a ver a atitude sobrenatural bem forte e o
tomar a sério da Aliança de Amor? Vocês sabem, posteriormente, ouve-se isto tão naturalmente,
encontra-se nisto uma lógica tão clara! Mas quando se está diante da decisão, quando
humanamente se deve escolher a morte mais certa, o assassínio mais certo e quando, por outro
lado, todos os que se ama, pedem e imploram: faça agora doutro modo! São vocês capazes de
compreender que isto encerra em si uma intensa luta espiritual?
De facto aconteceu que imediatamente antes fora transportado também um Sacerdote para
Dachau. (Ele) atropelou todas as leis da cadeia, saltou para a minha cela e prostrou-se diante de
mim e gritou: Eu tenho de ir para Dachau! Eu vou fazer mal à Igreja! – Tudo acumulado, para
tornar a decisão terrivelmente difícil. Mas eu, graças a Deus, mantive-a firme.
Agora devem entender-me bem: eu não quero dizer que agora Deus sabe como isto foi heróico.
Outros podem ter feito actos muito mais heróicos. Sabem, aqui o contexto é o mais importante:
realização da condição que a Mãe de Deus no contrato tinha posto. Outra pessoa podia por mim
realizar um acto mais heróico, o efeito não viria a ser o mesmo. Entendem porquê? Porque isto
31
devia ser compreendido no quadro de toda a Acta de Fundação, no quadro da Aliança de Amor
como a condição posta. Que condição? Inscriptio de toda a Família.
E qual foi a reacção exterior? Como sempre, precisamente em Janeiro, os nossos Sacerdotes
estavam juntos. Eles tinham acompanhado toda a situação e a decisão: nós pagaremos o preço do
resgate pela sua liberdade. Entendi eu, por equívoco, que eles tinham já feito a Inscriptio, mas eles
precisaram ainda de dois anos, até eles realizarem o acto (a 18.10.1944) e quando o fizeram, fiquei
livre e a Schoenstatt não aconteceu nada.
A minha Inscriptio protegeu Schoenstatt e a Inscriptio da Família restituiu-me a liberdade. Vejam
um exemplo clássico da íntima ligação, do entrelaçamento de destino entre uns e outros. Vejam o
homem novo na nova comunidade de modo clássico, não dito, mas vivo.
De: J. Kentenich, Brasilien-Terziat, Santa Maria 1952
32
A partir da atitude inteiramente sobrenatural e da ideia do entrelaçamento de destino da família
espiritual, que no texto anterior encontrámos, formam-se, no tempo da prisão, duas grandes
correntes. Para isso estão duas realidades: o Jardim de Maria e o acto de seguimento.
Na Semana de Outubro de 1950 pronunciou palavras impressionantes acerca do Jardim de Maria e
introduziu toda a Família neste mundo, para ele tão precioso e que era a sua génese. É bom,
deixar-se informar por ele mesmo. Dá-lhe pelos vistos alegria, meter-se na linguagem de criança
da carta ao Jesus Menino e trazer assim para a luz o mundo fino e profundo da relação na Família
espiritual. Isto exige respeito e intuição, para entender tudo o que aqui, também entre linhas, é
dito. São processos de beleza e de delicadeza única, que uma Família guarda como sua preciosa
tradição de Família, mas que também todo aquele que a esta Família pertence deve conhecer.
Assim podemos entender, que na Semana de Outubro de 1950 o Pai a todos contou estes
acontecimentos.
33
A génese do Jardim de Maria
Vocês sabem como naquela altura, a Cabeça da Família estava sentada na prisão e como
relativamente rápido fui bem sucedido no ultrapassar de todos os limites para manter a
correspondência e, apesar do perigo de vida, consegui manter contacto com o exterior. O Hospital
em Coblença é o local histórico do Jardim de Maria. Uma das nossas Irmãs, chama-se Mariengard,
antes do Natal, a 23 de Dezembro de 1941, tivera o estímulo interior para escrever uma carta ao
Menino Jesus. – Pensem sinceramente nisto, também aqueles, que estão muito, muito acima de
algo assim: a criança que há em nós grita às vezes, também no homem. – Portanto ela escreveu
uma cartinha ao Menino Jesus. Na verdade tudo tinha sido pensado: a Superiora iria lê-la diante
da Família das Irmãs. A autora queria chamar a atenção às Irmãs: nós queremos rezar, para que o
Menino Jesus faça o milagre da Noite Santa. Esta era a grande carência, no Natal o Menino Jesus
iria soltar das cadeias a Cabeça da Família. É algo simples. Penso que a devo ler diante de vocês
como expressão da confiança, pois ela foi escrita de forma muito perfumada, filial.
«Querido Menino Jesus!
Em breve desces de novo à terra na Noite Santa, e ainda não Te escrevi a dizer o que me vais trazer. Mas
todos os anos trazes aos meninos bons muitas e lindas prendas. Com gosto, eu quero renunciar a elas, se só
o Pai vem de novo. Este ano eu tenho mesmo um pedido grande a fazer-Te a Ti. O nosso querido Pai está já
há tanto tempo longe de nós e todas nós temos saudade dele. Quando, na Noite Santa, desces à terra, não
podes enviar um anjo ao Pai? Então, de repente, ficaria muito claro na sua cela. O anjo dir-lhe-ia: Não
temas, venho anunciar-Te uma grande alegria. Hoje em Schoenstatt nasceu o Salvador. Vai depressa à
Capelinha. Deparas aí com o Menino nos braços da Mãe! E depois muitos anjos viriam abrir o caminho ao
Pai para o pequeno Santuário. Aí veria ele o ‘Milagre da Noite Santa’. O Menino diria: Tu podes agora ficar
sempre junto de Mim e contar às tuas crianças muitas coisas acerca de Mim, para que elas, pela mão da
Mãe, Me encontrem também inteiramente a Mim. E todos filhos de Schoenstatt teriam uma enorme alegria
e toda a noite Te louvariam a Ti e à Tua Mãe. E mais tarde se há-de falar ainda do ‘Milagre da Noite Santa’.
Querido Menino Jesus, agora tenho de dormir ainda duas vezes, depois é Natal. Eu confio muito
firmemente, que Tu me realizes este pedido, porque Tu és poderoso e, no Natal, presenteias os meninos
bons. Agora quero ainda escrever-Te depressa o meu nome: Eu chamo-me “Maria Providência” e moro na
filial das crianças em Coblença. Com a mãe somos, ao todo, 55 crianças.
‘Ó Tu querido Jesus Menino ouve, por favor, a nossa súplica,
Por favor, deixa que muito em breve voltemos a ver o Pai.
Queremos, então, como os anjos lá em cima
a Ti e à Tua Mãe louvar-Te: Jesus e Maria!’»
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A superiora fez chegar à prisão esta carta, escrevendo: “A carta é da Mariengard.” Ainda me
recordo bem, eu recebi-a à noite, ergui-me na cama e respondi. – Isto faço-o sempre, aproveito
sempre o que o Senhor Deus faz naqueles com que Ele me presenteia. Eu podia indicar-lhes com
exactidão aquilo que na Obra entrou desta ou daquela alma, desta ou daquela corrente. A cartinha
fora escrita ao Menino Jesus, a resposta tinha, por isso, de se adaptar ao estilo de criança. Querem
ouvir também a cartinha? Desperta em nós todos agora a criança.
“Minha querida pequena Mariengard! Satisfaço o teu desejo, se o teu coração e o coração de toda
a Família se tornar num florescente jardim de Maria; portanto a realização do teu pedido, o
‘Milagre da Noite Santa’, fica colocado na tua mão e na mão de todas as crianças de Schoenstatt’.
Apressai-vos, para que não venha a ser tarde demais. É que tenho ainda muitos planos e, para
isso, preciso do vosso Pai. Agora Eu o preparo para isso. Se cultivais bem o vosso jardim, Eu
acelero o trabalho de polir e apurar. Para consolação comunico-te que na cela do Pai, reina
sempre muita luz e calor. E trabalho tem ele quase tanto como em Schoenstatt. Diariamente ele
recebe muitas visitas. Saudação cordial e Bênção do Céu …”
Entendem, uma vez que a autora se chama Mariengard, baptizei o “todo” de “Jardim de Maria”. O
Milagre da Noite Santa acontece em mim, se ele aconteceu em vós. E quando acontece ele em
vós? Quando vocês se tornarem um florescente jardim de Maria: “Quando o coração de toda a
Família se tiver tornado um florescente jardim de Maria”, quando vocês tomarem a sério a
Inscriptio, então fico livre. Outro preço de resgate não há. Uma extraordinária consciência de
responsabilidade entre a Cabeça supra temporal e o séquito é o ponto que, depois foi captado
através da corrente de seguimento. O efeito da cartinha vem depois. Depois a pequena
Mariengard escreveu de novo outra cartinha. Há portanto sucessivas cartas ao Menino Jesus.
«Querido Menino Jesus! Hoje posso dar resposta à tua querida cartinha. Não calculas a imensa alegria que
causaste a nós todas. E, por isso, é que tenho de Te agradecer muito cordialmente. O que mais gostaria era,
eu mesma, levar pessoalmente a cartinha, mas não pode ser, o caminho é demasiado longo e,
seguramente, não me deixariam entrar. Assim, envio a minha cartinha de agradecimento pelo correio
celeste, então chegará bem, de novo, com toda a certeza.
Sabes Tu, eu jamais teria sonhado, que na Noite Santa, em que tens tanto que fazer, Te sentarias a escrever
uma cartinha à pequena Mariengard. Parece-me um sonho e, contudo, é realidade. E além disso, és tão
grande e tão inteligente e sabes tudo quando penso como muitas pessoas já ficariam muito felizes, se só
tivessem num papel a inicial, ou porventura até uma palavra de Ti, ocorre-me então a linda frase, que no
fim do seu discurso o Pai muitas vezes usava: ‘Os agricultores mais parvos têm as batatas maiores.’
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Portanto estou muito feliz, porque respondeste à minha cartinha de Natal. Recebi-a em Schoenstatt ontem,
no segundo dia de Natal. Então eu, quando estava novamente em casa, fui logo a correr à mãe e dei-lha a
ela. Se tivesses visto, como ela se alegrou! Depois fechámos a porta e, palavra por palavra, lemos a tua
cartinha. Tu sabes, eu não conseguia decifrar tão depressa a tua letra, mas ela conseguiu-o muito mais
depressa que eu. Mas ela também é maior, e talvez já lhe tenhas tido que escrever mais vezes uma cartinha,
porque ela agora também está assim muito sozinha. Sim, o Pai saiu. E educar como ‘santas’ tantas crianças,
não é assim tão simples.
Às vezes a mãe parava, também, numa palavra mas isto era de tanta alegria. Onde escreveste acerca do
trabalho de polir e de apurar, eu não o entendia bem. Depois a mãe esclareceu-me. É que eu nunca vi
nenhuns ‘cantos’ no nosso Pai e então pensei, que não se aplica ao Pai, pois o Pai foi sempre bom para nós.
Mas eu entendo isto muito bem, seguramente só mais tarde, quando o Pai no-lo explicar.
E, quando acabámos de ler a tua cartinha, rezámos a seguir uma pequena oração de acção de graças e
começámos depois, novamente, do princípio. – E tivemos muita alegria, certamente que viste isto desde o
Céu. A meio da leitura bateram à porta, o que me doeu muito, pois estava tão fascinada, era tão lindo …
A seguir fui logo para o trabalho, porque queria começar imediatamente com o ‘Jardim de Maria’, e porque
aí pertence também o ‘cumprimento fidelíssimo do dever’. Mas acredita, não conseguia esquecer a tua
cartinha. Nos meus ouvidos eu ouvia sempre: ‘Minha querida pequena Mariengard!’»
Quando se ouve isto, parece que estamos perante uma narração do livro “Mil e uma noite”. E, de
facto, era mas num fundo escuro. Imaginem o perigo (na prisão). O Menino Jesus responde, mas
depois acaba.
«Minha querida pequena Mariengard! Tu me compreendeste bem. Antes estavas sempre a pensar que
devias toda a vida ficar órfã de pai. Estás convencida agora do contrário? Então, começa também em breve,
com as outras irmãs, a cultiva, cuidadosamente o jardim de Maria. Em breve Eu vou chegar … e, se gostar
de todas os canteiros de flores, satisfaço o vosso desejo e envio-vos o Pai de volta, bem preparado para o
novo trabalho e novas lutas …»
Na verdade, foi isso mesmo que se tornou realidade. Vejam, esta é a primeira etapa. Vejam o que
então se tornou vivo. A ideia central é esta: um mútuo entrelaçamento de destino e uma
consciência de responsabilidade, extremamente fortes. A este respeito costumamos dizer: Uma
viva, profunda, eficaz Aliança de Amor com e entre uns e outros.
Devo dar-vos testemunho de quanta força despertou isto. Não se trata só de uma Aliança de Amor
com a Mãe de Deus, entre o Céu e terra, mas também de uma Aliança de Amor entre a Cabeça e o
seu séquito e de uma Aliança de Amor do séquito entre si. Realmente, de modo heróico, todos os
36
anos se trabalhou sempre a partir do pensamento: O Milagre da Noite Santa tem de primeiro
acontecer em nós, depois acontece também na Cabeça.
De: J. Kentenich, Semana de Outubro de 1950
37
P. José Kentenich com a Ir. Mariengard na Casa Regina em 1.1.1968
38
No texto da Semana de Outubro de 1950 o Fundador referiu-se ao acto de seguimento dos
Sacerdotes de Schoenstatt como paralelo da corrente do Jardim de Maria, que sobretudo estava
viva nas Irmãs de Maria. Ele tinha esperado que os Sacerdotes do Movimento, na Jornada de
Janeiro de 1942, tivessem feito um acto neste sentido para contribuírem para a sua libertação.
Mas só aconteceu em 18 de Outubro de 1944. Posteriormente, este acto foi renovado sempre de
novo. No Terciado do Brasil, o Fundador, explica o sentido deste acto de seguimento com vista a
uma renovação, como fora levada a cabo pelos Sacerdotes, a 20 de Janeiro de 1949. Ele liga essa
importância ao facto de os Sacerdotes terem realizado o seu acto de seguimento perante ele
como (permanente) Cabeça supra temporal da Família. Trata-se de um texto reflectido, que
pretende apontar e fazer compreender os motivos para o acto de seguimento.
39
No seguimento do Fundador
Se agora pensarmos no acto de seguimento de 1949, então perguntamos: Diante de quem é feito
este acto, directamente? A resposta é: da Cabeça da Família como supra temporal, não
formalmente, como condicionada pelo tempo. Onde estão então as razões para o acto de
seguimento, que em 1949 os nossos Padres e os Sacerdotes do Instituto fizeram, mas que há
muitos, muitos anos antes, as nossas Irmãs tinham realizado? O que, na nossa coluna dos homens,
segundo o modelo dos nossos Sacerdotes, se chama acto de seguimento, as nossas Irmãs
chamam-lhe acto de filialidade. Mais tarde foi assumido pelas comunidades femininas sob a
designação: implantação no Jardim de Maria. Mas é sempre a mesma realidade. Não esqueçam, as
expressões são diversas, a realidade é a mesma: acto de seguimento. Agora uma vez mais: Onde
estão pois os motivos mais profundos para este acto? São, sobretudo, dois.
O primeiro motivo: Reconhecidamente ele é um motivo metafísico, fundado na ordem do ser. Se
na ordem do ser a actual Cabeça é uma realidade supra temporal querida por Deus, então,
segundo a Lei “Ordo essendi est ordo agendi” (a ordem do ser determina a ordem do agir), seguese por si mesmo: por conseguinte temos nós, duma maneira ou doutra, de fazer o acto de
seguimento. Ou dito de outro modo: Nós reconhecemos este carácter supra temporal da Cabeça.
E, na prática, por meio do quê, acontece este reconhecimento? Eticamente, pelo acto de
seguimento.
O segundo motivo é um mais sociológico. Não podem esquecer que desde Dachau cada um dos
Institutos recebeu uma existência própria. Tornaram-se, portanto, juridicamente totalmente
autónomos. Até Dachau tinha eu juridicamente a Direcção de todos os Ramos. Em Dachau tornei
todos os Institutos juridicamente autónomos. Estão a ver, os nossos Sacerdotes do Instituto, uma
comunidade própria, com o seu governo, inteiramente independente. Exactamente tão
independentes como as Irmãs de Maria de todas as outras chefias e direcções, eram os Irmãos de
Maria, eles eram também, totalmente independentes, um mundo por si, juridicamente uma
comunidade própria. O mesmo vale para as Senhoras de Schoenstatt. Conscientemente, portanto,
eu larguei da mão, todos os direitos de direcção perante estes Institutos. Podem entender onde,
sociologicamente considerado, estava agora o grande perigo? Que o independente Um com o
Outro amanhã se tornasse num independente Um contra o Outro. O perigo era duplamente
grande, porque todos têm a sua casa mãe no mesmo lugar e todos teriam que lutar com
dificuldades financeiras. Entendem, quão grande o perigo era de que a Família fosse inteiramente
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destruída? Estão a ver, para a sociologia de toda a Família, a independência jurídica de cada um
dos Ramos tornava necessário um ponto central que, pelo menos, tivesse uma posição de
confiança reconhecida por todos.
São estes os dois motivos que me levaram a aceitar o acto de seguimento. O acto de seguimento,
nos nossos Sacerdotes, resultou da visão de 20.1.42. O motivo sociológico não esteve, em
primeiro plano, no pensar sobrenatural, foi depois que eu o acrescentei. Para além disso, quando
aceitei o acto, dei-lhe, um extraordinariamente forte, carácter simbólico.
Em primeiro lugar acentuei: eu quero só, como transparente de Deus, aceitar o acto de
seguimento. Em si, isto era evidente. Homens maduros fazem só um acto dentro deste contexto
mas, como metafísico, dou importância em acentuar sempre o último e, por isso, sempre me
esforcei por fazê-lo.
Em segundo lugar acentuei: Eu compreendo-me a mim como símbolo para a autoridade paternal
na Família e, por isso, da corrente de seguimento fiz surgir uma corrente de obediência.
De: J. Kentenich, Brasilien-Terziat, Santa Maria 1952, 52ª Conferência
41
O texto seguinte é proveniente da Argentina onde, nos anos 50, a província argentina das Irmãs de
Maria teve um papel importante para a corrente do Pai. Paralelamente se consagrava a província
do Brasil à corrente de Cristo, e a do Chile à do Espírito Santo. No dia do S. José, em 1952, o
Fundador, em Florêncio Varela (Argentina), abençoou o Olho do Pai para o Santuário e, nesse
momento, acentuou que a Mãe de Deus, na História de Schoenstatt, não só conduziu a Cristo, mas
também, n’Ele, ao Pai. Para o Padre Kentenich esta permanecerá, para sempre, a tarefa da Mãe de
Deus. Schoenstatt, segundo o desejo e vontade do Fundador, dedicar-se-á, por isso, sempre ao
cultivo de uma espiritualidade mariana e patrocêntrica.
Nesta homilia o Padre Kentenich fala também de duas correntes do Pai, no sentido de que se
encara tanto, a relação para com o Pai do Céu como, também, a relação para com seu
transparente no pai terreno, ou seja, para com a pessoa do Fundador. Ele confia em que a Mãe de
Deus desde o Santuário propague estas duas correntes. Trata-se de uma missão, que até hoje toda
a Família de Schoenstatt desde a Argentina gravou na sua bandeira.
42
A Mãe de Deus
e a corrente do Pai
Sem dúvida que nós como província tínhamos, desde o princípio, como grande tarefa levar pelo
mundo e pelo tempo fora, uma corrente do Pai. É algo extraordinário e admiravelmente grandioso
e profundo, como é que nós pudemos viver e saborear as correntes da Família que ajudámos a
elaborar. Quanto mais nós fomos conduzidos para a Mãe de Deus, tanto mais fortemente a Mãe
de Deus nos conduziu em Cristo e com Cristo para o Pai. Parece-me, que não há na Igreja de Deus
nenhuma comunidade como a nossa, movida de modo tão grandioso, forte e profundo por uma
tão elementar corrente do Pai, que tudo vence. E que, a esta corrente do Pai se oponham
dificuldades, é o mais normal do mundo. Pode ver-se agora se a Mãe de Deus encenou a corrente
do Pai ou se algo de humano colaborou.
Ad Patrem! Proclama-o o olho do Pai. E entretanto, crescida esta corrente elementar, também o
elementar reverso da medalha cresceu: a corrente filial. Pai e filho estão relacionados. Onde uma
corrente do Pai se tornou forte, dá-se aí uma corrente filial. De que precisa o tempo actual mais
que de uma corrente do Pai e filial! Muitas vezes no-lo disseram numa despretensiosa, simples
explicação de criança. Nós sabemos: assim como na família natural a tarefa da mãe consiste em
revelar o pai, chamar a atenção para o pai – porque doutro modo a criança não sabe quem é o pai,
pois o pai não vive assim tão instintivamente juntamente com o filho como a mãe -, assim o fez
também a Mãe de Deus. Sem a mãe jamais chegaríamos a saber quem é o nosso pai, e a tarefa de
uma autêntica mãe consiste em elevar o pai para o primeiro plano. Viram isto realizado na Família,
numa forma extraordinariamente profunda. Foi este, desde o princípio, o meu Ideal: conduzir
todos vós para a Mãe e a Mãe de Deus, tomando-vos pela mão, vos conduzirá ao Pai. Não
esqueçam: O Pai é o último, o mais profundo; o Pai é o princípio e o fim de toda a História da
Salvação.
Não esqueçam: Toda a nossa piedade pode ser mariana e permanecê-lo-á eternamente. A nossa
piedade permanecerá eternamente uma piedade crística, uma piedade pneumática, mas ela tem
de permanecer também, eternamente, patrocêntrica. Na nossa simples forma de pensar que
sempre vê natural e sobrenatural como um todo, Deus cuida para que, pelo nosso caminho de
vida, encontremos transparentes de Deus Pai. Nós queremos isto e quer a Mãe de Deus aqui
desde os seus Santuários criar um profundo movimento de renovação do mundo. Então Ela tem
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de cuidar para que os transparentes de Deus, para que o Pai, o pai terreno como reflexo do eterno
Pai, de novo, se torne o ponto de repouso de toda a forma de vida aqui na terra.
Corrente do Pai! Corrente filial! Aí têm os dois círculos, as duas correntes do Pai, que se desperta
por meio da expressão: a Patre ad Patrem! De Deus Pai para o Deus Pai! Parece ser uma das
tarefas essenciais da Mãe e Rainha Vencedora Três vezes Admirável de Schoenstatt, a partir dos
seus Santuários, criar estas duas correntes do Pai. Para isso, desde há anos dissemos: Uma das
mensagens essenciais de Schoenstatt é a mensagem do Deus Pai, isto é, a mensagem da imagem
terrena do Pai, do transparente de Deus, e isto como o meio instintivo mais importante para
deixar crescer uma íntima, viva e extremamente fecunda filialidade perante Deus Pai.
Assim devem interpretar o despretensioso acto da Bênção do “Olho do Pai”. Para nós isso é tão
frequente e a simplicidade do cerimonial exterior determina a grandeza do acto. A solenidade do
cerimonial externo está em relação inversa à sua importância. Assim, queria eu também, por
minha parte, dar ao simples e despretensioso acto de hoje, a Bênção, dar ao “Olho do Pai” a
Bênção da Igreja. Mas vocês sentem tudo o que neste acto se deve expressar, e eu pessoalmente
creio inabalavelmente que, através das lutas actuais, é de esperar uma abertura da corrente
mariana para a corrente do Pai com um duplo cunho: da imagem quer terrena, quer celestial do
Pai.
De: J. Kentenich, Homilia por ocasião da colocação do Olho do Pai
no Santuário de Florêncio Varela /Argentina 19.3.1952
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No esclarecimento acerca da novidade do Movimento de Schoenstatt e da sua espiritualidade,
desde os anos 50 que se fala de três pontos de contacto. Schoenstatt vive da Aliança de Amor com
a Mãe de Deus, sabe-se acolhido no Santuário de Schoenstatt e está unido ao Fundador, Padre
José Kentenich. Trata-se, nada menos, da identidade da Fundação, pela qual um Fundador, no
futuro tem de lutar. O Padre Kentenich vê a sua Fundação continuamente exposta a tendências
que põem em perigo esta identidade. Para ele, a fecundidade de Schoenstatt depende de que
permaneça fiel às forças fundamentais, a partir das quais se formou e cresceu. Na Jornada de
Natal de 1967, em retrospectiva, ele fala das grandes lutas, precisamente, desde 1949, em torno
do terceiro ponto de contacto. Deste modo ele se refere ao tempo da Visitação e do exílio que
visavam separar Schoenstatt do seu Fundador e reduzir a sua autoridade de Fundador. O Fundador
vê nestas discussões acerca da sua posição como Cabeça da Família, o plano de Deus, que queria
saber para sempre assegurada a Fundação no seu Fundador. Para a aprovação desta visão ele
invoca os últimos Papas.
45
Luta à volta do “terceiro ponto de contacto”
Então nós conhecemos, sem dúvida, também o terceiro ponto de contacto. Trata-se da Cabeça da
Família. Não podemos admirar-nos se o bom Deus, como assim o cremos e acreditámos, fez de
Schoenstatt a sua ocupação predilecta – não foi por acaso que desde 1949 deixou irromper as
grandes lutas que tiveram sempre como objecto a Cabeça. Não o princípio meramente em si,
apesar de também ser de extraordinária importância, sobretudo quando o vemos no plano
sobrenatural. No plano natural tratava-se também do portador do princípio paternal. Se o bom
Deus tomou assim a seu cuidado uma realidade, um processo de vida, é evidente que isto há-de
ter um sentido especial.
Por isso, afirmo novamente que o terceiro ponto de contacto é a Cabeça supra temporal da
Família. Nós não podemos negar isto: o princípio paternal, a corrente do Pai, não teria penetrado
tão profundamente no espírito, na alma, na alma da comunidade da Família, se antes se não
tivessem dado estas duras lutas. Quanta coisa teve que ser examinada! Quando uma afirmação se
torna cada vez mais dura, a pessoa fica cautelosa. Se, no entanto, o bom Deus quis uma tal
discussão, evidentemente que também a Cabeça supra temporal tem de se manter para sempre
como ponto de contacto. E aqueles que, no decurso dos anos passados, arriscaram por esta causa,
lutando e sangrando, podem saber que estiveram ao serviço de uma ideia de Deus.
Que posso e devo dizer agora sobre este aspecto, em particular? Não o sei. Nós queremos
recordar-nos como os últimos Papas se puseram todos neste terreno: cada comunidade religiosa
tem de examinar o seu espírito, em relação com o espírito do Fundador. Por isso, em toda a linha
o lema: regresso à pessoa do Fundador! Sabemos também que o Santo Padre, por ocasião da
renovação e da revisão dos Estatutos, quis que se prestasse atenção, principalmente a dois
momentos: Primeiro. Correspondem os Estatutos ainda ao espírito do Fundador? Segundo (não
pertence agora ainda aqui, mas depois queremos falar mais detalhadamente sobre isso). Em cada
uma das suas determinações, estão os Estatutos de acordo com a Sagrada Escritura?
Neste contexto, já anteriormente tinha referido muitas vezes, - aliás vai há muito, quando pela
primeira vez o contei – como nos Salesianos se conserva a memória do Fundador Dom Bosco. Isto
se passou numa altura, em que alguém me dizia, cada salesiano devia estar uma vez em Turim. Na
verdade, os Salesianos não tinham um sistema completo de educação, mas o espírito de Dom
Bosco, esse está embutido nas paredes de Turim. E quando a alguém – assim me contaram acerca
do que lá se passa – se pergunta pelo sistema de Dom Bosco, procura ele dar só duas respostas: a
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primeira: “Aprendei a amar!” Na “Santidade da vida diária” podemos ler o seu testamento. E,
depois, a segunda resposta: “Olhai como eu faço, e imitai-me!”
Compreendem o que isto significa? Mas o que, de certo modo, ultimamente como mudança agora
se constata é que a sua Comunidade cresceu muito. Por isso, é muito difícil que uma vez na vida
todos possam experimentar o espírito de Dom Bosco que dessas paredes, de Turim, emana.
Mantém-se, contudo, a afirmação: o profundo afecto de cada salesiano ao Fundador supra
temporal, à Cabeça supra temporal.
Porque é que eu conto isto? Pura e simplesmente para acentuar que tudo o que neste sentido
queremos não é nada de novo. Moderno, assim me parece, devíamos quando muito dizer, isto é,
para o nosso tempo. E porque a humanidade de hoje, no estádio actual, anda tão
extraordinariamente afastada da autoridade, o bom Deus teve, sim senhor, de fazer tantos
ensaios, de dar tantos golpes à Família, até que ela se tornou simples e, em toda a linha, de novo
aceitou este terceiro ponto de contacto.
Não esqueçam que, nós antes dissemos que estes três pontos de contacto, actualmente no
conhecimento claramente reflexivo, são um resultado de lutas. Que quero eu dizer com isto?
Temos de distinguir sempre o que, funcionalmente era evidente, e o que para segurança reflexiva
se destacou e, por isso, também como claramente conhecido, reflexivamente, tem, como meta, de
ficar assegurado.
De J. Kentenich, Jornada de Natal 1967, 28.12.
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A forte acentuação da ideia do pai no Movimento de Schoenstatt não se entende sem a visão
fundamental do Fundador acerca da importância da experiência do pai. A experiência como cura
de almas e a ampla reflexão filosófica, teológica e psicológica durante décadas fizeram
amadurecer no Padre Kentenich a consciência de que à experiência do pai como raiz da fé em Deus
cabe uma importância decisiva. Já em 1937 tinha ele orientado um retiro de quatro semanas sobre
“Ser filho diante de Deus”. Na Jornada Pedagógica de 1951 insiste ele sobre a relação entre a
questão acerca do pai e a questão de Deus. Progressivamente ele vê a sua tarefa e missão nisto:
abrir à fé em Deus Pai, como ela constitui o núcleo central da mensagem de Jesus, um caminho
para o futuro.
48
Importância da experiência do Pai
A raiz irracional da nossa fé em Deus, adoeceu. Com isto tocamos um ponto que, como segundo
fio vermelho, atravessa toda a Jornada e que, por isso também, deveria ficar profundamente
marcado.
Esta raiz irracional da nossa fé em Deus é a experiência natural, experiência do pai que penetra até
à vida subconsciente da alma, pois segundo a lei da transferência do afecto, facilmente pode e
deve ser transferida para Deus Pai, no qual, nós na tormenta do tempo actual, podemos
unicamente ter um ponto de repouso, uma segurança, que vence todas as dificuldades. Entendem
a grande importância das impressionantes frases? Tenho eu razão, quando digo: nós vivemos num
tempo sem pai? Tenho razão, quando acrescento: porque vivemos num tempo sem pai,
consequentemente também, num tempo sem Deus? Possa a Mãe de Deus ajudar-nos para que,
tomando a sério as relações internas, retenhamos profundamente em nós verdades tão
importantes e tão impressionantes.
Nietzsche diz a importante frase: “Hoje, no tempo moderno, não há mais terras de crianças,
porque não há terras de pais.” Sabem o que isto quer dizer? Posso continuar o pensamento no
sentido do contexto, que agora mesmo estabelecemos? Nós não temos mais nenhumas terras de
Deus, porque não temos nenhumas terras de pais. Por isso, também não temos mais nenhumas
terras de crianças.
A Pestalozzi atribui-se um outro pensamento: “A maior infelicidade para o tempo actual é a perda
do sentido de criança, porque torna impossível a acção paterna de Deus.” Psicologicamente
considerado, a raiz mais profunda para a perda do sentido de criança, está no tempo sem Deus.
Este é o facto aflitivo, porque não temos mais pais saudáveis que genuinamente possam despertar
o natural sentido de criança que penetra no subconsciente da alma e atinge o homem todo.
Eu quero, uma vez mais, citar e apresentar, neste contexto, o pensamento de Nietzsche.
Conhecemos o seu grito: “Deus está morto!” Dão-me vocês razão, se eu acrescento: Deus está
morto, porque o pai, na ordem natural, está morto!? Sem as experiências naturais mais profundas
de criança, perante o verdadeiro pai ou um pai substituto, normalmente, é extremamente difícil
uma experiência e imagem do pai, sobrenatural, que lhe corresponda.
Portanto, donde pode advir a ideia de que temos de falar hoje desta forte repressão da ânsia de
Deus? Porque vivemos num tempo sem pai e, por isso, tempo sem Deus. Quem entende isto, tem
49
com uma das respostas mais profundas às necessidades religiosas do tempo actual, sobretudo,
quando se trata da nossa juventude.
De: J. Kentenich, Jornada Pedagógica de 1951
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Mãe, conduz-nos ao Pai.
Não só a nós, mas a todos
os que aqui chegam
para experimentar o teu amor e poder.
Conduz-nos ao Pai.
Concede-nos o mundo admirável
da filialidade.
Faz com que, em breve, experimentemos milagres.
E conduz toda a Família
para o Santo Padre,
para que ele cada vez mais
seja o Pai da nossa Família.
Conduz-nos pelos caminhos,
que durante a tua vida terrena
Tu percorreste;
foram os caminhos escuros da Fé.
Conduz-nos também pelos caminhos de Cristo.
Faz-nos participar sempre
no seu destino.
José Kentenich
No Santuário do Fundador de Madison, USA
19.8.1953
51
O seguinte texto provém das assim chamadas Conferências de Segunda à Noite em Millwaukee. O
Padre Kentenich desde 1955 até 1964 encontrava-se, sistematicamente, à segunda à noite, com
casais e com eles tratou de temas de Fé e, sobretudo, de questões referentes à vida do
Matrimónio e da Família.
Num tal grupo, ele tratou também, de modo compreensível, a questão da transparência humana
da paternidade em vista da paternidade de Deus. Aí abordava os problemas que surgem na vida
concreta e deu muitos impulsos para a sua solução.
52
Girar em torno do Pai
Se agora reflectimos: o que deve, pois, significar propriamente, para nós, o dia do Pai? Basta-nos
só compará-lo com o dia da Mãe. Isto é, no dia do Pai devíamos gravitar em torno do nosso Pai,
mas também, ao mesmo tempo, em torno do Pai do Céu. Nós já sabemos isso, o pai da terra é o
transparente do Pai do Céu.
O que significa, então na prática? Significa que devemos gravitar em torno do nosso pai. Portanto,
primeiro em torno do pai da terra e a sua imagem deve ser sempre colocada diante do nosso olhar
espiritual.
Recordemos então: Na minha vida como é que o meu pai se encontrou comigo? Que tenho para
lhe agradecer? Quanto fez ele por mim? E se ele agora está na eternidade, quero eu de novo, uma
vez mais, muito expressamente pensar nele e, de todo o coração, ser-lhe agradecido por tudo o
que ele de bom, de algum modo, fez porque ele me deu a vida, porque cuidou pela saúde, pela
formação – ou o que quer que seja, ele me fez.
Mas, se tenho de dizer para mim próprio que aqui e ali ele falhou (por exemplo, provavelmente a
um filho ele deixou estudar e eu não recebi formação nenhuma; ou seja que outro motivo for.
Vêm? Temos primeiro que pensar nisto: O pobre pai talvez não soubesse fazer melhor! Em que
condições cresceu ele? Provavelmente, ou pelos vistos, ele não me podia dar mais do que o que
me deu. E se eu, apesar disso, constatar erros, então devia agora, de coração, perdoar-lhe.
Sim, e por isso: Se nós mesmos somos pais, então queremos lembrar-nos de que dias destes,
parecidos com os dias cristãos de festa são, não só dias de recordação, mas também de
renovação. Que quero eu então renovar? A minha atitude de pai perante os meus filhos. Sim e
como se apresenta esta atitude? (Acerca disso queremos mais tarde falar, mais detalhadamente.)
Mas nós não queremos esquecer também o Pai do Céu. Também aqui se diz para reflectir: Que
agradeço eu na minha vida, que agradeço eu na vida da minha família, ao Pai do Céu? Não é
verdade, e sobre isto já falámos muitas vezes, que a maioria dos católicos hoje, em geral, não tem
nenhum sentido para Deus como Pai? Um dia devemos reflectir, quantos, desde que andamos
juntos, já pudemos contar e falar sobre Deus como Pai.
Depois não podem esquecer um segundo ponto, do qual que também já muitas vezes falámos uns
com os outros. Nós sempre dizemos que a missão especial da Mãe de Deus, aqui no nosso
Santuário, consiste em que Ela nos abre o espírito para Deus Pai e nos educa para verdadeiros
filhos do Pai. Não é verdade, que nós estamos habituados a dizer usualmente que a Mãe de Deus
53
nos conduz para o Salvador? Ora, não basta dizê-lo. Onde há Santuários de Schoenstatt, aí estão
centrais de educação da querida Mãe de Deus: Ela nos conduz em Cristo, ao Pai.
Vejam, a partir daqui, já compreendem também muito melhor, que uma graça específica do nosso
Santuário consiste em que nós per eminentiam (de modo excelente) nos tornemos filhos da
Providência. Providentiae filius (filho da Providência) e filho do Pai é sempre a mesma coisa, pois
na medida em que, como sou filho da Providência, coloco as rédeas da minha vida na mão de Deus
Pai. E, na medida em que sou filho de Deus Pai, isto é, filho do Pai do Céu, eu tenho sentido para a
actuação de Deus na minha vida, através das circunstâncias.
De: J. Kentenich, À segunda à noite … Conversa com famílias, Vol. 21: A nossa vida na luz da Fé
.
54
Um segundo contexto central da corrente do Pai é, ao lado da importância do pai para a questão
de Deus, a importância do pai para a questão da autoridade. José Kentenich vê a autoridade muito
em relação com a paternidade e “Auctoritas” no sentido de autoria. No seu breve estudo
intitulado “My Philosophy of education” do tempo de Milwaukee ele trata pormenorizadamente, a
relação de paternidade com autoridade. Esta elaboração expõe a sua compreensão em muitas
facetas e é um permanente desafio aos detentores de autoridade na casa paterna e na escola,
Igreja e Estado.
55
Renascer do Pai
O renascer do Pai é o renascer da autoridade paterna. Há uma autoridade interior e exterior.
Ambas têm de estar sempre unidas uma com a outra. Falta a autoridade interior, então a exterior
fica sem alma e torna-se por isso ineficaz: As suas funções assemelham-se a uma rectificação ou a
um adestramento. Se não se tornar em fonte de vida verdadeira, ela contrariará o modo próprio
de ser da autoridade.
Ter autoridade significa ser autor, ser criador da vida que dela brota. Dado que, na educação, a
fonte mais perfeita da vida é a pedagogia do amor, a autoridade interior do educador deve ser
compreendida como análoga ao seu poder de amor. Este amor não é só uma força, que une, mas
também uma força, que torna semelhante; a sua eficácia no outro consiste numa ampla
transferência de vida.
Dito com maior precisão: A autoridade paterna recebe a sua força interior e o seu peso da força
criadora do amor paterno, da sabedoria paterna e do cuidado do paterno.
O amor paterno actua formalmente como doação pessoal ao tu da pessoa humana, semelhante a
Deus, curva-se com profundo respeito perante o seu modo de ser, perante o seu destino e perante
a sua missão pessoal. Ele consegue uma inesgotável confiança enaltecedora, quer dizer, acredita,
em todas as situações, no que há de bom no outro e não se deixa inibir no serviço desinteressado
à missão do educando. Exemplo desta atitude fundamental é o modo de educar de Deus Pai, na
condução de toda a humanidade, assim como de cada membro e indivíduo. Lição viva dá o Ideal
do bom Pastor que vive numa mística biunidade espiritual com seu séquito – de modo semelhante
como Cristo o faz com seu Pai -, e assim, o verdadeiro bom Pastor, mesmo que também
infinitamente inferior, pode dizer com o Homem Deus: “Eu conheço os meus, e os meus conhecemMe, como o Pai Me conhece, e Eu conheço o Pai” (Jo 10, 14-15). Este conhecimento mútuo, de um
pelo outro, não um conhecimento meramente abstracto. Ele encerra em si, ao mesmo tempo, um
místico um com o outro, profundamente rico, um no outro, um com o outro e um para o outro de
amor. Como o bom Pastor, também a sua imagem conhece uma fidelidade de pai e de pastor, que
de si pode dizer: “O bom Pastor dá a sua vida pelas suas ovelhas” (Jo 10, 11).
O amor paterno, como todo o verdadeiro amor, compõe-se de três elementos: Dedicação,
Respeito e Confiança.
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A dedicação paterna exige, por isso, uma perfeição e coroação no respeito paterno diante da
grandeza e da dignidade por Deus, impressa no outro. Ao mesmo tempo, ela exige uma inabalável
confiança na pessoa e na missão.
Esta tríplice atitude no educador desperta, naturalmente, no educando a mesma atitude
tridimensional. Encontram-se estas atitudes umas com as outras, criamos então a atmosfera, em
que só é possível uma educação profunda. Na medida em que um, ou outro elemento falta, são
ilusórias as medidas educativas. Frequentemente conseguem o contrário. O conhecimento de tais
conexões serve de norma e critério para toda a educação.
O amor do pai procura o seu complemento na sabedoria do pai e no cuidado do pai. Com simples
naturalidade, o amor do pai aceita, sobretudo, o amor estimulado da criança com verdadeira
gratidão e profundo respeito e procura cuidar dele, segundo a lei da transferência e da
transposição orgânica.
Sob o ponto de vista pedagógico, a transferência orgânica para cima dá-se de três modos: através
da indicação do ser e verbal, através da conscientemente cultivada, conduzida pela inteligência,
renúncia corporal a estar junto dele e, através da desilusão de um com o outro. Orientação para o
processo de vida aqui considerado é o aforismo joanino: “Ele tem de crescer, eu porém tenho de
diminuir” (Jo 3, 30). Quer dizer, Deus deve cada vez mais ir para o primeiro plano, enquanto o
educador recua mais fortemente na consciência desperta do educando, sem contudo perder o
contacto vital um com o outro. Por isso, nós falamos da lei da transferência orgânica e não da
transferência mecânica ou mecanicista.
A sabedoria do pai concilia, cuidadosamente, a simplicidade interior com a intocabilidade exterior
conforme ao seu estado. Ela conhece uma eterna unidade de tensão entre proximidade e
distância, entre austeridade e bondade, em resumo, em todas as situações ela imita a sabedoria
de educação de Deus Pai.
O cuidado do pai luta pela arte de abrir, escutar e distinguir a voz, assim como pela obra-prima de
vigorosa condução esclarecida. De mais a mais, não se trata só de uma introdução geral ao amor
como lei fundamental do mundo e à lei de vida e de educação daí resultante: tudo por amor, tudo
através do amor e tudo para o amor. A condução esclarecida sabe, que cada indivíduo como
encarnado um pensamento original de Deus – na medida em que originalmente no Verbum
divinum, desde a eternidade, foi e é pensado e, no Espírito Santo, amado – tem uma original
missão de amor pessoal, individual, que mais proximamente é determinada através da disposição
pessoal, da atitude, das relações exteriores e da autoridade dada por Deus. Mais exactamente,
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daqui em diante a lei fundamental da vida recebe a seguinte forma: tudo por amor original, tudo
através do amor original e tudo para o amor original.
De: J. Kentenich, Philosophie der Erziehung 1959
58
Pai
A nossa mão
na tua mão.
O nosso pensamento
no teu pensamento.
O nosso coração
no teu coração.
Oração diária da comunidade
dos Padres de Schoenstatt
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Depois do regresso do exílio em Milwaukee o Fundador constata uma grande corrente do Pai
espalhada por todo o Movimento. No fundo de cada uma, aquém e além, ele percebe a clara
ausência do pai, e vê aqui uma grande dádiva, não evidente, na evolução do Movimento. Fica
cheio de gratidão pelo facto da corrente do acto de seguimento ter atingido todo o Movimento e
amadurecido para uma ternura pelo Pai. Ao mesmo tempo ele acentua que esta ternura pelo Pai
abrange ambas as coisas, a relação com Deus Pai e a relação com o Pai do Movimento. O resumo
para o que de vida, neste sentido, nos diversos Ramos e grupos cresceu, ele o encontra na
corrente Victoria Patris. Esta está hoje especialmente viva nas Dioceses de Tréves e de Freiburgo.
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Ternura de todo o Movimento pelo Pai
A grande necessidade do tempo actual é a falta do Pai da terra e do Céu, é a fuga de Deus, de Deus
como pessoa, dum modo especial de Deus como Pai. Nós podemos conceber esta paternidade
como uma paternidade justa ou como uma paternidade, particularmente, misericordiosa. O facto
de não ser vista, nem reconhecida, é a maior ingente necessidade do nosso tempo. Não é em vão
que os intérpretes das determinações conciliares procuram dizer-nos: A preocupação fulcral do
Concílio e do tempo pós-conciliar não é, em primeiro lugar a Liturgia, nem muitas outras coisas
que hoje estão em primeiro plano. A preocupação mais central é Deus! – Depois trataremos mais
detalhadamente disto. Por isso repito outra vez: Visto que o grande princípio na nossa Família é
dar uma resposta às urgências do tempo, às necessidades do tempo, é compreensível, que na
Família estivesse sempre viva uma forte corrente do Pai.
Actualmente, principalmente nos últimos anos, esta corrente do Pai comoveu irresistivelmente
toda a Família, e precisamente de um modo em que a imagem do Pai ocupa, pelo menos procura
ocupar, não só a cabeça, mas também a vontade e o coração.
Podemos parar aqui um momento? É preciso. Com efeito, a afirmação central era esta: Posso
agora dizer? A grande dádiva é a intimidade do Pai e a ternura do Pai. Daí brotou uma corrente,
que começou a invadir, cada vez mais, todos os círculos da Família, uma corrente, que veio a
confluir no acto de seguimento, que gravita em torno da intimidade do Pai e da ternura do Pai e se
tornou património comum de todos os ramos e ramificações da Família. Ela conseguiu um tal
resultado que agora, depois que muita coisa neste sentido, amadureceu, aumenta o anseio de
colocar no Santuário o Olho do Pai, como expressão de gratidão por esta corrente do Pai.
Uma vez mais pergunto: É de facto verdade, que a Família é sustentada interiormente por esta
corrente da intimidade do Pai e da ternura do Pai?
Para não ser mal interpretado, mas também, para não encobrir nada, penso conscientemente
poder dizer: Trata-se aqui de uma dupla corrente do Pai: de uma corrente que gravita em torno do
Pai do Céu, mas também em torno do Pai da terra. Não foi em vão que muitas vezes procuramos
repetir: Se a nível natural nós não podemos registar experiências do pai, é extremamente difícil,
experimentar profundamente, de um modo íntimo, e deixar dominar sobre toda a nossa vida o
eterno Deus Pai. Por isso, vemos ao mesmo tempo duas correntes paralelas desembocarem uma
na outra: a corrente do pai, perante a Cabeça supra temporal da Família, e a Direcção da Família,
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sem dúvida na medida em que esta Direcção participa na paternitas da Cabeça supra temporal.
Mas porque a relação pai e filho no espaço da família e a respectiva vivência são expressão para a
vivência do pai do Céu, porque se tornaram e querem ser meio para inabalavelmente se apoiarem
no eterno Pai, e porque são protecção para a imagem do Pai do Céu, deste modo, surgiu também
uma forte corrente, que tem por objecto o eterno Pai. Desta forma, objectivamente resumi tudo e
não encobri nada, intencionalmente nada encobri.
Eu penso que devia agora, em pormenor, provar um pouco aquilo que afirmei. Refiro-me à
experiência, à experiência própria e à observação alheia.
Se um dia deixo actuar em mim as correntes que no último ano, vitoriosamente, por toda a parte
conquistaram a Família, então penso que elas confluem todas para uma expressão: a Família vive,
actualmente, de um modo manifesto do espírito Victoria Patris. Quantas vezes, no último ano eu
captei tudo isto que, neste sentido de modo bem singular, claramente se manifestou. Nos Retiros
de Sacerdotes pude detalhadamente falar sobre todas estas coisas. Eu afirmei, aquilo que nos
Ramos lentamente se formou, e que formulações foram usadas; depois, procurei, para isso, um
nome comum. O nome comum podia só chamar-se: Espírito da Victoria Patris. A todos aqueles
que participaram nestes cursos – não foram poucos, os diversos Ramos foram pouco a pouco
introduzidos neste mundo -, queria pedir para verem neles uma tarefa que consiste em
transmitirem nos seus círculos este espólio de ideias e de vida. Se é verdade, que através desta
manifesta corrente do Pai prestamos um contributo essencial para a missão da Igreja pósconciliar, então temos verdadeiramente a obrigação urgente de fazer, neste sentido, a nossa
parte.
Seria agora oportuno, ir buscar deste imenso complexo, pelo menos, um ou outro pensamento.
Infelizmente tenho de desistir desta ideia, senão ficamos parados na introdução da Jornada. Mas,
pelo menos, posso, em resumo, dizer o que se entende sob o espírito de Victoria Patris. Victoria
Patris! O eterno Pai triunfou, triunfou vitoriosamente! Dito do modo erudito, nós distinguimos um
genitivus subjectivus e objectivus. Neste contexto, pode Victoria Patris significar: o Pai venceu-nos
a nós; mas também pode significar: nós vencemos o Pai. Aqui significa as duas coisas. Se nós
queremos agarrar toda a realidade, temos de nos compenetrar da vida e do amor em ambas as
interpretações.
O Pai venceu-nos. Através do quê? Através das três virtudes teologais. Ele venceu a nossa
inteligência, a nossa vontade, o nosso coração. – Reparem nesta grande disposição. Se a
quisessem trabalhar entre vós, um mundo imenso se nos abriria de novo.
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Nós vencemos o Pai! Que quer isto dizer? Através do quê se deixa o Pai vencer? Através da nossa
pequenez! Está aqui diante de nós o mundo imenso do ser pequeno, a força, a missão do ser
pequeno diante de Deus. A propósito disto, quero citar novamente um pensamento da “Santidade
da vida diária”: A conhecida e reconhecida pequenez no homem significa “impotência” do pai e
“omnipotência” da pequenez do homem. Com gosto introduziria eu um dia toda a Família no
mundo assim visto. Quem compreende isto interiormente, quem viveu isto ou o vive possui
material em abundância para diálogos, para os encontros de grupo. Muitas vezes não sabemos o
que temos para conversar. Em resumo, esta é a grande questão: É verdade, que o Pai nos venceu
assim e nos encontramos no caminho, para O vencer?
De: J. Kentenich, Semana de Outubro de 1967
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Símbolo do Pai para o Santuário Original
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Nas conferências da Semana de Outubro de 1966 fala o Fundador do “Princípio da indissolúvel
solidariedade”. Ele fixa-se no olhar retrospectivo para a história do Movimento e vê aí uma
garantia também nas discussões e desafios, com que ele conta para o futuro.
A universalidade do Movimento e a diversidade dos Ramos autónomos tornam necessária uma tal
união profundamente íntima.
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Em indissolúvel solidariedade
O que aqui se deseja acentuar é um princípio singular: trata-se de um princípio que nós todos
vivemos, também agora de modo próprio, particular, o vivemos; mas de um princípio que,
reflexivamente, talvez ainda seja demasiado pouco conhecido; por conseguinte, de um princípio
que é de tal importância, que ao longo de todo o tempo futuro, podemos e devemos,
cuidadosamente conservar. Se um dia tiverem o princípio claro, encontrarão, então, também uma
resposta à misteriosa pergunta: como foi possível, que nós, apesar de tão diversos e de cada Ramo
ter seguido o seu caminho, apesar de tudo, nos tenhamos mantido unidos? Hoje de manhã
quando acentuei “nós temos e devemos contar com que, até ao fim dos tempos, seríamos tidos
como filhos da guerra, também chamei a atenção para que, no âmbito do catolicismo, tínhamos
que contar com discussões e tensões. Mais propriamente, teria de explicar, acrescentar e também
de contar com o seguinte: por causa da enorme universalidade da Família, por causa da
concentração de tantos Ramos devemos contar até ao fim dos tempos com algumas tensões entre
nós.
Qual foi, pois, até agora, um dos elementos mais essenciais que nos mantiveram unidos? Esse foi o
princípio que eu penso poder dizer: foi e é a lei de uma indissolúvel solidariedade! A lei de uma
indissolúvel solidariedade – naturalmente que, igualmente, devo acrescentar – entre Cabeça,
Santuário e Séquito.
Se aqui falo como Cabeça, sabemos, então, que se entende a Cabeça supra temporal, não a
cabeça temporal. O que naturalmente vale para a Cabeça supra temporal, pelo menos em alguma
coisa – aliás só em alguma coisa – se pode dizer também da cabeça temporal, também de cada
posição de dirigente. Dentro da Igreja isto é uma evidência, manter o contacto com o Fundador da
Família, é actualmente quase sempre acentuado pela Santa Sé. Já Pio XI não se cansava de
acentuar, sempre de novo, que as comunidades deviam orientar-se sempre pelo Fundador. E, se,
recentemente, ouvimos que o Santo Padre (Paulo VI) quer uma revisão dos Estatutos de todas as
comunidades, então entendemos, quando ele como medida menciona e como norma indica: A
reorientação do desenvolvimento da comunidade, a reorientação também dos Estatutos pelo
Fundador.
Trata-se portanto aqui da Cabeça supra temporal, da lei da indissolúvel solidariedade.
O que a lei, em pormenor, diz é que onde ela foi cumprida e o que daí se seguiu é o que agora se
irá, em resumo, recordar.
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Que significa isto? Aqui nós podíamos medir e fazer de cada palavra, objecto de aturadas
reflexões. Podíamos perguntar: Que entendemos por lei da solidariedade entre a Cabeça supra
temporal da Família e o Santuário?
Talvez perguntem, porque não adopto a divisão em três partes, que mais tarde se impôs. Uma das
dádivas mais essenciais e mais dignas de louvor, que o Padre Menningen ofereceu à Família: a
redução da Família a três elementos, os chamados “Contactos”, os três H: Senhora (Herrin),
Cabeça (Haupt) e Santuário (Heiligtum). Nos meus escritos, a princípio pelo menos, falava sempre
de dois momentos somente, a Cabeça e o Santuário. Essencialmente, estão contidos os outros
dois elementos no Santuário. Quando pensamos no Santuário, pensamos, evidentemente, de um
modo especial na Senhora, na Rainha, na Mãe, na Educadora que no Santuário mora e está
sentada no trono. Será bom, se permanecermos com esta tripartição, mas também será bom
recordarmo-nos que agora temos à mão um princípio de selecção que na admissão à Família
somos obrigados sempre a aplicar. Quando alguém tem vocação para a Família, há-de mostrá-lo
através da sua ligação íntima com estes três contactos: Herrin (Senhora), Haupt (Cabeça) e
Heiligtum (Santuário).
De: J. Kentenich, Semana de Outubro de 1996
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Após 14 anos de exílio regressou o Fundador de Milwaukee a Roma, onde chegou a 17 de
Setembro de 1965. Em Roma houve ainda semanas interessantes, até que a 20 de Outubro, por
ocasião da sessão plenária dos Cardeais do Santo Ofício, através do envio da Causa Kentenich à
Congregação dos Religiosos, todos os Decretos cessam e o Papa Paulo VI a 22 de Outubro
confirmava esta decisão. Nas semanas seguintes o Padre Kentenich reunia as direcções das suas
comunidades em torno de si e pronunciou as conhecidas “Conferências de Roma”. Em vista da
proximidade da festa de Natal redigiu o Fundador uma carta a toda a Família de Schoenstatt. É um
documento admirável acerca dos frutos da corrente do Pai e do tempo de Milwaukee, em
particular. Na primeira parte, formulou de modo bem sistemático os traços da nova imagem de
Pai e de criança, que posteriormente desenvolveu, muitas vezes, aquando das suas visitas aos
diversos Centros e comunidades de Schoenstatt.
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Nova imagem do Pai e da criança como fruto do tempo de
Milwaukee
Mais do que nunca está próxima de nós a iminente festa de Natal, na qual lançamos um olhar
retrospectivo aos anos passados. Coração, inteligência, memória e fantasia param, de bom grado,
no Natal de 1941 e na sua cercania. Entre aquele tempo e hoje há, de facto, muitos e importantes
pontos de comparação.
No centro está o milagre da Noite Santa e a Visão da Candelária. O que sob estes dois
acontecimentos se compreende gravou-se tão profundamente na Família que se torna supérfluo
aprofundá-lo mais.
O milagre da Noite Santa é para nós uma irrupção elementar do Divino na nossa Família e a sua
penetração no próprio interior, assim como a sua propagação no interior de toda a personalidade
e na comunidade. Como prova exterior mais visível desta divina penetração e elevação de
indivíduo e comunidade esperávamos para a Obra, Fundador e Comunidade, o desprender das
cadeias exteriores. Uma, como a outra, foi-nos abundantemente concedida durante e após a
primeira prisão.
A segunda prisão desde 1951 até 1965 foi visivelmente sustentada pelo mesmo grande anseio e
esperança. Olhando retrospectivamente para os últimos 14 anos, a 22 de Outubro de 1965, mais
ainda do que em 1945, podemos cantar o nosso cântico de gratidão. Nós pudemos constatar que
caíram não só pesadas cadeias exteriores mas, também, cadeias interiores: ambas eram tão
pesadas que a Família ainda não se apercebeu do quão grande chegara a ser o espírito de
liberdade de nós mesmos e para Deus, e o desejo e vontade de Deus. Nós hoje ainda não
compreendemos bem, quão nova a forma de filho, de pai e de comunidade se tornou realidade
em nós mas que, ao mesmo tempo, também é de esperar como dádiva permanente para todas as
gerações da nossa Família... Não é que até agora não tivéssemos tido já uma imagem clara desta
tríplice forma. Também sabemos, que cada um dos traços se foi ano, após ano, gravando e
expressando cada vez com mais força em indivíduo e comunidade. Do mesmo modo, nos é assaz
conhecido que a tríplice forma é capaz de evolução e transformação até ao fim da nossa vida. Será
este o caso até de que ela na Visio beata (visão beatífica) venha a alcançar a sua última forma.
Mas aqui não podemos deixar de ter presente até que profundidade esta transformação se
realizou, no fim da segunda prisão.
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Isto vale primeiro para a imagem do Pai. Para nós foi sempre Deus o Pai do amor. Este facto,
mostra a forte acentuação da lei fundamental do universo que desde o começo determinou e
penetrou o espírito da Família. Nós sabemos, não só teoricamente, mas também na prática, que o
fundamento de todos os fundamentos para todo o actuar divino é o amor. Tudo o que d’Ele
procede acontece por amor, através do amor, para o amor. Sempre o compreendemos como a
nossa missão, tornar esta lei fundamental do universo, na nossa lei fundamental de educação e de
vida. Nós também sabíamos que, sob este amor de Deus, se havia de entender como traço
característico, o seu amor misericordioso. Mas o que para nós é novo é a extraordinária grandeza
deste divino amor misericordioso. Deixámo-nos conduzir demasiado pelo pensamento do amor
justo – quer dizer: pela opinião de que devíamos merecer este amor através de acção e
transformação, através de todo tipo de sacrifício e ainda hoje estamos atidos, também,
fortemente, a esta firme convicção, tal como Dante, nos esforçamos, dessaa forma por causar
alegria ao Pai do Céu; mas quando se trata de fazer uma avaliação encontramo-nos no caminho de
não prestarmos demasiada importância a esta nossa colaboração. Importante para nós é só Deus,
o Pai e o seu amor misericordioso. Afinal de contas Ele não nos ama tanto – como já desde o
começo da história da Família ensinámos -, porque fomos bons e honestos, mas porque Ele,
precisamente, é nosso Pai ou porque Ele derrama sobre nós o seu amor misericordioso com maior
abundância, quando alegremente reconhecemos as nossas limitações, as nossas fraquezas e
misérias e as consideramos como o maior título para a abertura do seu Coração e o irromper do
seu amor.
Por isso, nós perante Deus, futuramente mais do que até agora, nos orientamos por dois títulos:
pela sua infinita misericórdia e pela nossa profunda miséria. De bom grado juntamos as mãos e
rezamos: Querida Mãe e Rainha Três Vezes Admirável de Schoenstatt, cuida para que nós nos
sintamos miseráveis e dignos de compaixão filhos de Rei e, como predilectos do amor
infinitamente misericordioso de Deus Pai, de um modo especial, caminhemos assim pela vida.
Assim, à nossa maneira, indicámos e elegemos como nosso Ideal a imagem de Pai de Teresinha do
Menino Jesus. De modo semelhante a ela, no futuro, não queremos tanto ser vítimas da justiça,
mas da misericórdia, isto é, nós não damos tanta importância a todo o bem que fizemos, e ao
direito à retribuição que através disso adquirimos, mas antes, nos apoiamos, em todas as
situações, na infinita misericórdia de Deus Pai e na nossa própria miséria, na medida em que
dizemos sim a esta e nos tornamos conscientes de que por este meio atraímos a misericórdia de
Deus de modo especial sobre nós, sobre a nossa Família, sobre a Igreja e sobre o mundo inteiro. A
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“Santidade da vida diária” diz a este propósito: Reconhecida e admitida a fraqueza de criança
significa a omnipotência da criança e a impotência do Pai.
Deste modo fica ao mesmo tempo caracterizada a nova imagem da criança que nos passados 14
anos pudemos viver e experimentar e que desejamos transmitir às gerações seguintes.
De: J. Kentenich, Carta de Natal à Família de Schoenstatt,
Roma, 13.12.1965
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P. José Kentenich no Santuário Original na Noite Santa de 1965
72
O texto seguinte é extraído, igualmente, da carta de Natal de 1965. A nova imagem de
comunidade pertence exactamente aos frutos do período de Milwaukee que o Pai quer anunciar.
Talvez esta parte da sua mensagem não tenha chegado do mesmo modo, nem esteja presente na
Família, como para a imagem do pai e da criança deve estar em vigor. Mas, nos três anos
seguintes, sempre que o Fundador visitava a sua Família, algo se experimentava desta nova
realidade. A ele se abriam todos os corações e os membros da Família experimentavam-se como
irmãos e irmãs numa nova proximidade cordial que ele até na arriscada imagem da “fusão do
coração”, nessa altura, sempre de novo, arriscava expressar. Está viva a recordação, pois nessa
altura iniciava sempre os encontros e punha as comunidades em contacto umas com as outras. No
caminho para o ano 2014 talvez nos seja concedido algo desta dádiva se, de novo, colocarmos o
Pai no centro.
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Dádiva da nova imagem de comunidade.
A nossa imagem de comunidade conhece traços supra temporais que estão marcados pela
totalidade da nossa Aliança de Amor. Desde sempre que nós sabíamos compreender e realizar a
Aliança de Amor com a nossa querida MTA como expressão, protecção, seguro e meio para a
Aliança de Amor com o Deus Trino e para a Aliança de amor entre uns e outros e de uns com os
outros e de uns para os outros. Ano após ano fomos, profundamente, experimentando esta
estreita união das Alianças de uns com os outros. Normalmente, o motivo da Aliança com o
mundo do Além tem certo grau de analogia com a Aliança de uns com os outros. É fácil por isso
avaliar a verdade daquilo que, no fim da segunda prisão, podemos constatar: a fusão dos corações
entre uns e outros, isto é, entre Pai, Mãe e filhos e dos filhos entre si, alcançou uma misteriosa
profundidade que só na luz da fé e em virtude da irrupção do Divino na nossa Família pode, de
algum modo, chegar a ser compreensível. Hoje para nós isto é uma coisa certa: que nós todos,
entre nós, chegámos a ser uma comunidade de tarefa e de coração, como aliás é difícil de
encontrar em qualquer outro lugar. Todos uns com os outros levámos a mesma cruz que desde a
eternidade foi planeada para o Pai da Família e, na altura própria, foi colocada sobre os seus
ombros. Todos, sem excepção, puseram a seu modo os próprios ombros à disposição. De novo, de
certo modo, aconteceu que a dificuldade da cruz perdera peso, porque ninguém sozinho era capaz
de aguentar o seu duro peso. Assim vivemos nós uns com os outros, num espiritual uns com os
outros, uns nos outros e uns para os outros, de modo que, só agora entendemos bem, como se
apresenta o Homem Novo na Nova Comunidade. Nós também pressentimos bem que com isto
nos aproximámos de um Ideal para o qual normalmente a Igreja do futuro é interiormente
impelida a estender a mão e a ela, com direito, pode aplicar o louvor: Vede como eles se amam!
Se, num ligeiro olhar retrospectivo para os anos passados, em síntese, pudermos reparar para os
frutos das disposições e conduções divinas, naturalmente, então, por meio disso, se despertam e
aprofundam em nós, duas atitudes fundamentais: a primeira é a atitude de uma inefável profunda
gratidão. Agradecidos, queremos estender as mãos (às mãos) da nossa Mãe Rainha Três Vezes
Admirável de Schoenstatt como as mãos visíveis do Deus Trino. Agradecidos, queremos também
ser uns aos outros pelo modo fiel como levámos a cruz comum, e, constantemente, prometemos
fidelidade ao amor uns aos outros.
Os muitos presentes que por ocasião do meu octogésimo aniversário, de todos os lados, quer
dizer: de todos os Ramos e membros me chegaram e eu, cordialmente retribuo, compreendo
74
como símbolo para a entrega indissolúvel do coração à minha pessoa como expoente da Família e
como imagem do Deus Trino. Eu sei que vocês assim pensaram, sei também que vocês pensaram
neles como símbolo para o próprio coração. Oferta e aceitação exprimem por isso uma fusão
mútua dos corações como, deste modo e neste grau, não é frequente na História da Salvação.
Pelos vistos, exige a sabedoria de Deus e o cuidado materno de Maria, a experiência da Nova
Comunidade, desta forma, como modelo para a nova experiência de Igreja que os Padres
conciliares tão ardentemente ansiaram para a Igreja da nova margem e, para a qual, todos eles
estendem a mão.
Resumindo tudo isto, então, alma e coração não se cansam de repetir o “Hino de gratidão”:
Por tudo, tudo cordialmente agradeço, 559
com íntimo amor, Mãe, a Ti me uno.
Que teria sido de nós sem Ti,
Tu que por nós cuidaste maternalmente!
Porque de grande aflição nos salvaste, 560
com amor fiel a Ti nos cativaste:
Eu Te agradeço, quero ser grato eternamente
e com indiviso amor a Ti me consagrar.
Como outrora em casos semelhantes, assim também nesta situação, não esquecemos o axioma:
Dons sãos missões! O que herdámos dos nossos pais, queremos dia após dia, conquistar de novo
para o possuir e, às gerações futuras, como herança sagrada, transmitir.
Em resumo: neste ano, o milagre da Noite Santa, tornou-se realidade num grau como nunca até
agora experienciámos. Isto garante que todos os anos se torne mais perfeito até que a Família
experimente a continuação na eternidade. Um dia, será algo inefavelmente belo e profundo
quando, por toda a eternidade, nós pudermos saborear no nosso “Schoenstatt celeste” a nova
forma de criança, de Pai e de comunidade, ao vir a verificar-se a expressão de Agostinho:
Videbimus et amabimus in fine sine fine! (Veremos e amaremos no fim sem fim!)
De: J. Kentenich, Carta de Natal à Família de Schoenstatt,
Roma, 13.12.1965
75
P. José Kentenich por ocasião da visita em Oberkirche a 3.9.1967
76
A 30.10. 1966 o Fundador, no Santuário de Schoenstatt em Colónia, para toda a Família selou,
solenemente, a Aliança de Amor com Deus Pai e benzeu o símbolo do Pai. Deste modo declarou
que a meta da Aliança de Amor com a Mãe de Deus tem sempre, como fim último, a Aliança de
Amor com Deus Pai.
Na sua conferência, nesse dia, ele apresentou as razões que o conduzem a este fim último. É bom
que no Movimento se acolha com entusiasmo e mantenha muito vivo, este pensamento
profundamente patrocêntrico do Fundador.
77
Deus Pai como meta da Aliança de Amor
Como chegamos pois, agora, da Aliança de Amor com a Mãe de Deus à Aliança de Amor com o Pai
do Céu? Quero, muito rapidamente, alinhar três pensamentos:
. Porque assim o quis o Pai
. o nosso coração por isso anseia
. a Família está orientada para essa Aliança.
Três pensamentos.
O Pai assim o quis. Que quis Ele? Que a Aliança de Amor com a querida Mãe de Deus nos conduza
pelo caminho mais rápido e mais seguro à Aliança com Ele. E, que queremos nós hoje? Nós
queremos agora selar solenemente e em comum, a Aliança de Amor com Deus Pai, proclamada no
ano passado. De que modo? Assim, ao colocarmos o Olho do Pai como símbolo da Aliança de
Amor recíproca. Solene constituição para toda a Família da Aliança de Amor com o Pai.
Uma vez mais reitero: desde a eternidade, o Pai assim o quis. Sim, donde sabemos nós isso? Eu
podia agora pegar de dois lados o pensamento. Digo primeiro uma frase, que é muito importante,
mas não se compreende tão rápido. Sim, este é o sentido da Aliança de Amor com a querida Mãe
de Deus: ela deve ser a expressão da Aliança de Amor com Deus Pai. Deve, em segundo lugar, ser
o seguro para esta Aliança de Amor com o Pai e, em terceiro lugar, o meio para selar
indelevelmente a indissolúvel Aliança de Amor com o Pai. Constatamos este facto já na missão da
querida Mãe de Deus.
Com efeito, podemos considerar a missão a partir de um duplo ponto de vista: Ela é nossa Mãe, tal
como na ordem natural também é assim: a mãe tem primeiro a tarefa de conduzir o filho ao pai.
Que a Mãe de Deus fez isto entre nós, entendemos nós muito bem, em toda a linha. É tão
evidente que o pensamento do Pai, agora, por toda a parte na Família pega e já há muito pegou.
Depois, se consideramos o pensamento a partir de Cristo, então a Mãe de Deus está diante de nós
como a oficial auxiliar e colaboradora permanente de Cristo. Cristo tinha a tarefa de conduzir ao
Pai todos os homens salvos por Ele. Por isso (diz Ele), aí onde Ele a si mesmo dá contas acerca da
sua missão: “ Revelei aos homens o Teu nome, o nome de Pai” (Jo 17,6). É esta a sua missão. “A
obra”, diz Ele ao Pai, “que Me confiaste, Eu a consumei” (Jo 17,4). Portanto, em resumo, isto é a
coisa mais evidente do mundo. Por isso, diríamos nós que, em si, a Aliança com a querida Mãe de
Deus, há-de ser compreendida – sim, como o devo exprimir? – como um redemoinho do Pai.
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Quando eu entro num redemoinho, então não posso mais sair daí. Aquele que pela Aliança um dia
se entrega à Mãe de Deus, fica num redemoinho do Pai e num redemoinho de Cristo.
Não se trata de coisas opostas, como hoje geralmente se pensa. Não são nenhumas contradições,
nenhumas contradições insolúveis. Porque nós hoje, sobretudo nos nossos círculos instruídos,
pensamos demasiado pouco organicamente e sentimos sempre a aflição: quando se cultiva, de um
modo especial, a Aliança com a Mãe de Deus, pensa-se que isso não deveria acontecer, sem que,
por esse motivo, a Aliança de Amor com Cristo e com o Deus Trino, com o Pai, passe para o
segundo plano. Dá-se o inverso! Quanto mais sólida, mais profunda a Aliança de Amor com a Mãe
de Deus, tanto mais segura, tanto mais vigorosa a Aliança de Amor com Cristo e com Deus Pai!
Portanto, o Pai quer que a Mãe de Deus nos conduza a Ele, que a Aliança de Amor com a querida
Mãe de Deus se manifeste de um modo especial como Aliança de Amor com o Pai.
Depois, em segundo lugar: Nós mesmos temos o anseio disso. Porquê? Ah, quando de repente
pensamos: a humanidade actual encontra-se numa extraordinária fuga de Deus. Vocês já
arriscaram uma vez a palavra: O homem de hoje, a humanidade é uma sociedade assassina de
Deus. E o próprio Deus? Ele retira-se sempre de novo, cada vez mais e mais; ora isto está a tornarse incompreensível, pois permite tanta cruz e sofrimento. Por isso, quando a imagem de Deus já
não brilha como imagem de Pai, nós temos a ânsia de consolidar de novo em nós a imagem de
Deus. Mais precisamente ainda, na preparação que vocês têm na mão, estão os pensamentos tão
belamente interpretados, que não preciso de os repetir. De facto vocês compreendem, nós
precisamos agora não só simplesmente duma imagem de Deus, que solidamente apreendemos,
não só da imagem do justo querido Deus Pai, mas também da imagem de Pai, do Pai
misericordioso!
Devemos reparar bem nisto: todos nós, sobretudo os mais velhos dentre nós, por quanto
sofrimento não passámos já na nossa vida! E, muitas vezes, quão débeis somos nós fisicamente,
moralmente, religiosamente! Se agora não tivermos diante dos olhos a imagem de Deus Pai como
imagem do Pai misericordioso e, como podemos ler aqui no texto, não virmos também de novo
transformada a imagem do débil, miserável e miserando filho do Pai então, com o tempo, todos
nos chegaremos a ser fugitivos de Deus, porque não podemos mais domar a vida. Portanto, não só
o Pai quer que a Aliança de Amor com a Mãe de Deus conflua na Aliança de Amor com o Pai, mas
também nós por isso ansiamos.
Em terceiro lugar, a Família precisa disto. Por favor não esqueçam: a Família, como todo, não nos
dá apoio nenhum na actual situação, então ela não tem em si muito sentido, então ela é uma
79
grande brincadeira, como hoje tantas comunidades são. Em suma, hoje precisamos de apoio;
apoio em três pontos determinantes, que são processos de vida:
Apoio
numa
comunidade
religiosa
verdadeiramente
saudável.
A
uma
comunidade
verdadeiramente saudável pertence hoje, dado que o mundo se encontra em fuga de Deus, o
incessante gravitar em torno do pai.
Nós devemos procurar apoio num conhecimento claro. De tudo o que antes ouvimos, de todas as
oferendas que foram feitas percebemos como o conhecimento religioso, o conhecimento de
Schoenstatt, cresceu. No futuro, temos de voltar a ver e a dizer este testemunho; devemos, por
isso começar já de modo a que estejamos em condições de enfrentar aqueles que, no seu
pensamento mecanicista, não sabem como estes nexos religiosos, em pormenor, se manifestam.
Devemos procurar apoio, por fim, assim pensamos poder e dever dizer, também na formação de
verdadeiros caracteres que, de modo claro, nos dão exemplo do Ideal da nossa Família.
Como complemento a tudo o que hoje em nós recebemos, que vive na nossa alma, penso que
com isto, vos terei reconduzido, àquilo que eu queria, aos últimos princípios.
De: J. Ketenich, Conferência na inauguração do símbolo do Pai
Em Colónia 30.10.1966.
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Nos seus estudos do período de Milwaukee do ano 1964 o Padre Kentenich reflecte sobre a íntima
relação e a mútua dependência da paternidade terrena e divina. Ao fim e ao cabo, toda a
paternidade parte do eterno Deus Pai. Tanto a paternidade corporal como a paternidade espiritual
derivam d’Ele. Mas, evidentemente, que elas não estão no mesmo nível. A mediação acontece no
sentido da transmissão e da transferência. Disto trata ele neste estudo.
O Fundador quer, com este estudo mostrar que as vozes do tempo exigem um movimento
orgânico do Pai e um reino orgânico do Pai.
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Visão dum Reino universal do Pai
Nesta atitude fundamental, profundamente ancorada em Deus, o pai terreno não esquece que a
sua paternidade – em comparação com a divina – é só uma analogia, só uma participada. O
Senhor já chama a atenção para isto, quando Ele em Mateus esclarece: “Também vós não deveis
chamar pai a ninguém na terra. Só um é o vosso Pai, que está no Céu” (cf. Mt 23,9).
Neste contexto, só o eterno Pai é Pai no sentido pleno da palavra; toda a outra paternidade
terrena – tanto a de sangue como a espiritual – o é, meramente, com uma imensa limitação.
Portanto, as duas não significam a mesma coisa. Ambas se distinguem, essencialmente, uma da
outra. Por isso, as duas não podem ser colocadas no mesmo nível.
A união entre ambas realiza-se segundo a lei da transmissão e transferência orgânica: a primeira
de baixo para cima, a outra de cima para baixo, sem que as duas sejam separadas uma da outra.
Isto quer dizer: a paternidade terrena não pode eclipsar e ocultar a divina, muito menos ainda
recalcar e substituir e deixá-la cair, assim, no esquecimento. Pelo contrário! A sua função consiste
muito mais nisto: colocar a última na verdadeira luz, apoiá-la, defender e proteger e tornar
fecunda. Mas a paternidade divina também não pode eliminar ou substituir a terrena de modo
que a última perde o seu carácter transparente e ambas interiormente separadas, ou seja, estar e
continuar mecanicamente uma ao lado da outra.
A parábola do filho pródigo aproveita, exemplarmente, a imagem terrena do pai, para tornar
compreensível a divina. E a experiência de todos os dias confirma até onde as duas imagens
dependem uma da outra, mais exactamente: em que medida a imagem terrena co-determina a
divina, e que influência a divina tem sobre a humana. Ambas partilham sorte e destino uma com a
outra. Ambas se condicionam uma à outra para muita ruína e sucesso.
Acabámos agora de falar acerca da influência da imagem terrena do pai na divina.
Aqui, trata-se mais do reverso da medalha: da importância da imagem divina para a terrena. O
que sobre isto – com um olhar de relance sobre a actual situação - há a dizer, pode-se resumir em
duas teses.
Primeira tese:
Na medida em que a divina imagem original desaparece, não tem a terrena nenhum último apoio
e, por isso, nenhuma força de atracção mais.
Bodamer afirma que o homem moderno não é homem nenhum e por isso não é pai porque ele
não reconhece nenhum pai por cima dele. Depois continua: “O problema da paternidade é uma
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questão de relação com Deus que a consciência técnica, tão perfeitamente, eliminou dele mesmo
que, contudo, ainda continua a ser uma ideia, mas não uma realidade, uma pessoa, à qual, mesmo
que invisível, se pode rezar e diante da qual um tem de se sentir responsável. A figura do pai
terreno só existe, porque o Pai de todas as coisas, o Criador, para isso ‘delegou’ nele, de acordo
com a sua condição de imagem e semelhança. Desde que o homem de hoje ficou ‘órfão de pai’,
não possui mais nenhuma legitimação superior, fica entregue a si mesmo, não tem um espelho
que lhe reflicta a sua imagem e o corrija. Ele não é mais parábola da paternidade exemplar, não é
mais autor delegado e, por isso se tornou numa figura ambígua, a si mesma obscura, sem força
nem segurança interior, sem a evidente serenidade do sábio que serve a um superior a ele, por
incumbência dele age e se apresenta a responder-lhe. Deste modo, ele se tornou incapaz de
transmitir ao filho uma herança que hoje, na sociedade sem propriedade e sem experiência, só na
transmissão e transferência de paternidade, podia subsistir. Como podia ele também sentir
respeito diante do seu pai, emoção diante da autoridade e do mistério do ser pai, se ele, deste seu
pai, quando muito, só aprende técnicos beliscões de vida e muito cedo só experimenta, quanta
insegurança e superficialidade se disfarça por detrás duma visão do mundo, que só conhece e
defende ‘este mundo’ (Der Mann von heute. Seine Gestalt und Psychologie, Herder-Taschenbuch
171, Freiburg 1964, S 140)?”
Mantém-se a opinião, de que o mundo moderno está numa vertiginosa fuga de Deus, procurando,
por todos os meios, pô-Lo de lado e “dar-Lhe a morte”, para em seu lugar colocar o homem ou a
matéria ou a massa. Então compreende-se as consequências, que isto tem de originar para a
imagem terrena do pai na cultura actual…
O cristão que vive e cresce numa tal atmosfera de um tempo “órfão de pai” e que,
simultaneamente, não conhece um forte equilíbrio numa comunidade religiosamente ancorada,
ou não vive uma vida interior cuidadosamente cultivada, deve contar que, mais cedo ou mais
tarde, irá ser contagiado e quase irremediavelmente doente devido aos múltiplos bacilos que se
propagam através do tempo actual. Aquilo que outrora se disse acerca do Espírito Santo: Ele é o
Deus desconhecido dos cristãos, pode-se hoje, cada vez mais, em certo grau, também afirmar de
Deus Pai. Praticamente, em muitíssimos círculos, Deus Pai é considerado, de facto, como o Deus
desconhecido. Onde, ainda pelo menos com a boca, aparece o seu título de honra – o nome de Pai
– que pelos lábios de Cristo, continuamente, ressoava com grande ardor, isso acontece por hábito,
sem relação pessoal, sobretudo sem emoção interior pelo paterno Tu divino.
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Sem mais nada, tudo isto é compreensível no fundo escuro da actual opinião pública. Também se
pode referir muitos outros motivos. Não é preciso analisá-los um a um. Seja brevemente chamada
a atenção só a um.
Recorde-se como uma sociedade massificada, que se aglomerou mecanicamente que não conhece
nenhuma ligação entre causa primeira e causa segunda e entre os membros entre si, segundo as
leis da transmissão e transferência orgânica, por natureza, necessariamente despersonaliza tudo.
Ela despersonaliza o tu divino e humano. Num, como noutro caso, ela conhece um amor
impessoal, mas não o amor a um tu. Ela despersonaliza e massifica também o próprio eu. Tudo
isto, pelos vistos, à custa da imagem divina e terrena do pai.
Para o nosso objectivo basta a verificação do facto: um cego pode agarrar com as mãos. Ele se
cruza connosco em todos os círculos da sociedade e em todas as situações. Quantas vezes se
chega a verificar, porque razão os cristãos também não se sabem suficientemente acolhidos e
seguros numa mão paterna calorosa, bondosa e omnipotente, sucumbindo muitos deles sob os
duros golpes da vida actual e – aberta e secretamente - caindo até vítimas das heresias modernas.
Mais: quão raramente eles encontram na sua oração pessoal o caminho para Deus Pai. …
Segunda tese:
Ela resulta necessariamente da primeira, que ao mesmo tempo contém a sua justificação. Ela diz
assim:
A lei da porta aberta e da resultante criadora justifica e exige um amplo movimento orgânico do
pai com a intenção declarada da edificação no mundo de um reino do pai universal orgânico.
Antes que o estudo entre em pormenores, ele esclarece algumas expressões para o leitor que não
estão suficientemente familiarizados com o nosso mundo de Schoenstatt.
A lei da porta aberta é equivalente ao axioma: Vox temporis vox Dei (a voz do tempo é a voz de
Deus). Que carência do tempo e a necessidade do tempo apontam para um movimento do pai e
para um reino do pai como expressão de um claro desejo de Deus? Após as exposições
supramencionadas não necessita de mais nenhuma justificação especial. Sem mais nada ela podia
ficar justificada.
A lei da resultante criadora aponta para o Movimento de Schoenstatt, no qual – como já se vai
provar – desde há anos ambas se tornaram de uma forma real, que aí se pode ver - pelo menos
aproximadamente - uma confirmação divina.
Com cuidado por duas vezes se junta a palavra “orgânico”, quando se trata do reino do Pai.
Movimento orgânico do Pai – como acima foi apresentado – inclui paternidade divina e terrena.
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Num como noutro caso é, ao mesmo tempo considerada, a união com todos os demais factores
alicerçados na ordem de ser; quer, por isso, também ser entendida. Porém, tudo sempre segundo
a lei da transmissão e da transferência orgânica. Sob este aspecto, paternidade terrena quer, por
fim, ser vista em relação orgânica com maternidade e filialidade. Paternidade divina quer ser vista
e avaliada, não ser separada da sua essencial relação fundamental com o Espírito Santo, com o
Filho Unigénito de Deus feito homem e com a sua companheira e auxiliar permanente em toda a
Obra da Redenção (assim como com os todos os Anjos e Santos).
O Movimento Litúrgico e Bíblico, que através do Concílio, foi trazido fortemente para o primeiro
plano, oferece em si, valiosíssimos pontos de partida para o proclamado Movimento orgânico do
Pai e do reino do Pai. Só depende de se e em que medida é bem sucedido, agarrar os pontos de
partida e lutar pelo seu incremento, em conformidade com o seu ser e com o tempo.
A lei de orientação litúrgica basta encontrar expressão na Oração Litúrgica. Mas forma ela também
a vida prática? A experiência prova o contrário. Há só alguns pequenos começos no Movimento
Litúrgico que se ocupam seriamente com o patrocêntrico do conjunto da vida cristã.
A mesma coisa se pode dizer do Movimento Bíblico. Os Evangelhos mostram, de modo
sumamente claro que Cristo, na sua vida e no seu actuar, só conhecia um único grande objectivo:
Eis que venho, oh Pai, para fazer a tua vontade. (cf. Heb 10, 7.9)
A nossa literatura de Schoenstatt que está disponível apresenta, a este propósito, tantas provas
que bem posso aqui abster-me de outras explicações. Podemos também fazer isto porque elas, na
generalidade já dominam o sentimento de vida de cada um dos nossos membros.
Mas é também, noutra parte, o caso? O exame consciencioso justifica também neste, –
semelhante ao anterior – a opinião: em nenhuma parte se encontra, no nosso sentido, vestígio de
um pronunciado Movimento orgânico do Pai.
Em nenhuma parte, isto é, fora de Schoenstatt. Na medida em que a nossa experiência alcança,
um tal Movimento só se encontra no âmbito de Schoenstatt. Ele domina não só a Oração, mas
também o conjunto da vida da Família de tal maneira que, perante ele, o Movimento Mariano
passa para segundo plano. Em todo o caso, este último, não constitui nenhum obstáculo ao seu
desenvolvimento; pelo contrário, parece ter atingido nele o seu último objectivo. Nele ele vê uma
tarefa essencial, continuamente sustentar, com cuidado, o Movimento orgânico do Pai que o
gerou, constantemente apoiá-lo e protegê-lo e manter o caminho aberto, para lhe possibilitar uma
marcha triunfal através do tempo actual.
De: J. Kentenich, Studie 1964
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Fontes
Serviço materno paterno a cada um individualmente
J. Kentenich, Brief an P. Alex Menningen, Milwaukee,
EUA 9.12.1953 (não editado)
Em sincero amor
J. Kentenich, Brief an Josef Engling vom 2.3.1917, in:
Josef Engling, Breife und Tagebuchnotizen Teil II, vom
19.11.16 bis 31.12.17, zusammengestellt von Paul Hannappel, Manuskript gedruckt, S. 92-96
Vinculação pessoal de José Engling ao seu Director Espiritual
J. Kentenich, Chroniknotizen, Milwaukee 1957, S. 520522, in: P. J. Kentenich, Josef Engling. Textsammlung
Zusammengestellt von P. Josef Maria Klein, als
Manuskript herausgegeben von P. Michel Marmann
1988, S. 68-70
Vinculação espiritual mútua
J. Kentenich, Vortrag bei der Feier seines Silbernen
Priesterjubiläums, Schönstatt 11.8.1935, Não editado,
masch. Schriftl. Hersg. v. Säkularinstitut der Schönstäter
Marienschwestern, S. 9-15
Entrelaçamento de destino entre a Família o Fundador
J. Kentenich, Brasilien-Terziat, Terziat der PallottinerPatres in Santa Maria/Brasilien vom 16.2.-5.3.1952, 3.
Band, Schönstatt 1975, S. 109-112
A génese do Jardim de Maria
J. Kentenich, Oktoberwoche 1950, als Manuskript hrs.
v. Säkularinstitut der Schönstäter Marienschwestern, 2.
Aufl. 1993, S. 309-315
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No seguimento do Fundador
J. Kentenich, Brasilien-Terziat, Terziat der PallottinerPatres in Santa Maria/Brasilien vom 16.2.-5.3.1952, 4.
Band: Vorträge 52-63, Schönstatt 2009, S. 7-9
A Mãe de Deus e a corrente do Pai
J. Kentenich, Ansprache in Florencio Varela/
Argentinien 19.3.1952, não editado
Luta à volta do “terceiro ponto de contacto”
J. Kentenich, Weihnachtstagung 1967, Zweiter Vortrag,
Sonderband der Reihe P. J. Kentenich, Propheta locutus
est, Vorträge und Ansprachen von Pater J. Kentenich aus
seinen drei letzten Lebensjahren, Band XIX, hersg. v. d.
Schönstattpatres, 2. verbesserte Auflage, Vallendar
2005, S. 50-53
Importância da experiência do Pai
J. Kentenich, Dass neue Menschen werden. Eine
pädagogische Religionspsychologie. Vorträge der
Pädagogischen Tagung 1951, bearbeitete Nachschrift, 2.
Auflage, Schönstatt 1978, S. 5-27
Girar em torno do Pai
J. Kentenich, Am Montagabend … Mit Familien im
Gespräch. Band 21: Unser Leben im Licht des Glaubens,
Vallendar-Schönstatt, 1996, S. 221-223
Renascer do Pai
J. Kentenich, Philosophie der Erziehung. Prinzipien zur
Formung eines neuen Menschen- und Gemeischftstyps,
bearbeitet von Herta Schlosser, 2. Auflage, Schönstatt
1993, S. 81-85
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Ternura de todo o Movimento pelo Pai
J. Kentenich, Oktoberwoche 1967, Zweiter Vortrag, als
Manuskript hrs.v. Säkularinstitut der Schönstäter
Marienschwestern, S. 35-39
Em indissolúvel solidariedade
J. Kentenich, Oktoberwoche 1966, 4. Vortrag, 15.10.
1966, in: P. J. Kentenich, Propheta locutus est, Vorträge
und Ansprachen von Pater J. Kentenich aus seinen drei
letzten Lebensjahren, Band XI: 1966, hrsg. v. d.
Schönstattpatres, Vallendar 1996, S. 80-83
Nova imagem do Pai e da criança como fruto do tempo de Milwaukee
J. Kentenich, Weihnachtsbrief an die Schönstattfamilie,
Rom 13.12.1965, in: P. Joseph Kentenich an seine Pars
Motrix, Band III: Das Jahr 1966, Teil I, Berg Sion 1989, S. 9-11
Dádiva da nova imagem de comunidade
J. Kentenich, Weihnachtsbrief an die Schönstattfamilie,
Rom 13.12.1965, in: P. Joseph Kentenich an seine Pars
Motrix, Band III: Das Jahr 1966, Teil I, Berg Sion 1989, S. 11-14
Deus Pai como meta da Aliança de Amor
J. Kentenich, Vortrag bei der Enthülung des
Vatersymbols in Köln 30.10. 1966, in: P. J. Kentenich,
Propheta locutus est, Vorträge und Ansprachen von
Pater J. Kentenich aus seinen drei letzten Lebensjahren,
Band XI: 1966, hrsg. v. d. Schönstattpatres, Berg Sion 1998, S. 87-91
Visão dum Reino universal do Pai
J. Kentenich, Studie 1964, não editado
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Fotos
Capa: Georg Egle, Michael Gerber
p. 23:
Foto archiv-Schönstätt-Institut Marienbrüder
p. 37:
Sr. M. Hermia Schlichtmann, Koblenz-Metternich
p. 62:
Oskar Bühler
p. 70:
Fotoarchiv – Schönstatt – Institut Marienbrüder
p. 74:
Schönstattzentrum Marienfried, Oberkirch
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