MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
PROCURADORIA GERAL DO TRABALHO
GABINETE DA SUBPROCURADORA-GERAL DO TRABALHO
IVANA AUXILIADORA MENDONÇA SANTOS
Processo PGT/CCR/PP 9532/2014
Origem:
PRT 4ª Região
Interessado 1:
Sindicato dos Empregados em Empresas de Seguros Privados e
Capitalização e de Agentes Autônomos de Seguros Privados e de
Crédito do Estado do Rio Grande do Sul
Interessado 2:
Fundação de Seguridade Social - GEAP
Assunto:
Anulação do TAC
Procurador(a) Oficiante:
Adriane Perini Artifon
ANULAÇÃO DE TAC. DESCONTO DE
CONTRIBUIÇÃO
ASSISTENCIAL
DE
TRABALHADOR NÃO ASSOCIADO. O
desconto de contribuição assistencial, ou similar,
de trabalhadores não associados ao sindicato, sem
autorização expressa, ofende os princípios da
liberdade de associação e de sindicalização,
insculpidos nos artigos 5º, XX, e 8º, V, da
Constituição Federal, além de contrariar a
jurisprudência da Superior Corte Trabalhista,
consubstanciada no Precedente Normativo nº 119
e na Orientação Jurisprudencial nº 17 da SDC.
VOTO
Trata-se de remessa realizada pela Procuradora do Trabalho Adriane Perini
Artifon, em observância ao art. 14-A da Resolução nº 59/2007, acrescido pela Resolução nº
100/2011, ambas do CSMPT, para deliberação sobre a possibilidade de anulação do Termo de
Ajuste de Conduta de fls. 26, firmado pelo Sindicato dos Empregados em Empresas de
Seguros Privados e Capitalização e de Agentes Autônomos de Seguros Privados e de Crédito
do Estado do Rio Grande do Sul e pela Fundação de Seguridade Social - GEAP, que autoriza
o desconto de contribuição assistencial de todos os integrantes da categoria, mesmo os não
associados aos sindicatos.
Processo PGT/CCR/PP 9532/2014
A Procuradora do Trabalho requerente assim fundamenta o pedido de
anulação:
“Trata-se de procedimento instaurado em 1994 para apuração de
irregularidades identificadas em acordo coletivo firmado entre a GEAP –
Fundação de Seguridade Social e o SINDICATO DOS EMPREGADOS EM
EMPRESAS DE SEGUROS PRIVADOS E CAPITALIZAÇÃO E DE AGENTES
AUTÔNOMOS DE SEGUROS PRIVADOS E DE CRÉDITO DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL no que se refere a instituição de contribuição assistencial.
Em audiência realizada no dia 10 de maio de 1994, os inquiridos
firmaram Termo de Ajuste de Conduta prevendo a seguinte obrigação de não fazer
(fl. 26):
“1. Absterem-se de instituir, a título de Contribuição Assistencial,
cláusula de desconto nos salários dos empregados que não contenha,
expressamente, a possibilidade de oposição por parte dos integrantes
da categoria profissional, manifestada perante a GEAP até 10 (dez)
dias após a sua retenção , sob pena de pagamento de multa no valor
equivalente ao décuplo do valor eventualmente arrecadado, reversível
ao FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador.”
Em 2012, foi apresentada notícia de que o sindicato investigado
instituiu, em convenção coletiva de trabalho, contribuição assistencial obrigatória
também aos não associados à entidade (IC n. 001604.2011.04.000/1 – apenso).
Considerando a informação acima, os presentes autos foram
desarquivados e redistribuídos a esta signatária (fl. 34).
Fiscalizados os últimos dez anos, constatou-se o descumprimento do
TAC nos anos de 2003, 2004, 2005, 2008 e 2009, apurando-se a multa comunitória
no valor de R$ 53.859,70.
Designada audiência com o sindicato (ata fl. 52), foi deferido prazo
para recolhimento do valor. No mesmo ato, diante do entendimento desta
Procuradora de que o direito de oposição não legitima descontos a título de
contribuição assistencial, foi apresentada nova proposta de Termo de Ajuste de
Conduta, com a seguinte redação:
“abster-se de instituir, em acordo ou convenção coletiva de trabalho,
contribuição em favor da entidade sindical a título de taxa para
custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou
fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando não
filiados ao sindicato beneficiado.”
Manifestação do sindicato nas fls. 115 e seguintes, informando que
não concordava em recolher o valor apurado e também não concordava com a
nova proposta de TAC.
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Processo PGT/CCR/PP 9532/2014
2.Fundamentação
A Constituição Federal, em seu artigo 8º, estabelece o direito à livre
associação profissional ou sindical. Em sequência, dispõe que ninguém será
obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato (inciso V). Nada mais do
que a materialização em norma constitucional do direito fundamental do homem à
liberdade associativa sindical, objeto inclusive de norma constitucional da
Organização Internacional do Trabalho (Convenção de nº 87).
Consequentemente, se não é obrigado a se filiar, o trabalhador
também não pode ser obrigado a contribuir para com determinado sindicato.
A esse respeito, a instituição de contribuição assistencial a ser
descontada dos salários de todos os trabalhadores integrantes da categoria,
filiados e não filiados ao sindicato, implica em violação ao princípio da liberdade
sindical.
Nessa linha, o Tribunal Superior do Trabalho – TST, em um primeiro
momento, adotou posição mais liberal, materializada pelo Precedente Normativo
n. 74:
“74 – Desconto assistencial. Subordina-se o desconto assistencial
sindical à não-oposição do trabalhador, manifestada perante a
empresa até 10 dias antes do primeiro pagamento reajustado.” (DJ
08.09.1992 Cancelado – Res. 82/1998, DJ 20.08.1998)
Posteriormente, essa Corte passou a adotar posição mais restritiva.
Com exceção da contribuição sindical propriamente dita, toda e qualquer
contribuição instituída pelos sindicatos, independe da nomenclatura utilizada, só
poderá ser cobrada dos filiados à entidade sindical, não havendo se falar,
inclusive, em direito de oposição. Em substituição ao Precedente Normativo nº 74,
o TST editou o Precedente nº 119:
"A Constituição da República, em seus arts. 5º, XX e 8º, V, assegura o
direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa
modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção
coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor
de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema
confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical
e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não
sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal
restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente
descontados."
A Seção de Dissídios Coletivos do TST, por sua vez editou a
Orientação Jurisprudencial n. 17 no mesmo sentido, enfatizando a nulidade das
cláusulas de convenções e acordos coletivos que estabeleçam quaisquer
contribuições em favor da entidade sindical, a qualquer título, obrigando
trabalhadores não sindicalizados:
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Processo PGT/CCR/PP 9532/2014
CONTRIBUIÇÕES
PARA
ENTIDADES
SINDICAIS.
INCONSTITUCIONALIDADE DE SUA EXTENSÃO A NÃO
ASSOCIADOS. (inserida em 25.05.1998). As cláusulas coletivas que
estabeleçam contribuição em favor de entidade sindical, a qualquer
título, obrigando trabalhadores não sindicalizados, são ofensivas ao
direito de livre associação e sindicalização, constitucionalmente
assegurado, e, portanto, nulas, sendo passíveis de devolução, por via
própria, os respectivos valores eventualmente descontados.
Na mesma esteira á jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a
respeito da matéria, conforme ementa a seguir transcrita:
“Constitucional. Sindicato. Contribuição instituída pela Assembleia
Geral: caráter não tributário. Não compulsoriedade. Empregados
não sindicalizados: Impossibilidade do Desconto. CF, art. 8º, IV.
I – A contribuição confederativa, instituída pela assembléia geral –
CF, art. 8º, IV – distingue-se da contribuição sindical, instituída por
lei, com caráter tributário – CF, art. 149 – assim compulsória. A
primeira é compulsória apenas aos filiados do sindicato.
II – RE não conhecido. (STF, Recurso Extraordinário nº 198.092-3,
São Paulo, Relator Ministro Carlos Velloso, DJ 11/10/96)”
Ressalte-se, também, o teor da Súmula nº 666 do Supremo Tribunal
Federal:
“666 – CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA – ART. 8 º, IV, DA
CONSTITUIÇÃO – FILIADOS – EXIGÊNCIA. A contribuição
confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição, só é exigível
dos filiados ao sindicato respectivo.”
Em observância ao disposto no §1º do artigo 14-A da Resolução nº 69/2007,
foi dada ciência ao Procurador do Trabalho signatário do TAC.
É o relatório.
ADMISSIBILIDADE
O presente feito foi remetido a esta Câmara de Coordenação e Revisão nos
termos do art. 14-A da Resolução CSMPT 69/2007 (incluído pela Resolução CSMPT
100/2011), pelo que conheço do procedimento de anulação de Termo de Ajuste de Conduta,
uma vez que satisfeitos os requisitos de admissibilidade.
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Processo PGT/CCR/PP 9532/2014
VOTO
A i. Procuradora do Trabalho Adriane Perini Artifon decidiu por
encaminhar o feito para anulação do TAC de fls. 26, uma vez que o citado termo autoriza o
desconto de contribuição assistencial de trabalhadores não-associados, ainda que assegurado o
exercício do direito de oposição diretamente na GEAP – Fundação de Seguridade Social.
Pois bem.
Quanto à matéria em debate, como bem observado pela Procuradora do
Trabalho requerente, faz-se necessária a anulação do TAC de fls. 26 diante da negativa das
entidades signatárias em retificar os termos do acordo e em razão do flagrante desrespeito a
preceitos constitucionais, além da evidente dissonância daquele com o entendimento
jurisprudencial acerca do tema firmado pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho.
A corroborar com esse entendimento, os recentes precedentes da Superior
Corte Trabalhista a seguir transcritos:
RECURSO DE REVISTA. 1. CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL. PREVISÃO
DE DESCONTO EM CONVENÇÃO COLETIVA. COBRANÇA REFERENTE A
TRABALHADORES NÃO SINDICALIZADOS. A exigência do pagamento da
contribuição assistencial, ou de outra similar, quanto aos trabalhadores não
associados ao sindicato, ainda que autorizado por assembleia geral, ofende os
princípios da liberdade de associação e de sindicalização, insculpidos nos artigos
5º, XX, e 8º, V, da Constituição da República. Esse é o entendimento desta Corte,
consubstanciado no Precedente Normativo nº 119 e na Orientação Jurisprudencial
nº 17, ambos da SDC. Recurso de revista conhecido e provido, no particular. 2.
CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. O recurso no tema não está fundamentado
adequadamente, à luz do art. 896 da CLT Recurso de revista não conhecido. 3.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA. Tratando a presente ação
de cobrança de contribuições assistenciais e sindicais, aplica-se à hipótese o
disposto no art. 5º da Instrução Normativa nº 27/2005 do TST. Inexiste, pois,
contrariedade às Súmulas nºs 219 e 329 desta Corte, mormente porque aplicáveis
somente às lides empregatícias. Recurso de revista não conhecido. (RR - 56607.2012.5.04.0352, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento:
30/04/2014, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 05/05/2014)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. NULIDADE.
NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. PRECLUSÃO. A reclamada
não opôs embargos de declaração, a fim de suscitar o pronunciamento do TRT
acerca das questões sobre as quais entende omisso o acórdão regional, restando,
portanto, preclusa a oportunidade de discuti-las, o que inviabiliza o exame da
nulidade suscitada, nos termos das Súmulas 184 e 297, II, do TST.
JULGAMENTO EXTRA PETITA. PREQUESTIONAMENTO AUSENTE. As
alegações da recorrente, no tópico, carecem do necessário prequestionamento, a
teor da Súmula 297/TST. DEVOLUÇÃO DOS DESCONTOS À TÍTULO DE
CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA E ASSISTENCIAL PREVISTA EM
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Processo PGT/CCR/PP 9532/2014
NORMA COLETIVA. EMPREGADOS NÃO ASSOCIADOS. AUSÊNCIA DE
AUTORIZAÇÃO ESPECÍFICA. COBRANÇA INDEVIDA. 1. A cobrança de
contribuição assistencial de empregados não associados ao sindicato respectivo
sem autorização expressa dos descontos ofende a liberdade de filiação sindical
prevista no art. 8º, inciso V, da Constituição Federal, bem como a liberdade de
associação prevista no art. 5º, inciso XX, restringindo tais direitos fundamentais.
Nesse sentido são os reiterados julgados da SDI-I desta Casa, bem como o
Precedente Normativo nº 119/SDC e a OJ 17/SDC. 2. Diante da consonância do
acórdão regional com a jurisprudência assente nesta Corte, incidem os óbices do
art. 896, § 4º, da CLT e da Súmula 333/TST, ao conhecimento do recurso.
MULTA CONVENCIONAL. 1. O Tribunal Regional consignou que violada a
cláusula 11, relativa aos descontos autorizados (...), deve a reclamada arcar com o
pagamento da multa prevista na cláusula 58, de f. 130-. 2. Decisão regional em
consonância com a Súmula 384, II, do TST, no sentido de que é aplicável multa
prevista em instrumento normativo (sentença normativa, convenção ou acordo
coletivo) em caso de descumprimento de obrigação prevista em lei, mesmo que a
norma coletiva seja mera repetição de texto legal-. Agravo de instrumento
conhecido e não provido. (AIRR - 200700-75.2009.5.03.0031, Relator Ministro:
Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 23/04/2014, 1ª Turma, Data de
Publicação: DEJT 02/05/2014)
Assim, voto pela anulação do Termo de Ajuste de Conduta de fls. 26, que
versa sobre o desconto de contribuição assistencial de trabalhadores não-associados, ainda
que assegurado o exercício do direito de oposição diretamente na GEAP - Fundação de
Seguridade Social.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, voto pela anulação do Termo de Ajuste de Conduta de fl.
26, que versa sobre o desconto de contribuição assistencial de trabalhadores não-associados,
ainda que assegurado o exercício do direito de oposição diretamente na GEAP - Fundação de
Seguridade Social, nos termos da fundamentação supra.
Retornem os autos à origem para as providências cabíveis.
Brasília, 2 de julho de 2014.
IVANA AUXILIADORA MENDONÇA SANTOS
Subprocuradora-Geral do Trabalho
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Processo PGT/CCR/nº 9532/2014 - Ministério Público do Trabalho