II Congresso de Educação – UEG/UnU Iporá
A formação de professores: uma proposta de pesquisa a partir da reflexão sobre a prática docente
OS DESAFIOS NA REDE PÚBLICA DE ENSINO: OS
ENFRENTAMENTOS DO PROFESSOR INICIANTE DE GEOGRAFIA
EM IPORÁ E REGIÃO
SILVA, Paula Junqueira¹
Universidade Estadual de Goiás – Unidade Universitária de Iporá
¹[email protected]
RESUMO
A pesquisa aqui apresentada teve como objetivo compreender os desafios enfrentados pelos
professores de Geografia iniciantes na prática docente nas escolas públicas estaduais de Iporá,
Diorama, Jaupaci e Palestina (estado de Goiás) bem como levantar as percepções e anseios
dos estagiários em Licenciatura de Geografia – UEG/Iporá frente à sala de aula, cujas
reflexões possam balizar propostas de mudanças no processo de preparação no curso de
formação de professor de Geografia. Através dos relatos constatamos as dificuldades
estruturais da rede de ensino da região, das limitações profissionais e psicológicas do
professor e das realidades e perspectivas distintas dos educandos ao adentrarem no ambiente
escolar.
Palavras Chaves: professor iniciante de geografia, estágio supervisionado da UEG/Iporá,
ensino-aprendizagem.
INTRODUÇÃO
Podemos definir que o processo de ensino-aprendizagem no contexto analisado é
desafiador. Nessa perspectiva, deveria ser libertador do ser humano, valorizado das atitudes
individuais e coletivas. Ele deveria ainda propiciar a tomada de consciência dos educandos
sobre a aceitação das diversidades e das semelhanças culturais e fisionômicas entre as pessoas
e também entre os objetos no meio ambiente. Acrescentado, na escola a construção de laços
de fraternidade e solidariedade deveria superar os rastros da violência (física, verbal e
emocional) que marcaram as raízes históricas de nossa sociedade brasileira. E a disciplina ser
um instrumento facilitador da organização do saber e, portanto a chave para a autonomia do
saber pensar e saber fazer.
O fato de perceber que as escolas têm vivenciado outros paradigmas que não os
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citados acima, foi que nos motivou para realização desta pesquisa. Para tanto, buscamos
sintetizar os seguintes objetivos específicos: 1) Conhecer e reconhecer as reclamações
recorrentes dos professores iniciantes frente a prática docente; 2) Compreender os aspectos da
identidade dos grupos no ambiente escolar a partir do perfil sócio-cultural dos educandos; 3)
Identificar as dificuldades estruturais da rede de ensino, das limitações profissionais e
psicológicas do professor iniciante; 4) Observar a prática docente e as estratégias desse
profissional na superação das dificuldades na implementação dos conteúdos procedimentais e
atitudinais; 5) Registrar a experiência do estagiário em geografia para repensar o estágio
supervisionado e a prática docente dos cursos de licenciatura para tentar minimizar os
desafios dos iniciantes professores.
MATERIAL E MÉTODO
Nossas observações e análises de campo basearam-se em escolas de quatro cidades
da região: duas estaduais em Iporá, uma em Palestina, uma em Jaupaci e uma em Diorama, já
lotadas com professores iniciantes e espaço de estágio dos graduandos de Geografia.
Adotamos a perspectiva de análise da Guarniere (2001). A autora observou uma
educadora de ensino infantil e nós observamos cinco professores iniciantes para a analise do
perfil desse universo de profissionais iniciantes.
Consideramos a participação de 11
estagiários, do ano de 2010, como objeto de estudo o que contribuiu para o levantamento dos
dados, haja vista o orientação recebidas por estes para realizarem o estágio supervionado nas
escolas. Por esta se tratar de uma pesquisa de análise qualitativa sobre os relatos de
experiências e observações empíricas nos espaços escolares, a orientação metodológica para o
uso das informações obtidas em campo foi a análise do discurso,
A leitura dos Projetos Pedagógicos das escolas selecionadas foi importante para
verificar a incoerência entre os ideais pedagógicos escritos e a prática docente e a gestão
escolar. Para entender os enfrentamentos dos professores iniciantes utilizamos Souza (2006).
Centramos as observações no comportamento do ser humano e a relação deste com os demais.
Através dos autores Haesbaert (1995, 1997) e outros, analisamos as escolas do ponto de vista
da reflexão geográfica, como o lócus das territorialidades distintas dos educandos e dos
professores, segundo a perspectiva cultural. .
Em relação aos educandos também realizamos conversações em busca de relatos
espontâneos sobre o cotidiano escolar. Entrevistas diretivas levantaram aspectos sobre os
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motivos pelos quais sentem necessidade de transgredirem as regras escolares. Além destes, os
dados sócio-culturais também foram contextualizados em nossa discussão.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No momento de nossas observações empíricas constatamos que os ambientes
escolares quase sempre não contribuem para o comportamento comprometido com os estudos
por parte dos educandos: salas de aulas pequenas para o número de alunos; janelas e portas
que não auxiliam a ventilação e iluminação adequada ao mínimo de conforto ambiental e
aproveitamento de energia; pátios reduzidos compostos por paredes e obstáculos que expõem
professores e educandos ao acidente físico; em contrapartida encontramos pátios amplos
porém sem acomodação para os educandos se reunirem para colocarem a conversa em dia; a
acústica que não reduz a poluição sonora no entorno da escola. No caso específico de
Palestina, a escola observada se encontrava em reforma e os alunos estudavam em espaços
improvisados, pouco preparados para a própria dinâmica de aulas.
Assim, todos estes aspectos somatizam negativamente o aproveitamento do ato de
ensinar e aprender. Outro aspecto observado que altera a possibilidade de uma aprendizagem
qualitativa refere-se aos alunos oriundos da zona rural. Estes passam horas dentro de ônibus
de viagem para chegarem à escola, fazendo com que cheguem cansados e pouco estimulados
às atividades de ensino.
No Colégio Estadual Dom Bosco, em Iporá, a situação se repete; "As condições dos
educandos são precárias, esses alunos não tem muito estímulo na escola, são carentes de
tudo", em outro depoimento sobre o mesmo colégio completa que "...distâncias longas,
sofrimento de infra-estrutura, alimentação atrasada e vários outros obstáculos desistimulando
o educando..." . Realidade que faz com que esses profissionais ausentem-se da sua postura de
agente transformador politico daqueles que estão sob sua tutela.
O reduzido tempo destinado ao planejamento e o excesso de alunos por professor
impede a troca de experiências entre os profissionais, não permitem que se conheça
individualmente o potencial de cada aluno. Para os professores de área, com é o caso de
Geografia e História por exemplo, a situação é ainda mais dramática, pois o número reduzido
de aulas por turma faz com que o professor entre em muito mais salas e tenha, portanto, mais
educandos e assim mais dificuldades de identifica-los. De acordo com os dados do NEPEG
(2007) sobre os professores de Geografia da Rede Pública Estadual de Goiás do total de 150
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professores pesquisados, 64% possuem carga horária que variam de 30 a 60 horas, o que
“expressa uma sobrecarga de trabalho dos professores” (SANTOS e ATAÍDES, 2007, p. 112).
Realidade que, com certeza, também expressa para os professores de área. Nesse sentido a
avaliação somativa que classifica o indivíduo a partir da práxis meritocrática (FERNANDES
e FREITAS, 2006) é instrumento utilizado pelos professores para cumprirem sua função
profissional.
É a partir desse contexto que os professores observados pelos estagiários ( e os
próprios no período de regência) preenchem as fichas diagnósticas dos educandos e cumprem
a burocracia escolar. Professores sentam alguns minutos furtados do tempo dos demais
colegas que estão em horário de planejamento para decidirem a "nota" que o educando
merece. No caso dos professores iniciantes, que ainda não conseguem identificar a maioria
dos educandos, não diagnosticam com mais precisão o desempenho sócio-afetivo dos
estudantes e o "jeito" é aceitar a opinião do colega professor e “dar a nota” ao educando como
se ele de fato “valesse um número de 0 a 10”. Assim:
“O professor, em seu primeiro ano de profissão, ao confrontar as
idéias trazidas pelo curso de formação com a realidade escolar, tende
a abandonar aquelas idéias e a mudar sua atitude que, durante a
formação era mais liberal e progressista, pode mostrar-se mais
conservadora” (VEENMAN, 1988 apud GUARNIERE, 1999, P.
135).
A avaliação formativa, portanto, ainda está longe de ser uma prática neste ambiente
escolar. Este tipo de avaliação espera que seja uma atividade orientada para o futuro,
individualizando sempre os percursos da aprendizagem, reorientando sempre as
possibilidades de aprendizagem do indivíduo, exercitando a auto-avaliação dos indivíduos
sobre seus avanços, dificuldades e superação.
Do outro lado dessa relação estão os educandos recheados de informações adquiridas
no cotidiano fora da escola. Ao chegarem dentro da escola crianças, pré-adolescentes e
adolescentes vulgarizam o poder da autoridade: professor, coordenador, diretores e demais
funcionários parecem estar ali para os servirem como subalternos; sendo tratados como seres
irracionais e não dotados de espírito justiça. O exemplo disso são as inúmeras fichas de
advertências e suspensão assinadas pelos professores e quase sempre ignoradas e ou
desconhecidas pelos responsáveis pelo educando.
Conforme também a constatação de Guarniere (1999, p. 137):
A adversidade do ambiente de trabalho provoca reações de insegurança
e confusão na professora iniciante, mas ao mesmo tempo contribui para
o seu distanciamento das colegas, ao perceber a inadequação das
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atitudes delas em relação aos alunos, resistência para aceitar sugestões
e a insatisfação delas pela própria profissão.
Outro aspecto negativo vivenciado na escolas-campo, identificado na citação acima,
é que os professores iniciantes que chegam às instituições escolares com novos paradigmas de
ensino-aprendizagem, precisam transpor as barreiras impostas por eles mesmos, pelos
professores veteranos, pelos demais gestores escolares e pelos professores universitários que
contribuíram para sua formação. Nesse sentido, o desafio de se construir a identidade do
professor merece ser executada de forma que o indivíduo aprenda a aprender, aprenda a fazer,
aprenda a fazer junto e aprenda a ser (JACQUES DELORS apud HOFFMAN, 2003).
Uma nova condição instalada no processo de ensino-aprendizagem é a
territorialidade agressiva e materialista manifestada no ambiente escolar que faz da escola um
espaço competitivo de quem tem mais poder: o educando que transgride as regras sociais ao
sentir diminuído pela sua pouca possibilidade de consumir versus os educadores que buscam
executar sua autoridade do saber em sala de aula. O resultado desse paradigma nas escolas
públicas desestruturadas historicamente foi a desierarquização dos professores! E a escola,
assim, tem sido o espaço em que nos encontramos com as adversidades da sociedade, a
intenção do Estado, o nosso potencial procedimental/atitudinal e nossas fragilidades
profissionais e pessoais. Assim, como apontou Souza (2006, p.119) ao investigar o fazer do
trabalhador-professor, os egressos da licenciatura de Geografia de UEG, o professor “mostrase angustiado pelo desprestígio econômico e social de sua profissão.”
Desanimados e desiludidos estes iniciantes profissionais da educação abandonam a
idéia de serem professores e ou acabam se adaptando ao comportamento indisciplinado e
pouco reflexivo dos educandos. Fato que colabora para a letargia do professor em buscar
novidades e estratégias de ensino aprendizagem que não sejam de cunho conservador e
tradicional.
Outro dado constatado pelos estagiários e pelos professores recém atuantes na
profissão está na má formação teórica durante o curso de formação universitária. Como
também reclamam a ausência de espaços apropriados para a produção e testes de material
didático para a prática de ensino de Geografia.
Ou seja, espera-se que a experiência de estágio dentro da sala de aula do ensino
fundamental e médio de Geografia que comumente prepara os professores iniciantes a sentir
na „pele‟ os efeitos colaterais e frontais da utopia do processo de ensino aprendizagem
(professores-profissionais e ou educadores-professores não conseguem ensinar e tão pouco
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aprender coisas novas nesta realidade que se encontra a escola pública) retomem as rédeas da
autoridade do conhecimento dentro de uma escola, encontrem metodologias capazes de
transformar a territorialidade da libertinagem e do comodismo e da frustração em ações
construtoras de indivíduos capazes de pensar e respeitar a comunidade/sociedade em que vive.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme relatam os estagiários, nas escolas-campo há muito que ser superado no
quesito de colocar em prática a proposta pedagógica da escola. A começar pelo professor
regente despir-se de preconceitos em relação ao papel do estagiário nos momentos de
observação, regência e semi-regência: às vezes são tratados como avaliadores negativos; ou
são visto como os professores substitutos não pagos para realizarem as tarefas dos professores
regentes, liberando estes para o descanso ou para resolverem seus problemas pessoais. O
resultado: a indisciplina dos estudantes das escolas-campo e a frustração do estagiário,
passando a se julgar incapaz de assumir a sala de aula.
Esperamos que o aprendizado proporcionado por esta pesquisa possa estimular os
professores iniciantes a enfrentar os problemas da sala de aula. Entendemos que estes são
aqueles que possivelmente levarão novidades para o ambiente escolar: e o novo incomoda,
pois mostra que são necessárias as mudanças. Mas, o mais importante dos resultados
esperados é levá-los à comunidade universitária da UEG de Iporá, em especial ao curso de
Geografia para que nós, professores do quadro, possamos reavaliar nossa prática docente e
nossa abordagem dos componentes curriculares e atender os anseios desses estudantes e
estagiários: saírem da universidade para as salas de aula, dotados de maior segurança quanto
ao domínio do saber geográfico e autonomia para elaborarem suas estratégias para lidar com
as adversidades na sala de aula.
REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS
FERNANDES. C. de O.; FREITAS, L. C. de. Currículo e avaliação. In: MEC. Indagações
sobre o currículo (versão preliminar). Brasília: MEC. 2006.
GUARNIERE, Maria Regina. O professor iniciante e o trabalho com as diferenças dos alunos.
In.: ANDRÉ, Marli. Pedagogia das diferenças na sala de aula. 2 ed. Campinas, SP:
Papirus,
2001.
p.
133-152.
(Série
Prática
Pedagógica.
(máximo 3 páginas)
HAESBAERT, Rogério. Desterritorialização: entre as redes e os aglomerados de exclusão. In:
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A formação de professores: uma proposta de pesquisa a partir da reflexão sobre a prática docente
Castro, Iná Elias de, e et alii. Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand do
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SANTANA, Eduardo Augusto Rosa. Ciclos de Formação: encontros fortuitos com o
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SOUZA, Edna Duarte de. A atividade docente de egressos da licenciatura em Geografia: o
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professores: concepções e práticas em Geografia. Goiânia: Ed. Vieira, 2006. p. 109-124.
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