Ouro Preto, 13 de julho de 2009.
“É tão estranho
Os bons morrem jovens
Assim parece ser
Quando me lembro de você
Que acabou indo embora
Cedo demais.” (L.U.)
Carta aberta à Ouro Preto:
Dentre as lições que aprendemos no decorrer desse caminho que é viver, infelizmente a
mais trágica é perceber que a eternidade da memória não altera em nada a brevidade da
vida. A existência nos corações e mentes persiste mesmo tendo se esgotado o curto prazo
que se encerra com o último suspiro de cada um. A memória do nosso querido amigo
Ramon Rodrigues Bicalho, o Mudin, estará sempre presente nos corações e nas mentes
daqueles que o acompanharam em sua curta jornada.
Foi com muita dor que nós da República Marragolo assistimos a triste evolução de uma
doença que consumiu seu corpo e, por conseqüência, também nossas almas. Silenciosa,
uma pneumonia instalou-se em seu peito sem que nem ele nem qualquer outro que com ele
convivesse notasse. Quando enfim começou a se manifestar, após ser escolhido como
morador da república, uma chapa do pulmão tirada na UPA revelou que a pneumonia já
tinha uma semana ou duas, tendo o médico comentado inclusive que a aparência dos seus
pulmões era a mesma dos pulmões de um fumante inveterado, sendo que acima de tudo ele
sempre fora saudável. O Mudin necessitava de repouso absoluto. Dois dias depois, na
segunda feira 29 de junho, sua mãe veio buscá-lo por acharmos que Ouro Preto não teria
um ambiente propício para sua recuperação.
Chegando em Contagem foi novamente ao atendimento de emergência público, onde foi
liberado para tratar da pneumonia em sua casa. Porem, na sexta feira houve um
agravamento do seu estado e, dessa vez, quando conduzido ao Hospital Júlia Kubitschek,
foi imediatamente internado no CTI, sob protestos indignados da médica que o atendeu em
relação aos demais médicos que primeiramente liberaram o Mudin apesar da evidente
necessidade, vista na chapa de seus pulmões, de sua internação. Aparentemente o que
piorou seu quadro foi uma “bactéria oportunista” que o atacou quando sua imunidade caiu e
comprometeu seriamente sua respiração. Vários exames foram feitos na tentativa de
descobrir que bactéria era essa, houve suspeita de tuberculose e mesmo de gripe suína. Com
equipamentos que lhe auxiliavam a respirar foi colocado em um quarto isolado e suas
visitas precisavam de máscara, porque os médicos não sabiam se a bactéria era contagiosa.
O Mudin não resistiu à gravidade da doença e faleceu na madrugada da sexta feira
seguinte à sua internação. Hoje, o dia em que escrevo esta carta é seu aniversário,
completaria dezenove anos.
Infelizmente essa tragédia que o nosso querido amigo passou não é inédita na Marragolo.
Em 2003 o falecimento do geólogo e ex-aluno de casa Leonardo Martins, o Ceará, teve
paralelos com sua história. Formado em 2002, Ceará voltou do Pará para fazer o mestrado
na UFOP. Portador de doença que já tratava, foi atacado por uma bactéria que, como no
caso do Mudin, era “oportunista” e o levou de modo muito parecido com esse recente caso.
Na época os médicos sugeriram que ele havia sido contaminado por essa bactéria no Pará e
quando em decorrência de sua doença teve uma queda em sua imunidade ela o atacou.
Por preocupação com os demais moradores e as futuras gerações que um dia farão parte
da Marragolo procuramos a reitoria que, na figura do Reitor, Prof. João Luiz Martins e o
Vice Reitor, Prof. Barbosa, nos ouviu e providenciou para que todos que moram e
convivem com a Casa tenham uma atenção médica no sentido de observar se existe um
paralelo entre esses dois casos, se alguém pode também ter contraído esse mal, observar se
a estrutura física da casa possui algum fator de insalubridade que possa ter contribuído,
enfim, de constatar a origem e extirpar, se possível, o perigo que violentamente levou esses
nossos dois amigos.
Nesse momento de profunda tristeza para a família, para os amigos e para a Marragolo,
agradecemos a atenção, apoio e amizade daqueles que estiveram conosco. Em especial às
Lajes e às demais Repúblicas que junto a Marragolo sofreram todas as lágrimas que uma
Casa pode suportar, aos Ex-Alunos, cuja presença, força e conselho foram fundamentais
nesses dias negros que passamos, ao Reitor e Vice Reitor pela prontidão com que se
apresentaram e a todos que rezaram e choraram pelo Ramon. Para a mãe, d. Amélia e
família, que Deus conforte essa dor absurda só entendida por Nossa Senhora e, os laços que
através do seu querido filho atamos não sejam jamais cortados.
Nosso querido amigo Mudin deixa muitas saudades em todos os lugares que andou. Ouro
Preto também chora a juventude desse menino cujo sorriso constante ainda e sempre ecoará
entre as paredes da Marragolo, levando em troca os nossos próprios sorrisos. Deus te
receba, irmão.
Flávio Caramico Steffen
Véio Safado
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Carta República Marragolo