8º Encontro de Juristas Bancários de Expressão Oficial Portuguesa
Empréstimos Bancários e seu
Enquadramento na Ordem Jurídica
Cabo-Verdiana
Célio Quaresma Afonso
Caixa Econômica de Cabo Verde
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8º Encontro de Juristas Bancários de Expressão Oficial Portuguesa
Digníssimos colegas,
Minhas senhoras e meus senhores
Nos diversos encontros já realizados e conforme os relatórios apresentados, foram
debatidos temas de relevante importância do ponto de vista técnico – jurídico, o que faz
deste fórum, uma espaço para troca de experiência sobre aquilo que tem sido, a aplicação
do Direito na actividade Bancária em cada país falante de Português, aqui representado.
Assim, pretendo com o presente tema e nesta sessão, trazer a vossa consideração
uma abordagem pratica e concreta, esperando de vós, como é óbvio, os doutos
comentários e considerações atinentes ao tema que é:
EMPRESTIMOS BANCÁRIOS E SEU ENQUADRAMENTO NA ORDEM JURÍDICA
CABO-VERDIANA
Antes de entrarmos no cerne do nosso tema, importa abrir um parêntese para
informar que o nosso Código Civil é o Código Civil Português aprovado pelo Decreto
Lei n.º 47.344 de 25 de Novembro de 1966, tornado extensivo às então Províncias do
Ultramar pelo Portaria n.º 22.869 de 4 de Setembro de 1967, com as alterações
introduzidas até 1975. De 1975 a esta parte, inúmeras alterações foram introduzidas ao
Código por diversos Diplomas avulsos, até que, em 1997 e pela Portaria n.º 68-A/97 de
30 de Setembro o mesmo foi reconstituído, sem ser alterado na sua estrutura constitutiva.
DO EMPRÉSTIMO
No sentido corrente e mesmo a nível do D. Civil ou Comercial o empréstimo
consiste na cedência ou atribuição de uma coisa para ser restituída em espécie ou coisa
equivalente.
Recuando no tempo, o código de Seabra no seu artigo 1506, rezava que o
empréstimo era gratuito e que consistia na cedência de uma coisa, para que o beneficiário
se servisse dela, com a obrigação de a restituir em espécie ou equivalente; quando a
restituição devesse ocorrer em coisas de mesma espécie, tínhamos o comodato e quando
recaía em coisas do mesmo género qualidade e quantidade, tínhamos o mútuo. Segundo
o artigo 1507 do mesmo código, o empréstimo era gratuito: Se o comodato fosse
retribuído tínhamos o aluguer e, em caso de mutuo retribuído tínhamos a usura.
Nos nossos dias, o contrato de empréstimo, quando se tratar empréstimo mercantil,
tem a sua consagração legal no artigo 362º do C. Com. que preceitua: “São comerciais
todas as operações do banco, tendentes a realizar lucros sobre numerário, fundos públicos
ou títulos negociáveis, e em especial os de câmbio, os arbítrios, empréstimos, descontos,
cobranças, aberturas de créditos, emissão e circulação de notas ou tintas fiduciárias
pagáveis à vista e ao portador.”
Por conseguinte, o crédito bancário engloba um conjunto de contratos em que
avulta como elemento fundamental, o facto de uma instituição de crédito realizar, em
dado momento, uma prestação creditícia a um seu cliente, ficando este obrigado a
efectuar, em momento diferido, a referida contraprestação e a pagar um preço – o juro.
Relativamente as operações atrás referidas os empréstimos bancários sob forma de
mútuo, os descontos e as aberturas de créditos são os mais correntes.
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DO MÚTUO
O mutuo à luz do direito civil, é um contrato nominado e tem o seu enquadramento
jurídico no artigo 1142º do C. Civ. que o define como sendo “... contrato pela qual uma
das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada
a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade”.
De acordo com a substância deste artigo e ainda por força do disposto no art.º
1144º do mesmo código civil, o mutuo consuma-se com a passagem da coisa mutuada,
da esfera jurídica do mutuante, para a do mutuário.
A nível do direito comercial e, atendendo a natureza das operações de crédito nas
instituições bancárias, o mútuo, que assume a forma de empréstimo comercial, é sempre
acompanhado das mais diversas garantias para, em caso de inadimplência, permitir ao
banco o recurso à garantia para reaver o seu crédito.
Quanto a forma, os contratos de empréstimos sob forma de mútuo civil, ao abrigo
do disposto no C. Civ. e mais concretamente no seu art.º 1143º, reza o seguinte, “ O
contrato de mútuo de valor superior a 1.500.000$00 só é válido se for celebrado por
escritura pública e o de valor superior a 100.000$00 se for por documento assinado
pelo mutuário”.
A respeito de forma, enquanto meio de prova nos contratos de empréstimos
bancários, preceitua o artigo 46º do Decreto Lei 52-E/90 de 4 de Junho que:
“ 1. Os contratos de mútuo, seja qual for o seu valor, quando feitos por instituições
de Créditos podem ser provados por escrito particular ou simples troca de
correspondência, ainda mesmo que a outra parte contraente não seja
comerciante.
2. Os documentos a que se reporta o número anterior constituirão título executivo
bastante contra aqueles que neles se obrigarem.”
O Legislador Cabo-verdiano não ficou por aí no processo de simplificação e
desburocratização das operações de crédito entre as instituições de crédito com seus
clientes e introduziu na nossa Ordem Jurídica mais um preceito inovador e agilizador
nas transações comerciais em que as instituições de crédito sejam partes, aditando ao
Código do Notariado o art.º 78º - A, com o seguinte texto:
“Nos contratos de mútuo em que sejam partes as instituições de crédito em que
seja necessária a prestação de garantias tendo por objecto coisas imóveis, apenas é
celebrada por escritura pública a parte do contrato que disser respeito às garantias”.
Como se pode verificar, o contrato de empréstimo sob forma de mútuo tem a sua
consagração legal no ordenamento jurídico Cabo - Verdiano quer a nível do C. Civil (quando
se tratar de mútuo civil), quer a nível do C. Comercial e demais normas de diversos diplomas
avulsos (quando se tratar de empréstimos mercantis e/ou operações bancárias).
Uma vez feita as considerações julgadas pertinentes em torno do mutuo, enquanto
contrato nominado, passamos a outra operação activa muito usada pelas instituições de
crédito em Cabo Verde.
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DA ABERTURA DE CRÉDITO
O Código Italiano no seu artigo 1842, define este tipo de contrato como contrato
pela qual o banqueiro se obriga a ter à disposição do cliente uma soma em dinheiro, por
um dado período de tempo determinado, noção essa, usada pela Jurisprudência
Portuguesa.
Se este contrato não se encontra conceituado no C. Civ. Português e, sendo o C.
Civ. Cabo-verdiano, todo ele inspirado no C. Civ. Português salvo opinião contraria,
não conseguimos descortinar qualquer preceito que conceitua o contrato de abertura
de crédito nos nossos Códigos, salvo referência feita no C. Com. e mais concretamente
no seu art.º 362º.
EM CONCLUSÃO
Para terminar e, no sentido de colher sugestões e opiniões dos presentes, no
concernente às realidades dos países aqui representados, gostaria de deixar à
consideração e apreciação deste plenário as seguintes questões:
Qual é a natureza Jurídica do Contrato de Abertura de Crédito? É um Contrato
Promessa? Um contrato inominado?
Normalmente cobra-se uma comissão de imobilização sobre a totalidade do crédito
disponibilizado. E se a parte não utilizar efectivamente o crédito? Que solução?
Quem, a luz do Direito são os sujeitos dessa relação juridico-contratual? Creditante
e Creditado? Mutuante e Mutuário? Mutuante e Devedor?
Importa reter que, quer A. Varela - das Obrigações; quer Galvão Telles no
Direito das Obrigações e; quer M. Cordeiro – D. Obrigações, têm um conceito
semelhante da figura do devedor que, é a pessoa que se encontra adstrita a efectuar uma
prestação. E no caso da abertura de crédito, enquanto o sujeito da relação não utilizar
efectivamente o crédito disponível, deve o mesmo assumir-se ab initio como devedor?
Célio Quaresma Afonso
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BIBLIOGRAFIAS CONSULTADAS
• Direito Bancário – Vasco Soares da Veiga, 2ª Edição revista e actualizada, 1997.
• Manual do Direito Bancário – António Menezes Cordeiro, 1998.
• Dicionário de Conceitos e Princípios Jurídicos (na doutrina e na jurisprudência) –
João Melo Franco e Herlander Antunes Martins, 3ª Edição revista e actualizada,
1991.
• Direito na Actividade Bancária – Instituto Superior de Gestão Bancária.
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