Gabinete Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis
APELAÇÃO CÍVEL Nº 399013-05.2013.8.09.0134 (201393990134)
COMARCA
QUIRINÓPOLIS
APELANTE
INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA DOS SERVIDORES
DO ESTADO DE GOIÁS – IPASGO
APELADA
SILVANE BARBOSA DE CASTRO
RELATORA
Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis
Ementa: Apelação cível. Ação de indenização por dano
material e moral. IPASGO. Negativa de realização de exame pleiteado pela segurada. Plano de saúde pago regularmente, sem qualquer pendência. Incidência CDC. Recusa injustificada, sem respado documental. Dever de indenizar configurado. Apelo a que se nega seguimento,
porque manifestamente improcedente (art. 557, caput,
do CPC).
DECISÃO MONOCRÁTICA
O INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA DOS SERVIDORES
DO ESTADO DE GOIÁS – IPASGO interpõe Apelação Cível da sentença1 proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de
Quirinópolis, Dr. PÉRICLES DI MONTEZUMA, nos autos da ação de indenização por dano material e moral aforada em seu desfavor por SILVANE BARBOSA DE CASTRO, apelada.
O Magistrado a quo, reconhecendo que a requerente
1 Vide fls. 75/80.
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foi lesada ao ter o exame do qual necessitava (lipidiograma) negado
pela autarquia requerida, mesmo sendo titular do plano de saúde regularmente pago, resolveu a lide nos seguintes termos:
“(...) Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos inciais e resolvo o mérito
da demanda nos termos do art. 269, I, do
CPC, para:
CONDENAR o réu ao pagamento de indenização por danos morais em favor da parte
autora, no importe de R$12.000,00 (doze mil
reais), a ser acrescido de correção monetária pelo INPC, desde a data da sentença
(Súmula nº 362, STJ) e de juros moratórios
legais (1% ao mês) desde o evento danoso
(solicitação negada) – Súmula 54, STJ;
CONDENAR o réu ao pagamento de indenização por danos materiais em favor da parte
autora,
no
valor
de
R$65,00
(sessenta
e
cinco reais), conforme despesa comprovada à
fl.19, a ser acrescido de correção monetária pelo INPC, desde a data do desembolso e
juros de mora de 01% (um por cento) ao mês,
desde a citação.
CONDENO o réu ao pagamento dos honorários advocatícios arbitrados em 15% (quinze
por cento) sobre o valor atualizado da condenação,
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nos
termos
do
art.
20,
§3º
do
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Código de Processo Civil. (...)”2
Nas razões recursais3, a apelante rebela-se contra a
sentença exarada, alegando que a recusa de autorização do exame que
pretendia fazer a apelada deu-se por culpa exclusiva da segurada, já
que esta deixou de apresentar os resultados do outro exame realizado
anteriormente, a menos de 90 (noventa) dias.
Sustenta, portanto, que ao negar aludida inspeção,
agiu conforme prevê a comunidade médica mundial, não podendo, por
isso, ser responsabilizada civilmente, sob pena de afronta ao regramento que disciplina as artes médicas e configuração do conhecido brocardo
latim “venire contra factum proprium” (vedação do comportamento contraditório).
Assim, com esses argumentos, colacionando julgados
que, na sua ótica, corroboram a tese defendida, requer o conhecimento
e provimento do recurso apelatório, a fim de que seja reformada in totum
a sentença, julgando-se, então, improcedentes os pleitos inaugurais e
invertendo os ônus sucumbenciais.
Preparo dispensado, ex vi legis.
Intimada, a apelada apresentou contrarrazões 4, em
2 Vide fl. 80.
3 Vide fls. 82/93.
4 Vide fls. 95/104.
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que pede o desprovimento do apelo.
Instada a se pronunciar, a ilustrada Procuradoria Geral de Justiça, por meio do parecer da lavra da Drª. REGINA HELENA
VIANA, opinou “pelo DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO e pela manutenção
da sentença de mérito em todos os seus termos.”5
É, em síntese, o relatório. Passo à decisão.
Presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso, dele conheço.
Cinge-se a controvérsia em saber se a negativa do
exame postulado pela autora/apelada foi ou não indevida, a ponto de
gerar-lhe indenização.
Pois bem. Em proêmio, insta salientar que a relação
aqui desenhada é de consumo, dada a contratação da recorrente para a
prestação de serviços médicos por meio de contribuição mensal, esta
paga pela recorrida. Vejamos o que diz a Lei nº 9.656/98, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde:
“Art. 1º (...)
I - Plano Privado de Assistência à Saúde:
prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a preço pré ou
5 Vide fls. 129/135.
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pós estabelecido, por prazo indeterminado,
com a finalidade de garantir, sem limite
financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente
escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e
odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto
ao prestador, por conta e ordem do consumidor.” (negritei)
Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça já
consagrou a tese consumerista ao longo dos anos, editando para tanto a
Súmula nº 469, que dispõe:
“Súmula nº 469/STJ. Aplica-se o Código de
Defesa do Consumidor aos contratos de plano
de saúde.”
Desta feita, não restam dúvidas de que a má prestação do serviço pela autarquia rebelante acabou gerando o ato ilícito aqui
debatido.
Ora, é inadmissível que a escusa da insurgente em
realizar o lipidiograma requerido pela segurada, prescrito por profissional
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habilitado, tenha se dado sob os pretextos de ausência de justificativa
médica e de que tal procedimento já havia sido feito a menos de 90 (noventa) dias, devendo a postulante, para viabilizar o novo exame, apresentar o anterior.
Isso porque, do simples compulsar do processo, denota-se, claramente, que o pedido de exame lá acostado 6 contém a justificativa clínica “controles”, razão pela qual não há falar em falta de motivo para autorizá-lo.
Ademais, mesmo invertido o ônus da prova 7, a apelante não colacionou à contenda um único documento sequer capaz de demonstrar a validade da cláusula limitativa de cobertura do plano de saúde contra a apelada, não podendo, por isso, eximir-se da responsabilidade que lhe é imputada, apenas afirmando que sua conduta está amparada nas normas que regem a “comunidade médica mundial”.
A próposito:
“CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PLANO DE
SAÚDE. LIMITAÇÃO DE DIREITOS. ADMISSIBILIDADE. Os contratos de adesão são permitidos
em lei. O Código de Defesa do Consumidor
impõe, tão-somente, que as 'cláusulas que
implicarem limitação de direito do consumidor
deverão
ser
redigidas
com
destaque,
6 Vide fl. 16.
7 Vide fls. 43/44.
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permitindo sua imediata e fácil compreensão.' (...)” (3ª T., REsp nº 319707/SP, Rel. p/ acórdão: Min. Castro Filho, j. 07/11/2002, DJ 28/04/2003, p.
198)
“(...) A operadora não pode recusar cobertura
de
tratamento
quando
a
cláusula
do
contrato que implicar limitação de direito
do consumidor, não excluir expressamente a
cobertura desse exame, pois a cláusula deve
ser redigida com destaque, permitindo sua
imediata e fácil compreensão. (...)” (TJMG,
12ª C.C., A.C. nº 1.0024.12.097586-7/001, Rel. Des. José
Flávio de Almeida, j. 29/04/2015, DJ 08/05/2015)
Já em contrapartida, a consumidora trouxe em anexo
à petição inicial, o Manual do Usuário 8, documentação tal que discorre
sobre o plano contratado e não faz menção alguma à limitação a ela imposta, tampouco à necessidade de apresentar exame já realizado a menos de 90 (noventa) dias para que um semelhante, prescrito pelo seu
médico, com a devida motivação, seja autorizado.
Desse modo, inexistindo nos autos qualquer meio de
prova expresso, claro e de fácil compreensão, apto a roborar a restrição
ao exame buscado pela recorrida, que, diga-se de passagem, paga religiosamente as mensalidade correlatas à contratação, não vejo como legítima a atitude da recorrente em recusar aludido procedimento, mor8 Vide fls. 20/34.
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mente porque esta, na condição de garantidora dos direitos à saúde e à
vida, não deve e não pode impor óbices desarrazoados aos segurados
que dela necessitam.
Ante as circunstâncias retro mencionadas, in casu, é
evidente o direito da autora/apelada à compensação do dano material reivindicado na peça de ingresso, eis que mesmo estando em dia com o
plano de saúde ajustado, teve que desembolsar o valor de R$65,00 (sessenta e cinco reais) para realizar o lipidiograma negado, conforme se vê
da nota fiscal jungida ao feito9.
Outrossim, também são devidos os danos morais fixados (R$12.000,00) advindos da injusta recusa de cobertura do plano de
saúde, pois referida situação agrava a situação de aflição psicológica e
de angústia no espírito daquele que necessita dos cuidados médicos.
Neste sentido, confiram-se os precedentes:
“(...) Nos termos da jurisprudência reiterada do STJ, 'a recusa indevida à cobertura
pleiteada pelo segurado é causa de danos
morais, pois agrava a sua situação de aflição psicológica e de angústia no espírito'
(REsp
657717/RJ,
Rel.
Ministra
NANCY
ANDRIGHI, DJ 12/12/2005) (...)” (STJ, 4ª T.,
AgRg no REsp nº 1518433/RS, Rel. Min. Luis Felipe
9 Vide fl. 19.
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Salomão, j. 28/04/2015, DJe 06/05/2015)
“(...) A recusa a cobertura de exame médico
capaz de fornecer o diagnóstico da doença
que acomete o segurado é causa de fixação
de
indenização
por
danos
morais.
(...)”
(STJ, 3ª T., AgRg no AREsp nº 202448/MT, Rel. Min.
João Otávio de Noronha, j. 25/11/2014, DJe 12/12/2014)
“DIREITO CIVIL. PLANO DE SAÚDE. COBERTURA.
EXAMES CLÍNICOS. RECUSA INJUSTIFICADA. DANO
MORAL. EXISTÊNCIA. 1. A recusa, pela operadora de plano de saúde, em autorizar tratamento a que esteja legal ou contratualmente
obrigada, implica dano moral ao conveniado,
na medida em que agrava a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito
daquele que necessita dos cuidados médicos.
Precedentes. 2. Essa modalidade de dano moral subsiste mesmo nos casos em que a recusa envolve apenas a realização de exames de
rotina, na medida em que procura por serviços médicos - aí compreendidos exames clínicos - ainda que desprovida de urgência,
está sempre cercada de alguma apreensão.
Mesmo consultas de rotina causam aflição,
fragilizando o estado de espírito do paciente, ansioso por saber da sua saúde. 3.
Recurso especial provido.” (STJ, 3ª T., REsp nº
1201736/SC, Relª. Minª. Nancy Andrighi, j. 02/08/2012,
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DJe 10/08/2012)
Finalmente, considerando que a apelante não se insurgiu quanto aos valores arbitrados em prol da apelada, a título de danos materiais e morais, deixo de tecer maiores considerações acerca do
tema, apenas consignando que não vislumbro equívoco algum em relação a tais quantias, visto que estipuladas com razoabilidade e proporcionalidade.
Nessas circunstâncias, pelos motivos acima delineados, resta patente a improcedência de que se revestem os pleitos deduzidos pela recursante.
EX POSITIS, nos termos do art. 557, caput, do CPC,
nego seguimento à apelação cível em epígrafe, porque manifestamente improcedente.
Transitada em julgado a decisão, remetam-se os autos à origem.
Publique-se. Intimem-se.
Goiânia, 10 de julho de 2015.
Desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis
Relatora
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