1 CENTRO UNIVERSITÁRIO NOSSA SENHORA DO PATROCÍNIO FACULDADE DE SALTO/SP CURSO DE DIREITO O PAGAMENTO DA INDENIZAÇAO DO SEGURO DE VIDA EM CASO DE SUICÍDIO NOS TERMOS DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 2002 RODRIGO NEGRÃO PONTARA SALTO – SP 2009 2 RODRIGO NEGRÃO PONTARA – RGM 32.299 O PAGAMENTO DA INDENIZAÇAO DO SEGURO DE VIDA EM CASO DE SUICÍDIO NOS TERMOS DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 2002 Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio como parte dos requisitos para a obtenção do grau de bacharel em Direito. Orientador(a): Profª Dr. Marcos Vinicius Monteiro de Oliveira SALTO – SP 2009 3 TERMO DE RESPONSABILIDADE “O Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio não se responsabiliza pelas informações contidas neste Trabalho de Conclusão de Curso. Essas informações são de responsabilidade exclusiva do autor Rodrigo Negrão Pontara, RGM 32.299 ___________________________________ Rodrigo Negrão Pontara 4 P811p Pontara, Rodrigo Negrão. O pagamento da indenização de seguro de vida em caso de suicídio nos termos do Código Civil Brasileiro de 2002. / Rodrigo Negrão Pontara. - Salto: Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio, 2009. 61p. Monografia (Direito). CEUNSP – SP. Orientador: Prof. Marcos Vinicius Monteiro de Oliveira. 1. Suicídio. 2. Segurado. 3. Voluntariedade. 4. Involuntariedade. 5. Indenização. I. Título. CDD – 340 5 RODRIGO NEGRÃO PONTARA O PAGAMENTO DA INDENIZAÇAO DO SEGURO DE VIDA EM CASO DE SUICÍDO NOS TERMOS DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 2002 Trabalho de Conclusão de curso apresentada à Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio como parte dos requisitos para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Profª Dr. Marcos Vinicius Monteiro de Oliveira A banca examinadora dos Trabalhos de Conclusão de Curso em sessão pública realizada em ___/___/___, considerou o candidato: RODRIGO NEGRÃO PONTARA 1) Orientador(a):___________________________ 2) Examinador(a):__________________________ 3) Examinador(a):__________________________ 6 DEDICATÓRIA A meu irmão Rogério Negrão pelo apoio irrestrito. 7 AGRADECIMENTOS A todos os colegas e amigos que fiz dentro da instituição nesses anos de graduação, que nunca desistam, força e fé porque o guerreiro de fé nunca gela. 8 "Tudo que é falso, é ruim, até mesmo a roupa emprestada. Se seu espírito não combina com a sua roupa, você está sujeito à infelicidade, porque é desta maneira que as pessoas se tornam hipócritas, perdendo o medo de agir mal e de dizer mentiras." Ramakrishna 9 RESUMO O trabalho ora apresentado mostrará as conseqüências do evento suicídio no seguro de vida, em relação ao direito ou não da indenização à parte beneficiária. Será apresentado as testes e correntes sobre o assunto existentes na doutrina. Também será apresentada as divergências jurisprudências, fruto da incerteza jurídica sobre o tema. Palavras-Chave: Suicídio – segurado – beneficiário- voluntariedade e involuntariedade– indenização 10 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.................................................................................................... 10 1- CONTEXTO HISTÓRICO DO SEGURO EM GERAL ........................... 11 1.1 – O contexto histórico do seguro de vida 12 2 DO CONCEITO DO CONTRATO DE SEGURO ...................................... 14 3 DO CONTRATO DE SEGURO E SUAS ESPÉCIES ................................. 15 3.1 - Do seguro de coisas..................................................................................... 15 3.2- Do seguro de pessoas ou de vida .................................................................. 15 3.3 - Das teorias sobre as espécies de seguro ....................................................... 16 4 DOS CARACTÉRES JURÍDICOS DO CONTRATO DE SEGURO........ 18 4.1 –Da bilateralidade .......................................................................................... 18 4.2- Da onerosidade ............................................................................................... 18 4.3- Da aleatoriedade ............................................................................................. 18 4.4 – Das características de contrato de adesão..................................................... 19 4.5 – Do formalismo............................................................................................... 19 4.6 – Da boa fé 19 .................................................................................... 5 DOS REQUISITOS DO CONTRATO DE SEGURO ............................... 21 5.1 – Requisitos subjetivos .................................................................................... 21 5.2 Requisitos objetivos........................................................................................ 22 5.3 – Da apólice de seguro como principal requisito formal ................................ 22 5.3.1 – Das espécies de apólice ............................................................................. 23 6 DA IMPORTÂNCIA DO ELEMENTO RISCO NO CONTRATO DE 25 SEGURO .............................................................................................................. 7 DA IMPORTÂNCIA DA MUTUALIDADE NO CONTRATO DE 11 SEGURO .......................................................................................................... 27 8 DO SEGURO DE VIDA................................................................................ 30 9 O PAGAMENTO DA INDENIZAÇAO DO SEGURO DE VIDA EM 31 CASO DE SUICÍDIO SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 1916......................................................................................................................... 9.1 – Da voluntariedade e da involuntariedade do suicídio ................................... 33 9.1.2 – Do momento da voluntariedade .................................................................. 36 9.2 – Do ônus da prova da premeditação ............................................................... 37 9.3- Do suicídio no seguro de vida e súmula 105 do Egrégio Supremo Tribunal 39 Federal .................................................................................................................... 9.4 - Do suicídio no seguro de vida e a súmula 61 do Egrégio Superior Tribunal 40 de Justiça ................................................................................................................ 10 DO PROJETO DO CÓDIGO DAS OBRIGAÇÕES DE 1965 ................. 41 11 CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 2002 E O SUICÍDIO NO SEGURO 42 DE VIDA............................................................................................. 11.1 – Da corrente doutrinária de interpretação literal do artigo 798 do Código 42 Civil Brasileiro de 2002.......................................................................................... 11.1.2 – Dos julgados defendendo a interpretação literal do artigo 798 do Código 43 Civil Brasileiro........................................................................................... 11.2 Da corrente doutrinária de interpretação sistemática do artigo 798 do 46 Código Civil Brasileiro de 2002............................................................................. 11.2.1 – Dos julgados defendendo a interpretação sistemática do artigo 798 do 49 Código Civil Brasileiro de 2002............................................................................. CONCLUSÃO........................................................................................................ 55 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 58 10 INTRODUÇÃO A magnífica ciência do Direito possui uma infinidade de assuntos intrigantes; o tema do presente trabalho faz parte deste rol que é até desconhecido por grande parte de seus operadores. O trabalho irá apresentar assunto relevante que é o pagamento da indenização do seguro de vida em caso de suicídio na vigência do Código Civil Brasileiro de 2002. O tema já foi muito polêmico por ocasião do Código Civil de 1916 sendo que até a sua revogação muito de discutia sobre os diversos aspectos que o envolvem, todavia a matéria não foi pacificada por ocasião do novo Codex. A ausência de definição a respeito do tema e a insegurança jurídica materializada nas decisões conflitantes dos diversos Tribunais de Justiça do Brasil motivaram a elaboração do trabalho, o assunto é latente e as discussões no meio jurídico vem pulsando a cada dia. Para que se compreenda melhor as implicações do suicídio do segurado no contrato, será apresentado de início, um aspecto geral do seguro no Brasil, suas espécies e características específicas. Em seguida será feita uma abordagem direta do contrato de seguro de vida mostrando os aspectos deste, no Código Civil Brasileiro de 1916, por meio de posições doutrinárias e jurisprudências para se definir como o tema era tratado. Exaurida a apresentação da matéria, nos termos da legislação cível revogada, haverá o ingresso na matéria conforme o Código Civil Brasileiro de 2002 com a exposição das correntes doutrinárias divergentes, para apoiar cada uma das correntes será estudado como os Tribunais de Justiça de determinados estados vem entendendo o assunto. 11 1 CONTEXTO HISTÓRICO DO SEGURO EM GERAL A história do seguro no mundo e no Brasil remonta ao surgimento das relações comerciais e da moeda, repousando seus fundamentos em disposições técnicas surgidas através dos séculos, tendo seu ponto de partida no período medieval, e foi voltado as relações marítimas. O contrato de seguro não era conhecido e nem praticado pelos romanos. No Brasil, a primeira regulamentação sobre o assunto ocorreu no Código Comercial de 1850, nesse período a normatização foi voltada somente às relações marítimas o que possibilitou o desenvolvimento deste ramo comercial eis que diminuiu os risco e os inúmeros perigos deste tipo de transporte. O Código Comercial Brasileiro, ainda no século passado, dedicou o Título VII e mais precisamente os artigos 666 a 769 ao seguro marítimo e os preceitos ali dispostos foram utilizados como base para os Códigos Civis Brasileiros de 1916 e de 2002, sendo que alguns artigos são ainda utilizados atualmente. Todavia o primeiro dispositivo legal sobre o assunto proibiu expressamente o seguro de vida e apesar da ausência de previsão legal para outro seguro que não o marítimo, as seguradoras negociavam outras espécies de seguro conforme a economia do País evoluía. Quando do início dos estudos para a elaboração do Código Civil de 1916, nosso país já possuía uma indústria securitária em crescimento torrente, e, sem disciplina própria, os princípios do Código Comercial eram utilizados para dirimir os conflitos. Assim o Código Civil Brasileiro de 1916 teve de dar atenção especial a esta espécie contratual e destinou diversos artigos sobre o seguro e suas espécies. Em virtude da regulamentação própria, houve um grande impulso no mercado de seguros, o que propiciou a edição de novos regulamentos com o intuito de aperfeiçoar as operações securitárias, sem, contudo, invadir o âmbito de incidência do Código Civil Brasileiro então em vigor. Posteriormente, a Constituição Federal da República Federativa do Brasil do ano de 1946, em seu artigo 149, expressamente previu a competência do Legislativo para regular o regime das empresas de seguro demonstrando, com isso, que o contrato em questão possuía grande interesse social. 12 Após, a Constituição Federal da República Federativa do Brasil do ano de 1946 surgiu o decreto lei n.º 73 de 21 de novembro de 1966, que é considerado a mais importante das leis esparsas disciplinadoras do contrato de seguro e instituidora do Sistema Nacional dos Seguros Privados. Cabe ressaltar que Sistema Nacional de Seguros Privados foi constituído de entidades controladoras da atividade securitária no país possuindo, a seguinte constituição: - Conselho Nacional de Seguros Privados – CNSP - Superintendência de Seguros Privados - SUSEP - Instituto de Resseguros do Brasil – IRB - Sociedades Autorizadas a Operar Seguros Privados e corretores Habilitados O Conselho Nacional de Seguros Privados tem entre as suas atribuições fixar normas e diretrizes da política de seguros privados, regula o funcionamento e fiscaliza àqueles que exploram as atividades securitárias descritas no decreto lei, logo possui competência para aplicar as penalidades aos que descumprem as normas previstas pelo Conselho. A Superintendência de Seguros Privados é constituída como autarquia federal e sua atuação diz respeito à execução das políticas traçadas pelo CNSP. O Instituto de Resseguros do Brasil é uma entidade de economia mista, assim é composta com capital do Governo Federal e das sociedades seguradoras, ele elabora no Brasil as normas do resseguro, que é a divisão do risco entre vários grupos seguradores. Sobre as Sociedades Autorizadas a Operar Seguros Privados, basicamente é o grupo de sociedades autorizadas pelos órgãos estatais citados a explorar a atividade securitária, o mesmo se diz dos Corretores Habilitados que nada mais são do que as pessoas físicas que comercializam o seguro em nome das sociedades. Por fim, e a Constituição Federativa da República Brasileira do ano de 1988, em seu artigo 22, VII, atribuiu competência à União para legislar sobre seguros e, assim, sem prejuízo do já existente Sistema Nacional de Seguros Privados, o Código Civil de 2002 veio a aperfeiçoar as normas já previstas no Código Civil Brasileiro do ano de 1916. revogado, porém, a interpretação de alguns dispositivos do Novo Código Civil ainda encontra discussão na doutrina e nos tribunais como veremos r no decorrer deste trabalho. 1.1 O contexto histórico do seguro de vida 13 A primeira tentativa de se incluir o seguro de vida em um diploma legal deu-se no Código Napoleônico, mas em sua elaboração a idéia não foi recebida, pois muitos reputavam imoral contratar risco sobre a vida ou a morte de alguém. Combatiam a possibilidade de tal cobertura sob o argumento que a álea permanente aproximava o seguro de vida do jogo e da aposta. Naquela época, o contrato de seguro de vida possuía diversas outras denominações, Thollil (2003 apud PEREIRA) dizia se tratar de empréstimo aleatório, Huc (2003 apud PEREIRA) de aposta sobre a vida, ao passo que Beseler (2003 apud PEREIRA) o definia como contrato “sui generis”. No Brasil o Código Comercial Brasileiro de 1850 foi o primeiro o primeiro diploma legal a prever a comercialização dos contratos de seguro, porém, seguindo os entendimentos doutrinários da doutrina alienígena proibiu expressamente a comercialização do seguro de vida em seu artigo 686, n.º 2, in verbis “ é proibido o seguro; sobre a vida de alguma pessoa livre”. Com a invasão de companhias estrangeiras no Brasil o contrato de seguro de vida passou a ser comercializado mesmo sem a previsão legal, ALVIM (2003, p.02) asseverou que “ até mesmo o seguro de vida, embora expressamente proibido, foi implantado com a tolerância das autoridades”. O seguro de vida, portanto, teve como primeiro diploma legal o Código Civil Brasileiro de 1916 com uma seção própria para regulando toda a matéria, sendo que o em seu artigo 1440 passou a prever a possibilidade da contratação do seguro em relação à vida e faculdades humanas, ou seja, neste caso os riscos cobertos seriam relacionadas à própria vida do segurado, como morte, invalidez e semelhantes. O Código Civil Brasileiro de 1916, como sabido, restou revogado pelo Código Civil Brasileiro de 2002. De forma geral, não houve mudanças significativas em relação ao seguro de vida, na verdade, este corrigiu alguns termos na redação dos dispositivos daquele com o intuito de aprimorar a aplicação das leis. Todavia, foi justamente essa mudança na redação dos artigos trouxe uma grande discussão no Poder Judiciário, principalmente em relação ao seguro de vida e o suicídio, objeto de estudo de nosso trabalho. 14 2 DO CONCEITO DE CONTRATO DE SEGURO O Código Civil Brasileiro hoje em vigência define o contrato de seguro em seu o artigo 757, in verbis: “pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados” Explicando essa conceituação Caio Mario nos ensina que : “ Seguro é o contrato por via do qual uma das partes (segurador) se obriga para com a outra (segurado), mediante o recebimento de um prêmio, a garantir interesse legítimo desta, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos futuros predeterminados” ( PEREIRA, 2003, p. 280)” Maria Helena Diniz, também sob a égide do Código Civil de 2002 assim preleciona : O contrato de seguro é aquele pelo qual uma das partes, se obriga para com outra, mediante a paga de um prêmio, a garantir-lhe interesse legitimo relativo a pessoa ou a coisa e a indeniza-la de prejuízo decorrente de riscos futuros, previstos no contrato ( DINIZ, 2001, pagina 515) Assim, podemos dizer que aquele que suporta o risco assumido após, o recebimento do prêmio é o segurador, que deve possuir considerável capacidade financeira para assumir o risco. A seu turno, o segurado é a pessoa que possui um interesse na conservação de coisa ou pessoa garantida no contrato, fornecendo, em contrapartida, contribuição periódica módica denominação de prêmio. 15 3 DO CONTRATO DE SEGURO E SUAS ESPÉCIES A doutrina é pacifica no sentido de que as espécies de seguro se dividem em seguro de coisas ou de dano e seguro de pessoas ou seguro de vida 3.1 Do seguro de coisas O seguro de coisas, também chamado seguro de dano, é aquele que possuí o típico caráter indenitário, pois tem o escopo de ressarcir o segurado dos prejuízos sofridos. Sobre o assunto, ALVIM nos ensina que nos seguros de dano ” é manifesto o seu caráter indenitário, porque o seguro não ultrapassa o valor da coisa, que constitui limite máximo do ressarcimento, ainda que a verba segurada seja maior”(ALVIM, 2007, p. 05) Pelo seu caráter de indenização, a coisa não pode ser segurada em quantia maior do que vale, da mesma forma não se pode celebrar mais de um contrato de seguro sobre a mesma coisa, salvo se o valor for repartido em dois contratos(artigo 778 do Código Civil). 3.2 Do seguro de pessoas ou de vida Já o seguro de pessoa é aquele que garante, após a quitação de certo prêmio anual ajustado, o pagamento de certa quantia a determinado beneficiário, por morte, incapacidade ou acidente do segurado. Neste sentido, Diniz afirma que “ nosso Código Civil permite que a pessoa humana seja objeto de seguro contra riscos de morte, comprometimento da saúde, incapacidade ou acidentes” (DINIZ, 2002, p.534). Dentre os seguros de pessoas, o mais difundido é o seguro de vida que trata-se de um ato nobilitante em beneficio do bem estar de outrem, neste o segurado não tem o intuito de preservar um interesse patrimonial pessoal, busca na verdade a tranqüilidade de seus entes queridos em caso de sua morte. 16 O segurador, no seguro de vida, tem a obrigação de pagar ao terceiro indicado pelo segurado a soma constante na apólice em caso de falecimento deste. No seguro de pessoas o valor recebido em caso de sinistro não tem caráter indenizatório e não existe limite para o valor segurado, posto que não há como quantificar o valor da vida humana. Por esse motivo é livre a estipulação do valor a ser recebido pelo beneficiário em caso da ocorrência do sinistro, como no caso dos seguros de vida. 3.3 Das teorias sobre as espécies de seguro Com relação as espécies de seguro, faz-se necessário destacar as teorias fundamentais a segui explanadas. O Código Cível Brasileiro de 1916 aparentemente não adotava diferença conceitual entre o seguro de coisas e de pessoas, isso se deu pelo fato de seu organizador ter seguido a teoria unitária, Beviláqua (apud ALVIM 2007) dizia que sem dúvida existia diferença entre o seguro de vida ou pessoa e o de dano ou de coisa, todavia não fazia sentido excluir dos seguros sobre a vida a idéia de dano. A seu turno a teoria dualista separa os seguros de caráter ressarcitório ou de dano, daqueles em que estão presentes os elementos aleatórios, como o seguro de vida, no qual não se busca uma indenização. Porém, o direito comparado sempre refutou o conceito unitário de seguro. O Código Civil Italiano, a lei sueca e a mexicana sempre seguiram a teoria dualista, dividindo o seguro entre os de dano e os de vida, seguida pela lei argentina que prevê a existência de contrato de seguro quando o segurador se obriga, mediante prêmio ou cota, ressarcir um dano ou cumprir a prestação combinada caso ocorra o evento previsto. No Brasil, quando da elaboração do Anteprojeto do Código das Obrigações de 1965, foi seguida a teoria da necessidade eventual que é muito parecida com a teoria unitária, no sentido de que o sinistro alteraria o equilíbrio entre exigências e os meios de satisfação. Logo surgiria uma demanda a ser coberta pelo seguro, que tanto poderia ser abstrata em caso de seguro de vida ou pessoa, ou concreta no caso de seguro de dano. 17 A teoria da necessidade eventual não logrou êxito em compor o conceito de seguro no Código Civil Brasileiro de 2002, foi entendido que, no seguro de dano, existiria a necessidade dupla do segurado, inicialmente, a de se resguardar contra o risco quando da celebração do contrato, após, se ocorrido o sinistro, surgiria a necessidade de ser ver ressarcido para manter o equilíbrio e retornar ao status quo. Já no seguro de vida, nenhuma necessidade experimentaria o beneficiário que, na verdade, aumenta seu patrimônio com o valor da indenização auferida. O Código Civil Brasileiro de 2002, na visão de Alvim (2007, p.03) adotou a teoria do interesse legítimo, prevendo no caput de seu artigo 757, a obrigação do segurador em garantir interesse legitimo, relativo a pessoa ou coisa, contra riscos predeterminados. A expressão “interesse legítimo”, insurge interpretação diante da amplitude, porém, para não deixar dúvidas, o legislador acrescentou o “ relativo a pessoa ou coisa”, deixando evidenciada a diferença entre o seguro de dano e o de vida. Porém, na lição de Cario Mario (2003, p.281), apesar do artigo 757 caput do Código Civil Brasileiro de 2002, especificar e diferenciar o seguro relativo à pessoa ou coisa, o contrato de seguro é único e se divide em vários ramos ou subespécies. Todavia, parece-nos que o Código Civil Brasileiro de 2002, ao disciplinar o contrato de seguro, adotou o caráter dualista, em que pese a inserção do chamado interesse legitimo. 18 4 DOS CARACTERES JURÍDICOS DO CONTRATO DE SEGURO A doutrina majoritária possui entendimento semelhante a respeito da classificação do contrato de seguro, entendendo como sendo um contrato bilateral, oneroso, aleatório, formal, de adesão e de boa fé. 4.1 - Da bilateralidade A bilateralidade ocorre, segundo Maria Helena, porque o contrato de seguro “gera obrigações para o segurado e para o segurador, já que o segurador deverá pagar a indenização se ocorrer o sinistro, e o segurado deverá continuar a pagar o prêmio sob pena do seguro caducar (DINIZ, 2005, pagina 518)” 4.2 – Da onerosidade A onerosidade vem exatamente pautada no fato de que o contrato de seguro traz consigo prestações e contraprestações, na medida que cada um dos contraentes visa obter vantagem patrimonial com a celebração do seguro. Caio Mário (2005, p.281) fala que a onerosidade ocorre porque o contrato de seguro cria benefícios e vantagens para as partes envolvidas na relação contratual.. 4.3 Da aleatoridade A aleatoriedade segundo Franz Martins ocorre : porque o evento previsto, que constitui o risco, pode acontecer ou não. Poder-se-ia dizer, nos seguros de vida, que a morte do segurado um dia irá acontecer, o que tiraria o caráter aleatório do contrato. Mas, se tal fato há de acontecer, há data incerta para sua ocorrência’ ” ( MARTINS, 1997, p. 353) 19 Sobre esta mesma aleatoriedade Caio Mario assim destaca: porque o segurador assume sem co-respectividade entre as prestações recíprocas, e sem equivalência que se conheça o valor global das obrigações do segurado. É por isso que se costuma acentuar que o risco é um elemento essencial no contrato, como acontecimento incerto, independente da vontade das partes” (PEREIRA, 2003, p. 303) 4.4 Das características de contrato de adesão O contrato de seguro é entendido como sendo um contrato de adesão porque se forma com a aceitação dos termos contratuais e em cláusulas impostas e predispostas pelo segurador na apólice, sem possibilidade de, em aceitando-as, o segurado as altera-las. 4.5 Do formalismo O contrato de seguro é considerado formal pela sua própria essência em particular, haja vista que a forma escrita é exigida para a substância do contrato. É essa posição de boa parte da doutrina, Franz Martins (1997, p. 355) justifica a formalidade do contrato pelo fato de que sua redução por escrito é essencial à sua existência. E a respeitadíssima Maria Helena nos dá o seguinte ensinamento: É um contrato formal, visto ser obrigatória a forma escrita, já que não obriga antes de reduzido a escrito. Considerando-se perfeito o contrato desde o momento em que o segurador remete a apólice ao segurado, ou faz nos livros o lançamento usual da operação. A forma escrita é exigida para a substancia do contrato -artigo 758 e 759 CC.02 ( DINIZ, 2005, p. 519) Por outro lado, com visão divergente Orlando Gomes (2003 apud PEREIRA) afirma que se trata de contrato consensual, sustentando que o instrumento escrito é elemento de prova, suscetível de ser suprida por outros meios, como no caso de perícia nos livros do segurador, na hipótese de vir a perecer a apólice. 4.6- Da boa fé 20 Além disso, cumpre-nos mencionar um dos mais importantes caracteres do contrato de seguro que é a boa fé. E sobre esse tema é importante mencionar Diniz que assim descreve: Por exigir uma conclusão rápida, requer que o segurado tenha uma conduta sincera e leal em suas declarações a respeito do seu conteúdo, do objeto e dos riscos, sob pena de receber sanções se proceder com má fé, em circunstancias em que o segurador não pode fazer diligências recomendáveis a sua aferição, como vistorias, inspeções ou exames médicos, fiando-se apenas nas afirmações do segurado, que por isso, deverão ser verdadeiras e completas, não omitindo fatos que possam influir na aceitação do seguro. ( DINIZ, 2001, pagina 520) A boa fé objetiva é requisito de todo o contrato, no caso do seguro esse possuí função ainda mais importante eis que a sua ausência pode inviabilizar a cobertura prevista em apólice de seguro. 21 5 DOS REQUISITOS DO CONTRATO DE SEGURO No tocante aos requisitos do contrato de seguro, é importante que destacar os requisitos subjetivos, objetivos e formais. 5.1 - Requisitos subjetivos No rol dos requisitos subjetivos está, evidentemente, a capacidade das partes, ou seja, do segurado e do segurador, porém os últimos possuem maiores restrições em nosso país.. A exploração de seguros privados não é permitida à qualquer individuo, por exemplo, a pessoa física jamais pode figurar na posição de segurador, tal previsão vem contida no parágrafo único do art. 757 do Código Civil Brasileiro. Assim, somente as sociedades anônimas e as sociedades mútuas podem, em regra, explorar tal atividade, admitindo-se, todavia que em determinados casos, cooperativas, na posição de seguradora para os casos de seguros agrícolas, existindo, ainda, a necessidade de autorização governamental para o funcionamento dessas companhias. Com relação ao segurado, cumpre salientar que nem todas as pessoas podem ser beneficiárias ou estipulantes de um seguro. No caso específico do seguro de vida, o artigo 793 do Código Civil fala da possibilidade da instituição do companheiro como beneficiário do seguro de vida, se quando da celebração deste o segurado era separado judicialmente ou se encontrava separado de fato, p que nos leva a concluir que a pessoa casada não pode indicar como beneficiária a sua companheira. Porém, tal previsão é sem propósito haja vista que a indenização do seguro de vida não tem natureza jurídica de herança, razão pela qual deveria ser livre a nomeação do beneficiário. Alvim (2007, p.168) diz que, no direito comparado não existe nenhuma previsão nesse sentido, salienta que o beneficiário do seguro de vida adquire direito próprio que não provém do patrimônio do segurado, e, por isso, deveria ter ampla liberdade para instituí-lo. O mesmo se diz no seguro sobre a vida alheia, ou seja, quem realiza um contrato nestes moldes deve demonstrar o seu interesse sobre a preservação da vida de terceiro, sendo tal 22 demonstração descartada quando o segurado é seu cônjuge, ascendente ou descendente do proponente beneficiário, conforme previsto no artigo 790 do Código Civil Brasileiro. 5 .2 Requisitos objetivos Não são muitos os requisitos objetivos do contrato de seguro, mas o mais importante a ser citado diz respeito ao objeto segurado. O objeto do contrato de seguro deve ser lícito, ou seja, o seguro pode incidir sobre todo bem jurídico desde que coberto de licitude. Conforme, alias, o entendimento de Caio Mario (2003, p. 283) a iliciedade do bem ou negócio segurado contamina e anula o contrato. Alias, o próprio do conceito de seguro previsto no artigo 757 do Código Civil Brasileiro deixa claro isso quando fala de interesse legitimo a ser segurado. Vale dizer que a ilciedade nem sempre recai sobre o objeto, em matéria securitária há ilícitos especiais, no seguro de dano, por exemplo, a coisa jamais pode ser segurada em valor maior do que realmente, do mesmo modo é proibido a pluralidade de seguros sobre a mesma coisa. Por fim, Diniz (2005, p.524) preleciona no sentido da necessidade do valor do objeto ser determinado, sendo um requisito objetivo qualquer sonegação nesse sentido pode anular o contrato de seguro. 5.3 Da apólice de seguro como principal requisito formal A apólice de seguro, na visão de Alvim(2007, p.23) é uma promessa de pagamento a ser satisfeita por quem a emitiu, caso venha a se manifestar o acontecimento previsto no contrato de seguro. A apólice é emitida e assinada pelo segurador, em seguida, é entregue ao segurado que a mantém em seu poder. Porém a apólice não é único documento do contrato, pois existe também a proposta. 23 O contrato de seguro, por sua peculiaridade, desdobra-se em duas fases, na primeira o segurado oferece sua proposta com os elementos que tornam possível o conhecimento por parte do segurador da gravidade do risco que vai assumir segundo previsão contida no artigo 759 do Código Civil Brasileiro, cuja parte final do fala de declaração dos elementos essenciais relativos ao interesse a ser garantido. Por isso é que se faz necessário que o segurado preste informações verdadeiras em sua proposta, pois qualquer omissão nas respostas aos quesitos essenciais poderá desnaturar o contrato, na medida em que o risco acabará sendo desvirtuado. A apólice, que é emitida com base na proposta, deverá conter, além das condições gerais, as especificas. Deverá designar: - quais as vantagens garantem o segurador - especificar os riscos assumidos - o valor ou o limite do objeto do seguro - o prêmio a ser pago - o termo inicial e final de sua vigência - os casos de decadência, caducidade e eliminação ou redução dos direitos do segurado ou beneficiários incluídos. Portanto, concluímos que os requisitos formais se materializam na necessidade do instrumento escrito apólice para dispor sobre as condições especificas do contrato. Isso porque o artigo 758 do Código Civil Brasileiro prevê que o contrato se prova pela exibição da apólice, do bilhete ou mesmo de documento que comprove o pagamento do prêmio. Contudo há que se ressaltar que apesar da possibilidade de comprovação da existência do contrato por meio de bilhete ou documento que demonstre o pagamento do prêmio, a natureza do contrato de seguro exige instrumento escrito. Logo não se deve confundir os meios de se provar a existência do contrato com a sua própria formação. O bilhete ou outro documento poderia servir como prova da existência de relação securitária em caso de extravio da apólice, todavia não se admitiria a existência de um contrato de seguro fundamento somente no bilhete. 24 5.3.1- Espécies de apólice O caput do artigo 760 do Código Civil Brasileiro prevê as espécies de apólices admitidas nos contratos de seguro em nosso país, que, respectivamente, podem ser nominativas, á ordem ou ao portador. Nominativa seria a apólice que menciona o nome do segurador, do segurado, do seu representante, se existir, ou daquele que em seu nome se faz o seguro. A apólice nominativa se transmite por alienação ou cessão, salvo se não existir previsão em sentido contrário na apólice. Apólice à ordem é aquela que pode ser transmitida por endosso em preto, datado e assinado pelo endossante e pelo endossatário. E apólice ao portador é a que dá a seu detentor o direito à cobertura contratual e se transmite por simples tradição, todavia estas só são admitidas no seguro de dano. O seguro de vida não admite a apólice ao portador porque este jamais pode ter como beneficiário a amante de um homem casado, do mesmo modo ninguém pode segurar a vida de terceiros, na qualidade de beneficiário, sem demonstrar interesse, sendo impossível a apólice de seguro de vida ao portador. Diniz afirma que as apólices podem ser especificas caso ocupem um certo risco delimitado, classificado-as como plúrima se cobrir uma serie de riscos garantidos por uma única apólice, ou abertas quando “ o risco de desenvolver ao longo de sua atividade, determinando a individualização e a especificação dos objetos segurados por meio de averbações realizadas no período de vigência, como no seguro de transporte( DINIZ, 2005, p.527) Por fim, diz-se apólice simples aquela que determina com precisão o objeto do seguro como aqueles celebrados sobre a vida de uma pessoa, e flutuante aquelas que prevêem a substituição da coisa segurada, como nos seguros de acidente de trabalho para empregados de determinada empresa que substitui os empregado demitidos pelos admitidos. 25 6 DA IMPORTÂNCIA DO ELEMENTO RISCO NO CONTRATO DE SEGURO Conforme ressaltado no item anterior, o contrato de seguro na sua formação é composto por duas etapas, ou seja, inicialmente o segurado responde a uma série de indagações feitas pelo segurador a respeito da natureza do bem a ser segurado e com base nessas é que a seguradora aceita ou não ou contrato e, em caso de aceite, calcula o valor do prêmio, entendido como sendo a quantia paga pelo segurado à seguradora em troca da cobertura securitária. Existem determinadas características do “interesse legítimo” a ser protegido pelo contrato de seguro que somente o segurado conhece, a exemplo do caso do seguro de vida no qual as informações sobre possíveis doenças ou tratamentos, pelos quais passa o segurado são imprescindíveis, posto que sem estas, seria impossível o segurador calcular o prêmio a ser pago. Assim é por meio das respostas dadas nas indagações formuladas a a respeito do bem segurado que o segurador conhece o chamado risco que é o principal elemento do contrato de seguro e dá causa ao surgimento do contrato, ou seja, sem o risco não se justificaria a celebração de um contrato de seguro. O risco no contrato de seguro é evento incerto e futuro, ocorrido sem “ animus” das partes em lesar algum interesse legitimo, sendo o risco fonte norteadora do contrato de seguro podemos dizer que ele preexiste à sua formação. O mestre Alvim (2007, p. 31) fala do risco como acontecimento possível, mas futuro e incerto, quer quanto a sua ocorrência, quer quanto ao momento em que se poderá produzir. Assim Caio vai além e diz que “o objeto do contrato de seguro é o risco, que pode incidir em todo bem jurídico”.(PEREIRA, 2003, p. 283) Assim sendo, a contribuição ou o prêmio de cada segurado deverá ser proporcional ao risco que se está correndo, daí a necessidade de o segurado relatar na proposta todos as circunstâncias que caracterizam a natureza do risco. Se o segurado ou beneficiário, forma dolosa, procura e causa o evento risco segurado, acontecerá a desnaturação do contrato, pois, a busca pelo risco exclui a incerteza, elemento fundamental do risco, e nesse caso, deve ser o contrato considerado nulo conforme previsão do artigo 762 do Código Civil Brasileiro de 2002 in verbis : “nulo será o contrato para 26 garantia de risco proveniente de ato doloso do segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro”. Sendo o elemento risco a base do contrato de seguro, pesam sobre ele diversas disposições legais tendo em vista sua posição de postulado fundamental desta espécie contratual, nesse sentido o artigo 766 do Código Civil Brasileiro de 2002 nos mostra que, caso o segurado não preste informações corretas sobre o bem segurado, poderá perder direito a indenização, salvo se a inexatidão não adveio da má fé do segurado. A omissão de dados fundamentais sobre a avaliação do risco assumido pelo segurador feriria o princípio da boa fé no contrato de seguro, artigo 765 do Código Civil Brasileiro, neste sentido: Diz-se que o seguro é um contrato de boa fé. Alias todos os contratos devem ser de boa fé. No seguro, porém, este requisito se exige com maior energia, porque é indispensável que as partes confiem nos dizeres uma da outra. Pela mesma razão, é posto, em relevo, no seguro, o dever comum de dizer-se a verdade ( MONTEIRO, 2003, p.368) Portanto, no momento da celebração do contrato, é dever do segurado prestar informações exatas, sob pena de anulação por dolo. Funda-se esta regra no princípio da transparência e da boa-fé, cuja conseqüência funda-se na perda do direito à indenização e obrigação de pagamento do prêmio já vencido. Deste modo podemos ver que o risco é sem dúvida um dos elementos mais importantes do contrato, com base nele é que se advém todas as condições e obrigações para o segurado e para o segurador. 27 7 DA IMPORTÂNCIA DA MUTUALIDADE NO CONTRATO DE SEGURO Além do risco, existe outro elemento fundamental do contrato de seguro que é o mutualismo. O homem, desde os primórdios, sempre se organizou em grupos como meio de aumentar a sua capacidade de sobrevivência, na busca de se prevenir de prejuízos incertos. E sob esse ponto de vista que se diz que o contrato de seguro possui um espírito comunitário, ou seja, existe um esforço conjunto de segurador e segurado para a defesa de seus bens mais preciosos contra riscos incertos ou desconhecidos que possam o lesar. No contrato de seguro, o segurador assume a obrigação de garantir um “ interesse legitimo” do segurado, com o pagamento de um valor calculado com base no risco, ao passo que a garantia do bem segurado é advinda da formação de um fundo composto dos prêmios captados pela seguradora de outros segurados. Assim a realização da garantia se faz com esses recursos e não com os da própria seguradora. A doutrina, a seu turno, avalia que o segurador se propõe a organizar o trabalho de cooperação na sociedade amealhando dos interessados pequenas contribuições que formarão um fundo comum para o pagamento das indenizações aos que são atingidos pelo infortúnio. Deste modo, é certo que o contrato de seguro não se realiza da forma isolada, pois o valor que cada segurado paga, isoladamente, pelo prêmio não é equivalente ao valor do risco assumido pelo segurador. Assim o contrato de seguro não se justifica e não existe de forma isolada. O mestre Al;vim se pronúncia, afirmando que “ o segurador deve ser considerado um intermediário entre os segurados; estes é que pelo caráter de mutualidade, imanente a todo seguro, são as verdadeiras partes contratantes” (ALVIM, 2007, p. 33). Sobre a mutualidade no contrato de seguro, Passos asseverou que : É um contrato comutativo, em verdade um negócio jurídico coletivo, integrado pelos muitos atos individuais que aportam para o fundo comum de recursos tecnicamente exigidos para a segurança de todos em relação às incertezas do futuro. A massa comum dos recursos a ninguém pertence, em termos de propriedade individua, sendo algo em aberto e permanentemente disponível para atender às necessidades que surjam e para cuja satisfação foi constituída( PASSOS, 1999, p. 95) Ademais, nossa legislação é clara ao prever que o risco jamais pode ser agravado de forma intencional pelo segurado, pois isso romperia a mutualidade do contrato, conforme 28 estabelecido no artigo 768 do Código Civil Brasileiro in verbis: ”o segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato”. Ao agravar o risco de forma dolosa o segurado acaba por alterar as condições contratuais, rompendo a equidade contratual na medida em que não mais existiria equilíbrio entre o prêmio e a indenização prevista em caso de sinistro. Considerando a mutualidade do contrato propriamente dita, o agravamento intencional prejudicaria a coletividade de segurados que contam com o fundo constituído para a cobertura dos infortúnios cobertos pela empresa seguradora. Cumpre salientar que o agravamento do risco não é oriundo somente de atos voluntários, já que as circunstâncias geradas pelo próprio segurado e posteriores a celebração do contrato podem ser consideradas como agravantes do risco e prejudiciais a mutualidade.. Alvim(2007, p.57), por suas vez, critica a redação dada ao artigo ora comentado, relatando que pouco importa a existência ou não do ato intencional de agravamento do risco, porque que deve se verificar é se o agravamento se deu por ato do segurado ou fato oriundo de sua vontade( o Código Civil de 1916 e o Projeto do Código das Obrigações possuíam este entendimento). Todavia, não é qualquer agravamento do risco que desnatura o contrato e rompe a mutualidade anunciada. Alterações pequenas e insignificantes do risco não interessam ao contrato, e sim somente aquelas que afetam o substancialmente desfigurando suas características primitivas. Deste modo, o agravamento tem de ser essencial, assim se o segurador conhecesse a possibilidade do agravamento anteriormente sequer celebraria o negócio. Como se nota, nossa legislação permite interpretação sobre o que pode ser considerado como agravamento de risco. Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça vem, de forma reiterada, decidindo que a perda do direito sobre a indenização somente deve ocorrer quando restar-se provado que o agravamento do risco influiu de forma decisiva na ocorrência do sinistro, neste sentido decidiu o Egrégio Superior Tribunal de Justiça: SEGURO. EMBRIAGUEZ. EXCLUSÃO. COBERTURA. VERIFICAÇÃO. MATÉRIA FÁTICA. CLÁUSULA CONTRATUAL. DESCABIMENTO. I - A embriaguez, por si só, não constitui causa de exclusão da cobertura securitária, sendo necessária a prova de que o agravamento de risco dela decorrente influiu, 29 decisivamente, na ocorrência do sinistro. Precedentes. II - A via especial não se presta à análise de matéria fática e de cláusula contratual, o que incide no óbice das Súmulas 5 e 7 do Superior Tribunal de Justiça. Agravo improvido( STJ -AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 637.240 - SC (2004/0027726-0) - RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO – Julg 10/08/06 – D.O 11/09/06) Por outro lado, se o agravamento do risco ocorrer sem a participação do segurado, deverá comunicar o segurador no prazo de 15(dias) da ciência do agravamento, sob pena de também perder o direito a indenização. Todavia a porém a perda do direito só se justifica se o segurador puder fazer algo para evitar o sinistro, conforme a previsão contida no artigo 769 e parágrafos do Código Civil Brasileiro de 2002, não se aplicando porém nos casos de seguro de vida. Por fim ressaltamos que o artigo 770 do Código Civil Brasileiro prevê a diminuição do agravamento do risco o decorrer do contrato, nesse caso o segurado não possui direito a diminuição do premio, porém caso a redução seja considerável pode solicitar a resolução do contrato ou revisão do premio, todavia é de se ressaltar que essa hipótese não se aplica ao seguros de pessoa. 30 8 DO SEGURO DE VIDA O seguro de vida, especificamente, é aquele por meio do qual a empresa seguradora se compromete a pagar a um ou mais beneficiários, indicados pelo segurado, determinada quantia em caso de sua morte, mediante o pagamento de um valor denominado como prêmio. O seguro de vida, hoje, possui importante papel na sociedade, eis que, em regra, tem o condão de evitar que famílias fiquem na miséria em razão da morte de determina pessoa responsável pelo sustento dessas.. Na lição de Alvim o seguro de vida “não busca proteção para os interesses patrimoniais mais sim a tranqüilidade de seus entes queridos, a sobrevivência do trabalho humano, a proteção útil que em vida opera o segurado e que ele garante aos beneficiários quando não mais lhe pode ser objetivamente proveitoso (ALVIM, 2007, p.149)” Importante destacar que o seguro de vida não busca tutelar interesses patrimoniais ou o lucro e sim o bem estar do beneficiário que, porventura, dependa da renda do segurado para viver. Por isso diz-se que o seguro tem também um caráter social, na medida que, acaba por beneficiar toda a sociedade a poupando da proliferação de miseráveis. Deste modo o seguro de vida jamais poderá ser usado com objetivos escusos, sob pena de, não só atentar contra a moral e os bons costumes da sociedade mas também de perder o seu objeto de instrumento de pacificação social. 31 9 DO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO DO SEGURO DE VIDA EM CASO DE SUICÍDIO, SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 1916. O Código Civil revogado surgiu como um grande avanço nas questões relacionadas ao seguro de vida, uma vez que foi o primeiro diploma legal a autorizar o bem da vida como objeto segurável. Deste modo, o Código Civil Brasileiro de 1916 dedicou diversos artigos sobre o tema, dentre eles, destacamos o artigo 1440: Art. 1440. A vida e as faculdades humanas também se podem estimar como objeto segurável, e segurar, no valor ajustado, contra os riscos possíveis, como o de morte involutária, inabilitação para trabalhar, ou outros semelhantes. Parágrafo único. Considera-se morte voluntária a recebida em duelo, bem como o suicídio premeditado por pessoa em seu juízo. O artigo em questão veio como forma de regulamentar uma prática que, como visto, já havia sido incorporada à sociedade brasileira, porém trouxe limitações legais à sua cobertura seguindo desta forma o direito alienígena. Notamos que a norma, de forma expressa, trouxe limitação á cobertura securitária em relação à vida, houve declaração de que a vida e as faculdades humanas constituem-se objeto segurável, porém desde que o óbito tivesse causa involuntária. A necessidade de a morte ser de origem voluntária seguiu uma linha adotada por todas as legislações estrangeiras, estas também sempre coibiram de forma absoluta a possibilidade de se segurar a morte voluntária, eis que, se assim não fosse seria despertado na sociedade impulsos nocivos ao individuo e à coletividade. Ao asseverar sobre o assunto Batista explica que: O Código Civil de 1916 ao autorizar como objeto segurável o bem supremo da vida, excluiu o suicídio voluntário. Assim procedeu em atenção à ordem pública33 , ao princípio da moralidade, à justiça social e à boa-fé. Assim procedeu em homenagem aos princípios fundamentais de todo o contrato (boa-fé, licitude, etc) e em especial aos princípios atinentes, especificadamente, ao contrato de seguro (risco, incerteza, interesse legítimo, mutualidade, etc) (BATISTA, 2009, p.30) 32 Se determinado individuo contrata um seguro de vida e, em seguida, dá cabo à própria vida, de forma consciente e proposital, ele acaba por buscar o risco e, é inconcebível que o risco, e por conseqüência o sinistro sejam causados pela vontade do segurado. Do mesmo modo, existe um total rompimento da mutualidade, ou seja, o valor referente à indenização acaba por ser pago pelos demais segurados que contribuíram com pequenos valores para a formação do fundo, com o intuito de se verem garantidos em situações inesperadas, conhecidas mais distantes da esfera de disponibilidade. No que diz respeito ao duelo, apesar de não ser o tema central deste trabalho, cabe ressaltar que o Código Bevilacqua o equiparou ao suicídio voluntário. Não muito tempo antes da promulgação do Código Civil Brasileiro de 1916, o duelo era praticado de forma contumaz, o duelo como ato consciente também se configurava como disposição voluntária da própria vida. Neste sentido, Bevilacqua disse que "a lei não admite seguro contra a morte voluntária, e considera tal a recebida em duelo, bem como suicídio premeditado por pessoa em seu juízo" (BEVILÁQUA, 1958, p. 571). Portanto, por ocasião do Código Civil Brasileiro de 1916 era evidente que o seguro de vida não poderia cobrir a morte voluntária como a recebida em duelo e do mesmo modo estaria afastada da cobertura do suicídio premeditado por pessoa em seu estado perfeito de juízo. O suicídio voluntário e o duelo, como visto, são atos anti-jurídicos e lesionam por completo os princípios fundamentais do seguro e assim jamais poderiam estar tutelados pela manta civil. Aparentemente, teve-se a impressão que a matéria foi pacificada no Código Civil Brasileiro de 1916, todavia, isso não é verdade. As normas jurídicas como sabemos possuem diversos meios de interpretação, e assim houve questionamentos diversos sobre o sentido das expressões morte voluntária e suicídio premeditado Existiu, portanto muita discussão a respeito do assunto, haja vista as companhias seguradoras e os beneficiários passaram a travar batalhas intermináveis, em todas as esferas do Poder Judiciário houve grande dificuldade em se definir o que poderia ser considerado como morte premeditada ou voluntária e o que seria uma morte involuntária ou não premeditada. Sabendo que as expressões, voluntário e involuntário, em relação ao suicídio, são cercadas de muitas dúvidas, coube à doutrina e à jurisprudência qualificar e quantificar o significado do suicídio voluntário e involuntário para o Direito, e não só isso, houve a 33 necessidade de se definir em que momento se verificaria o ato de voluntariedade, se no ato de assinatura do contrato ou no cometimento do suicídio. 9.1 - Da voluntariedade e da involuntariedade do suicídio A necessidade da definição das expressões “voluntário” e “involuntário”, em relação ao suicídio no seguro de vida, surgiu com a própria redação do artigo 1440 e de seu parágrafo único do Código Civil Brasileiro de 1916 e que deixaram bastante claro que a morte involuntária seria contemplada pelo seguro de vida. Para chegar a uma definição destes conceitos, indubitavelmente, instaurou-se um conflito médico-jurídico. O Direito Brasileiro ao buscar uma definição do que seria a involuntariedade em um evento de suicídio teve de esbarrar em conceitos da psicologia e da psiquiatria, sem, contudo, se ater as definições por elas trazidas, uma vez que o Direito buscava respostas que se enquadrassem no sistema legal, considerando a necessidade de uma resposta jurídica a esta questão. Os estudos médicos sempre disseram que o suicídio é sempre um ato intencional, Durkheim (2007, apud ALVIM) dizia que o suicido é sempre cometido com voluntariedade e consciência por pessoa que tem a intenção de morrer, e o termo suicídio seria aplicado a todos os casos de morte resultantes, direta ou indiretamente, de um ato positivo ou negativo da própria vítima que conhece o resultado que se produzirá.. Porém, o entendimento acima exposto jamais foi unânime, sobre o tema o doutrinador Vivante se expressa no sentido de que : a medida que a luta pela vida se faz mais difícil e cansa o cérebro, que serve princplamente para combate-la, cresce o número de locos e de suicídas, Influencias hereditárias e adquiridas no decorrer dos anos, nos lançam lentamente, quase de forma inconsciente a morte fazendo com que o individuou tenha pouca chance de resistir a tendência suicida” ( 2007 apud ALVIM, p.185) Ressaltamos que Durkheim e Vivante divergem sobre o suicídio, o primeiro, de maneira mais cientifica analisa do suicídio do ponto de vista mais objetivo, já o segundo analisa o suicídio como um fenômeno do mundo moderno, ocasionado por fatores externos e que aos poucos macula e vicia a vontade do individuo o tratando quase como uma doença. 34 Se nosso direito acolhesse qualquer uma das teorias, teríamos uma fácil missão ao explicar a aplicação das expressões ora discutidas aos casos concretos, pois, ou o suicídio seria sempre voluntário ou seria sempre entendido com involuntário. Todavia, nenhum dos posicionamentos absolutistas foram acolhidos visto que a maioria dos legisladores o estudaram com algumas restrições. Assim, nosso Direito necessitava e encontrou solução diversa criando-se a figura jurídica especial do suicídio voluntário e do involuntário, ou, como alguns preferem, do suicídio premeditado e não premeditado. Explicando o alcance dessas expressões encontramos na lição de Nader conceito completo do suicídio voluntário: “é o suicídio caracterizado pela consciente e real intenção da vítima de se matar. Vítima que, deliberadamente procura o risco e, dessa forma, desnatura o contrato de seguro de vida. Age movido pela torpe intenção de, ilicitamente enriquecer o beneficiário” ( NADER, 2002, pág 130). Agora, sobre o suicídio involuntário, Nader fala que “ o suicídio provocado pelo segurado que não se acha no gozo perfeito de sua saúde mental. Ao contrário, padece de grave perturbação de inteligência pelo que involuntariamente dá cabo à própria vida” ( NADER, 2002, pág 130)” Portanto, com base na lição de Nader, é possível compreender o motivo da necessidade de uma definição jurídica, e não médica, do suicídio voluntário ou involuntário, salientando que as expressões voluntário e involuntário, em relação ao suicídio, não é a melhor exege do instituto, assim muitos doutrinadores definiram ser mais correto o uso dos termos suicídio premeditado e suicídio não premeditado. A voluntariedade ou premeditação não deve ser analisada somente em relação ao suicídio. Deve-se observar que influência o contrato de seguro de vida teve no ato do suicida e se o pensamento na indenização indicada na apólice motivou o suicídio. A premeditação do suicídio é o ato do individuo que pretende encerrar a própria vida com o objetivo exclusivo de contemplar, com a indenização prevista no contrato, o beneficiário que indicou na apólice do seguro de vida. 35 A contrário senso, o suicídio não premeditado ou involuntário seria àquele cometido sem qualquer influência do seguro de vida , ou melhor, o individuo escolheu encerrar a própria vida por desinteligência, delinqüência mental ou alteração psíquica. Complementando o conceito de suicídio involuntário, Rizzardo (1988, p.825) diz que se trata da alienação mental, ou a lesão psíquica, ou de causa interna que retira totalmente a capacidade de autocontrole e faz a vítima perder a noção do efeito de seu ato. Dessa maneira, o correto é concluir que o suicídio não premeditado é equiparado ao acidente pessoal, pois os atos praticados pelo suicida foram imbuídos de vontade viciada e anômala, deste modo o resultado é sempre um acidente. Por conseguinte, a intenção do legislador no Código Civil Brasileiro de 1916 era de não contemplar com a indenização o beneficiário de segurado que se suicidou, com a intenção exclusiva de locupletar o primeiro com o valor constante na apólice. Neste sentido, o principal responsável pelo projeto do Código Civil Brasileiro de 1916 Bevilacqua, sobre o assunto e durante a vigência do Código Civil antigo, assim se expressou: “ o suicídio para anular o seguro deve ser conscientemente deliberado, porque será igualmente um modo de procurar o risco, desnaturando o contrato. Se, porém, o suicídio resultar de grave, ainda que subitânea, perturbação da inteligência, não anulará o seguro. A morte não se poderá, neste caso, considerar voluntária; será uma fatalidade; o indivíduo não a quis, obedeceu a forças irresistíveis."( BEVILÁQUA, 1958, p. 520). Ainda sobre a premeditação ou não do ato suicida, Pedro Alvim ensina que: "nem todo suicídio é voluntário ou consciente. Pode originar-se de um estado mórbido do segurado, em que sua decisão de auto-eliminar-se perde as características de um ato premeditado para configurar-se num caso fortuito ou de força maior. Ora, quando isto acontece, será vinculada a responsabilidade do segurador, pois o risco se apresenta com as suas peculiaridades de fato aleatório. Diz-se, então, que o suicídio involuntário, inconsciente ou não-premeditado, está coberto normalmente pelo contrato de seguro de vida. " (ALVIM, 1999, p. 236) Na mesma obra, o mestre Alvim (1999. p.249) ainda traz mais um ensinamento ao dizer que o suicídio involuntário encontra sua etiologia numa anormalidade psíquica do segurado. Provém de uma causa interna, isto é, de uma predisposição hereditária, de uma doença ou de uma perturbação, ainda que momentânea. Tais entendimentos foram desde sempre acolhidos por nossos Tribunais Superiores, assim somente se o segurado celebrasse o contrato de caso pensado e se suicidasse 36 para deixar o dinheiro do seguro com a família, é que se poderia cogitar de suicídio voluntário, nos demais casos, o suicídio equiparar-se-ia a morte natural, como um louco que se acidentou e morreu. Seguindo o exposto, assim já decidiu o Egrégio Superior Tribunal de Justiça: O suicídio não-premeditado equipara-se ao acidente, tendo a segurada o direito de receber a indenização correspondente à morte acidental. Precedentes. Recurso conhecido em parte e provido (STJ - RESP 304286/SP - DJ de 06/05/2002, PG: 295 Relator: Min. Ruy Rosado de Aguiar - Data da decisão: 12/03/2002 - Quarta Turma). O suicídio desintencional está abrangido pelo seguro de acidentes pessoais. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial atendido. Unânime (STJ - RESP 16560/SC - DJ de 22/06/1992, PG: 9765 - Relator: Min. Fontes de Alencar - Data da decisão: 12/05/1992 - Quarta Turma). Portanto, na vigência do Código Civil Brasileiro de 1916, a jurisprudência dos Tribunais informadores era pacífica e passou a dar segurança jurídica esperada, porém, a discussão não terminou somente na doutrina e na jurisprudência. 9.1.2 - Do momento da voluntariedade Sobre o assunto, importante ainda destacar o momento que dava a verificação da não premeditação, restando claro que tal matéria não é de interesse somente do Códex revogado, posto que as discussões sob involuntariedade e seu momento permanecem ainda latentes no Código Civil Brasileiro de 2002. A corrente doutrinária defendia pelas companhias seguradoras sempre preconizou que a voluntariedade diz respeito ao ato, ou seja, ao cometimento do suicídio, devendo-se observar se o individuou que resolveu se suicidar o fez com o objetivo de contemplar com a indenização o beneficiário inserido na apólice do seguro de vida Deste modo, sua vontade, quando da celebração do contrato não merece observação, porque se dolo já existia quando da formação do contrato, mas o contratante desiste do suicídio e acaba por falecer de outra causa natural, o pagamento da indenização é devido. Levando-se em consideração a aleatoriedade do contrato de seguro, essa corrente nos parece acertada, pois se não fosse assim poderíamos dizer que alguém que realiza um seguro de dano de um veículo pode no momento da contratação, não estar pensando em simular um 37 sinistro de furto, porém, se posteriormente o fizer perderá da mesma maneira o direito à indenização. Todavia, no ano de 2003, em julgado de caso ocorrido ainda sob vigência do Código Civil Brasileiro de 1916, Ministra Nancy Andrighi, considerada pelas companhias seguradoras como grande inimiga, proferiu julgado que subverteu o entendimento então pacificado pela Doutrina. A nobre Ministra relatou que a premeditação deveria ser observada quando da formação do contrato e não em relação ao ato do suicídio como notamos abaixo: RECURSO ESPECIAL. SEGURO DE VIDA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SUICÍDIO NÃO-PREMEDITADO. ACIDENTES PESSOAIS. - O suicídio não premeditado à época da contratação do seguro deve ser considerado abrangido pelo conceito de acidente para fins de seguro. - Recurso conhecido em parte e não provido." (STJ, REsp nº 472.236/RS, rel. Min. Nancy Andrighi, j. em 15.5.2003, DJ 23.6.2003, p. 361). Portanto, a Ministra, no julgado transcrito, acabou por lançar nova tese jurídica sobre o momento da premeditação, eis que no corpo do relatório foi dito que a premeditação descrita na súmula 61 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça é a existente no momento em que se contratou o seguro e não do ato do cometimento do suicídio. O julgado recebeu muitas críticas da comunidade jurídica ligada às companhias seguradoras, mas, desde então, nenhum outro Recurso Especial com as mesmas características foi julgado no Superior Tribunal de Justiça. 9.2 - Do ônus da prova da premeditação Ultrapassada a questão da definição de morte involuntária ou não premeditada, deve ser observada mais um ponto, ou seja, à quem incumbiria o ônus probatório da premeditação ou da não premeditação. Na busca de tal definição, devemos mergulhar no direito de forma mais ampla, nossa ordem jurídica, constitucional ou infraconstitucional, prestigia o princípio da boa-fé e, 38 assim, esta é sempre presumida, e em sentido contrário a má fé deve provada de forma absoluta e sua declaração não pode derivar de indícios e meras conjecturas. Assim, tem-se que a boa fé é “moldada nas idéias de proceder com correção, com dignidade, pautando sua atitude pelos princípios da honestidade, da boa intenção e no propósito de a ninguém prejudicar"( RODRIGUES, 2002, p. 60). O suicídio voluntário no seguro de vida, segundo a conceituação já ventilada no trabalho, é uma forma de fraude no seguro, pois é a procura intencional do risco por parte do segurado imbuído de má fé. Portanto, não há dúvidas de que, em caso de negativa de pagamento de seguro de vida, sob alegação de suicídio premeditado, cabe às seguradoras a prova da premeditação do suicídio, não pode ser lançada ao segurado uma presunção de má fé. Deste modo, se a seguradora se negar o pagamento da indenização do seguro em caso de suicídio terá que provar sua premeditação, neste sentido Carvalho Santos(apud ALVIM) o suicídio presume-se sempre como ato de inconsciência, cabendo a quem tiver interesse provar o contrário, de modo a destruir tal presunção, ao segurador compete fazer a prova de que o segurado suicidou-se premeditadamente, com a consciência de seu ato. Em sentido contrário, porém, Alvim (2007, p.187) leciona que o ônus probatório deveria pertencer ao beneficiário, tal afirmação é realizada com base em estudos do direito alienígena. Todavia, prevalece no entendimento de nosso Poder Judiciário que compete às companhias seguradoras a prova da voluntariedade do ato do suicídio para se livrar do pagamento da indenização. Para elucidar tal questão apresentamos os seguintes julgados: EMENTA: AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA. SUICÍDIO. VOLUNTARIEDADE. AUSÊNCIA DE PROVA. ÔNUS DA SEGURADORA. EQUIPARAÇÃO COM MORTE ACIDENTAL. PAGAMENTO DEVIDO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. Há de se observar a distinção entre suicídio voluntário premeditado e o involuntário. Aquele é caracterizado pela real e consciente intenção do segurado de se matar, agindo pela torpe intenção de, ilicitamente, enriquecer os beneficiários. No segundo, é o suicídio provocado pelo segurado que não se acha no gozo perfeito de sua saúde mental. Sendo a conservação da vida um ato natural e até mesmo instintivo, presume-se, até prova em contrário, que o suicídio se deu pela perda da razão, pelo menos momentânea. Somente o suicídio voluntário exime a seguradora da obrigação de indenizar, pois o involuntário é equiparado à morte 39 acidental. Todavia a prova de que o segurado agiu voluntariamente, de forma premeditada, é da seguradora. Na esteira do posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, inexistindo provas de ter sido o suicídio premeditado, não prevalecerá a cláusula contratual que exclui o suicídio dos riscos cobertos pelo contrato de seguro. Tratando-se de caso de suicídio involuntário, infere-se que resta estabelecida a obrigatoriedade do pagamento da indenização.(Ap n° 1.0702.02.023975-3/001 – 16.º Câmara Cível – Tribunal de Justiça de Minas Gerais - Relator: Exmo. Sr. Des. Sebastião Pereira De Souza DJ 10/09/08 – DO 24/10/08) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE ACIDENTES PESSOAIS. SUICÍDIO. DEVER DE COBERTURA. AUSENCIA DE VOLUNTARIEDADE E PREMEDITAÇÃO. INTELIGENCIA DA SUMULA 61 DO STJ E SUMULA 105 DO STF. PRECEDENTES DESTA CORTE E TRIBUNAIS SUPERIORES. Não tendo, a seguradora, produzido prova da voluntariedade e premeditação do suicídio, presume-se este involuntário, enquadrando-se no conceito de morte acidental e estando coberto pelo seguro de acidentes pessoais. Inoperância de cláusula restritiva. Inteligência do art. 1440, do Código Civil de 1916. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70014604540, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Artur Arnildo Ludwig, DJ 14/06/2007 DO 23/07/07) Portanto, afirmamos que é lógico e coerente a jurisprudência pátria neste sentido É tão forte o instinto de viver que jamais poderíamos imaginar que alguém se suicide em um estado perfeito de juízo, e concluímos que o ônus probatório da voluntariedade pertence a quem pretende prova-lo. 9.3 - O suicídio no seguro de vida e súmula 105 do Egrégio Supremo Tribunal Federal As companhias seguradoras passaram a figurar em posição jurídica delicada por ocasião do Código Civil Brasileiro de 1916, haja vista que simples alegação de suicídio já não bastava para a exoneração da obrigação de indenizar, pois tinham que provar que o suicídio se deu de forma premeditada ou voluntária. Assim as companhias seguradoras tentaram em vão uma forma de fugir de tais responsabilidades A prova da premeditação do suicídio é tarefa árdua e desgastante, tanto para a companhia seguradora como para o beneficiário e sua família. O contrato de seguro sempre trouxe, às companhias seguradoras, liberdade para particularizar e dar cobertura aos riscos que quisessem. Logo, pensando não ser obrigadas a dar cobertura a riscos indesejados as companhias seguradoras passaram a incluir nas apólices de seguro de vida cláusulas que excluíam a cobertura do suicídio, mesmo que involuntário, dentro de determinado temporal, criando-se nos seguros de vida o chamado prazo de carência. lapso 40 Tal prática foi uma forma de as companhias seguradoras se eximirem do pagamento do suicídio não premeditado na medida em que ocorrido dentro do prazo de carência, o suicídio não premeditado não seria pago eis que vedado em lei. Porém, o Egrégio Superior Tribunal Federal passou a vedar essa possibilidade editando a súmula 105, viabilizada na sessão de 13/12/1963 es publicada somente em 05/05/1964, com a seguinte redação “salvo se tiver havido premeditação, o suicídio do segurado no período contratual de carência não exime o segurador do pagamento do seguro” Os recursos extraordinários de números 14.991 e 50.389 foram uma das referencias à edição da súmula porque consideraram que a limitação da particularização dos riscos, por meio de cláusula que impõe carência em caso de ocorrência de suicídio não premeditado, é ilegal, isso porque o artigo 1440 e parágrafo único do Código Civil de 1916 o equipararam a morte involuntária. Assim não seria possível que uma cláusula contratual ferisse preceito legal, de modo que a redação da súmula teve o intuito de informar que, independentemente da inserção de um prazo de carência nas apólices visando objetivar a exclusão de cobertura do suicídio não premeditado, o pagamento da indenização seria devido. 9.4 – Do suicídio no seguro de vida e a súmula 61 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça De forma mais recente, em relação à súmula n.º 105 do Supremo Tribunal Federal publicada no ano de 1963, o Superior Tribunal de Justiça em 12/10/1992 publicou a súmula n.º 61 que em sua redação disse que “o seguro de vida cobre o suicídio não premeditado”. Levando-se em conta que a súmula do STF já abarcava a informação da cobertura do suicídio não premeditado no seguro de vida muitos viram como desnecessária a edição da súmula por parte do STJ. Todavia, apesar da discussão sobre o assunto ter se iniciado com a vigência do Código Civil Brasileiro de 1916 os Tribunais ainda viviam povoados de ações discutindo o mesmo assunto, na verdade o grande número de demandar levadas ao crivo do Poder Judiciário ainda ocorria por intransigência das seguradoras que insistiam em negar o pagamento da indenização em situações de suicídio não premeditado. 41 Esse caráter procrastinatório das discussões sobre assunto já pacificado fez com que o STJ editasse nova súmula como forma de exaurir a definição sobre o assunto e impedir que novos Recursos Especiais versando sobre o mesmo assunto lhe sejam remetidos para julgamento. 42 10 DO PROJETO DO CÓDIGO DAS OBRIGAÇOES DE 1965 Ë importante citar como o suicídio, em relação ao contrato de seguro de vida, foi disposto no projeto do Código Brasileiro das Obrigações de 1965, isso porque, ele foi utilizado como base para boa parte dos artigos relacionados ao seguro, ajudando portanto, uma melhor compreensão da matéria nos dias atuais. O projeto do Código das Obrigações de 1965 reuniu diversas figuras notórias do direito, tais como, Orlando Gomes e Caio Mario da Silva Pereira, e, nesta ocasião, já se notava a necessidade de uma solução harmônica da relação entre o suicídio e o seguro de vida. Assim, por recomendação de Caio Mario da Silva Pereira o artigo 748 do projeto previa que o segurador poderia recusar o pagamento do seguro de vida se a morte resultasse de suicídio premeditado, porém, se decorridos dois anos da celebração do contrato, o suicídio independente da causa, não obstaria o pagamento. Deste modo, seria introduzido um prazo de carência de 2(dois) anos para tornar incontestável o pagamento da soma segurada, qualquer que fosse a sua causa. Alvim(2007, p.187) comenta com propriedade, que com a possibilidade do pagamento do seguro de vida, mesmo em caso de suicídio premeditado, esse deixaria de ser uma questão de ordem pública, isso porque, estaria se legitimando e incentivando a prática do suicídio em detrimento dos princípios específicos do seguro, como, boa fé, risco e mutualidade. Porém os legisladores da época entenderam que aquele prazo de 2(dois) anos seria suficiente para afastar a discussão de premeditação ou não e o seguro não poderia mais ser encarado como fator de indução ao suicídio, ninguém faz planos de um suicídio dentro desse extenso lapso temporal. Todavia, o projeto jamais foi levado a votação e somente com o advento do Código Civil Brasileiro de 2002 é que houve alteração do preceituado no artigo 1440 do Código Civil Brasileiro de 1916. 43 11 O CÓDIGO CÍVIL BRASILEIRO DE 2002 E O PAGAMENTO DA INDENIZAÇAO NO SEGURO DE VIDA EM CASO DE SUICÍDIO Frustrada a edição do Código das Obrigações de 1965, as mudanças necessárias. Pertinentes ao tema tratado, somente puderam ser implementadas com o advento do Código Civil Brasileiro de 2002 e, assim, em seu artigo 798 estabeleceu : Art. 798. O beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso, observado o disposto no parágrafo único do artigo antecedente. Parágrafo único. Ressalvada a hipótese prevista neste artigo, é nula a cláusula contratual que exclui o pagamento do capital por suicídio do segurado. Porém, o que deveria ser uma solução harmônica tornou-se alvo de nova discussão a respeito da forma de interpretação do referido artigo, pois, como se nota, o artigo não trouxe as expressões “voluntariedade”, “premeditação”, ou “involuntariedade” ou não premeditação. Deste modo, o que seria a solução mansa e pacífica do tema tratado, se tornou na verdade, um amaranhado de teses sobre o seu modo de interpretação. A dificuldade sobre um consenso envolve nomes importantes da doutrinas, e, fruto disso, a jurisprudência pátria não é uniforme sobre o tema. A discussão reside no modo de interpretação do artigo, há duas correntes que divergem sobre o que o legislador pretendeu com a redação do artigo. Uma defende a interpretação literal ou gramatical do artigo, e assim diz que o sentido do artigo se encontra na própria letra da lei. A outra corrente defende a interpretação sistemática ou analítica do artigo de lei, e, assim, diz que o artigo deve ser interpretado com base no sistema jurídico onde ele se encontra inserido. 11.1 – Da corrente doutrinária que defende a interpretação literal do artigo 798 do Código Civil Brasileiro. 44 A dúvida sobre o artigo 798 do Código Civil Brasileiro reside na sua forma de interpretação e para extrairmos o melhor da norma é necessário que se busquemos um meio de interpretação que traduza a vontade do legislador. A corrente que defende a interpretação literal ou gramatical do artigo 798 do Código Civil entende que o legislador afastou do direito a figura do suicídio premeditado ou não premeditado e, assim, relata ter sido adotada um critério objetivo de definição sobre o direito a indenização do seguro de vida em caso de suicídio. Diz-se que com a nova redação do dispositivo legal, o critério a ser observado é o do lapso temporal de 2(dois) anos, entendendo tal corente que de forma proposital foi excluída a questão de voluntariedade com o intuito de dar segurança jurídica nas relações entre companhias seguradoras e segurados. Portanto a interpretação seria no sentido de que, se o suicídio ocorresse nos dois primeiros anos de vigência do contrato, independentemente de sua causa, não haveria direito do beneficiário em receber a indenização. Todavia, se o suicídio ocorrer após os dois anos iniciais de vigência do contrato ou de sua recondução, o beneficiário teria direito de receber a indenização pactuada em apólice até mesmo se o suicídio ocorrer de forma voluntária. Com base no parágrafo único do artigo 798 do Código temos então que se o suicídio ocorrer, após dois anos de vigência ou da recondução do contrato de seguro, nem mesmo uma cláusula contratual será capaz de afastar o direito ao recebimento da indenização prevista na apólice securitária. Essa corrente doutrinária defende que o Código Civil Brasileiro de 2002 seguiu o Código Civil Italiano que dispõe que a indenização pela morte do segurado não será paga se o segurado se suicidar nos dois primeiros anos de vigência do contrato, independente da causa. Segundo esses doutrinadores, o direito Italiano adotou esse prazo de dois anos sem a cobertura do sinistro por suicídio na forma de “spatio deliberandi”, entendido como sendo o prazo onde o seguro não realizada a cobertura com o intuito de resguardar a aleatoriedade do contrato em caso de suicídio proposital. Portanto, trata-se de típica interpretação gramatical da norma, pois não se extrai nada do artigo que não a letra da lei. Defendem tal interpretação Ernesto Tzirulnik, Flávio Cavalcanti e Ayrton Pimentel citam que: 45 A norma [art. 798] veio com o objetivo de pôr fim ao debate, estabelecendo o critério da carência de dois anos para a garantia de suicídio. O critério é objetivo: se o suicídio ocorrer nos primeiros dois anos, não terá cobertura; se sobrevier após este período, nem mesmo por expressa exclusão contratual poderá a seguradora eximir-se do pagamento. Não se discute mais se houve ou não premeditação, se foi ou não voluntário. Justifica-se este lapso temporal pelo fato de que é inimaginável que alguém celebre contrato de seguro 'premeditando' o suicídio para dois anos à frente. Ressalte-se, ainda, que a norma do dispositivo comentado é imperativa e obriga tanto a seguradora como o segurado e seus beneficiários( TZIRULNIK; CAVALCANTI; PIMENTEL, 2003, p.188). Sobre o assunto debatido, Pedro Alvim segue essa corrente afirmando que “ infere-se da sua leitura que o suicídio, seja premeditado ou não, esteja o segurado em seu juízo perfeito ou sob forte emoção, não terá cobertura do seguro, se ocorrer no período de carência de dois anos”(ALVIM, 2007, p.188). Para Venosa (2003, p.399) o legislador teve como precípua intenção, resolver de forma prática e objetiva a ocorrência do suicídio no do seguro de vida, assim não haverá pagamento da indenização se o suicídio ocorrer nos dois primeiros anos de vigência do contrato, logo acredita que não há que se falar em sobre premeditação com o advento do Código Civil Brasileiro de 2002.. E seguindo o rol de doutrinadores que defendem a existência da substituição do fator premeditação pela questão temporal está Rodrigues Netto, cujo entendimento segue colacionado a seguir: Ao se adotar um lapso temporal dentro do qual não há direito ao capital segurado quando sucede o evento morte por suicídio, e ultrapassado este período, ficam afastadas todas e quaisquer defesas do segurador para se evadir da prestação devida, o código suprime conjecturas subjetivas relativas ao direito, ou não, ao percebimento da soma da apólice. Há um critério objetivo, cuja prova de sua ocorrência se dá da data da celebração do contrato de seguro ou, se este tiver sido suspenso, da data de sua recondução. (RODRIGUES NETTO, 2004. p. 413) Conforme leciona o doutrinador acima citado, não há que se falar em elementos subjetivos do suicídio, o animus do segurado, quando do suicídio, não deve mais ser levado em consideração, devendo-se tão somente observar o cumprimento do lapso temporal ajustado em lei, para que exista o dever de indenizar. 46 11.1.2 – Dos julgados defendendo a interpretação literal do artigo 798 do Código Civil Brasileiro Alguns se nosso Tribunais vem decidindo de forma reiterada no sentido de que o artigo 798 do Código Civil deve ser interpretado de forma literal,ou seja, se o suicídio ocorrer nos 2(dois) primeiros anos de vigência do contrato não há que se verificar premeditação ou não e que não haverá direito a indenização O Tribunal de Justiça de São Paulo segue essa linha como podemos constar abaixo: SEGURO DE VIDA E ACIDENTES PESSOAIS COBERTURA SUICÍDIO Evento ocorrido nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato Presunção de premeditação Art. 798 do novo Código Civil Indenização securitária incabível Recurso improvido (TJ/SP - Apelação Cível n. 1.096.405-0/3 Paraguaçu Paulista 26ª Câmara de Direito Privado Relator: Vianna Cotrim DJ 04.06.07. DO 18/06/07) Da análise percebe-se que é exposto posicionamento literal e inflexível a respeito do artigo 798 do Código Civil Brasileiro, como vemos o julgador afirmou que o suicídio ocorrido nos 2(dois) primeiros anos de vigência do contrato é premeditado por presunção. O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, mesmo que em julgado que não representa o entendimento maior desta corte, explica que o artigo 798 é claro e taxativo e, assim não há que se falar em premeditação, ou não, se o suicídio ocorre nos dois primeiros anos de vigência do contrato. Vejamos o julgado: APELACAO CIVEL. RECURSO ADESIVO. ACAO ORDINARIA DE COBRANCA. SEGURO DE VIDA. SUICIDIO. 1 - o artigo 798, do codigo civil de 2002, inovou ao regular o direito do beneficiário do seguro de vida em caso de suicídio, estabelecendo um limite temporal de dois anos como condição para o pagamento do valor segurado, independente de o suicídio ter sido premeditado ou não. assim, a norma e cogente e o prazo de carência de dois anos e taxativo, não cabendo mais discussão quanto a ocorrência de premeditação do ato. 2 - nas causas em que não hà condenação, o julgador monocrático deve fixar a verba honorária com observância no art. 20, parágrafo quarto, do CPC, ou seja, valer-se de uma apreciação eqüitativa do contexto fático apresentado, considerando o grau de zelo do advogado, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo mesmo e o tempo exigido para o seu serviço. 3 - apelo e recurso adesivo conhecidos e improvidos.(Apelação Cível nº. 88598-4/188 3ª C. Cível do TJ/GO, Relator Nelmar Branco Ferreira Perilo- DJ: 13/12/2005 do 03/01/06) 47 Via de conseqüência, percebe-se que ambos os Tribunais entenderam pelo não pagamento do seguro de vida quando o suicídio ocorre nos dois primeiros anos de vigência do contrato temos que os motivos explicitados são diferentes. O Tribunal de Justiça de São Paulo fala em presunção de premeditação, se o suicídio ocorreu nos dois primeiros anos de vigência do contrato de seguro de vida. Se existe presunção de premeditação no biênio inicial do contrato, tal presunção é relativa ou júris tantum, admitindo prova em contrário. Contudo, com base nesse entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo não é possível afirmar que a análise de premeditação ou não do suicídio fora excluída do novo Código Civil. Da afirmação de presunção relativa de premeditação do suicídio se extrai que o ônus probatório contrário pertence ao beneficiário do segurado que se suicidou. Tal colocação coloca a seguradora em extrema vantagem eis que basta se manter inerte para não pagar a indenização. Ao contrário, o beneficiário terá de produzir prova de que o segurado não se suicidou de má fé, sendo tal ônus muito mais trabalhoso. Ao seu turno, o Egrégio Tribunal de Justiça de Goiás segue a linha de um critério objetivo, ou seja, de que não se deve mais analisar a premeditação, e assim, a ocorrência do suicídio nos dois primeiros de vigência do contrato não dá direito a indenização. Tal entendimento não decorre da presunção de suicídio premeditado nos dois primeiros anos de vigência do contrato e, sim, de um critério extremamente objetivo, o pagamento não é realizado pelo simples fato do suicídio ter ocorrido no chamado spatio deliberandi. Na ementa transcrita, mesmo que de forma implícita, Tribunal de Justiça de Goiás, deixa claro sua posição de que a verificação de voluntariedade ou involuntariedade do suicídio foi excluída do Código Civil Brasileiro de 2002. 11.2 - Da corrente doutrinária de interpretação sistemática do artigo 798 do Código Civil Brasileiro. 48 Ao contrário dos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais expostos nos tópicos acima existe outra corrente de interpretação do artigo 798 do Código Civil de 2002 como poderemos ver nos parágrafos abaixo. Esta corrente doutrinária defende a interpretação sistemática do artigo 798 do Código Civil Brasileiro, pregando que o novo Código Civil não trouxe critério objetivo para dirimir conflitos referentes ao suicídio de segurado, devendo a análise de premeditação do suicídio continuar a ser observada no que tange ao prazo inicial de dois anos de vigência do contrato. Deste modo, tal corrente se posiciona no sentido de que, após dois anos de vigência do contrato existirá uma presunção de que o suicídio não foi premeditado, ao contrário, se o suicídio ocorrer nos dois primeiros anos de vigência do contrato a indenização somente não será paga ao beneficiário se o suicídio for premeditado. Essa corrente defende que o legislador pretendeu afastar, ou pormenorizar, a discussão de premeditação ou não do suicídio do segurado, após o prazo de dois anos da vigência do contrato e não, para os dois anos iniciais do contrato. Se diz que o legislador pensou que o prazo de dois anos seria suficiente para que houvesse presunção de não premeditação do suicídio. Logo, após o lapso temporal de dois anos da celebração do contrato, haverá presunção de não premeditação em caso de suicídio, ao contrário, se o suicídio ocorrer nos dois anos iniciais haverá a imperiosa necessidade da prova da premeditação do suicídio. Defende essa corrente que o dispositivo estudado teria sido editado com a intenção de evitar a fraude no contrato de seguro, ou seja, o legislador teria considerado que ninguém poderia contratar um seguro de vida pensando em se suicidar depois de dois anos, assim seria evitado que pessoas contratassem seguro de vida pensando em se suicidar, afastando oportunistas e propiciando mais segurança jurídica aos Tribunais, pois em situações de suicídio ocorridos após o lapso temporal descrito na norma haveria uma presunção quase absoluta de não premeditação. É sabido que tal entendimento, inicialmente, repousa na legislação Francesa. Alvim (2007, p.188) menciona que o Código Civil Francês previa que toda apólice contendo uma cláusula pelo qual o segurador se obriga a pagar a soma segurada, mesmo em casos de suicídio voluntário e consciente do segurado, não pode produzir efeitos senão depois de um prazo de dois anos após a celebração do contrato. 49 Notamos que a legislação da França estipula que nos seguros de vida somente o suicídio voluntário e consciente tem a cobertura afastada nos 2(dois) primeiros anos de vigência do contrato e, assim, a corrente mais favorável ao segurado entende que nosso legislador seguiu o exemplo francês. Neste sentido Caio Mário expôs sua tese a respeito do artigo remetendo a análise, entre outros, a um fatos histórico: O Código de 2002 deu tratamento inusitado às hipóteses de suicídio. Em seu art. 798 determinou que o beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros 2 (dois) anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso. Esta regra deve ser interpretada no sentido de que após 2 anos da contratação do seguro presume-se que o suicídio não foi premeditado. Se o suicídio ocorrer menos de 2 anos após a contratação do seguro caberá à seguradora demonstrar que o segurado assim fez exclusivamente para obter em favor de terceiro o pagamento da indenização. Essa prova da premeditação é imprescindível, sob pena de o segurador obter enriquecimento sem causa, diante das pesquisas da ciência no campo da medicina envolvendo a patologia da depressão. Essa tinha sido a solução sugerida por mim no Código das Obrigações, e adotada no Código de 2002.( PEREIRA, 2003, p.291) O, festejado professor Caio Mario, ao dispor sobre o assunto mostra a convicção de quem participou da discussão sobre uma solução para o assunto por ocasião do Projeto do Código das Obrigações de 1965, fala até mesmo que a redação do artigo em questão fora por ele sugerida. Ainda sobre o assunto o doutrinador fala que se o suicídio ocorrer nos dois primeiros anos de vigência do contrato cabe a seguradora demonstrar a premeditação, assim ainda imputa as seguradoras o ônus probatório da premeditação do suicídio consagrando assim entre outros o princípio da boa fé presumida. E sabendo que o estudo do direito é ilimitado, Carlos Roberto assevera que o artigo 798 do Código Civil Brasileiro veio em direção realmente da doutrina italiana e não, da francesa, apresentando porém solução dentro da análise sistemática do dispositivo: "O dispositivo em apreço. ao introduzir lapso temporal no efeito da cobertura securitária em caso de suicídio do segurado, recepciona, como preleciona Jones Figueirêdo Alves, a doutrina italiana, onde o prazo de carência especial é referido como spatio deliberandi. Esse prazo de inseguração protege o caráter aleatório do contrato, diante de eventual propósito de o segurado suicidar-se. Assim, depois de passados dois anos da celebração do contrato, se vier o segurado a suicidar-se, poderá o beneficiário, independentemente de qualquer comprovação quanto à voluntariedade, ou não, do ato suicida praticado, reclamar a obrigação. Observa o ilustre autor pernambucano citado que o preceito veio em abono à pessoa do beneficiário, em detrimento das companhias 50 seguradoras, que, amiúde, se valiam de eventuais suicídios para se desonerarem da obrigação, ao argumento de que teria sido premeditado o evento. A nova regra deve ser interpretada, portanto, no sentido de que, após dois anos da contratação do seguro, presume-se que o suicídio não foi premeditado. Se este ocorrer antes da consumação do referido prazo caberá à seguradora demonstrar que o segurado assim agiu exclusivamente para obter em favor de terceiro o pagamento da indenização.(GONÇALVES, 2006, p. 467) Carlos Roberto defende a tese de que o artigo visou beneficiar os segurados e não, as companhias seguradoras uma vez que, após dois anos de vigência do contrato existe a presunção de que o suicídio não foi premeditado. Porém nos dois anos iniciais de vigência a indenização somente não será paga se a companhia seguradora demonstrar que existiu premeditação no suicídio. E completa dizendo que o artigo visou diretamente dirimir conflitos que porventura viessem a existir após dois anos de vigência do contrato, diferentemente da outra corrente que fala de critério objetivo em relação aos dois primeiros anos de vigência contratual. Seguindo com o rol de grandes doutrinadores da área de Direito Civil que seguem essa corrente, Diniz fala que “o beneficiário não poderá reclamar que o segurador pague a quantia avençada se o segurado vier a falecer de morte voluntária nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato”( DINIZ, 2005, p.534). Maria Helena Diniz não discorre de forma ampla sobre o assunto, porém fica bastante clara a sua posição de que o não pagamento da indenização ao beneficiário somente ocorrerá em caso de suicídio voluntário ocorrido nos dois primeiros anos de vigência do contrato de seguro de vida. Esta corrente doutrinária possui uma visão mais ampla quando da análise do artigo 798 do Código Civil Brasileiro, existe até um ponto de divergência sobre a regra a ser aplicada quando o suicídio ocorrer no biênio subseqüente de formação do contrato. Uns dizem que o valor deve ser pago independente de avaliação de premeditação, outros que, existe a presunção de não premeditação e, assim, poderia a seguradora provar a premeditação para não pagar a indenização. Todavia, todos concordam que o suicídio ocorrido nos dois primeiros anos de formação do contrato não irá ser indenizado, salvo se existir premeditação do suicídio, e o ônus probatório da premeditação do suicídio pertence as companhias seguradoras. 51 10.2.1 – Dos julgados referentes à interpretação sistemática do artigo 798 do Código Civil Brasileiro. Notamos, ainda que, a insegurança jurídica sobre o tema paira no ar, pois muitos Tribunais de Justiça de nosso país vem adotando a corrente que defende uma interpretação sistemática do artigo 798 do Código Civil, dentre eles o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande :. SEGURO. SUICÍDIO. ART. 798 DO CC/2002. O prazo de vigência inicial (2 anos), não deve ser analisado isoladamente, mas em conjunto com as demais circunstâncias que envolveram o caso, uma vez que seu objetivo não é a simples ultrapassagem de um lapso temporal, mas sim impedir a premeditação do suicídio para fins de recebimento de indenização. Ainda que ocorrido no prazo de carência estatuído no art. 798 do CC/2002, o suicídio não pode ser excluído do contrato de seguro, salvo se comprovada a premeditação Segundo o mencionado dispositivo, se o suicídio ocorre nos primeiros dois anos do contrato, a indenização não é devida. Sob este prisma, a beneficiária não teria direito a recebê-la, tendo em vista que seu esposo suicidou-se dias antes do contrato completar os dois anos exigidos. Todavia, o julgador deve utilizar, sempre que possível, uma interpretação mais ampla da norma, não se atendo ao seu sentido literal. Deve, assim, investigar sua finalidade e alcance, buscando o real objetivo do legislador. Dito isto, analisando o aludido dispositivo dentro do universo jurídico, depreende-se que seu objetivo é evitar fraude nos contratos de seguro, ou seja, evitar que a contratação seja firmada com o único propósito do segurado ceifar a própria vida, de forma premeditada, para obter em favor de terceiro o pagamento da indenização. Sob esta ótica, o legislador entendeu que o prazo de dois anos seria suficiente para presumir que não houve premeditação do suicídio. Assim, ultrapassados os dois anos, presume-se que o suicídio não foi premeditado, mas o contrário não ocorre, isto é, se o fato aconteceu antes deste período, haverá a necessidade da prova da premeditação. Noutras palavras, o mencionado prazo não deve ser analisado isoladamente, mas em conjunto com as demais circunstâncias que envolveram o caso, uma vez que seu objetivo não é a simples ultrapassagem de um lapso temporal, mas sim impedir a premeditação do suicídio para fins de recebimento de indenização.(TJ/RN –Apelação Cível n. 2008.012514-8, desprovido, Relator: Des. Amaury Moura Sobrinho Julgamento: 19.03.2009. DJ 20/03/2009) Da análise do acórdão em questão, percebemos que sua fundamentação repousa na doutrina da corrente sistemática de interpretação do artigo 798 do Código Civil Brasileiro, pois o julgador fala da análise do dispositivo legal de forma ampla e dentro de nosso universo jurídico, e não, de forma isolada. Quando fala de análise ampla do artigo incluem-se os preceitos contidos no Código de Defesa do Consumidor como a boa fé objetiva das partes contratantes, posteriormente introduzido no próprio Código Civil Brasileiro. 52 Na mesma linha de interpretação, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná prolatou a seguinte decisão: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE SEGURO DE VIDA. TÍTULO E XECUTIVO. EXIGIBILIDADE. SUICÍDIO. PRAZO DE CARÊNCIA. ARTIGO 798 DO CÓDIGO CIVIL. PREMEDITAÇÃO. PROVA INEXISTENTE. COBERTURA DEVIDA. EXCESSO DE EXECUÇÃO. JUROS. TERMO INICIAL. OBRIGAÇÃO POSITIVA E LÍQUIDA. APELO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. O contrato de seguro de vida é título executivo extrajudicial e é exigível a partir da ocorrência do sinistro. Nulidade inexistente. No caso de suicídio, somente é indevida a cobertura se ficar demonstrada a premeditação do ato e se este ocorrer até dois anos depois da contratação do seguro. É da seguradora o ônus de demonstrar que o ato foi premeditado, pois a regra do artigo 798 do Código Civil não autoriza presunção nesse sentido, sob pena de desprezo à realidade. Em se tratando de obrigação positiva e líquida, os juros moratórios incidem a partir do respectivo vencimento. Inteligência do artigo 397 do Código Civil. Ausente demonstração do prazo estipulado para a liquidação do sinistro, adota-se a data da recusa como início da mora. Procedência parcial dos embargos( TJ/PR Apelação Cível n.º 390187-5 – Relator Vitor Roberto Silva –Julgamento 12/07/07 – DO 7416) O julgado acima transcrito toca em num ponto interessante da matéria quando diz que o artigo 798 do Código Civil Brasileiro não tem o condão de presumir premeditação do suicídio nos dois anos subseqüentes a formação do contrato de seguro de vida. Ora, o julgador pretendeu informar que, caso sigamos o sentido literal do artigo estaríamos presumindo premeditação do suicídio somente pelo fato dele ter ocorrido dentro do lapso de tempo existente na norma, e assim, a análise estaria em confronto com o princípio da boa fé que sempre foi consagrado em nosso direito Quando diz que a presunção de premeditação do suicídio do segurado seria um desprezo à realidade o julgador assevera que a disposição proposital da própria vida jamais pode ser presumida em um dispositivo de lei, o suicídio, por sua violência, deve ser sempre provado quando consistir uma causa impeditiva ou extintiva de algum direito. O Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, sempre marcado por suas decisões inovadoras, também vem seguindo o entendimento mais favorável aos segurados, senão vejamos: APELAÇÃO CÍVEL. INÉPCIA DO RECURSO AFASTADA. SEGURO DE VIDA. SUICÍDIO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 798 DO NOVO CÓDIGO CIVIL. Apelação que satisfaz as exigências do art. 514 do CPC. Segundo a redação do artigo 798 do novo Código Civil, o beneficiário não fará jus à cobertura securitária se o suicídio for praticado, pelo segurado, nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato e ficar demonstrado que o ato foi premeditado. Ausente a prova de premeditação, o pagamento do capital segurado é medida que se impõe. Preliminar de inépcia do apelo afastada, à unanimidade. Apelo provido, por maioria. (TJ/RS Apelação 53 Cível nº. 70019265529, Quinta Câmara Cível, rel. Umberto Guaspari Sudbrack. DJ 19/06/07. DO 20/06/07) Neste, restou entendido o direito do beneficiário de auferir a indenização do seguro de vida no caso de suicídio não premeditado ocorrido no primeiro biênio subseqüente à formação do contrato de seguro. Porém, caso a seguradora constate a ocorrência de suicídio premeditado deve fazer prova de tanto, eis que se trataria de fato impeditivo que atrais o ônus probatório para quem o alega. Após a exposição das correntes divergentes sobre o tema proposto, cabe a nos ressaltar que nenhuma ação discutindo o direito ou não a indenização de seguro de vida em caso de segurado que se suicidou no biênio subseqüente a formação do contrato, após a vigência do artigo 798 do Código Civil Brasileiro, já foi analisado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça ou mesmo pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal. Sabemos que o primeiro caso que entrou na pauta para votação foi o Recurso Especial de número 959721, esse que visava a reforma do julgado ora transcrito, prolatado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e que como vimos adotou a tese da interpretação sistemática do artigo. O Recurso Especial foi distribuído para a segunda seção do Superior Tribunal de Justiça sendo que a relatoria ficou a cargo da Ministra Nancy Andrighi. Em seu relatório e conseqüente voto, a Ministra Andrighi consignou que a lei não inovou em detrimento da boa fé e dos contratantes, afirmou que ao contrário, limitou o prazo das discussões a respeito sobre a premeditação nos dois anos seguintes a formação do contrato de seguro de vida. A Ministra asseverou que as seguradoras sempre trouxeram a baila a discussões sobre a premeditação, mesmo em casos onde o contrato de seguro de vida já havia sido contratado há muito tempo, assim a norma teve o intuito de eliminar essa discussão sobre a premeditação de suicídio, ocorrido em contratos celebrados há mais de dois anos, eis que esse prazo é suficiente para elidir qualquer dúvida a respeito da premeditação. Andrighi ainda indicou que sequer conheceria do recurso uma vez que nele não existe qualquer discussão a respeito de premeditação, esta que em sua opinião, seria a única hipótese em que o recurso poderia ser analisado. 54 Porém, após o relatório a seguradora recorrente desistiu do Recurso Especial e assim ainda não temos nenhuma decisão superior sobre o tema. Portanto, com base no relatório de Andrighi tem-se a impressão que a primeira decisão do Superior Tribunal de Justiça defenderia a interpretação sistemática do artigo, todavia com a desistência do julgamento do recurso especial a incerteza jurídica ainda resiste sobre o tema proposto. 55 CONCLUSÃO Com tudo o que foi exposto se pôde perceber que o tema objeto do trabalho possui extrema relevância no mundo jurídico. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência, tem se manifestado de forma antagônica sobre o modo de interpretação do artigo 798 do Código Civil Brasileiro. O Código Civil Brasileiro procurou sim evitar confusões e novas discussões sobre a ocorrência do suicídio no seguro de vida, todavia, o legislador não logrou êxito ao dar redação confusa para o artigo 798 do Código Civil Brasileiro. A defesa da corrente de interpretação gramatical ou literal do discutido artigo é sem dúvida a mais adequada ao interesse das companhias seguradoras e, deste modo, muitos doutrinadores consultados para a elaboração do trabalho e que defendem essa corrente pertencem a entidades ligadas às companhias seguradoras. Já a interpretação sistemática ou analítica do artigo 798 do Código Civil Brasileiro é sem dúvida a mais adequada aos interesses dos consumidores, sejam beneficiários ou segurados. Com os estudos pude concluir ser mais correta a interpretação sistemática do artigo 798 do Código Civil Brasileiro de 2002. O Código Civil Brasileiro de 2002 não criou um novo Direito e sim aperfeiçoou aquilo que havia ficado obsoleto no Código Civil de 1916, assim, para a extração correta da vontade do legislador devemos analisar o artigo de forma mais ampla. Em primeiro plano, em nosso direito a boa fé das partes sempre foi presumida, logo, não se coaduna com sistema jurídico pátrio a interpretação de que o suicídio cometido nos dois primeiros anos de vigência do contrato é presumido com premeditado. O legislador jamais quis dar essa interpretação ao artigo em discussão. A sua interpretação literal com a supremacia do aspecto objetivo temporal traz consigo embutido uma presunção da má fé que é inadmissível e jamais poderia fazer parte de um Código Civil que primou, inclusive, pela boa fé objetiva das partes na formação do contrato.. Em segundo plano, o Código Civil Brasileiro de 2002 veio com o intuito de corrigir os erros e atrasos do Código Civil Brasileiro de 1916. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já possuíam interpretação concisa no sentido de que o suicídio não 56 premeditado em relação ao seguro de vida seria uma espécie de acidente pessoal ocasionado pela ausência de discernimento e desinteligência psíquica. Assim, na letra da lei, quando o legislador disse que não haveria direito ao capital segurado em caso de suicídio nos dois primeiros anos de vigência do contrato, devemos entender que o legislador se referiu ao suicídio propriamente dito, ou seja, cometido com premeditação, eis que, a doutrina e a jurisprudência por ocasião do Código Civil Brasileiro de 1916 qualificaram o suicídio não premeditado tal qual a um “não suicídio”, logo, o não seria lógico o legislador ter buscado na redação do artigo defender uma nova tese sobre o assunto. Na exposição do trabalho, mais precisamente no tópico dez, foi explicitado a forma como o tema foi tratado no projeto do Código das Obrigações Brasileiro de 1965. Boa parte do Projeto do Código das Obrigações de 1965 foi utilizado como base e norte para a elaboração do Código Civil Brasileiro de 2002, no que tange aos contratos em geral, assim não foi diferente em relação a matéria seguro, portanto não há dúvidas que o artigo 798 do Código Civil Brasileiro seguiu a sugestão dada por Caio Mario por ocasião do projeto do Código das Obrigações de 1965. A redação do artigo sugerida por Caio Mario seria a explicação lógica do sentido real do artigo 798 do Código Civil Brasileiro, isso porque fala da recusa do pagamento da indenização do seguro de vida se o suicídio premeditado ocorrer nos dois primeiros anos de vigência do contrato, todavia se o suicídio não for premeditado o pagamento da indenização deve ser realizado. A tese da interpretação sistemática do artigo 798 do Código Civil Brasileiro é baseada em uma pluralidade de argumentos que passam pelos princípios gerais do direito ao histórico da matéria em nosso Direito. Todavia a defesa da interpretação literal ou gramatical do mesmo artigo de lei é realizada com parcos argumentos e se limita a tese que se o legislador quisesse distinguir o suicídio premeditado ou não premeditado teria disposto essas expressões na redação do artigo. A necessidade de uma interpretação mais ampla do novo artigo deu-se por sua confusa redação, assim tenho que a interpretação mais correta é aquela feita em consonância com nosso sistema jurídico, Neste caso até mesmo a busca de um fundamento histórico não deixa de louvar a interpretação sistemática, eis que, somente sabendo a história que antecedeu o artigo é que se pode realizar um enquadramento jurídico mais correto. 57 Porém, tenho que admitir que a matéria é controversa uma vez que doutrinadores importantes e respeitados compactuam com outra análise do artigo. O mesmo se diz do Tribunal de Justiça de São Paulo que uniformemente segue a corrente literal. Assim, hoje, temos uma grande insegurança jurídica sobre o tema, insegurança essa que vem em sentido contrário do que preleciona o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal. Essa incerteza fará com que diversos processos sejam levados ao conhecimento dos Tribunais maiores uma vez que existe o dissenso jurisprudencial necessário ao Recurso Especial, e também a, repercussão geral exigida no Recurso Extraordinário. Portanto, será necessário que esses Tribunais sedimentem jurisprudência e, até sumulem o assunto para que a segurança jurídica volte a pairar sobre as relações envolvendo o seguro de vida. 58 REFERÊNCIAS ALVIM, Pedro. O contrato de seguro. Rio de Janeiro: Forense, 1999) ____________. O seguro e novo Código Civil. 1.º Ed, Rio de Janeiro, 2007 ALVIM, Tereza (Coord.); RODRIGUES NETTO, Nelson et al. Comentários ao Código Civil Brasileiro. Direito das Obrigações..Rio de Janeiro, Forense, 2004.. BATISTA, José Armando da Glória. 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