CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO
MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL
Heloísa Augusta Amaral Pimentel Pôssa
A MEDIDA SOCIOEDUCATIVA NA AGENDA DA REDE MUNICIPAL
DE EDUCAÇÃO DE BELO HORIZONTE:
A escola como local de prestação de serviço à comunidade
Belo Horizonte
2013
Heloísa Augusta Amaral Pimentel Pôssa
A MEDIDA SOCIOEDUCATIVA NA AGENDA DA REDE MUNICIPAL
DE EDUCAÇÃO DE BELO HORIZONTE:
A escola como local de prestação de serviço à comunidade
Dissertação apresentada ao Mestrado em
Gestão
Social,
Educação
e
Desenvolvimento
Local
do
Centro
Universitário Una como requisito parcial à
obtenção do título de mestre.
Área de concentração: inovações sociais,
educação e desenvolvimento local.
Linha de Pesquisa: Processos Políticosociais: articulações institucionais e
desenvolvimento local.
Orientadora: Profa. Dra. Wânia Maria de
Araújo
Belo Horizonte
2013
P856m
Pôssa, Heloísa Augusta Amaral Pimentel
A medida socioeducativa na agenda da rede municipal de educação de Belo
Horizonte: a escola como local de prestação de serviço à comunidade/Heloísa
Augusta Amaral Pimentel Pôssa. –2013.
142f.: il.
Orientador: Profa. Dra.Wânia Maria de Araújo
Dissertação (Mestrado) – CentroUniversitário UNA, 2013. Programa de
Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local.
Bibliografia f.90-97.
Ficha catalográfica desenvolvida pela Biblioteca UNA campus João Pinheiro
1. Escolas públicas – Belo Horizonte (MG).2. Medida socioeducativa.
I.Araújo, Wânia Maria de. II. Centro Universitário UNA. III. Título.
CDU: 658.114.8
Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas,
que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos
caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o
tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos
ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.
Fernando Pessoa
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a todas as pessoas que acreditam no ser humano e, em
especial, às pessoas que acreditam nos adolescentes em cumprimento de medida
socioeducativa.
AGRADECIMENTOS
A Deus pela vida e pela possibilidade de aprender cada vez mais.
Ao meu filho, Vinícius Pimentel, pela paciência e compreensão nos momentos de
ausência.
À minha mãe, Wanja Pimentel, pelo incentivo aos estudos.
À Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, na pessoa do Padre
Agnaldo, pela especial colaboração no fornecimento dos dados.
À professora e eterna orientadora Andréa Márcia Santiago Lohmeyer Fuchs pelos
ensinamentos e incentivo.
À professora e orientadora Wânia Maria Araújo pelo acompanhamento pontual e
competente.
Aos profissionais da Educação, Saúde e Assistência Social que contribuíram com
seus depoimentos.
À Secretaria Municipal de Governo de Belo Horizonte pelas informações prestadas.
A todos os professores e colegas do Curso de Mestrado em Gestão Social,
Educação e Desenvolvimento Local pela oportunidade de convivência e crescimento
profissional.
RESUMO
Este trabalho procurou compreender como têm sido as dinâmicas e práticas
institucionais desenvolvidas pelas escolas da Rede Municipal de Educação de Belo
Horizonte - RME na execução da medida socioeducativa de Prestação de Serviços à
Comunidade - PSC, e se essas práticas têm oferecido uma abordagem
sociopedagógica no acompanhamento do adolescente autor de ato infracional de
forma que ela atenda aos parâmetros da gestão pedagógica previstos pelo SINASE.
A investigação visou contribuir para que o recebimento dos adolescentes em
cumprimento da medida socioeducativa e a execução da medida no interior das
escolas venham ao encontro do que está previsto na legislação. Buscou-se, por meio
da pesquisa documental, bibliográfica, observação de campo, aplicação de
questionários e realização de entrevistas semiestruturadas, responder como o
cumprimento da medida socioeducativa de PSC acontece no interior das escolas da
rede municipal. Partiu-se da hipótese de que as dinâmicas e as práticas institucionais
das escolas da RME de Belo Horizonte que recebem adolescentes autores de ato
infracional para cumprimento de medida socioeducativa de PSC não têm oferecido
uma abordagem sociopedagógica no acompanhamento do cumprimento da medida
pelo adolescente de acordo com os parâmetros, conforme prevê o SINASE. Verificouse que o cumprimento da medida socioeducativa de PSC nas escolas municipais
ainda não é compreendido como medida educativa, pedagógica. Além disso, a
abordagem proposta pelo SINASE, pelos Planos Nacionais e Municipais de
Convivência Comunitária e outras legislações específicas não são de conhecimento
dos envolvidos no processo. Concluiu-se por meio desta pesquisa que o processo de
cumprimento de medida socioeducativa de PSC nas escolas da rede municipal de
educação de Belo Horizonte apresenta-se pouco sistematizado e distante da
legislação e abordagens teóricas existentes.
Palavras-chave:
Medida
socioeducativa.
comunidade.Intersetorialidade. Políticas públicas.
Prestação
de
serviço
à
ABSTRACT
This paper aimed at understanding the dynamics and institutional practices carried
out by the Municipal schools of Education of Belo Horizonte (RME) and its results in
implementing the measure to provide community services penalties (PSC). Another
interest of this paper is to find out if these practices have offered a socio-pedagogical
approach in assisting the juvenile criminal in such a way that it meets the parameters
of the pedagogical management provided by SINASE. The goal of the present
research is to give a contribution for the reception of adolescents fulfilling sociopedagogical penalties and the implementation of the measure within the schools to
comply with the legislation. Using desk research, field observation, questionnaires
and semi-structured interviews, we tried to answer how the fulfillment of the
educational measure of PSC happens inside the city schools. We started from the
dynamics and institutional practices of schools of RME of Belo Horizonte that receive
juvenile criminals to comply with educational measure of PSC have not offered a
sociopedagogical approach in monitoring the implementation of the measure by
teenager according to the parameters stated by SINASE. It was found that the
fulfillment of the educational measure of PSC in municipal schools is still not
understood as an educational and pedagogical measure. In addition, the approach
proposed by SINASE, by National and Municipal Community Coexistence Plans and
other specific laws are not fully understood by those involved in the process. It was
possible to conclude through this research that the process of compliance with
educational measure of PSC in the municipal schools of education of Belo Horizonte
is not well systematized and far from existing legislation and theoretical approaches.
Keywords: Educational Measurement, Community Service Penalty, Intersectional
Approach, Public Policy.
LISTA DE FIGURAS E TABELAS
Figura 1:
Sistema de Garantia de Direitos a partir da perspectiva do SINASE.
Figura 2:
Mapa 1- Regional Barreiro e sua divisão territorial.
Figura 3:
Mapa 2- Regional Barreiro e escolas selecionadas para a pesquisa.
Tabela 1:
Distorção idade/série no Ensino Fundamental/Rede pública.
Tabela 2:
Número de entradas de adolescentes por ano: 2009 a 2011.
Quadro 1:
Comparativo entre uma legislação orientada pela Doutrina da Situação
Irregular e uma legislação orientada pela Doutrina da Proteção Integral
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1:
Medidas socioeducativas - ECA.
Gráfico 2:
Número de adolescentes que cumpriram medida socioeducativa na
escola de 2009 a 2012.
Gráfico 3:
A gestão do programa e o coletivo da escola.
Gráfico 4:
Perspectiva de diálogo entre os sujeitos.
Gráfico 5:
Conhecimento sobre o SINASE.
Gráfico 6:
Coordenação das atividades dos adolescentes em cumprimento de
MSE.
Gráfico 7:
Tipos de atividades direcionadas aos adolescentes em cumprimento
de MSE.
Gráfico 8:
Inserção dos adolescentes sob medida socioeducativa no convívio
diário com alunos do tempo regular de aula.
Gráfico 9:
Período de cumprimento da medida socioeducativa.
Gráfico 10:
Distribuição por decisões em audiência preliminar.
Gráfico 11:
Percentual de escolaridade dos adolescentes.
Gráfico 12:
Situação escolar dos adolescentes em cumprimento de MSE.
Gráfico 13:
Percentual da raça/cor do adolescente.
Gráfico 14:
Adolescentes autores de ato infracional e inserção no mercado de
trabalho.
Gráfico 15:
Tipo de residência dos adolescentes autores de ato infracional.
Gráfico 16:
Participação das famílias.
Gráfico 17:
Medidas socioeducativas e socialização do adolescente infrator.
Gráfico 18:
Distribuição por tipo de ato infracional em Belo Horizonte.
Gráfico 19:
Distribuição dos adolescentes entrevistados por uso de cada tipo de
droga.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CIA
CONANDA
DOPCAD
DSC
ECA
FEBEM
FUNABEM
FMI
GECMES
GERED
GINED
ILANUD
LDBEN
MSE
NAMSEP
ODM
PIA
PSC
PNBEM
RME
SAM
SEDS
SEDH/PR
SEPI
SGD
SIGPS
SINASE
SMAAS
SMED
SUAS
SUASE
SUS
TJMG
UMEI
UNESCO
Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Autor de Ato
Infracional
Conselho Nacional da Criança e do Adolescente
Delegacia de Orientação e Proteção à Criança e ao Adolescente
Discurso do Sujeito Coletivo
Estatuto da Criança e do Adolescente
Fundação Estadual do Bem Estar do Menor
Fundação Nacional do Bem Estar do Menor
Fundo Monetário Internacional
Gerência de Coordenação das Medidas Socioeducativas
Gerência Regional de Educação
Gerência de Informações Educacionais
Instituto Latino Americano das Nações Unidas para prevenção do
delito e tratamento do delinquente
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
Medida Socioeducativa
Núcleo de Atendimento às Medidas Socioeducativas e Protetivas
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
Plano Individual de Atendimento
Prestação de Serviços à Comunidade
Política Nacional do Bem Estar do Menor
Rede Municipal de Educação
Serviço de Assistência ao Menor
Secretaria de Defesa Social
Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da
República
Setor de Pesquisa Infracional
Sistema de Garantia de Direitos
Sistema de Informações e Gestão das Políticas Sociais
Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo
Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social
Secretaria Municipal de Educação
Sistema Único de Assistência Social
Secretaria de Atendimento às Medidas Socioeducativas
Sistema Único de Saúde
Tribunal de Justiça de Minas Gerais
Unidade Municipal de Educação Infantil
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura
SUMÁRIO –
1
2
2.1
2.2
3
3.1
3.2
3.3
4
4.1
5
5.1
5.2
5.3
5.4
5.5
6
6.1
7
INTRODUÇÃO …......................................................................................
ADOLESCENTE AUTOR DE ATO INFRACIONAL: DA DOUTRINA DA
SITUAÇÃO IRREGULAR À DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL ..
Política de atendimento socioeducativo na perspectiva da doutrina da
proteção integral …....................................................................................
Cidadania, direitos e educação ….............................................................
POLÍTICA, POLÍTICA PÚBLICA E INTERSETORIALIDADE: UMA
APROXIMAÇÃO CONCEITUAL …...........................................................
Políticas públicas …...................................................................................
Políticas públicas e intersetorialidade …...................................................
Políticas públicas e Gestão Social …........................................................
METODOLOGIA .......................................................................................
O universo da pesquisa ….........................................................................
CARACTERIZAÇÃO E DISCUSSÃO DO PSC NAS ESCOLAS DA
REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO …....................................................
PSC: Do encaminhamento ao cumprimento ….........................................
A execução da medida de PSC no interior das escolas …........................
A Gestão do programa pela SMAAS e pela SMED …...............................
A participação das famílias no acompanhamento do cumprimento da
medida socioeducativa de PSC ….............................................................
Dialogando com os adolescentes: o dia a dia no cumprimento da
medida socioeducativa de PSC nas escolas ….........................................
ECA: AVANÇOS OU RETROCESSOS NO CAMPO DO
ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO …..................................................
Desafios no recebimento dos adolescentes para cumprimento da
medida socioeducativa de PSC nas escolas ….........................................
CONSIDERAÇÕES FINAIS …..................................................................
PROJETO DE INTERVENÇÃO …............................................................
REFERÊNCIAS ….....................................................................................
APÊNDICE A: Identificação e caracterização dos sujeitos
entrevistados ..........................................................................................
APÊNDICE B: Roteiro de entrevistas semiestruturadas aplicadas
aos sujeitos envolvidos na execução da medida socioeducativa de
PSC ….......................................................................................................
APÊNDICE C: Roteiro de entrevista semiestruturada aplicada aos
gestores da medida socioeducativa de PSC …....................................
APÊNDICE D: Questionário enviado às escolas …..............................
ANEXO A: Parâmetros da Gestão Pedagógica no Atendimento
Socioeducativo .......................................................................................
ANEXO B: Parecer Consubstanciado do CEP .....................................
12
16
23
29
33
34
37
41
44
47
49
49
53
59
68
71
74
78
82
86
90
98
99
102
105
108
139
12
1 INTRODUÇÃO
Esta pesquisa teve como objetivo analisar quais e como têm sido as dinâmicas e
práticas institucionais das escolas da Rede Municipal de Educação - RME de Belo
Horizonte que recebem adolescentes autores de ato infracional para cumprimento
de medida socioeducativa de Prestação de Serviços à Comunidade, tendo como
parâmetro as diretrizes pedagógicas do Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo - SINASE. Pretendeu-se também realizar levantamento quantitativo
do número de adolescentes que cumpriram medida de Prestação de Serviços à
Comunidade - PSC nas escolas da Rede Municipal de Educação - RME de Belo
Horizonte, da Regional Barreiro, bem como estabelecer um perfil sociodemográfico
básico desses adolescentes.
A partir do levantamento realizado, buscou-se identificar se as escolas que recebem
adolescentes para cumprimento de medida socioeducativa de PSC possuem
conhecimento sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA e o SINASE,
sobretudo no que diz respeito à execução da medida. Analisou-se ainda como as
escolas estão organizadas e de que forma se adéquam como locais de prestação de
serviços à comunidade para as ações previstas no eixo estratégico do “suporte
institucional e pedagógico”, ditados pelos parâmetros socioeducativos do SINASE.
O desenvolvimento desta pesquisa permitiu-nos ainda mapear o percurso
institucional realizado pelo adolescente no encaminhamento para o cumprimento da
medida de PSC, desde o seu comparecimento ao programa até sua chegada e
inclusão nas atividades no local de prestação de serviço à comunidade, ou seja, nas
escolas da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte. Para que esta pesquisa
fosse realizada, foi necessário buscar uma fundamentação teórica específica
exigindo maior aproximação da temática do adolescente autor de ato infracional,
desde a doutrina da situação irregular até os dias de hoje: a doutrina da proteção
integral.
O capítulo 1 traz uma abordagem teórica a partir da qual foi realizada uma
contextualização histórica da temática abordando tanto as mudanças relativas à
legislação ao longo do tempo quanto às mudanças de referenciais e paradigmas na
13
política de atendimento ao adolescente autor de ato infracional. Buscou-se
apresentar nesse capítulo como, ao longo da história, a aplicação das medidas
socioeducativas aconteceu, e como se processaram as mudanças de procedimento
em relação ao conteúdo, método e gestão com base na nova ordem constitucional e
também nas normativas internacionais referentes aos direitos da criança e do
adolescente.
A política de atendimento socioeducativo, na perspectiva da doutrina da proteção
integral, tem como suporte legal o SINASE, que surge em 2006 como um
documento que simboliza a união de esforços do Estado, da sociedade e da família
em torno de um sistema de garantia de direitos - SGD para discutir e responder às
demandas que envolvem adolescentes e, nesta pesquisa, em especial, os
adolescentes autores de ato infracional.
Atualmente essa temática chama atenção da sociedade e estudiosos, tanto no
campo teórico quanto prático, pois, de acordo com o Fundo das Nações Unidas para
a Infância - UNICEF, o Brasil nunca teve e não voltará a ter tão grande população de
adolescentes em sua história.
Discutiu-se ainda nesse capítulo a ideia de cidadania, direitos e educação a partir da
perspectiva de que todos os adolescentes são sujeitos de direitos: o direito de ser
adolescente em toda a sua plenitude e em toda sua diversidade.
No segundo capítulo, a pesquisa aborda as dimensões da política, política pública e
intersetorialidade fazendo uma abordagem do papel do Estado e da participação
popular na construção das políticas públicas. A intersetorialidade é discutida como
uma das formas de enfrentamento às demandas da população jovem excluída em
seus direitos: educação, saúde, lazer, etc. Para tanto, discutiu-se o papel dos
Conselhos de Direitos (Nacional, Estaduais e Municipais) da Criança e do
Adolescente, bem como os órgãos gestores do SINASE na articulação de ações
integradas que constituirão a elaboração de políticas públicas voltadas para o
público adolescente.
14
O conceito de gestão social também foi apresentado no capítulo 2 e, por ser um
conceito em construção, foi discutido na perspectiva de diversos autores, tais como
Tenório (2008), Fischer (2002) e França Filho (2003), por compreender a
importância da discussão que levantam em torno do conceito.
A seguir, no capítulo 3, a discussão inicial diz respeito à metodologia utilizada na
construção deste trabalho. Optou-se pela abordagem qualitativa alicerçada na
pesquisa social. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com 10 sujeitos
envolvidos no processo e aplicados questionários nas 26 escolas de ensino
fundamental que recebem adolescentes autores de ato infracional. O objetivo das
entrevistas e da aplicação dos questionários foi criar um banco de dados para
analisar quais e como têm sido as dinâmicas e práticas institucionais das escolas da
RME que recebem adolescentes autores de ato infracional para cumprimento de
Medida Socioeducativa - MSE de PSC tendo como parâmetro as diretrizes
pedagógicas do SINASE.
Ressaltamos que foi estabelecido um recorte na amostra para atuação da
pesquisadora, cujo objetivo foi buscar uma escola dentro de cada uma das cinco
microrregiões do Barreiro. A escolha se deu de forma aleatória.
Nos capítulos seguintes, buscou-se caracterizar e discutir a medida de PSC no
interior das escolas da rede municipal de educação. Os dados coletados foram
apresentados em forma de gráfico para que o leitor possa ter maior clareza do
processo de gestão do programa, bem como analisar os avanços ou retrocessos no
campo do atendimento socioeducativo.
Conforme será visto no decorrer da pesquisa, os dados coletados por meio de
questionários e entrevistas possibilitaram maior clareza do processo vivenciado
pelos adolescentes em conflito com a lei encaminhados para as escolas da rede
municipal de educação para cumprimento de medida socioeducativa.
Por meio dos gráficos apresentados e depoimento dos sujeitos envolvidos, o leitor
poderá identificar onde estão os principais pontos e falhas na execução do programa
dentro daquilo que é proposto pelo SINASE e demais marcos regulatórios. A
15
identificação desses pontos foi trabalhada pela autora ao longo dos capítulos e nas
considerações finais, tendo como referência os dados obtidos.
Finalmente, se as informações e reflexões acerca da temática desenvolvida
puderem servir de amparo ou incentivo para novas pesquisas, a pesquisadora terá
atingido seu objetivo.
16
2 ADOLESCENTE AUTOR DE ATO INFRACIONAL: DA DOUTRINA DA
SITUAÇÃO IRREGULAR À DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL
O ambiente de redemocratização do País iniciado na década de 1980 criou
condições políticas e sociais para processos reivindicatórios no campo dos direitos,
sinalizando para uma refundação da cidadania brasileira que, segundo Coutinho
(1997),pode ser entendida como um movimento dinâmico que expressa a própria
democracia:
Cidadania é a capacidade conquistada por alguns indivíduos, ou (no caso
de uma democracia efetiva) por todos os indivíduos, de se apropriarem dos
bens socialmente criados, de atualizarem todas as potencialidades de
realização humana abertas pela vida social em cada contexto
historicamente determinado (COUTINHO, 1997, p. 146).
Nesse sentido, a promulgação da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) e,
posteriormente, o Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990 introduzem na
agenda da infância e adolescência brasileiras a defesa e garantia dos direitos
humanos,1 trazendo mudanças de referenciais e paradigmas na política de
atendimento a esse segmento.
Historicamente o atendimento às crianças tem seu marco na Roda dos Expostos, 2
instrumento que servia para que as mães deixassem seus filhos em mãos seguras
sem serem identificadas. Esse processo a que crianças eram expostas nada mais
era do que o início de um processo de incentivo ao abandono e segregação.
Outro marco no atendimento às crianças e adolescentes é o Código Filipino vigente
até o século XIX. No Brasil colonial, as regras ditadas pelas Ordenações
portuguesas Manuelinas, Afonsinas e Filipinas expressavam as concepções, valores
e interesses da sociedade acerca das crianças e adolescentes. Entretanto, a
legislação brasileira acerca da responsabilização penal do adolescente data do
1
O artigo 227 da CF-88 (BRASIL, 1988) e 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA – Lei
Federal nº 8069 de 13 de julho de 1990 (BRASIL, 1990) – seguem os princípios da Doutrina das
Nações Unidas.
2
Antes da proclamação da Independência, era comum abandonar crianças recém-nascidas nas
Santas Casas de Misericórdia, que por esse motivo, também eram conhecidas por Casas dos
Expostos. As Casas dos Expostos também eram conhecidas como “Roda dos Expostos”, devido a
uma espécie de roleta na qual a criança era depositada e entrava na instituição (geralmente, Santas
Casas de Misericórdia), sem que se identificasse quem ali a colocara (LIBERATI, 2006, p. 38).
17
século XIX (1830), quando introduz o Código Criminal do Império. Nesse
documento, os adolescentes eram responsabilizados pelos seus atos de acordo com
“discernimento” presumido para os maiores de quatorze anos, devendo este ser
comprovado para a responsabilização dos menores dessa idade. 3 Nesse mesmo
período, surgem os tribunais de menores, sendo o primeiro criado em Illinois, nos
EUA, e posteriormente em outros países da Europa, Ásia e América Central. Essas
instituições afirmavam a ideia da intervenção estatal ilimitada, ou seja, em nome da
suposta proteção a crianças e adolescentes em situação irregular, o Estado, por
meio dos juízes, tinha o poder de intervir na vida dessas pessoas que eram
consideradas abandonadas ou delinquentes.
Com o Código Republicano de 1890, pouco foi alterado em relação aos critérios de
responsabilização, permanecendo o critério subjetivo do discernimento do menor,
diminuindo, porém, o limite da isenção de responsabilidade para nove anos:
Art. 27. Não são criminosos:
§1º Os menores de 9 anos completos;
§2º Os maiores de 9 e menores de 14, que obrarem sem discernimento;
Art. 30. Os maiores de 9 anos e menores de 14 anos que tiverem obrado
com discernimento serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares
industriais, pelo tempo que ao juiz parecer, e contanto que o recolhimento
não exceda a idade de 17 anos (MACEDO, 2008, p. 3).
Em 1932, com a Consolidação das Leis Penais, o documento estabelecia que os
menores de 14 anos não poderiam ser considerados criminosos. Os menores de 18
anos e maiores de 14 anos ficariam submetidos ao regime estabelecido pelo Código
de Menores, Decreto n. 17.943-A, de 12 de outubro de 1927, também conhecido
como Código Mello Mattos (BRASIL, 1927). Esse código era aplicado aos menores
de 18 anos em situação de abandono (moral ou material) e também aos
delinquentes, ou seja, também era aplicado àqueles que haviam cometido algum
tipo de ato infracional e que seriam, de acordo com a legislação, recolhidos em
estabelecimento próprio – os reformatórios.
O Código Penal de 1940, vigente até os dias de hoje com alterações promovidas no
curso do tempo, adotou sistemática diferente do que então era praticado no país. As
3
(Texto original). Art. 10 Também não se julgarão criminosos: §1º Os menores de quatorze anos. Art.
13. Se se provar que os menores de quatorze anos que tiverem cometido crime obraram com
discernimento, deverão ser recolhidos às casas de correção, pelo tempo que ao Juiz parecer,
contanto que o recolhimento não exceda a idade de dezessete anos.
18
contravenções penais deixaram de fazer parte do documento, passando à lei
autônoma: Lei das Contravenções Penais. A responsabilização penal vigente
baseava-se no critério biológico, conforme dispunha o art. 23 do Código Penal: “Art.
23. Os menores de 18 anos são penalmente irresponsáveis, ficando sujeitos às
normas estabelecidas na legislação especial” (BRASIL, 1927).
Em 1942, é criado o Serviço de Assistência ao Menor - SAM,
[...] órgão do Ministério da Justiça, caracterizado por uma orientação
correcional repressiva, que funcionava como o equivalente do sistema
penitenciário para a população menor de idade. O sistema de atendimento
era constituído por internatos (reformatórios e casas de correção) para
adolescentes autores de infração penal e por patronatos agrícolas e escolas
de aprendizagem de ofícios urbanos, para menores carentes e
abandonados (MENDEZ; COSTA, 1994, p. 124).
Durante o período da ditadura militar, algumas tentativas de mudança foram
lançadas, mas todas sem sucesso, em razão da inadequação de seus ideais de
alteração do sistema do Direito Penal ao contexto social da época. É implantada na
vigência do regime autoritário a política de atendimento a crianças e adolescentes
que, por meio do órgão central, a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor FUNABEM, inicia a Política do Bem-Estar do Menor - PNBEM, lei n. 4513/64
(BRASIL, 1964). A partir de então, surgem as Fundações Estaduais do Bem-Estar
do Menor - FEBEMs, que ficam responsáveis pelo atendimento de crianças e
adolescentes abandonados.
Ainda sob o comando militar, entra em vigor a Lei n. 6.697 de 10 de outubro de
1979, conhecida como Código de Menores (BRASIL, 1979). Por determinação
expressa, os decretos anteriores são revogados.
Dispunha o artigo 1º:
Art. 1º. Este código dispõe sobre a assistência, proteção e vigilância a
menores:
I- até dezoito anos de idade, que se encontrem em situação irregular;
II- entre dezoito e vinte e um anos, nos casos expressos em lei.
Parágrafo único. As medidas de caráter preventivo aplicam-se a todo menor
de dezoito anos, independentemente de sua situação (BRASIL, 1979).
No Código de Menores (BRASIL, 1979), embora se previsse a integração
sociofamiliar do menor, verificava-se a adoção de medidas restritivas e privativas de
liberdade nas quais os adolescentes não eram considerados como sujeitos de
19
direitos. Eram conhecidos como “menores” em situação irregular, delinquentes,
menores abandonados.
Nos anos de 1990, com a implantação da Lei n. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do
Adolescente – uma nova diretriz é proposta para o tema (BRASIL, 1990). A Lei
regulamenta os direitos constitucionais das crianças e adolescentes, expressos no
artigo 227, caput, da Constituição Federal de 1988 e, numa clara evolução,
adolescentes passam a ser considerados como sujeitos de direitos, credores de
proteção integral, tanto os adolescentes vitimados, alvo de medidas especiais de
proteção, quanto os adolescentes autores de atos infracionais, sujeitos a medidas
socioeducativas de privação e restrição de liberdade. Os adolescentes deixam de
ser objetos de intervenção do Estado e passam a ter direitos, protegidos por serem
pessoas em desenvolvimento com todas as garantias legais e processuais. Toda a
discussão que culminou com o surgimento do ECA tem no Movimento de Meninos e
Meninas de Rua4 e também na Declaração Universal dos Direitos da Criança, 5
aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1959, seu referencial de
mudança de paradigma encerrando a doutrina da situação irregular e iniciando uma
nova fase da história: crianças e adolescentes são sujeitos de direitos e não mais
objeto de intervenção estatal.
A nova ordem constitucional trouxe para os adolescentes uma compreensão distinta
acerca do cumprimento das medidas socioeducativas aplicadas em razão de prática
de ato infracional. As medidas dividem-se em dois grupos: o grupo das medidas
privativas de liberdade e o grupo das medidas em meio aberto.
As medidas privativas de liberdade (semiliberdade e internação) são utilizadas em
situações excepcionais, devendo ser aplicadas sob os princípios da brevidade e da
excepcionalidade:
4
Este movimento se constituiu como uma entidade civil independente em 1985. Não presta
atendimento direto aos menores, mas procura mobilizar os próprios menores, os técnicos, os
educadores de rua, os diretores, os funcionários de instituições, enfim todos os que estão envolvidos
com esse segmento da população brasileira. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 1988).
5
Proclamada pela Resolução da Assembleia Geral 1386 (XIV), de 20 de Novembro de 1959 (ONU,
1959).
20
Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos
princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento (BRASIL, 1990, p. 101).
Além dessas medidas, ao adolescente podem ser aplicadas: a) a advertência; b) a
obrigação de reparar o dano; c) a prestação de serviços à comunidade; d) a
liberdade assistida. As medidas em meio aberto (Prestação de Serviços à
Comunidade e Liberdade Assistida) são aplicadas ao adolescente sem restrição de
sua liberdade, porém com acompanhamento sistematizado por parte do Estado.
Com a correta aplicação das medidas, rompe-se o mito da impunidade:
As medidas socioeducativas preconizadas pelo Estatuto, se forem
adequadamente postas em funcionamento, dão a resposta de
responsabilização compatível aos jovens em conflito com a lei e se revelam
remédios eficazes diante de atos infracionais praticados (SARAIVA, 2010, p.
194).
O adolescente autor de ato infracional, a partir da Lei n. 8069/90 (BRASIL, 1990),
responde pelos atos praticados, dentro de um contexto pedagógico, educativo, não
mais como um sujeito irregular. Tal procedimento tem correspondência com as
normativas internacionais referentes aos direitos da criança e do adolescente:
Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e
Tratamento do Delinquente - ILANUD; Convenção das Nações Unidas sobre os
Direitos das Crianças; Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da
Justiça de Menores (Regras de Beijing); Regras Mínimas das Nações Unidas para a
Proteção dos Jovens Privados de Liberdade.
A Doutrina da Proteção Integral que rege o Estatuto da Criança e Adolescente - ECA
compreende, a partir de então, que todas as crianças e adolescentes, incluindo
também os adolescentes autores de ato infracional, são sujeitos de direitos e, por se
encontrarem em desenvolvimento, passam a ser prioridades absolutas. Sendo então
os adolescentes sujeitos de direitos, e não mais objetos de intervenção (mudança de
conteúdo), é necessário que as práticas de intervenção destinadas aos adolescentes
autores de ato infracional na execução das medidas (mudança de método)
assegurem a prevalência da ação socioeducativa sobre os aspectos meramente
sancionatórios, como eram anteriormente adotados na antiga Doutrina da Situação
Irregular que orientava o Código de Menores (Lei n. 6.697/1979). (BRASIL, 1979).
21
O campo da gestão também traz mudanças na relação entre os entes federativos
(municipal, estadual/distrital e nacional) com responsabilidades e competências
definidas e compartilhadas, o que demanda, inclusive, uma maior integração entre
as políticas. Essas mudanças propostas no ECA, de conteúdo, de método e de
gestão, impactaram, sobretudo, o campo da execução das medidas socioeducativas.
De acordo com a doutrina da proteção integral, devem ser implementadas ações
educativas e contextualizadas para que a medida aplicada seja de fato educativa. O
adolescente precisa sentir-se acolhido e reconhecido como sujeito de direitos e
deveres em uma sociedade para que ele possa se educar.
No contexto jurídico, a partir da doutrina da proteção integral, a aplicação da medida
pelo juiz não é mais discricionária, estando limitada por garantias, diferentemente do
que ocorria no passado, no qual a privação de liberdade era regra.
Educar não quer dizer deixar de exigir do adolescente o cumprimento das regras
que a própria sociedade lhe impõe. Não exigir do adolescente seria o mesmo que
ignorá-lo, o que contribuiria para uma situação de abandono, de alienação da
realidade social e da sua própria realidade. Entretanto “a medida aplicada ao
adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a
gravidade da infração” (BRASIL, 1990, p. 96). A falta de ação dos órgãos
responsáveis pelo cumprimento da medida socioeducativa acaba demonstrando
para a sociedade um exemplo de inoperância do sistema, o que de certo modo
contribui para o protecionismo que, segundo Demo (2011), “deixa a criança e o
adolescente inatingíveis a sanções, como se tivessem apenas direitos, não deveres”
(DEMO, 2011, p. 60).
De acordo com o UNICEF (2011), a adolescência é uma fase de oportunidades, de
socialização, construção da identidade e autonomia. Sendo assim, ele chama
atenção para a urgência, a relevância e a oportunidade de investir na adolescência
como forma de se alcançarem os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio - ODM
com equidade.
22
Pela nova ordem resultante da Convenção das Nações Unidas de Direitos da
Criança e de toda a normativa internacional, bases da Doutrina da Proteção Integral
de Direitos – presente na Constituição Federal (BRASIL, 1988) e no ECA (BRASIL,
1990) – encerra-se a doutrina da situação irregular.
QUADRO 1 – Comparativo entre uma legislação orientada pela Doutrina da
Situação Irregular e uma legislação orientada pela Doutrina da Proteção Integral
Situação Irregular
Proteção Integral
Código de Menores
ECA
Menores
Objetos de proteção
Proteção de menores
Proteção que viola e restringe direitos
Infância dividida
Incapazes
Não importa a opinião da criança
Situação de risco ou perigo moral ou
material ou situação irregular
Menor em situação irregular
Centralização
Juiz executando política social/assistencial
Juiz como bom pai de família
Juiz com faculdades ilimitadas
O assistencial confundido com o penal
Menor abandonado/delinquente
Desconhecem-se todas as garantias
Atribuídos de delitos como inimputáveis
Direito penal de autor
Privação de liberdade como regra
Medidas por tempo indeterminado
Fonte: SARAIVA, 2010, p. 28.
Crianças e adolescentes
Sujeitos de direitos
Proteção de direitos
Proteção que reconhece e promove
direitos
Infância integrada
Pessoas em desenvolvimento
É fundamental a opinião da criança
Direitos ameaçados ou violados
Adultos, instituições ou serviços em
situação irregular
Descentralização
Juiz em atividade jurisdicional
Juiz técnico
Juiz limitado por garantias
O assistencial separado de penal
Desaparecem essas determinações
Reconhecem-se todas as garantias
Responsabilidade penal juvenil
Direito penal de ação
Privação de liberdade como exceção e
somente para infratores/outras sanções
Medidas por tempo determinado
O ECA (BRASIL, 1990), ao considerar o adolescente como uma pessoa em
desenvolvimento, aposta na sua capacidade de situar-se como trabalhador e como
cidadão na sua comunidade. Ao adolescente autor de ato infracional, a lei não o
criminaliza, pois lhe é oferecida uma chance de ser atendido em condições especiais
e, nesse sentido, o ECA tem importante papel pedagógico a desempenhar, gerando
a oportunidade de o adolescente mudar a sua conduta e repensar valores,
estimulando-o para que crie projetos de vida, ou seja, torne-se um cidadão pleno.
23
2.1 Política de atendimento socioeducativo na perspectiva da doutrina da
proteção integral
O Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, instituído pela Lei n. 8.069/90
(BRASIL, 1990), contrapõe-se a um passado historicamente excludente no qual,
sustentados pela Doutrina da Situação Irregular, os adolescentes eram vistos como
objetos de intervenção do Estado.
Sustentado na Doutrina da Proteção Integral, o ECA expressa direitos da população
infanto-juvenil brasileira, pois afirma a necessidade de os adolescentes serem vistos
como sujeitos de direitos, pessoas em desenvolvimento, merecedoras de proteção
integral por parte da família, da sociedade e do Estado, devendo este atuar por meio
de políticas públicas e sociais na promoção e defesa de seus direitos.
A partir da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) e do Estatuto da Criança e
do Adolescente (BRASIL, 1990), a Secretaria Especial de Direitos Humanos da
Presidência da República e o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente - CONANDA6 apresentam o Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo - SINASE.7
O SINASE surge em 2006 como um documento que simbolizaria a união de
esforços do Estado, da sociedade e da família em torno de um Sistema de Garantia
de Direitos- SGD para discutir e responder às demandas que envolvem
adolescentes autores de ato infracional ou vítimas de violação de direitos no
cumprimento de medidas socioeducativas.
6
CONANDA: o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, foi criado pela Lei n.
8242/91, é o órgão responsável por tornar efetivos os direitos, princípios e diretrizes contidos no ECA
(BRASIL, 1991).
7
SINASE: fruto de uma construção coletiva que envolveu nos últimos anos diversas áreas de
governo, representantes de entidades e especialistas na área, além de uma série de debates
protagonizados por operadores do Sistema de Garantia de Direitos em encontros regionais que
cobriram todo o País (BRASIL, 2006a).
24
A FIG. 1 possibilita a visualização do SINASE dentro do Sistema de Garantia de
Direitos - SGD.
FIGURA 1 – Sistema de Garantia de Direitos a partir da perspectiva do SINASE
Sistema
Educacional
Sistema
Único de
Saúde
SUS
SINASE
Sistema de
Justiça e
Segurança
SUAS
Sistema Único
de Assistência
Social
Sistema Nacional
de Atendimento
Socioeducativo
Fonte: BRASIL, 2006a.
Sendo um sistema integrado, o SINASE articula os três níveis de governo para o
desenvolvimento de programas de atendimento a essas demandas, considerando a
intersetorialidade e a corresponsabilidade da família, da comunidade e do Estado. O
documento está organizado em nove capítulos que abordam desde o marco
situacional acerca da temática até o detalhamento técnico para execução das
medidas socioeducativas. Estabelece, ainda, as competências e responsabilidades
dos conselhos de direitos que devem sempre estar em diálogo permanente com
outros órgãos de defesa e promoção dos direitos: Poder Judiciário e Ministério
Público.
Pelas disposições contidas na Constituição Federal de 1988 e no ECA, cabe à União
a coordenação e a edição de normas gerais para todo o território nacional em
matéria de infância e adolescência.
Assim, cabe à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios, no âmbito
de atuação de cada um:
a) estabelecer normas sobre o atendimento socioeducativo;
25
b) financiar, conjuntamente com os entes federativos a execução de programas
específicos;
c) garantir a publicidade dos atos públicos pertinentes à execução das medidas
socioeducativas;
d) garantir transparência dos atos públicos;
e) fornecer, via Poder Executivo, os meios e instrumentos necessários ao pleno
funcionamento dos respectivos Conselhos dos Direitos da Criança e do
Adolescente;
f) elaborar e aprovar junto ao respectivo Conselho dos Direitos da Criança e do
Adolescente o Plano de Atendimento Socioeducativo;
g) atuar na promoção de políticas que estejam em consonância com os
princípios de Direitos Humanos e contra o racismo, a discriminação racial, a
xenofobia e intolerância;
h) implementar programas em parceria com a sociedade civil organizada, ONGs
e instituições afins com o propósito de garantir os direitos das populações e
grupos discriminados, desfavorecidos ou em situação de vulnerabilidade
social.
Por ser uma medida a ser cumprida em meio aberto e da competência da esfera
municipal, cabe aos municípios a implementação da medida socioeducativa de PSC
a partir das seguintes ações:
a) Coordenar o Sistema Municipal de Atendimento Socioeducativo;
b) Instituir, regular e manter o seu sistema de atendimento socioeducativo,
respeitadas as diretrizes gerais fixadas pela União e pelo respectivo
Estado;
c) Elaborar o Plano Municipal de Atendimento Socioeducativo;
d) Editar normas complementares para a organização e funcionamento dos
programas de seu sistema;
e) Fornecer, via Poder Executivo, os meios e os instrumentos necessários
ao pleno exercício da função fiscalizadora do Conselho Tutelar;
f) Criar e manter os programas de atendimento para a execução das
medidas de meio aberto;
g) Estabelecer consórcios intermunicipais, e subsidiariamente em
cooperação com o Estado, para o desenvolvimento das medidas
socioeducativas de sua competência (BRASIL, 2006a, p. 35).
A implantação do SINASE tem como objetivo o desenvolvimento de uma ação
sustentada nos princípios de direitos humanos, estruturados principalmente em
bases éticas e pedagógicas. Além de ser um documento normativo, é fonte de
produção de dados e informações que servem para fundamentar a construção e o
26
desenvolvimento de novos planos, políticas, programas e ações para a garantia de
direitos de todos os adolescentes, reduzindo-se a vulnerabilidade e a exclusão social
a que muitos estão expostos.
O Sistema Socioeducativo engloba políticas, planos e programas e demais ações
voltadas para o atendimento de adolescentes submetidos a processo judicial de
apuração de ato infracional ou sob medida socioeducativa, sendo que os princípios
do atendimento articulam-se dentro do Sistema de Garantia de Direitos. Dessa
forma, todos os princípios, regras e critérios do SINASE integram-se de forma
articulada para que o documento seja entendido como política pública social de
inclusão do adolescente autor de ato infracional no direito à dignidade humana.
Os parâmetros para a ação e gestão pedagógicas estão fundamentados nas
normativas legais já citadas e abrangem as diretrizes pedagógicas, nas quais são
abordados os aspectos relativos ao caráter do programa no que tange à prevalência
da ação socioeducativa sobre o caráter sancionatório.
O SINASE considera que as ações socioeducativas devem exercer uma influência
sobre a vida do adolescente para a construção de sua identidade, de modo a
contribuir com seu projeto de vida, possibilitando que o adolescente assuma um
papel inclusivo na dinâmica social e comunitária. Nesse aspecto, a socioeducação
destaca que o desenvolvimento deve ocorrer de forma integral e esse
desenvolvimento integral dar-se-á a partir das interfaces do sistema e das
oportunidades que serão dadas a esse sujeito.
A participação dos adolescentes na construção, no monitoramento e na avaliação
das ações socioeducativas é fundamental para o desenvolvimento crítico desses
sujeitos que, em todos os momentos, serão levados a exercer a responsabilidade, a
liderança e a autoconfiança, fatores importantes no desenvolvimento da cidadania.
O SINASE, na condição de sistema integrado, além de apresentar as diretrizes
pedagógicas para cada programa de atendimento, enumera os profissionais que
devem atuar em conjunto nos diversos programas e normatiza os parâmetros
arquitetônicos para atender os adolescentes sem negligenciar seus direitos. Dispõe
27
ainda sobre previsão orçamentária e diretrizes para execução e manutenção das
medidas socioeducativas.
A responsabilidade pela concretização dos direitos básicos sociais é da pasta
responsável pela política setorial, conforme a distribuição de competências e
atribuições de cada um dos entes federativos e da rede de serviços. Contudo, é
indispensável a articulação das várias áreas para maior efetividade das ações,
inclusive com a participação da sociedade civil (BRASIL, 2006a, p. 23).
Entre as diversas ações que podem favorecer a efetividade da articulação,
destacam-se as seguintes:
1)
2)
3)
4)
5)
6)
Estímulo à prática da intersetorialidade;
Campanhas conjuntas destinadas à sociedade em geral e aos profissionais
da área, com vistas à concretização da Doutrina de Proteção Integral adotada
pelo ECA;
Promoção de discussões, encontros, seminários (gerais e temáticos)
conjuntos;
Respeito às competências e atribuições de cada ente federativo e de seus
órgãos, evitando-se a sobreposição de ações;
Discussão e elaboração, com os demais setores do Poder Público, para
expedição de atos normativos que visem ao aprimoramento do sistema de
atendimento;
Expedição de resoluções conjuntas, disciplinando matérias relacionadas à
atenção a adolescentes inseridos no SINASE (BRASIL, 2006a, p. 24).
Por serem objetos desta pesquisa as escolas e suas práticas pedagógicas em
relação à medida socioeducativa de PSC, abordaremos o parâmetro da gestão
pedagógica no atendimento socioeducativo.
O sistema educacional, além de acolher o adolescente, seja ele autor ou não de ato
infracional, deve propiciar-lhe medidas que devam garantir o acesso aos direitos e
às oportunidades de superação de sua situação de exclusão e de ressignificação de
valores, bem como o acesso à formação de valores para a participação na vida
social. Dessa forma, deve o sistema educacional garantir sobretudo o regresso,
sucesso e permanência dos adolescentes na rede formal de ensino. Muito embora
isso esteja disposto em lei, a pesquisa revelou um grande número de adolescentes
em cumprimento de medida socioeducativa fora do sistema educacional.
É bem verdade também que o formato atual das escolas não atende as
necessidades desses adolescentes que, em sua maioria, se encontram em idade
diferente da idade ideal para aquela série ou ano de escolaridade. Com isso o eixo
do SINASE que dispõe sobre a necessidade de a escola redirecionar sua estrutura e
28
organização (tempo, espaço, currículo) se mostra comprometido, uma vez que as
escolas não oferecem forma diferenciada para atender esse público. Muitos desses
adolescentes acabam abandonando a escola por não reconhecerem naquele
espaço escolar um espaço de oportunização. Não basta garantir o acesso, é preciso
considerar as particularidades desse público que durante muito tempo tem a
exclusão como sua principal marca. É preciso de fato inserir esse adolescente e
ofertar uma escola diferente, e não apenas garantir a sua matrícula.
Fundamentado pela CF/88 e pelo ECA, o SINASE é o principal documento que
contribuiu para a concretização dos direitos dos adolescentes autores de ato
infracional.
Muito embora a doutrina da Proteção Integral tenha trazido mudanças e conquistas
nas discussões do tema, sabe-se que muitas delas ainda estão apenas no campo
jurídico e político-conceitual, não chegando efetivamente aos seus destinatários:
A sensação de que há avanços é uma percepção empírica, sem deixar de
registrar que o modelo juridicamente vencido vive e é resistente, porque
ainda povoa mentalidades aculturadas pelo menorismo, em que a infração
penal na idade juvenil nada mais significava senão uma das diversas
hipóteses de situação irregular (KONZEN, 2005, p. 344).
É importante que a elaboração de uma política de atendimento esteja integrada com
as demais políticas sociais desenvolvidas para os adolescentes. Cabe ao Estado a
função de investir cada vez mais em políticas sociais que facilitem a concretização
desse importante instrumento normativo, o SINASE.
Em 18 de janeiro de 2012, é publicada a lei 12.594 − Lei do SINASE (BRASIL,
2012), com objetivo de oferecer subsídios à execução de programas de atendimento
e ao cumprimento de medidas socioeducativas. A implementação da lei e as várias
ações decorrentes da conjugação de esforços dos operadores do Sistema de Justiça
da Infância e Juventude têm proporcionado um pronto e efetivo atendimento ao
adolescente autor de ato infracional.
29
2.2 Cidadania, direitos e educação
Tradicionalmente, a ideia de cidadania está relacionada aos direitos políticos e civis.
Somente a partir da ampliação da concepção de direitos humanos – que incluem os
direitos sociais, econômicos e culturais – o conceito de cidadania passou a ser
associado a outros aspectos, tais como direito à saúde, educação, lazer, segurança
e moradia, entre outros.
A discussão acerca da ideia de que as crianças e adolescentes são sujeitos de
direitos é relativamente nova. Começou a ser difundida, a partir do final dos anos de
1980 com o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (CONSELHO
FEDERAL DE PSICOLOGIA, 1988). Com a Convenção sobre os Direitos da
Criança8 e, posteriormente, com o ECA (BRASIL, 1990) esses direitos são
reforçados. Passados vinte e três anos de vigência do ECA, percebe-se que muito
pouco está garantido em termos de conquista de cidadania para esses sujeitos.
Segundo Volpi (2001), o conceito de cidadania é algo mais amplo e que envolveria,
pelo menos, três dimensões: a) o direito de ter direitos; b) o direito de usufruir, no
cotidiano, dos direitos assegurados na lei; e c) o direito de construir, a cada dia,
novos direitos. Nesse sentido, a realidade brasileira não tem demonstrado na prática
a garantia dessas dimensões, principalmente para os adolescentes.
Na área da educação, a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDBEN (BRASIL, 1996),9 várias mudanças foram introduzidas,dentre elas, a
ampliação da oferta de vagas para educação básica. Essa garantia, ainda que não
esteja universalizada, representa um grande avanço. Contudo, um aspecto que
ainda merece atenção é a qualidade do ensino ofertado na escola pública.
Assim como a educação, outros direitos são assegurados na Constituição Federal:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,
ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
8
A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança é um tratado que visa à proteção de
crianças e adolescentes de todo o mundo, aprovada na Resolução 44/25 da Assembleia Geral das
Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989. (ONU, 1989).
9
Com alterações trazidas pela lei 12.796 de 05/04/2013 (BRASIL, 2013).
30
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988, p. 116).
Entretanto, é sabido que esses direitos não são efetivados para grande parte da
população de crianças e adolescentes, o que contribui para o aumento do número
de cidadãos excluídos da sociedade. E essa exclusão social, a falta de acesso à
cultura e ao lazer inviabilizam o pleno exercício da cidadania, pois não basta que o
poder público ofereça vagas na escola pública, por exemplo, é necessário criaremse mecanismos para que as famílias em situação de vulnerabilidade econômica
tenham condições de manter seus filhos nas escolas.
Da mesma forma, os outros direitos precisam ser assegurados para que esses
adolescentes não sejam colocados à margem da sociedade, tornando-se cada vez
mais vulneráveis. “Conflitos e situações de emergência aumentam o risco de
empobrecimento e tornam os adolescentes mais vulneráveis a atividades
criminosas, violência e exploração” (UNICEF, 2011, p.10).
Apesar das garantias legais e fundamentais presentes na Constituição Federal
(BRASIL, 1988) e no Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), ainda
se observa em nosso país a violação dos direitos desses sujeitos.
No trato da questão infracional, são necessários programas ou políticas que
promovam a reeducação e reinserção social dos adolescentes, de modo que a
aplicação de medidas socioeducativas não se torne um meio meramente
sancionatório e punitivo. “O objetivo de sistemas de justiça juvenil deve ser a
conciliação e a reintegração, orientando os jovens em direção à cidadania
responsável” (UNICEF, 2011, p.10).
A Vara Infracional da Infância e da Juventude de Belo Horizonte, por meio de ações
conjuntas, tem buscado oferecer um trabalho articulado nas diversas políticas
públicas que envolvem o atendimento ao adolescente autor de ato infracional, de
modo a cumprir o disposto no art. 88, inciso V do ECA (BRASIL, 1990), que versa
sobre a integração operacional dos órgãos envolvidos no atendimento ao
adolescente autor de ato infracional.
31
Em setembro de 2008, foi criada em Belo Horizonte a CIA/BH – Centro Integrado de
Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional. Esse centro, composto por
equipe interinstitucional, está constituído por representantes do Poder Judiciário,
Ministério Público, Secretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais,
Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, Polícia Civil do Estado de Minas
Gerais, Polícia Militar do Estado de Minas Gerais, Prefeitura de Belo Horizonte. A
implantação desse centro é um dos grandes avanços na política de atendimento ao
adolescente autor de ato infracional, que durante muito tempo foi marcada pelo
improviso.
A desarticulação entre os órgãos responsáveis pelo atendimento inicial ao
adolescente infrator era um dos principais fatores desencadeantes do
aumento da criminalidade envolvendo este público. Antes da criação do
CIA/BH, 60% dos adolescentes que eram processados na Justiça Juvenil,
apesar de devidamente citados, não compareciam para a audiência de
apresentação. Entre a prática do ato infracional e a intervenção da justiça
decorria-se um lapso temporal muito grande, tornando-se, na maioria das
vezes, ineficaz a aplicação de qualquer medida (TJMG, 2012).
Ressalta-se que o improviso no atendimento ao adolescente autor de ato infracional
tem raízes históricas. Vale lembrar que ainda temos resquícios da doutrina da
situação irregular, e as mudanças necessárias ainda não chegaram com a
efetividade necessária.
Dados da pesquisa realizada demonstram que grande parte das pessoas envolvidas
no processo de ressocialização do adolescente autor de ato infracional conhece as
medidas socioeducativas previstas no ECA, porém esse alto percentual de
conhecimento chama atenção para o fato de que há um descrédito quanto à
efetividade da aplicação das medidas. Isto demonstra a necessidade de maior
investimento dos órgãos responsáveis pelas medidas protetivas e socioeducativas
aplicadas às crianças e adolescentes brasileiros, principalmente de capacitação e
orientação a todos os sujeitos envolvidos no processo de cumprimento dessas
medidas.
32
GRÁFICO 1 – Medidas socioeducativas – ECA
Você conhece as medidas socioeducativas previstas no ECA?
15%
SIM
NÃO
85%
Fonte: Questionário aplicado aos gestores escolares da rede municipal de BH. Autoria própria.
Embora grande parte dos sujeitos tenha declarado conhecimento das medidas
socioeducativas, a mídia reforça que o ECA é um documento que apresenta
somente direitos. Essa situação talvez possa ser explicada pela pouca efetividade
dos órgãos responsáveis na correta execução e acompanhamento do cumprimento
das medidas socioeducativas. Isso faz com que a própria sociedade se sinta
insegura em reconhecer o ECA como instrumento que regulamenta também os
deveres.
33
3
POLÍTICA,
POLÍTICA
PÚBLICA
E
INTERSETORIALIDADE:
UMA
APROXIMAÇÃO CONCEITUAL
Segundo Frey (2000), a palavra política comporta várias dimensões que variam de
acordo com os conceitos atribuídos para as palavras inglesas policy, politics e polity:
Para a ilustração dessas dimensões, tem-se adotado na ciência política o
emprego dos conceitos em inglês de ‘polity’ para denominar as instituições
políticas, ‘politics’ para os processos políticos e, por fim, ‘policy’ para os
conteúdos da política (FREY, 2000, p. 216).
A dimensão institucional polity, para Frey (2000), refere-se à ordem do sistema
político, ou seja, é a estrutura institucional do sistema político-administrativo e é
delineada pelo sistema jurídico. Já a dimensão processual “politics” diz respeito ao
processo político de caráter conflituoso, em razão da imposição de objetivos aos
conteúdos e às decisões.
Os conteúdos concretos, ou seja, os programas políticos, o conteúdo das decisões
políticas na dimensão material que Frey (2000) denominou de ‘policy’ determinam a
perspectiva em que se fará o recorte desta pesquisa.
Apesar de as dimensões atribuídas pelo autor apresentarem características
independentes, na realidade política essas dimensões estão entrelaçadas e
influenciam-se mutuamente. Segundo Shubert (1991), citado por Frey (2000), “a
ordem política concreta forma o quadro, dentro do qual se efetiva a política material
por meio de estratégias políticas de conflito e de consenso” (SHUBERT, 1991 apud
FREY, 2000, p. 217).
Entretanto é importante discutir o conceito de política como resolução de conflitos
que, segundo Rua (1998), envolve coerção, mas que não se limita a ela.
De acordo com Rua (1998), “a política consiste no conjunto de procedimentos
formais e informais que expressam relações de poder e que se destinam à resolução
pacífica dos conflitos quanto a bens públicos” (RUA, 1998, p. 1).
34
Isso implica dizer que na base da política existem correlações de forças que são
marcadas por conflitos de interesses e compreendem um conjunto de decisões e
ações que envolvem poder, o qual pode ser exercido de diversas formas, fazendo
com que uma política venha a tornar-se pública, ou seja, de todos.
3.1 Políticas públicas
O conceito de políticas públicas, segundo Souza (2006), como área de
conhecimento e disciplina acadêmica, nasce nos EUA, enquanto que na Europa
surge como um desdobramento dos trabalhos sobre o papel do Estado:
Assim, na Europa, a área de política pública vai surgir como um
desdobramento dos trabalhos baseados em teorias explicativas sobre o
papel do Estado – o governo –, produtor, por excelência, de políticas
públicas. Nos EUA, ao contrário, a área surge no mundo acadêmico sem
estabelecer relações com as bases teóricas sobre o papel do Estado,
passando direto para a ênfase nos estudos sobre a ação dos governos
(SOUZA, 2006, p. 22).
No Brasil o tema surge com maior visibilidade a partir do final dos anos de 1980, em
razão do novo cenário político e econômico dos países em desenvolvimento e em
processo de democratização. De acordo com Souza (2006), alguns fatores
contribuem para maior visibilidade dessa área, tais como a adoção de políticas
restritivas de gasto, o ajuste fiscal e o fato de os países em desenvolvimento não
terem conseguido equacionar desenvolvimento econômico e promoção de inclusão
social de grande parte de sua população.
Uma política pública, segundo Rua (1998), envolve mais do que uma decisão e
requer diversas ações selecionadas para implementar as decisões tomadas:
A sua dimensão pública é dada não pelo tamanho do agregado social sobre
o qual incidem, mas pelo seu caráter ‘imperativo’. Isto significa que uma das
suas características centrais é o fato de que são decisões e ações
revestidas da autoridade soberana do poder público (RUA, 1998, p. 2).
O vínculo da política pública com o Estado diz respeito à responsabilidade com que
as políticas são desenvolvidas com vistas ao bem coletivo. Entretanto, não resta
dúvida que diversas forças sociais integram o Estado, e elas representam, muitas
vezes, posições antagônicas que podem acabar por privilegiar determinados
setores.
35
Segundo Pereira (2008),
Política pública não é sinônimo de política estatal. A palavra pública, que
sucede a palavra política, não tem identificação exclusiva com o Estado.
Sua maior identificação é com o que em latim se denomina de res publica,
isto é, res (coisa), publica (de todos), e, por isso, constitui algo que
compromete tanto o Estado quanto a sociedade (PEREIRA, 2008, p. 94).
Como não existe uma única definição para o termo, vale aqui mencionar uma das
questões mais conhecidas que permeiam o conceito de política pública, construída
por Laswell (1951): “decisões e análises sobre política pública implicam responder
às seguintes questões: quem ganha o quê, por quê e que diferença faz” (LASWELL,
1951apud SOUZA, 2006, p. 24).
Assim, ao buscar uma origem para as políticas públicas, seus marcos iniciais
estarão nos confrontos, nos problemas enfrentados por indivíduos ou grupos de
indivíduos que convivem em uma mesma sociedade, o que pode ser caracterizado
como a situação problema, ou seja, uma situação que incomoda e gera
insatisfações, podendo vir a ser, ou não, uma política pública.
O processo de formulação da política pública no contexto do Estado Democrático de
Direito é aquele em que se exigem compromissos da parte dos diversos setores
envolvidos, sejam eles públicos ou privados. Os atores públicos são aqueles que se
distinguem por exercer funções públicas e por mobilizar recursos associados a
essas funções. Estão representados, segundo Rua (1998), por políticos e
burocratas. Entre os atores privados, estão os empresários, que podem se
manifestar como atores individuais ou como atores coletivos. 10
Importante salientar que, no processo de elaboração das políticas públicas, outros
atores devem ser considerados pelo poder de influência que possuem: os agentes
internacionais de financiamento (Fundo Monetário Internacional - FMI, Banco
Mundial, entre outros) e a própria mídia com o poder de chamar atenção do público
para problemas diversos e de influir sobre as opiniões e valores da população.
Também os trabalhadores, com seu poder de organização, influenciam a partir do
maior ou menor poder de pressão. Portanto “política pública expressa, assim, a
10
Chamados também de grupos de pressão (Frente de Prefeitos, Empresários da Zona Franca de
Manaus, MST, ONGs, etc.).
36
conversão de demandas e decisões privadas e estatais em decisões e ações
públicas que afetam e comprometem a todos” (PEREIRA, 2008, p. 17).
A partir da participação popular, mesmo que de forma indireta, esboça-se um
instrumento de controle das ações do Estado por parte da sociedade – controle
entendido como integração da sociedade e administração pública com a finalidade
de solucionar problemas e as deficiências sociais com mais eficiência, eficácia e
efetividade.
Pode-se, então, resumir política pública como o campo do conhecimento
que busca, ao mesmo tempo, “colocar o governo em ação” e/ou analisar
essa ação (variável independente) e, quando necessário, propor mudanças
no rumo ou curso dessas ações (variável dependente). A formulação de
políticas públicas constitui-se no estágio em que os governos democráticos
traduzem seus propósitos e plataformas eleitorais em programas e ações
que produzirão resultados ou mudanças no mundo real (SOUZA, 2006. p.
26).
O Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) contempla os vários
direitos que deverão ser assegurados como forma de se garantir uma política
pública efetiva. Entretanto, tais direitos deverão ser garantidos em todos os níveis de
Poder, ou seja, as ações do Estado devem estar articuladas para essa efetivação.
Assim, em nível Federal, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos - SEDH/PR
articula as entidades que devem garantir a aplicação das leis referentes a crianças e
a adolescentes, as quais serão efetivadas pelos poderes públicos em suas
diferentes instâncias. A Constituição Federal (BRASIL, 1988) e o ECA (BRASIL,
1990) instalaram um sistema de proteção geral de direitos de crianças e
adolescentes, cujo intuito é a efetiva implementação da Doutrina da Proteção
Integral, denominada Sistema de Garantia de Direitos - SGD. No interior desse
sistema, existem diversos subsistemas que regem as políticas sociais voltadas para
esse atendimento. Nesse contexto é que se insere o Sistema Nacional de
Atendimento Socioeducativo - SINASE, o qual se comunica com e sofre interferência
dos demais subsistemas.
Se a política está proposta a partir de sistemas, eles devem estar articulados para
efetivação das políticas públicas, garantindo a participação popular, que, no
37
atendimento ao adolescente, tem-se dado principalmente por meio dos conselhos 11
(tutelares, da criança e adolescente). Essa participação tem aproximado a
administração pública dos cidadãos, porém essa relação nem sempre é harmônica
em razão das limitações e especificidades da administração pública, da falta de
integração de suas ações e, muitas vezes, da falta de competência e conhecimento
técnico acerca das políticas e também dos problemas.
Contudo, é importante salientar que a efetividade da política pública só se dará
mediante ações conjuntas entre o Estado e a sociedade. A participação da
sociedade é de extrema importância na formulação das políticas, e é desse tema
que trataremos a seguir.
3.2 Políticas públicas e intersetorialidade
Para discorrer sobre o conceito de intersetorialidade é necessário entender as
correntes teóricas acerca do tema, uma vez que no Brasil o tratamento dado às
questões sociais não é o mesmo aplicado às outras áreas.
Segundo Bronzo (2007), a discussão conceitual acerca da intersetorialidade é um
desafio, considerando que, na agenda pública, o termo está mesclado com outros
termos, o que dificulta os limites e distinções entre eles.
Como a discussão acerca do tema terá ênfase nas políticas voltadas para o
atendimento socioeducativo aos adolescentes em conflito com a lei, a questão da
pobreza será um ponto constante nas discussões, uma vez que grande parte dos
adolescentes em conflito com a lei é oriunda das classes sociais mais vulneráveis,
conforme dados do mapa da violência no Brasil. Esse recorte é necessário para que
possamos compreender os desafios da intersetorialidade no atendimento à
população jovem.
11
Os Conselhos Tutelares surgiram com a criação da Lei n. 8069/90. No Brasil, os Conselhos
Tutelares são órgãos municipais destinados a zelar pelos direitos das crianças e adolescentes. Sua
competência e organização estão previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente. Os Conselhos
dos Direitos da Criança e do Adolescente são órgãos deliberativos responsáveis por assegurar, na
União, nos estados e nos municípios, prioridade para a infância e a adolescência (BRASIL, 1990).
38
O relatório sobre a situação da adolescência brasileira de 2011 aponta que os 21
milhões de adolescentes representam para o país um quadro singular de energias e
possibilidades. “Afinal, o Brasil nunca teve e não voltará a ter tão grande população
de adolescentes em sua história” (UNICEF, 2011). Entretanto, esse mesmo relatório
pontua que o Brasil não será um país de oportunidades para todos enquanto houver
desigualdade, seja pela cor, raça, etnia, grau de instrução, sexo, condição social etc.
“Enfrentar as desigualdades e reduzir as vulnerabilidades é, portanto, uma tarefa
urgente” (UNICEF, 2011).
O enfrentamento a essas questões não é tarefa fácil e só poderá ser feito por meio
de políticas públicas universais para todos os adolescentes e políticas específicas no
combate à discriminação e redução das desigualdades e vulnerabilidades.
Uma das formas de enfrentamento desse cenário será por meio de ações
intersetoriais e, ainda que não haja um conceito preciso para o termo, a grafia da
palavra12 permitirá uma primeira aproximação a partir da ideia de interação mútua,
complementar e interativa. “A perspectiva da integralidade constitui a base da
intersetorialidade e, no caso da pobreza, uma compreensão ampliada do fenômeno
exige um olhar pautado pela integralidade” (BRONZO, 2007, p. 9).
Outro conceito necessário a essa discussão diz respeito ao que se entende por
setor: pode-se dizer que são atividades que são desenvolvidas por meio das ações
do Estado nas diversas áreas: saúde, educação, planejamento urbano etc. A
estruturação e a hegemonia dos setores passa a ser então o grande desafio, uma
vez que, no exercício das atividades de cada setor, há conflitos de interesses,
(in)disponibilidade financeira, ideias e estratégias diferenciadas e, em algumas
vezes, divergência quanto à orientação da política pública a ser implementada.
Desse modo, a intersetorialidade das políticas públicas passa a ser um requisito
para implementação das políticas setoriais, uma vez que não se observa uma
efetividade dessas políticas no atendimento das demandas da população.
12
Por se tratar de uma palavra composta pelo prefixo Inter, mais o sufixo setorialidade, vamos
trabalhar com a noção de interação mútua entre vários setores.
39
Neste sentido, a intersetorialidade na gestão pública significa adotar uma
decisão racional no processo de gestão, cuja aplicação pode ser positiva ou
não. Ela não pode ser considerada antagônica ou substitutiva da
setorialidade, mas complementar, ou seja, deve-se realizar uma
combinação entre política setorial com intersetorial, e não contrapô-las no
processo de gestão (SPOSATI, 2006, p. 134).
No campo das medidas socioeducativas e em consonância com o SINASE (BRASIL,
2006a) e ECA (BRASIL, 1990), a intersetorialidade deve obedecer ao princípio da
convergência de esforços para a ação em determinada situação. Em linhas gerais,
percebe-se que anteriormente ao ECA não havia políticas públicas que iam ao
encontro dos jovens, restando a eles o engajamento em políticas de atendimento às
diversas faixas etárias.
Somente a partir dos anos de 1990, com um maior engajamento da sociedade civil e
dos movimentos sociais caracterizando uma pressão popular, as várias instâncias
de Poder são mobilizadas. Entretanto, a implantação de políticas é produto de
conflitos em torno do destino de recursos públicos quase sempre limitados. Esse é o
caso das políticas criadas com base em temáticas, e onde se insere a política – ou a
sua falta – de atendimento ao jovem.
Nesse cenário marcado pelo conflito, porém na concepção ampliada de direitos,
alguns setores da sociedade brasileira passaram a discutir políticas de atendimento
para os adolescentes, sobretudo para aqueles em processo de privação de direitos.
Segundo o relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância- UNICEF (2011), o
percentual de adolescentes brasileiros de 12 a 17 anos que vivem em famílias de
extrema pobreza (até um quarto de salário mínimo per capita) cresceu entre 2004 e
2009. De acordo com o relatório Situação da Adolescência Brasileira 2011, o
percentual passou de 16,3% para 17,6%. No mesmo período, a situação de extrema
pobreza da população em geral caiu de 12,4% para 11,9% (UNICEF, 2011). Isso
mostra que os adolescentes são mais vulneráveis que outros segmentos da
população, estando expostos ao trabalho precário, dependência química, abuso
sexual e violência física (entre elas, o homicídio). Além disso, o relatório aponta que,
40
em relação às desigualdades entre os adolescentes, há os que sofrem as maiores
violações aos seus direitos.
O direito à educação, premissa básica para o desenvolvimento do ser humano,
ainda é um dos grandes desafios a serem vencidos, e estudos recentes mostram
que o número de adolescentes autores de ato infracional fora da escola é bem alto.
A interface, intersetorialidade e articulação política passam, então, a ser
determinantes no atendimento socioeducativo, já que as políticas setoriais precisam
atender a população naquilo que lhe é assegurado no arcabouço jurídico. Ações
intersetoriais serão complementares e não substitutivas no processo da gestão do
sistema socioeducativo, conforme prevê o SINASE.
Para tanto, os Conselhos de Direitos (Nacional, Estaduais e Municipais) da Criança
e do Adolescente, bem como os órgãos gestores do SINASE, devem articular-se
com os demais sistemas e políticas sociais para o desenvolvimento de ações
integradas. Entre outras ações que podem favorecer essa articulação, destacam-se:
a)
b)
Estímulo à prática da intersetorialidade;
Campanhas conjuntas destinadas à sociedade em geral e aos
profissionais da área, com vistas à concretização de Doutrina de Proteção
Integral adotada pelo ECA;
c)
Promoção de discussões, encontros, seminários (gerais e temáticos)
conjuntos;
d) Respeito às competências e atribuições de cada ente federativo e de
seus órgãos, evitando-se a sobreposição de ações;
e) Discussão e elaboração com os demais do Poder Público para
expedição de atos normativos que visem ao aprimoramento do sistema de
atendimentos;
f)
Expedição de resoluções conjuntas, disciplinando matérias
relacionadas à atenção a adolescentes inseridos no SINASE (BRASIL,
2006a).
Percebe-se, a partir dessas ações, a necessidade de uma dinâmica pluridimensional
a partir da qual os diferentes operadores públicos e também a sociedade devem
atuar para um efetivo processo de intervenção, que terá mais eficazes resultados
quanto mais participativo for e envolver a comunidade local. Neste sentido, a
intersetorialidade articula-se de forma mais ampla com novas perspectivas no âmbito
da gestão pública e, principalmente, no campo da gestão social (BRONZO, 2007).
41
Para além da integração das políticas de atendimento, é necessário universalizá-las
para realizar os direitos de cada um e de todos os adolescentes brasileiros.
3.3 Políticas Públicas e Gestão Social
Para um adequado entendimento do tema da gestão social, é preciso saber as
dimensões desse conceito que, no senso comum, é entendido como uma gestão
voltada para o social. Entretanto, entender o conceito somente na perspectiva da
finalidade seria restringir, ou mesmo banalizar, o que o conceito de fato pode
exprimir. Outro perigo seria utilizar o termo para identificar tudo aquilo que não é
gestão tradicional ou estratégica, ou seja, o conceito entendido na perspectiva de
meio, como processo de gestão.
Por se tratar de um conceito complexo, é preciso discutir a interação humana em
sua construção com a percepção de que necessariamente envolve dois níveis:
societário e organizacional, ou seja, o conceito de gestão social deve absorver tanto
a dimensão de processo quanto da finalidade:
Nesta forma de compreensão, o termo gestão social acaba confundindo-se
com a própria ideia de gestão pública, pois a gestão das demandas e
necessidades do social sempre fora atribuição típica do Estado na
modernidade, através das chamadas políticas públicas, especialmente as
políticas sociais. Entretanto, se a gestão das demandas e necessidades do
social sempre fora uma atribuição típica dos poderes públicos na
modernidade, isto nunca significou exclusividade. O termo gestão social
vem sugerir assim que, para além do Estado, a gestão das demandas e
necessidade do social pode se dar via a própria sociedade, através das
suas mais diversas formas e mecanismos de auto-organização,
especialmente o fenômeno associativo (FRANÇA FILHO, 2003).
Essa interação, para o autor, está relacionada à ampliação das Parcerias PúblicoPrivadas - PPPs e à presença mais direta de organizações não governamentais na
formulação das políticas públicas e na gestão de políticas sociais.
Para Tenório (2008), o conceito de gestão social está associado à gestão de
políticas sociais de forma dialogada, compartilhada entre os participantes da ação:
Entenderemos gestão social como o processo gerencial dialógico onde a
autoridade decisória é compartilhada entre os participantes da ação (ação
que possa ocorrer em qualquer tipo de sistema social-público, privado ou de
organizações não governamentais). O adjetivo social qualificando o
substantivo gestão será entendido como o espaço privilegiado de relações
sociais onde todos têm o direito à fala, sem nenhum tipo de coação
(TENORIO, 2008, p. 39).
42
Com o advento da Constituição Federal de 1988 e a partir dos anos de 1990, há um
incremento na participação social na gestão das políticas públicas por meio dos
conselhos gestores de políticas públicas. Assim, o atual contexto da gestão social
exige que as instituições responsáveis pelos programas redimensionem as ações
buscando cada vez mais a participação dos sujeitos envolvidos nas decisões e
ações das diversas políticas públicas.
Ao se fazer a defesa pela participação e envolvimento da sociedade na gestão das
políticas públicas, não se isenta o Estado do seu papel de gestor de serviços
públicos. Defende-se a gestão social como modo de gestão próprio das
organizações e da sociedade civil, esta como esfera pública de ação que não é
pública estatal.
Fischer (2002) entende que a gestão social pode ser praticada tanto no âmbito
público quanto privado, tendo como objetivo fundamental o desenvolvimento social,
seja em nível micro ou macro, uma vez que a gestão sempre se orienta para a
mudança e para o desenvolvimento.
Ao se discutir o conceito de gestão social ou a sua construção, remete-se sempre à
discussão de espaço coletivo, complexo e que demanda interação entre diferentes
setores. Nesse aspecto, cabe salientar que o SINASE, por ser um sistema,
pressupõe para seu efetivo funcionamento articulação e integração entre os vários
setores da sociedade e do Estado, este como gestor de serviços públicos.
Cabe ao Estado, gestor do serviço, articular os diversos segmentos envolvidos no
campo do atendimento socioeducativo para que, de fato, a medida socioeducativa
não seja apenas uma resposta retributiva ao ato infracional praticado pelo
adolescente, mas que possa também representar uma intervenção educativa que
favoreça a reinserção sociocultural do adolescente autor de ato infracional.
Como bem dispõe o artigo 88 do ECA (BRASIL, 1990) no que tange às diretrizes da
política de atendimento, é preciso integração interinstitucional com o objetivo de
agilizar e dar maior efetividade à jurisdição penal juvenil. Isso já vem acontecendo
desde 2008 com a criação do Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente
43
Autor de Ato Infracional - CIA, que, no mesmo espaço físico, compreende vários
órgãos de atuação, dando efetividade à política de atendimento.
Também os conselhos gestores desempenham papel importante na articulação das
políticas, em especial as políticas de atendimento aos adolescentes, objeto desta
discussão, a partir do Sistema de Garantia de Direitos - SGD. O grande desafio
ainda é a pouca participação popular nas discussões das políticas públicas para
identificar e eleger as prioridades da comunidade.
Belo Horizonte tem uma longa história de participação popular na gestão da cidade.
Vários canais de participação estão abertos, entre eles Conferências Municipais
temáticas, Fóruns de discussão, Audiências Públicas, Conselhos Escolares,
Orçamento Participativo, etc. Porém, de nada adiantará a existência desses canais
se não houver participação popular.
Em 2012 foi lançado pela Prefeitura de Belo Horizonte o Portal de Gestão
Compartilhada (BELO HORIZONTE, 2012c), que é mais um espaço de informação e
participação do cidadão. Entretanto, é preciso ampliar a participação cidadã e
fortalecer os instrumentos de controle social para que possamos de fato fazer da
política pública uma política republicana, no sentido etimológico da palavra, res
publica, coisa pública, de e para todos.
44
4 METODOLOGIA
Uma das grandes discussões acerca da violência envolvendo adolescentes em
conflito com a lei diz respeito à sua não responsabilização. Entretanto esta pesquisa
parte do princípio de que os adolescentes autores de ato infracional já foram
sentenciados e estão em processo de cumprimento de medida socioeducativa, ou
seja, já houve a responsabilização pelo ato infracional.
De acordo com o SINASE, a execução das medidas socioeducativas deve acontecer
de forma integrada e articulada entre Estado, como gestor da política, e a sociedade
civil, em uma perspectiva educativa e não punitiva. Essa articulação fundamenta a
incompletude institucional e, nesse aspecto, esta pesquisa abordará como acontece
a execução da medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade no
interior das escolas da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte.
A prestação de serviços à comunidade é uma das medidas a serem cumpridas pelo
adolescente autor de ato infracional após sentença expedida pelo juizado da infância
e adolescência. Por se tratar de uma medida a ser cumprida em “meio aberto”, um
dos espaços para sua execução é a escola. Dessa forma, o processo investigativo
desta pesquisa centrou-se no interior das escolas procurando analisar suas
dinâmicas e práticas institucionais e a interface com as outras políticas no
atendimento ao adolescente autor de ato infracional.
Optamos pela abordagem qualitativa alicerçada na pesquisa social, pois a pesquisa
qualitativa, segundo Minayo (2011), responde a questões muito particulares da
realidade que não podem ou não devem ser quantificadas, pois
ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações,
das crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos
humanos é entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser
humano se distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por
interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com
seus semelhantes (MINAYO, 2011, p. 20).
A escolha por essa metodologia vai além da tentativa de descrever como têm sido
as dinâmicas e práticas institucionais das escolas da Rede Municipal de Educação
de Belo Horizonte que recebem adolescentes autores de ato infracional para
45
cumprimento de medida socioeducativa de PSC, visto que buscará explicar se tais
práticas estão em consonância com o SINASE.
Para analisar as dinâmicas e práticas institucionais das escolas que se constituem
como local de prestação de serviço à comunidade para adolescentes sentenciados a
essa medida socioeducativa no município de Belo Horizonte, definiu-se pelas
escolas que integram a Rede Municipal de Ensino e, dentre essas, optou-se por
cinco escolas municipais da Regional Barreiro, sendo uma escola de cada território
dessa regional. Elas foram selecionadas com base no critério da territorialidade e
classificação valorativa definida pela Secretaria Municipal de Educação.
A escolha dessa regional se deu em razão da experiência profissional da
pesquisadora como gestora educacional na região durante oito anos e por ser o seu
local de residência. Outro fator importante e que merece ser compartilhado é o fato
de, mesmo afastada da escola e hoje atuar na Secretaria Municipal de Educação,
perceber que os mesmos desafios enfrentados pelos gestores escolares nos anos
de 1999 e seguintes são, em grande parte, os mesmos de hoje.
Estabelecida a delimitação geográfica, iniciou-se a pesquisa com o envio de um
questionário a todas as 27 escolas da Regional Barreiro para conhecimento prévio
das que recebem ou já receberam adolescentes para cumprimento da medida
socioeducativa de PSC.
A partir do diagnóstico, cinco escolas foram selecionadas para atuação da
pesquisadora. A seleção teve como critério a territorialidade e o público atendido.
46
FIGURA 2 – Mapa 1: Regional Barreiro e sua divisão territorial
Fonte: GINED/2012 (BELO HORIZONTE, 2012c).
FIGURA 3 – Mapa 2: Regional Barreiro e escolas selecionadas para a pesquisa
Fonte: PRODABEL/2012 (BELO HORIZONTE, 2012c).
47
4.1 O universo da pesquisa
Com base no universo total de escolas da RMEBH (188), delimitou-se
geograficamente a Regional Barreiro. A escolha deu-se primeiramente por ser esta a
terceira maior regional administrativa em número de escolas municipais, sendo
formada por 28 unidades escolares. Da totalidade de escolas, 20 desenvolvem o
programa Escola Aberta13 que oferece oficinas educativas à população nos finais de
semana, e é para onde a maioria dos adolescentes em cumprimento de medida
socioeducativa de PSC dessa regional é encaminhada. O programa Escola
Integrada também prevê a ampliação da jornada do aluno na escola ou em
entidades parceiras que oferecem oficinas de lazer, esporte e dança, entre outras, e
é oferecido em 26 escolas municipais da regional. Foi diagnosticada por meio desta
pesquisa a inserção de adolescentes cumprindo medida socioeducativa nesses dois
programas.
O processo inicial do campo investigado foi por meio da aplicação de questionário
nas 26 escolas de ensino fundamental dessa regional. Das 28 escolas, uma não foi
objeto de pesquisa por se tratar de escola que oferece somente educação infantil, e
a outra, por não oferecer ainda os projetos Escola Integrada e Escola Aberta.
Realizaram-se também entrevistas com as pessoas diretamente ligadas ao processo
de
encaminhamento
e
acompanhamento
desses
adolescentes.
Todos
os
entrevistados estão ligados à Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social
e/ou à Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte. Os sujeitos que
responderam ao questionário também fazem parte do quadro efetivo da área de
Assistência Social e/ou Educação e atuam na Prefeitura de Belo Horizonte. Por se
tratar de sujeitos distintos, mais à frente será apresentada sua caracterização.
Nas entrevistas semiestruturadas realizadas, buscou-se identificar as dinâmicas e as
práticas institucionais das escolas da rede municipal de Belo Horizonte, bem como
os
13
órgãos
responsáveis
pelo
encaminhamento
e
acompanhamento
dos
O Programa Escola Aberta incentiva e apoia a abertura, nos finais de semana, de unidades
escolares públicas localizadas em territórios de vulnerabilidade social. A estratégia potencializa a
parceria entre escola e comunidade ao ocupar criativamente o espaço escolar aos sábados e/ou
domingos com atividades educativas, culturais, esportivas, de formação inicial para o trabalho e
geração de renda oferecidos aos estudantes e à população do entorno (BRASIL, 2010).
48
adolescentes autores de ato infracional em cumprimento da medida socioeducativa
de PSC.
As entrevistas realizadas permitiram perceber questões que não foram identificadas
nos questionários aplicados e que contribuíram para a conclusão desta pesquisa. Os
sujeitos participantes da entrevista semiestruturada apontaram que não há uma
prática única, comum, nas escolas acerca do trabalho desenvolvido com os
adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa. Tanto os professores
quanto o grupo de gestores apontaram como dificuldade a falta de orientação e
integração das instituições responsáveis pelo programa socioeducativo, o que será
mostrado oportunamente.
Quanto aos questionários, o uso desse instrumento nos permitiu fazer uma análise
interna das escolas, identificando como se dá a prática da medida socioeducativa de
PSC no interior das que foram analisadas. Dos 26 questionários enviados, 13 foram
devolvidos respondidos pela direção ou vice-direção da escola.
Após a realização das entrevistas e questionários, foi feita observação livre em
algumas
escolas
onde
havia
adolescentes
em
cumprimento
de
medida
socioeducativa de PSC nos finais de semana. Muito embora o campo de pesquisa
naquele momento fosse destinado à observação livre, foram constantes as
conversas informais da pesquisadora com os adolescentes.
Todos os dados obtidos por meio dos instrumentos já citados e também a partir da
experiência de vivenciar o cotidiano desses adolescentes nos possibilitaram a
construção de uma proposta de um curso de capacitação para os gestores escolares
de modo a contribuir para melhoria das dinâmicas e práticas institucionais com base
na realidade pesquisada.
A discussão, categorização e a análise dos dados foram feitas contextualizando a
prática do programa de PSC a partir do referencial teórico trabalhado e o marco
regulatório que ampara a temática.
49
5 CARACTERIZAÇÃO E DISCUSSÃO DO PSC NAS ESCOLAS DA REDE
MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
A partir da sentença proferida pelo juiz, inicia-se o processo de cumprimento da
medida ou fase de execução. Entretanto, essa fase nem sempre acontece com a
celeridade necessária em razão dos vários órgãos nela envolvidos. Assim, é comum
acontecer de um adolescente ter recebido uma sentença anteriormente a outro
adolescente (também sentenciado), este último já ter iniciado o processo de
execução, e o outro ainda estar aguardando para cumprimento.
5.1 PSC: Do encaminhamento ao cumprimento
O SINASE é o documento legal que traz todas as diretrizes para aplicação das
medidas socioeducativas. Tendo a medida socioeducativa de PSC que ser cumprida
em meio aberto, uma das possibilidades desse cumprimento pelo adolescente autor
de ato infracional é o seu encaminhamento às escolas.
De acordo com um levantamento feito na Gerência Regional de Educação Barreiro,
todos os adolescentes autores de ato infracional encaminhados para as escolas
passam primeiro pela Regional e, a partir daí, são encaminhados para as escolas.
Entretanto, o primeiro contato do adolescente já sentenciado é com o órgão
responsável pelo cumprimento da medida, ou seja, a Secretaria Adjunta de
Assistência Social.
Eles chegam na escola depois que eles são encaminhados pela assistência.
A gente tem conhecimento. Eles passam aqui, mas quem leva para a escola
é a assistência social através dos técnicos que acompanham. É assim.
14
(Informante 9 ).
A prática de encaminhamento de adolescentes para cumprimento de medida
socioeducativa em escolas é realizada desde o ano de 1998. Com base nos
questionários15 respondidos, as escolas receberam em média três adolescentes
para cumprimento de medida socioeducativa. Três escolas receberam de quatro a
seis adolescentes, e somente duas escolas receberam entre sete e dez
14
15
Detalhamento sobre os informantes pode ser verificado no Apêndice A.
Vide Apêndice D.
50
adolescentes. Para a coordenadora do programa e técnica de referência da
Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social - SMAAS, esse número é maior e
só não apareceu pelo fato de nem todas as escolas terem respondido ao
questionário. Atualmente há na regional quatro técnicas da assistência social
trabalhando em média, cada uma, com 18 adolescentes autores de ato infracional.
Esse número de técnicos acompanha uma média de 72 casos de adolescentes em
situação de vulnerabilidade social que precisam de alguma forma estar inseridos no
Sistema de Garantia de Direitos (SGD) conforme preconiza o SINASE.
Nós somos quatro para o Barreiro todo para o atendimento social:
educação, saúde, assistência. A gente está com uma média de 18 casos
por técnico (Informante 10).
GRÁFICO 2 – Número de adolescentes que cumpriram medida socioeducativa na
escola no período de 2009 a 2012
No período de 2009 a 2012, quantos adolescentes em cumprimento
de medida socioeducativa de PSC a escola recebeu?
ATÉ 3 ADOLESCENTES
15%
DE 4 A 6 ADOLESCENTES
DE 7 A 10 ADOLESCENTES
23%
62%
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
No decorrer da investigação, percebeu-se que a discussão da temática com o
coletivo de professores da escola ainda não é uma prática. A pesquisa demonstrou
que os professores são informados da presença desses adolescentes, porém não
participam do processo de discussão e sua inserção nas atividades cotidianas da
escola.
51
GRÁFICO 3 – A gestão do programa e o coletivo da escola
Ao receber um adolescente para cumprimento de medida socioeducativa de PSC
na escola, o coletivo de professores da escola é informado?
46%
54%
Sim
Não
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
A implementação do SINASE tem como objetivo principal uma ação pedagógica, na
qual há prevalência da ação socioeducativa sobre o caráter sancionatório. Essa
dimensão educativa foi demonstrada em algumas escolas onde as atividades
atribuídas aos adolescentes estavam voltadas para uma formação ética, educativa.
Em outros espaços, essa prática não foi verificada e estava marcada pelo improviso
das ações. Percebe-se que as escolas precisam avançar nas ações, tendo como
base o eixo estratégico do suporte institucional e pedagógico previstos nos
parâmetros socioeducativos do SINASE.
É fundamental que o adolescente ultrapasse a esfera espontânea de
apreensão da realidade para chegar à esfera crítica da realidade,
assumindo conscientemente seu papel de sujeito. Contudo, esse processo
de conscientização acontece no ato de ação-reflexão. Portanto, as ações
socioeducativas devem propiciar concretamente a participação crítica dos
adolescentes na elaboração, monitoramento e avaliação das práticas
sociais desenvolvidas, possibilitando, assim, o exercício – enquanto sujeitos
sociais – da responsabilidade, da liderança e da autoconfiança (BRASIL,
2006a, p. 47).
52
GRÁFICO 4 – Perspectiva de diálogo entre os sujeitos
Há debate entre os professores sobre o que fazer?
15%
SIM
NÃO
85%
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
No encontro com os adolescentes em cumprimento da medida de PSC, buscou-se
observar suas práticas e como as atividades eram absorvidas por eles. Pôde-se
perceber em alguns deles certo distanciamento; em outros, uma satisfação, ainda
que o momento para eles fosse de “cumprimento do que o juiz mandou” (Fala do
adolescente).
Segundo Craidy (2005),
[...] se desejarmos fazer um trabalho mais sério em relação aos
adolescentes que praticam ato infracional, é indispensável a implantação de
um sistema unificado de informações que integre os diferentes órgãos do
sistema de justiça e de aplicação das medidas socioeducativas, e que todos
utilizem os mesmos critérios de anotação. Tal providência permitiria seguir o
percurso do adolescente e conhecer suas características formando um
consenso que inspire uma política não apenas de repressão ao crime, mas
de promoção da juventude (CRAIDY, 2005, p. 25).
Observando a prática dos adolescentes, verificou-se que muitos deles são
moradores da região ou do entorno e conhecem os outros adolescentes da escola e
crianças que frequentam os projetos escolares nos finais de semana. Para esses
adolescentes, estar naquele espaço para cumprimento da medida foi opção deles.
A inserção social é um dos fatores preponderantes do programa. Esse aspecto será
mostrado nos itens a seguir por meio dos relatos e da análise das práticas
institucionais.
53
5.2 A execução da medida de PSC no interior das escolas
O SINASE, situado no interior do SGD,16 prevê que o atendimento socioeducativo
seja feito de maneira articulada com várias secretarias, de modo que as ações
referentes aos direitos do adolescente sejam de responsabilidade também de cada
um dos órgãos da política setorial. Assim, a Secretaria Municipal de Educação SMED e a Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social - SMAAS devem
prever ações conjuntas para esse atendimento.
No conjunto de articulações, a pesquisa revelou que há pouco diálogo entre as
secretarias e, nesse universo, as escolas se consideram desamparadas pelos
órgãos gestores do programa na execução das atividades com esses adolescentes.
Setenta e sete por cento dos entrevistados disseram que já ouviram falar do
SINASE, entretanto falta debate sobre o que fazer com esses adolescentes.
GRÁFICO 5 – Conhecimento sobre o SINASE
Você já ouviu falar no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo?
23%
SIM
NÃO
77%
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
Não há objetivos definidos na escola não. Muitas vezes o adolescente é
olhado com preconceito por todos os que mantêm algum contato com ele.
Eu não conheço o SINASE (Informante 6).
O objetivo principal é que ele se perceba como uma pessoa capaz de
participar de um processo onde todos trabalham, cumprem um papel
importante para si mesmo, bem como para a comunidade, sabe e, além
disso, é que ele aprenda e construa uma série de habilidades importantes
para o seu crescimento, é, aí, sobre cumprir horário, ser respeitoso com as
pessoas, ter responsabilidade com o trabalho, é isso (Informante 8).
16
Ver capítulo 1.
54
Acho que ele cumpre as atividades dentro do tempo e dos horários, mas
não percebo que haja algum envolvimento sabe, com a escola, que permita
contribuir de forma tão significativa quanto deveria para a formação do
adolescente. Acho que não (Informante 5).
O desafio aí primeiro, né, as escolas, vou falar da nossa experiência: não
fomos instruídos desse processo, como é que recebe, como lidar com esses
adolescentes, então foi usada a experiência, né, experiência que a gente
tem com outros meninos, experiência que a gente tem no dia a dia na
educação e alguns relatos. Acho que o desafio seria primeiro preparar as
escolas para estar recebendo, elas não são preparadas, chega com o
adolescente e oferece. Como que podemos inserir? Então primeiro teria que
ter uma proposta mais clara, colocar a questão dos procedimentos, como
lidar com os adolescentes, como desenvolver o projeto com ele, que ele
está aqui, etc. Então não é muito bem claro, bem feito isso não. Eu acho até
que é por isso que é adesão, que a pessoa pode escolher ou não querer
porque de repente as pessoas pensam: ah, vou estar recebendo um
marginal na minha escola, vai influenciar meus alunos, porque eles não tem
uma definição clara do programa (Informante 1).
Na articulação das políticas, ou seja, a intersetorialidade, os entrevistados apontam
fragilidades:
Não sei se tem alguma coisa articulada. Acredito que a gerência faz esse
comunicado com o conselho tutelar, deve fazer também com o pessoal do
Família Escola né ? (Informante 1).
Acho que acontece com os conselhos tutelares e outros poderes, além de
ONGs. Eu vejo assim (Informante 3)
Acho que não há articulação né? A escola procura intuitivamente ajudar o
jovem na sua reinserção” (Informante 2)
Acredito que sim, seria o Família Escola? Isso é pegadinha??? (Informante
7).
Percebo que a escola fica bastante isolada nesta ação e as alianças com o
conselho tutelar, por exemplo, deixam bem a desejar (Informante 5).
Essa forma de realizar o atendimento ao adolescente na escola é uma
forma de parceria, não é? Outras existem também. Posso falar desta escola
que tem parceria entre a escola e várias outras instituições no atendimento
dos adolescentes, sabe, a Secretaria Municipal de Assistência Social com
seus programas, a Secretaria de Esportes e Lazer, a da Cultura, a
Fundação Municipal de Cultura, a Secretaria de Saúde e outras que não
estou lembrando (Informante 8).
De acordo com os dados do questionário, o acompanhamento desses adolescentes
é feito principalmente pela direção escolar. Os coordenadores pedagógicos quase
não participam do processo de discussão e/ou acompanhamento, o que dificulta de
fato a inclusão dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa com o
coletivo de estudantes e o corpo docente. Percebe-se também que, embora
constasse no questionário apresentado, a opção professor não foi marcada por
nenhum dos informantes. Essa falta de integração entre os diversos órgãos e
sujeitos envolvidos no processo de cumprimento da MSE dificulta o avanço do
55
programa que tem na intersetorialidade e na interinstitucionalidade suas premissas
básicas.
Na escola ficou determinado que não seria da competência do coordenador
pedagógico tratar das questões dos atendidos por medida socioeducativa
(Informante 2).
Nos casos que nós tivemos aqui, o coordenador pedagógico não foi
envolvido (Informante 1).
No caso do coordenador pedagógico, ele deve acompanhar e informar a
quem de direito o desenvolvimento e comportamento do aluno, quer dizer,
desse menino infrator (Informante 6).
Na prática, o coordenador só monitora este atendimento; o resto, as demais
orientações ao adolescente ou aos outros profissionais envolvidos são
encaminhados para a direção da escola (Informante 5).
Na escola, essa pessoa poderia ser o coordenador pedagógico, mas nem
sempre era. O papel de todos os profissionais da escola é igualmente o
mesmo de acolher com respeito aquele adolescente e contribuir para o
desenvolvimento dele (Informante 8).
Na escola a gente chama essa pessoa que vai acompanhar de educador de
referência. Nem sempre vai ser o diretor da escola, pode ser alguém da
área de educação física, da secretaria, da biblioteca... e aí, com isso, as
atividades são também diversas, né? O diretor é ele que autoriza, mas nem
sempre é ele que é o educador de referência, não é sempre que é ele que
acompanha. É o que eu já te falei, são os bibliotecários, os professores de
educação física, cantineiro, porteiro, zelador (Informante 10).
GRÁFICO 6 – Coordenação das atividades dos adolescentes em cumprimento de
medida socioeducativa
Quem coordena as atividades desses adolescentes na escola?
10%
20%
65%
5%
DIREÇÃO
COORD. PEDAGÓGICA
COORD. ESCOLA ABERTA
PROFESSOR
OUTROS
17
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
17
Na legenda foi mantida a opção professor, pois era uma das possibilidades de resposta no
questionário enviado às escolas.
56
Ainda discutindo o aspecto pedagógico, o programa de execução da medida de PSC
pressupõe um planejamento político-pedagógico em prol de um atendimento
adequado e que propicie o pleno desenvolvimento dos adolescentes como sujeitos
de direitos. Nesse aspecto, a pesquisa revelou que os adolescentes estão inseridos
em diversas atividades nas escolas, algumas pedagógicas, outras com caráter mais
punitivo. Percebe-se que um grande número de adolescentes (21%) encontra-se
realizando outras atividades (gráfico a seguir). Talvez o improviso, a falta de
metodologia e estratégias adequadas a respeito das práticas e dinâmicas das
escolas no recebimento dos adolescentes autores de ato infracional tenham
colaborado para esse índice.
O SINASE prevê parâmetros para o cumprimento da medida socioeducativa
potencializando a competência pessoal, relacional, cognitiva e produtiva do
adolescente. Entretanto, a pesquisa demonstrou que nem sempre esses parâmetros
são de fato o norte da medida de PSC, que tem em seu rol de diretrizes a
prevalência da ação socioeducativa sobre os aspectos meramente sancionatórios.
Chamou muita atenção o fato de que, apesar de os adolescentes estarem
cumprindo medida socioeducativa nas escolas, muitos deles não estarem
frequentando a escola regular. Em conversa, disseram que “o juiz mandou fazer a
matrícula, mas eles não foram porque só tem menino pequeno lá”.
Durante a realização das entrevistas, e até mesmo por meio dos dados revelados
nos questionários, não ficou evidenciado um planejamento das ações e consequente
monitoramento e avaliação de todo o processo de execução da medida
socioeducativa de PSC nas escolas. Embora os sujeitos da pesquisa sejam
receptivos ao projeto de inserção desses adolescentes para cumprimento de MSE
nas escolas, ainda é bastante frágil a forma como isso vem acontecendo.
O gráfico abaixo ilustra essa situação, visto que um número baixo de adolescentes
se encontra em atividades de fato pedagógicas. Percebe-se que a dimensão
sancionatória ainda se faz bastante presente nas ações no interior das escolas. As
atividades esporte, lazer e apoio pedagógico, que prioritariamente deveriam ser
exploradas por serem de fato condizentes com a idade desses adolescentes, é
inferior às atividades de manutenção e limpeza, o que caracteriza uma abordagem
mais punitiva.
57
GRÁFICO 7 – Tipos de atividades direcionadas aos adolescentes em cumprimento
de MSE
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
Chama-nos atenção uma resposta dada para uma atividade classificada como
“outros”. Nos questionários, elas foram apontadas pelos diretores como atividades
relacionadas a apoio à coordenação, auxílio à mecanografia, secretaria e biblioteca.
Essas atividades são desenvolvidas durante a semana e estão fora dos programas
Escola Integrada e Escola Aberta, ou seja, esses adolescentes encontram-se
inseridos nas atividades do dia a dia das escolas e não somente em projetos
específicos. Entretanto, os gestores escolares responderam que na maioria das
escolas não há algum tipo de inserção desses adolescentes no convívio diário com
os alunos do tempo regular de aula. Isso só vem reforçar o problema da exclusão
desse grupo de sujeitos que a cada dia tem mais reforçada a violação de seus
direitos como cidadãos.
58
GRÁFICO 8 – Inserção dos adolescentes sob medida socioeducativa no convívio
diário com alunos do tempo regular de aula
Há algum tipo de inserção desses adolescentes no convívio diário
com os alunos do tempo regular de aula?
SIM
NÃO
23%
77%
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
Acho que ainda são precisos muitos esclarecimentos e acordos, sabe?
Todas as partes precisam ser ouvidas e precisam entender os objetivos e
funcionamento para que o adolescente que cumpre medida protetiva não
seja um corpo estranho ao ambiente escolar (Informante 5).
Acho que tem muito a questão do preconceito. Isso perpassa no
investimento pessoal dessas pessoas que poderiam estar recebendo esses
adolescentes. O que a instituição pode oferecer de socioeducativo e o que o
adolescente pode oferecer para a escola. É aquele que vai contribuir,
colaborar. É uma troca que eu ainda acho que pode acontecer mais, crescer
(Informante 10).
A pesquisa também demonstrou que a grande maioria dos adolescentes em
cumprimento de medida socioeducativa cumpre a sentença nos finais de
semana. Isso nos leva a concluir que eles estão inseridos de alguma forma
nas atividades do programa Escola Aberta e são acompanhados pelo
18
professor comunitário.
18
Professor comunitário é um professor da RME que possui extensão de jornada e atua nos finais de
semana coordenando as atividades do programa Escola Aberta.
59
GRÁFICO 9 – Período de cumprimento da medida socioeducativa
De que forma os adolescente cumprem a medida socioeducativa
nessa escola?
31%
38%
FINAL DE SEMANA
VARIÁVEL
DURANTE A SEMANA
31%
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
A escola, ao aceitar os adolescentes e engajá-los no processo educativo, seja nos
programas de ampliação da jornada escolar ou mesmo dentro de sua jornada,
reforça o objetivo desta pesquisa, que é de colocar a medida socioeducativa na
agenda da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte trazendo a escola como
local de prestação de serviço à comunidade. Os dados revelados nesta pesquisa
apontam que as escolas são de fato locais para cumprimento da medida
socioeducativa, entretanto falta articulação intersetorial para uma maior efetividade
do programa.
5.3 A Gestão do programa pela SMAAS e pela SMED
A execução das medidas socioeducativas previstas no ECA apresenta as esferas de
competência para sua execução. No caso específico da MSE de PSC, compete ao
município a execução do programa que, a partir da lei n. 8069/90 (ECA) e lei n.
12.594/2012 (SINASE), vem apresentando mudanças significativas no atendimento
rompendo com a concepção de menor infrator até então presente nas legislações
anteriores, entre elas, o código do menor.
60
É inegável a mudança. É o Código do Menor e o Eca, né? São, assim, dois
momentos distintos. E é isso, inclusive, instrumentaliza o que é de direito e
o que é de dever daquele cidadão (Informante 10).
O gráfico abaixo apresenta uma distribuição por decisões em audiência preliminar
nos anos de 2009 a 2011 e que servirão de comparação para os dados da pesquisa
e gráficos seguintes.
GRÁFICO 10 – Distribuição por decisões em audiência preliminar
2500
2000
1500
1000
500
2009
2010
0
2011
Fonte: Autoria própria, baseado em TJMG (2009, 2010 e 2012).
Ao analisarmos o gráfico acima, percebemos que um grande número de
adolescentes está inserido na medida mais gravosa, ou seja, a internação.
Entretanto, esse dado precisa ser mais bem analisado, pois se trata de audiência
preliminar onde é feita uma análise inicial do ato infracional. Por se tratar de medida
restritiva de liberdade, portanto mais gravosa, com base nos princípios da brevidade
e excepcionalidade, esses números não podem ser analisados como números
definitivos, por representarem dados de audiência preliminar.
A execução das medidas socioeducativas em meio aberto é realizada desde 1998
por meio de um convênio de parceria firmado pelo Judiciário (Juizado da Infância e
Juventude) e Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social. A partir desse
convênio, os adolescentes, ao receberem a determinação para cumprimento de
61
medida socioeducativa, iniciavam um processo onde eles, após receberem a
sentença judicial, aguardavam em casa até os órgãos responsáveis (Secretaria de
Atendimento às Medidas Socioeducativas - SUASE e Gerência de Coordenação das
Medidas Socioeducativas - GECMES) entrarem em contato por meio de telegrama,
telefone ou pela rede socioassistencial da comunidade. Após esse procedimento, o
adolescente iniciava o cumprimento da medida.
Até o ano de 2010, esse era o procedimento adotado e, em consequência do grande
espaço de tempo decorrente desde a sentença do adolescente até o início do
cumprimento da medida, muitos deles perdiam. Perdiam por dois motivos. Primeiro
porque o adolescente não cumpria a medida por causa da falta de monitoramento e
controle do sistema e, segundo, porque muitos morriam neste decurso de tempo,
vítimas do crime e das drogas.
No ano de 2011, a Prefeitura de Belo Horizonte inaugurou o Núcleo de Atendimento
às Medidas Socioeducativas e Protetivas - NAMSEP no Centro Integrado de
Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional - CIA. Em um mesmo espaço
físico, uma equipe interdisciplinar trabalha para um atendimento integral ao
adolescente autor de ato infracional, desde a audiência preliminar até a sentença
proferida pelo juiz. Instituído por meio da Instrução Normativa NAMSEP-BH/CIA, n.
002/2011 (BELO HORIZONTE, 2012b), o Núcleo visa estabelecer as diretrizes e
procedimentos necessários à execução das medidas de proteção e socioeducativas
em meio aberto, entre elas a Prestação de Serviços à Comunidade, objeto de nosso
estudo. Essa instrução se aplica às unidades administrativas da Secretaria Municipal
Adjunta de Assistência Social, Secretaria Municipal de Educação e Secretaria
Municipal de Saúde, por estarem todas implicadas no Sistema de Garantia de
Direitos - SGD.
A partir da sentença proferida pelo juiz, inicia-se o processo de execução e
cumprimento da medida socioeducativa sob a responsabilidade da SMAAS, que
possui técnicos responsáveis pelo atendimento aos adolescentes nas nove regionais
de Belo Horizonte. Os técnicos realizam o primeiro atendimento e inserem os dados
em um sistema próprio – Sistema de Informação e Gestão de Políticas Sociais -
62
SIGPS – onde é elaborada a ficha de encaminhamento para a Gerência de
Educação- GERED.
Por se tratar de uma ação intersetorial, o programa de atendimento às medidas
socioeducativas está articulado com várias secretarias, entre elas a Secretaria
Municipal de Educação - SMED, que, por meio do programa Rede pela Paz, 19 vem
fazendo o monitoramento desses adolescentes quanto à matrícula e frequência na
escola. Mensalmente é elaborado um relatório pelas gerências regionais, que é
encaminhado à coordenação do Rede pela Paz. Embora exista esse monitoramento,
a pesquisa revelou que há um grande número de adolescentes fora da escola,
conforme se pode analisar nos gráficos.
O cumprimento da medida de PSC inicia-se com o acolhimento do adolescente e da
família pela SMAAS em sua regional de domicílio e, em seguida, o adolescente
passa por uma etapa de atividades preparatórias que acontecem no NAMSEP e são
compostas por entrevistas com a família, discussão sobre a responsabilização do
adolescente, escuta técnica e, a partir daí, ele é encaminhado para as regionais para
o cumprimento da medida em uma instituição. Na instituição onde cumprirá a
medida, é definido um profissional que exercerá o papel de educador de
referência.20 A partir daí, inicia-se o processo de cumprimento da medida:
E aí, depois disso ele é encaminhado, é feito um contato com a instituição,
vê a possibilidade de recebimento desse aluno para cumprimento dessa
medida e aí são articuladas as atividades, os dias, os horários, e aí a ação,
a pessoa que vai ficar a frente disso lá na instituição, a gente chama de
educador de referência, é ele que vai acompanhar (Informante 10).
No interior das escolas, nem sempre o diretor é o educador de referência. A
pesquisa revelou que outros atores 21 assumem esse papel. De acordo com uma das
técnicas do programa, o educador de referência recebe do técnico da SMAAS o
apoio para lidar com esse dia a dia no cumprimento da medida. Entretanto, a
19
O Programa Rede pela Paz tem como foco principal a função de formar, elaborar e executar
políticas públicas de aprimoramento do clima escolar, por meio de ações relacionadas à construção
de uma cultura de paz sustentável, à mediação de conflitos, à prevenção e ao combate à violência
escolar.
20
Educador de referência é a pessoa designada pela instituição que acompanhará o adolescente
durante todo o processo de cumprimento da medida.
21
Ver gráfico 6.
63
pesquisa aponta resultados divergentes22 demonstrando falta de articulação entre as
secretarias envolvidas.
No contexto da resolução n. 109 de 11/11/2009, que trata da Tipificação Nacional de
Serviços Socioassistenciais, o serviço tem por finalidade “prover atenção
socioassistencial e acompanhamento aos adolescentes em cumprimento de
medidas socioeducativas em meio aberto, determinadas judicialmente” (BRASIL,
2009). O acompanhamento é feito a partir da elaboração do Plano Individual de
Atendimento - PIA, que é elaborado com a participação do adolescente e de sua
família para que o cumprimento da medida socioeducativa estabelecida pelo juiz
seja compatível com as aptidões e favorecedor do desenvolvimento pessoal e social
do adolescente. Esse plano deve ser dinâmico e flexível, podendo ser replanejado e
repactuado com o adolescente e a família sempre que existir necessidade. A
construção do PIA ainda é um desafio dentro da execução do programa e, até o
fechamento desta pesquisa, não tivemos acesso a nenhum plano individual
construído para e com algum adolescente sentenciado.
Partimos desses dados para análise de como o programa de PSC, objeto deste
estudo, está articulado dentro do Sistema de Garantia de Direitos. Preconiza a
LDBEN 9394/96 a obrigatoriedade da educação básica dos quatro aos dezessete
anos de idade (BRASIL, 2013). Entretanto, os dados dispostos a seguir demonstram
que é preciso maior investimento nesse público.
No que tange à aplicação das medidas socioeducativas, dispõe o SINASE no eixo
Educação comum a todas as entidades e/ou programas que executam medidas
socioeducativas:
[...] redirecionar a estrutura e organização da escola (espaço, tempo,
currículo) de modo que favoreça a dinamização das ações pedagógicas, o
convívio em equipes de discussões e reflexões e que estimulem o
aprendizado e as trocas de informações, rompendo, assim, com a repetição,
rotina e burocracia (BRASIL, 2006a).
Embora a disposição legal seja clara, a pesquisa revelou que os adolescentes
autores de ato infracional não estão inseridos em projetos pedagógicos
diferenciados, o que faz aumentar o índice de evasão e repetência desses sujeitos.
22
Ver gráfico 4.
64
Muitos deles, há um bom tempo afastados das instituições escolares, ao retornarem
após decisão judicial, não identificam o espaço escolar como sendo parte de sua
vida. Se por um lado esse sujeito não se sente incluído nesse ambiente, por outro, a
própria escola não flexibiliza e oportuniza um espaço de convivência e formação
diferenciadas.
GRÁFICO 11 – Percentual de escolaridade dos adolescentes
25%
20%
15%
10%
2009
2010
5%
2011
0%
Fonte: Autoria própria, baseado em TJMG (2009, 2010 e 2012).
Se por um lado a LDBEN 9394/96 destaca o acesso à educação, os dados acima
demonstram a necessidade de investimento na permanência e na qualidade de
ensino ofertado a esses adolescentes. Não basta o juiz determinar a matrícula deles,
é preciso criar novas possibilidades de inserção desses adolescentes nos espaços
escolares, de modo que possam participar da construção de um novo formato de
escola. A baixa escolaridade dificulta a inserção desses adolescentes nas escolas.
Embora tenhamos analisado apenas os números da educação em relação aos
adolescentes em conflito com a lei, verificamos que a distorção idade/série é um
problema que também atinge crianças e adolescentes matriculados nas redes
educacionais, o que precisa ser enfrentado pelas secretarias responsáveis para
permitir a inserção sociocultural desses sujeitos. 23
23
Essa questão será analisada no capítulo 6.
65
2009
2010
2011/2012
Rede
Estadual
34,1%
36,4%
Sem
informação
Rede Federal
26,9%
22,6%
Sem
informação
Rede
Municipal
42,3%
42,9%
Sem
informação
TABELA 1: Distorção idade/série/Ensino Fundamental/Rede Pública
Fonte: Autoria própria, baseado em MEC-INEP (2012).
Os dados a seguir dizem respeito ao primeiro semestre de 2012, 24, quando foram
atendidos no NAMSEP PBH/CIA 2.021 adolescentes.
GRÁFICO 12 – Situação escolar dos adolescentes em cumprimento de MSE
Situação escolar: frequência nas redes
Rede pública
45%
48%
Rede particular
Sem informação
Não frequentou a
escola
6%
1%
Fonte: Autoria própria, baseado em TJMG (2009, 2010 e 2012). Período: janeiro a julho/2012
O atendimento intersetorial está previsto dentro do Sistema de Garantia de Direitos.
Entretanto, a pesquisa revelou que é necessário priorizar investimentos no
atendimento às crianças e adolescentes. O número de adolescentes fora da escola
é muito alto se considerarmos que a educação é obrigatória para essa faixa de
idade.
24
Os dados do segundo semestre de 2012 e iniciais de 2013 não foram disponibilizados.
66
Analisando o Sistema de Justiça Juvenil, especificamente a respeito dos dados em
Belo Horizonte, percebe-se que a grande maioria dos adolescentes envolvidos em
atos infracionais é de negros, homens e pobres. Esse dado poderia nos levar a
acreditar que adolescentes brancos e ricos não cometem ato infracional. Entretanto
sabemos que adolescentes brancos e ricos também cometem ato infracional.
GRÁFICO 13 – Percentual da raça/cor do adolescente
45,00%
40,00%
35,00%
30,00%
25,00%
2009
20,00%
2010
15,00%
2011
10,00%
5,00%
0,00%
Branco
Pardo
Preto
Amarelo Indígena
NS/NR
Fonte: Autoria própria, baseado em TJMG (2009, 2010 e 2012).
Também é preciso desconstruir a afirmativa de que adolescentes infratores estão
inseridos na criminalidade por falta de opção – entre elas, a falta de trabalho. Os
dados25 a seguir demonstram que parte dos adolescentes autores de ato infracional
já se encontra no mercado de trabalho.
25
Os dados de 2012 e 2013 não foram disponibilizados.
67
GRÁFICO 14 – Adolescentes autores de ato infracional e inserção no mercado de
trabalho
90,00%
80,00%
70,00%
60,00%
50,00%
Sim
40,00%
Não
30,00%
20,00%
10,00%
0,00%
2009
2010
2011
Fonte: Autoria própria, baseado em TJMG (2009, 2010 e 2012).
Outro dado que nos chama atenção diz respeito ao número de adolescentes que
possuem residência fixa, contrariando o senso comum de que adolescentes autores
de ato infracional são, em sua maioria, moradores de rua.
Os dados que obtivemos mostram que essa não é a realidade de Belo Horizonte.
GRÁFICO 15 – Tipo de residência dos adolescentes autores de ato infracional
Residência
90,00%
80,00%
70,00%
60,00%
50,00%
40,00%
30,00%
20,00%
10,00%
0,00%
Casa
Apto
Fonte: Relatório CIA 2009-2011 (TJMG, 2012).
Barraco
Casa própria
68
Ao analisarmos o adolescente infrator, é necessário pensá-lo como um sujeito que
tem o seu cotidiano marcado por problemas sociais, principalmente familiares, para
que não resvalemos no argumento do senso comum de criminalização da pobreza.
A questão não é de estrutura de moradia ou mesmo de trabalho. É preciso avançar
nas discussões e em ações articuladas e integradas entre diferentes órgãos e
serviços, de modo a envolver toda a sociedade para alcançarmos uma resposta
capaz de garantir eficiência, eficácia e efetividade no enfrentamento à violência
infanto-juvenil.
5.4 A participação das famílias no acompanhamento do cumprimento da
medida socioeducativa de PSC
Conforme preconiza o SINASE (BRASIL, 2006a),
[...] a participação da família, da comunidade e das organizações da
sociedade civil voltadas à defesa dos direitos da criança e do adolescente
na ação socioeducativa é fundamental para a consecução dos objetivos da
medida aplicada ao adolescente (BRASIL, 2006a, p. 49).
É por meio da convivência que se consolidam parcerias nos diferentes níveis
visando a um melhor atendimento aos adolescentes e às famílias. O acesso às
políticas públicas assegurado por lei nem sempre é um direito garantido, e ficou
demonstrado nesta pesquisa que muitos dos adolescentes em cumprimento de
medida socioeducativa de PSC não estão inseridos em programas de assistência
social, apenas cumprem a medida socioeducativa após a decisão judicial.
No processo de efetividade do Estatuto, especialmente na área infracional,
o que se tem visto, de uma maneira geral, é o descumprimento do
mandamento constitucional que dispõe que crianças e adolescentes se
constituem em prioridade absoluta da Nação brasileira.
Hão de ser priorizadas as ações e a efetivação de programas que os
tenham como destinatários, e, naturalmente, hão de ser priorizados os
programas que viabilizem a execução das medidas socioeducativas,
buscando a integração social destes jovens (SARAIVA, 2010, p.195).
Um dos eixos comuns previstos pelo SINASE sobre o cumprimento de medida
socioeducativa diz respeito à ampliação do conceito de família para aquele grupo ou
pessoa com as quais os adolescentes possuam vínculos afetivos, respeitando os
diferentes arranjos familiares. Nesse aspecto, as escolas pesquisadas têm buscado
ampliar o conceito de integração e convivência comunitária ao propiciar atividades
69
envolvendo esses adolescentes e a comunidade nos finais de semana por meio do
programa Escola Aberta.
A questão da integração. O ser humano é um ser de relações e precisa se
redescobrir como cidadão participante da sociedade, se tornar responsável
por suas atitudes e as consequências delas (Informante 7).
A presença da mãe é bastante recorrente na escola. Parece que há uma
preocupação por parte dela de que o filho não reincida no ato infracional
(Informante 2).
As atividades contribuem sim e a proposta é que seja inclusiva,
responsável, de maneira educativa. Os adolescentes não ficam em
atividades isoladas, a gente oferece atividades de relacionamento com os
outros indivíduos que frequentam a escola (Informante 3).
Tem um envolvimento muito passivo das famílias, sabe... que na maioria
das vezes não assumem a sua responsabilidade na educação desses
adolescentes infratores. É igual na escola... uns pais acompanham, outros
não querem nem saber de nada (Informante 3).
Embora o acompanhamento e a participação das famílias sejam de grande
importância na vida dos adolescentes, a pesquisa aponta para uma participação
frágil das famílias no acompanhamento do processo de cumprimento da medida
socioeducativa.
GRÁFICO 16 – Participação das famílias
Durante o cumprimento da medida socioeducativa, as
famílias dos adolescentes procuram a escola para
acompanhar o processo?
31%
Nunca
Às vezes
69%
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
Esse dado pode ser analisado como uma das dificuldades da socialização e
reinserção do adolescente na sociedade. Neste sentido, Saraiva (2010) diz que
70
[...] na maioria absoluta das vezes, é de integração e não de reintegração,
pois se sabe (e neste sentido são os dados estatísticos do Conselho
Nacional dos Direitos da Criança - CONANDA) quase 70% dos atos
infracionais praticados o são contra o patrimônio, ou seja, por excluídos em
99% das vezes, pelo que, não há falar-se em reintegrar quem nunca esteve
integrado. A proposta é integrar (SARAIVA, 2010, p. 195).
Também segundo os informantes,
O desafio é promover a inclusão e promover o diálogo sobre a importância
de viver em sociedade, ué, né? No cumprimento das leis, no
acompanhamento para ele não fazer de novo, né, a reincidência do
adolescente nos atos infracionais (Informante 2).
São muitos os desafios, mas o principal é o diálogo. Falta diálogo entre as
pessoas e as secretarias. A gente conversa pouco (Informante 9).
Outro desafio apontado na pesquisa diz respeito ao desenvolvimento de ações
contidas no Plano Nacional de Promoção, Defesa e Garantia do Direito de Crianças
e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária.26 Em grande parte das
escolas analisadas, esse eixo não se fez presente, principalmente pela ausência de
participação das famílias e pela falta de articulação dos órgãos envolvidos, conforme
já relatado pelos sujeitos participantes da pesquisa.
A participação das famílias e a integração das políticas públicas podem ser
compreendidas como uma das fases para a ressocialização do adolescente autor de
ato infracional. Entretanto a pesquisa demonstrou, reiterando o que aponta Saraiva
(2010), que, antes de reinserir o adolescente, é preciso inseri-lo na sociedade que,
por vários momentos, contribuiu para sua exclusão.
Ainda que não se tenha a certeza de que a implantação de políticas públicas garanta
a ressocialização de todos os adolescentes, se não houver a garantia dos direitos
das crianças e adolescentes de forma integrada e articulada por meio dessas
políticas, não se pode falar em proteção integral e absoluta prioridade de
atendimento.
26
O Plano Nacional de Promoção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência
Familiar e Comunitária representa um importante instrumento para mobilização nacional com vistas à
formulação e implementação de políticas públicas que assegurem a garantia dos direitos das crianças
e adolescentes, de forma integrada e articulada com os demais programas de governo.
71
5.5 Dialogando com os adolescentes: o dia a dia no cumprimento da medida
socioeducativa de PSC nas escolas
Identificar o adolescente como sujeito de suas ações, como sujeito de direitos, e, em
consequência, titular de direitos e obrigações, nem sempre é perfeitamente
compreendido. São comuns críticas endereçadas ao ECA pela sociedade,
principalmente em relação ao cumprimento das medidas socioeducativas que, na
opinião de muitos, não se aplicam à realidade brasileira.
Os adolescentes autores de ato infracional são vistos como “violentos”, “bandidos” e
“perigosos”, o que demonstra resquícios do tratamento dado às crianças e
adolescentes com base em legislações anteriores. Essa interpretação acaba
contribuindo para que parte da sociedade apregoe a necessidade de condenação
social antes mesmo da sentenciação judicial.
Especialmente na área infracional, percebe-se um total descumprimento das
tratativas legais impondo aos adolescentes em conflito com a lei condições de
cumprimento de medida socioeducativa quase sempre desvinculadas de uma
proposta que Costa (2001) chama de pedagogia da presença:
Mas, o educador que se dirige ao educando na perspectiva da Pedagogia
da Presença verá que uma outra ordem de exigências antecede e dá
suporte a essas preocupações. Ele já observou que muitos desses jovens
vivem “amarrados por dentro”, encerrados em um universo tenso, reduzido
e espesso. Eles frequentemente anulam iniciativas e esforços realizados em
seu favor. Agem como se os problemas que tentamos resolver com eles
não fossem realmente os seus verdadeiros problemas (COSTA, 2001, p.
33).
Segundo o mesmo autor (2001), os programas socioeducativos dirigidos a jovens
autores de ato infracional, ou, como prefere chamar, “jovens em situação de especial
dificuldade” (Costa, 2001, p. 45), ainda não sabem, em sua maioria, tirar proveito
pleno das possibilidades da pedagogia da presença, e são raríssimas as situações
em que a perspectiva da presença é chamada a intervir como primeiro elemento da
dinâmica do atendimento: o envolvimento do educador no ato de estar junto do
educando.
A partir das observações realizadas nas escolas no dia a dia dos adolescentes no
cumprimento da medida de PSC, percebeu-se a concepção que os adolescentes
72
possuem do que vem a ser a medida socioeducativa para eles. Em conversa
informal, como forma de aproximação dos adolescentes, muitos disseram que estão
tendo uma oportunidade na vida e que aquele espaço – referindo-se à escola – é um
espaço para a convivência com as pessoas. Cabe, porém, lembrar que as medidas
socioeducativas são determinadas pela autoridade, o adolescente não as escolhe, é
obrigado a cumpri-las, o que por si só gera resistência. Notou-se em muitos
adolescentes certa naturalidade e até identificação com o espaço escolar, seja na
expressão facial deles ou até mesmo na disponibilidade em colaborar de certa forma
com as atividades da escola.
Verifica-se, a partir da fala dos adolescentes, que há, em alguns casos, maior
aproximação com algumas pessoas. Do ponto de vista da pedagogia, o que esses
adolescentes estavam buscando era uma forma de encontrar-se, um desejo de
aproximação das pessoas. Em uma das escolas, ficou claro esse vínculo.
A gente tinha até a visita deles, de vez em quando eles vêm aqui, voltam
aqui durante a semana, final de semana para conversar com a gente,
gostaram né? (Informante 1).
No trato da questão infracional, a pesquisa apontou posicionamentos otimistas nos
resultados que algumas pessoas esperam alcançar com esses adolescentes ao final
do cumprimento da medida socioeducativa de PSC. Entretanto, para outros
profissionais que atuam no programa, os desafios parecem ser maiores,
principalmente no que se refere à concepção do programa.
Sempre se espera que a experiência seja positiva e que o adolescente
consiga refletir e se responsabilizar mais por suas atitudes perante a
sociedade (Informante 5).
Acredito que o desejo é de que o adolescente se perceba como parte
integrante da sociedade e que perceba sua capacidade de mudança de
atitudes através do trabalho, se sentindo útil, sabe, e através da
aprendizagem (Informante 7).
Olha, a gente espera que o jovem seja persuadido a desistir do rumo da
delinquência e opte pela capacitação, para o desenvolvimento de aptidões
que lhe tornem um ser útil a si próprio e à sociedade onde está inserido
(Informante 2).
Na maioria das vezes, esperamos apenas que ele consiga sobreviver no
ambiente escolar sem trazer outros problemas e principalmente sem
influenciar outros alunos (Informante 6).
Pois é. O objetivo final disso aí, né, é uma contenção, já que ele teve uma
infração, vamos dizer, leve e talvez com essa socialização, com essa
medida socioeducativa é mais uma oportunidade que ele tem para refletir,
para repensar, para não prosseguir naquela vida, naquele ato que ele foi
inserido, seja involuntário, ou que já tenha sido repetido para que realmente
73
o cidadão volte para aqueles objetivos iniciais que a escola tenta colocar
para ele (Informante 1).
A gente espera que o adolescente saia da medida mais consciente do seu
papel na sociedade e que não seja reincidente em atos infracionais
(Informante 3).
Esperamos que ele consiga interagir de tal forma no ambiente de trabalho
que construa outros valores e que, quando terminar de cumprir a medida,
comece a questionar suas ações do dia a dia (Informante 8).
GRÁFICO 17 – Medidas socioeducativas e socialização do adolescente infrator
Você acredita que o cumprimento de medida socioeducativa de PSC nas escolas
contribui para o processo de aprendizagem e socialização do adolescente infrator?
38%
SIM
NÃO
62%
F
Fonte: Questionário respondido pelos gestores escolares. Autoria própria.
Conclui-se, a partir dos relatos, que a execução do programa de PSC nas escolas
tem contribuído para consolidar parcerias com outras secretarias, possibilitando
maior inserção do adolescente autor de ato infracional na comunidade. Embora a
pesquisa tenha apontado para essa parceria, o trabalho de efetivação da
intersetorialidade entre os diversos órgãos responsáveis pelo sistema de garantia
dos direitos e, principalmente dos direitos dos adolescentes autores de ato
infracional, ainda tem um longo percurso a trilhar. Percebeu-se que faltam
qualificação e formação profissional para os sujeitos envolvidos no processo, o que
pode comprometer a efetividade da execução da medida socioeducativa. Muitos dos
sujeitos que atuam diretamente na execução do programa de PSC, ou seja, os
próprios gestores escolares, não recebem orientação específica para que possam
contribuir com o programa.
74
6 ECA: AVANÇOS OU RETROCESSOS NO CAMPO DO ATENDIMENTO
SOCIOEDUCATIVO
O Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) trouxe avanços
significativos, não apenas no campo do atendimento às crianças e adolescentes. Ao
inseri-los como sujeitos de direitos, rompe-se de fato com a condição de objeto de
compaixão e repressão pelo qual o menor (criança ou adolescente) era tratado.
Sob a perspectiva do direito, dados do Fundo das Nações Unidas para a InfânciaUNICEF apontam que ainda precisamos cuidar mais dessa população que alcançou
a categoria de sujeito a partir da Constituição Federal de 1988. O princípio
constitucional de prioridade absoluta precisa ser de fato para todas as crianças e
adolescentes, e não apenas vivenciado para uma parcela da sociedade. O ECA
assegura que nenhuma criança ou adolescente deve ser objeto de discriminação,
negligência, exploração, violência, crueldade ou agressão dentro ou fora da família.
Entretanto esta não é a realidade brasileira.
Ao analisarmos as mais diversas informações veiculadas nos meios de
comunicação, percebe-se que muitos de nossos adolescentes têm seus direitos
negligenciados e grande parte desses sujeitos não são reconhecidos pela própria
sociedade como sujeitos de direitos. Diariamente somos surpreendidos com notícias
de violações de direitos de crianças e adolescentes por pessoas e órgãos que,
teoricamente, teriam que zelar pela integridade desses sujeitos.
Muito se divulga na imprensa sobre a necessidade de redução da maioridade penal
como forma de diminuição da criminalidade, mas pouco se fala do submundo a que
muitos dos nossos jovens foram e ainda são relegados. Dados do último mapa da
violência (2012) no país indicam que a violência envolvendo adolescentes tem
crescido ao longo dos anos, principalmente envolvendo adolescentes negros.
Segundo registros do Sistema de Informações de Mortalidade, “considerando o
conjunto da população, entre 2002 e 2010, as taxas de homicídios brancos caíram
de 20,6 para 15,5 homicídios – queda de 24,8% – enquanto a de negros cresceu de
34,1 para 36,0 – aumento de 5,6%” (WAISELFISZ, 2012, p. 38).
75
Esses dados se agravam à medida que percebemos a falta de vontade política e
compromisso ético para estruturar de fato um sistema de responsabilidade penal
juvenil que funcione tal qual preconiza o ECA. Se por um lado o adolescente deve
ser visto como um sujeito de direitos, exigíveis no ordenamento jurídico, por outro,
esse mesmo sujeito deve se implicar em deveres, ou seja, existirá sempre uma
relação de reciprocidade. A não responsabilização do adolescente autor de ato
infracional corresponde, na verdade, à negação de sua condição de sujeito em
condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
Entretanto, o adolescente deve entender que ele é responsável pelas consequências
de seus atos, e que estes serão também consequência de suas escolhas. Fazer
com que o adolescente responda por seus atos é uma maneira de educá-lo,
responsabilizá-lo
frente
às
regras
de
convivência
em
sociedade.
Essa
responsabilização, porém, deve ser feita com todas as garantias processuais que
são garantidas ao sujeito adulto.
À medida que o adolescente percebe que não foi vítima de um ato
caprichoso, mas que teve, através da igualdade na relação processual, a
condição de defender-se, se dá conta de que a resposta da sociedade não
é arbitrária. Neste momento, ele está frente a uma dura, mas eficaz
oportunidade de compreender a justiça como um valor concreto de sua
existência (COSTA, 2009, p. 194).
A doutrina da proteção integral abre uma grande discussão a respeito do
atendimento de crianças e adolescentes. No campo socioeducativo, especificamente
no cumprimento das medidas socioeducativas, ainda são poucos os avanços frente
à necessidade de enfrentamento do problema. A regulamentação do SINASE por
meio da Lei 12.594 de 2012 representou um avanço na aplicação das medidas,
porém é preciso que o novo direito saia efetivamente do papel.
Com base nos relatórios estatísticos do Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG,
nos anos de 2009 a 2011 os encaminhamentos de adolescentes no CIA/BH
somaram 28.578 casos. O ano de 2010 foi o que registrou o maior número de
entradas (9.864) e 2011 apresentou redução de 7,65%em relação a 2010. A média
diária de atendimentos no período analisado foi de 26 adolescentes, e a média
mensal, de 794 atendimentos.
76
Frequência
Percentagem
Percentagem
Percentagem
válida
acumulada
2009
9.605
33,6
33,6
33,6
2010
9.864
34,5
34,5
68,1
2011
9.109
31,9
31,9
100,0
Total
28.578
100,0
100,0
TABELA 2 – Número de entradas de adolescentes por ano 2009-2010-2011
Fonte: Autoria própria, baseado em TJMG (2009, 2010 e 2012).
A articulação em rede prevista no SINASE deve ser capaz de responder à sociedade
frente à demanda que diariamente é exposta pela mídia sobre os adolescentes
infratores. A visão que a sociedade tem do adolescente autor de ato infracional é
que ele é “perigoso”, “violento” e “bandido” e que merece repressão, internação e
exclusão.
Dados do NAMSEP/CIA apontam que no período de 2009 a 2011 o índice de
adolescentes sentenciados à medida de internação (a mais gravosa) em Belo
Horizonte estava em torno de 3,5%. Esse dado nos leva a refletir sobre uma
sustentação equivocada de que o aumento da violência está ligado à menoridade. O
maior número de adolescentes sentenciados conforme ato infracional praticado está
ligado ao uso e tráfico de drogas, ou seja, os adolescentes são mais vítimas do que
autores.
Várias são as hipóteses para explicação deste fenômeno do aumento de
infrações ligadas às drogas e consequente diminuição das infrações contra
o patrimônio ao longo dos anos na cidade de Belo Horizonte. Uma delas é a
maior atuação policial no centro da cidade, além da instalação de câmeras
do programa Olho Vivo que vieram a inibir os furtos e roubos que ocorriam
nesta região, diluindo assim, as infrações para outras áreas da cidade.
Outro fator importante revela-se nos altos lucros obtidos com a venda de
drogas nas regiões dos aglomerados, onde o risco de ser apreendido pela
polícia é bem menor do que nas ruas do centro da cidade que possuem
monitoramento eletrônico (TJMG, 2012).
O gráfico a seguir mostra a distribuição por tipo de ato infracional em Belo Horizonte
no período de 2009 a 2011.
77
GRÁFICO 18 – Distribuição por tipo de ato infracional em Belo Horizonte
2500
2000
1500
1000
2009
2010
500
2011
0
Fonte: TJMG, 2012.
Os dados apresentados acima indicam que o maior número de atos infracionais
praticados pelos adolescentes está ligado aos crimes contra o patrimônio e uso e
tráfico de drogas. Para nós, aí está o cerne do problema: a ausência de ações
preventivas e a falta de políticas públicas inibidoras da subcidadania infanto-juvenil.
É o que discutimos anteriormente nesta pesquisa: a criminalização da pobreza. Isso
nos leva a crer que a única ação do Estado que chega até essas pessoas é a força
punitiva.
GRÁFICO 19 – Distribuição dos adolescentes entrevistados por uso de cada tipo de
droga
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Fonte: Autoria própria, baseado em TJMG (2009, 2010 e 2012).
2009
2010
2011
78
Pesquisa realizada pela Secretaria de Pesquisa Infracional - SEPI, juntamente com
a SUASE e Delegacia de Orientação e Proteção à Criança e ao Adolescente DOPCAD, indica que nos anos de 2009 a 2011 o número de adolescentes infratores
usuários de drogas aumentou. Foram entrevistados 9.150 adolescentes.
Voltando à discussão sobre a falta de políticas públicas, analisamos a distribuição
percentual da escolaridade dos adolescentes. Com base no estudo realizado pela
SUASE em 2011 (MINAS GERAIS, 2011), nos anos de 2009 e 2010, mais de 95%
dos adolescentes entrevistados estavam fora do ano ideal para sua idade. Essa
distorção idade/série é um dos grandes problemas da educação que vem ao longo
dos anos engrossando o número de adolescentes que optam por estar fora das
escolas, aumentando a visão preconceituosa e estigmatizadora da sociedade acerca
desses sujeitos.
Quando perguntados sobre a frequência à escola, pouco mais do que a
metade (53,3%), informaram que estudam atualmente, sendo que 46,7%
informaram que não estudam. Dentre os que estudam, 92,2% estão
matriculados em escola pública (MINAS GERAIS, 2011).
Para além dos muros da escola, outras áreas precisam ser chamadas à
responsabilização, de modo que os adolescentes sejam atendidos por todas as
políticas afirmativas de direito, tais como saúde, assistência, segurança, etc. Se
estamos falando em atendimento integral, é preciso pautar no orçamento público
todas essas ações para que de fato tenhamos garantido que crianças e
adolescentes sejam de fato prioridade absoluta.
6.1 Desafios no recebimento dos adolescentes para cumprimento da medida
socioeducativa de PSC nas escolas
O novo ordenamento jurídico trazido pelo ECA e posteriormente pelo SINASE tem
exigido novas práticas e estrutura coletiva de trabalho acerca dos adolescentes
autores de ato infracional. Essa nova legislação tem implicado uma articulação das
diversas secretarias e órgãos envolvidos no atendimento desses adolescentes que,
a partir da doutrina da proteção integral passaram a ser reconhecidos como sujeitos
de direitos que devem ser garantidos por meio das diversas políticas públicas de
atendimento.
79
Como já discutido no capítulo 2, o processo de elaboração de toda política, em
especial a política voltada para o adolescente autor de ato infracional, conta com o
envolvimento de todos os profissionais e instituições que atuam direta ou
indiretamente com a questão desse adolescente. Nesta pesquisa, alguns dados
apontaram para a necessidade de uma discussão maior que entendemos como
desafios a serem vencidos na política de atendimento a esses sujeitos.
Muito embora o ECA esteja em vigor há 23 anos, muitas mudanças ainda precisam
ser efetivadas, pois encontram-se apenas no campo jurídico, o que traz para o
Sistema de Garantia de Direitos uma lacuna: a necessidade de se construir uma
rede efetiva de atendimento intersetorial, uma vez que “o adolescente é de todos,
para o bem e para o mal” (Agnaldo Lima, Padre, 2013).
No campo do atendimento socioeducativo, essa construção precisa se dar de
maneira coletiva, onde cada setor e órgão responsável pela sua política de
atendimento – seja ela a saúde, a educação, a assistência social, a justiça juvenil –
perceba que o adolescente precisa ser visto como um sujeito em formação e com
direitos que precisam ser garantidos. Não se pode falar em atendimento
socioeducativo retirando do sujeito os direitos que lhe são assegurados por lei.
Belo Horizonte aponta avanços no atendimento jurídico ao concentrar no mesmo
espaço (NAMSEP/CIA) uma equipe interdisciplinar para atendimento do adolescente
autor de ato infracional. Entretanto, sabemos que a existência de um espaço físico,
por si só, não muda a política de atendimento. Faz-se necessária, para além do
espaço físico, a integração dos órgãos para a garantia dos direitos desses
adolescentes, ou seja, intersetorialidade no tratamento da questão.
Outro desafio que está posto para todas as secretarias e órgãos envolvidos no
Sistema de Garantia de Direitos é a formação e a qualificação dos sujeitos
envolvidos para que o SINASE seja de fato um instrumento garantidor de direitos no
campo socioeducativo. Embora ações isoladas aconteçam no interior das
secretarias, pouco se sabe acerca de eventos intersetoriais que tratem a temática de
forma a construir uma interlocução entre as várias secretarias proporcionando
80
melhor gestão do programa do qual, no caso da medida socioeducativa de PSC, o
município é responsável pela execução.
O significado da municipalização do atendimento da medida socioeducativa de PSC
tem em uma de suas justificativas o fortalecimento do contato e o protagonismo da
comunidade e da família dos adolescentes em cumprimento da medida. Esse limite
geográfico é uma referência para que o atendimento seja prestado dentro ou nas
proximidades dos limites do município, não guardando relação com descentralização
de poderes:
A Constituição Federal determina que a competência da União se restrinja à
coordenação nacional e à formulação de regras gerais do atendimento,
enquanto os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão gerenciar e
coordenar e executar programas de atendimento no âmbito de suas
competências (BRASIL, 2006a, p. 30).
O Plano Municipal de Convivência Comunitária é também outra diretriz que norteia o
processo de cumprimento da medida socioeducativa. Destaca-se, porém, que
nenhum dos sujeitos participantes da pesquisa soube dizer do uso desse material na
gestão do programa, o que nos leva a entender que essa lacuna também precisa ser
preenchida para que o atendimento aos adolescentes seja aprimorado e que atenda
aos parâmetros do SINASE.
Cabe à sociedade civil, por meio dos Conselhos representativos, acompanhar a
execução do programa socioeducativo para que todo adolescente autor de ato
infracional sentenciado à medida de PSC cumpra sua medida judicial dentro dos
parâmetros socioeducativos, favorecendo a construção de uma sociedade mais
justa, tolerante e inclusiva.
Recentemente foi aprovado pela Câmara dos Deputados o projeto de lei n. 4.529 de
2004, que institui o Estatuto da Juventude.27 Nesse documento estão expressas
ações que favoreçam o desenvolvimento juvenil por meio de programas setoriais e
27
Institui o Estatuto da Juventude, dispondo sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das
políticas públicas de juventude, o estabelecimento do Sistema Nacional de Juventude e dá outras
providências.
81
intersetoriais de modo a garantir a integração das políticas de juventude com os
Poderes Legislativo e Judiciário e com o Ministério Público. Esse projeto, se
aprovado no Senado e sancionado pela presidente da República, terá impacto nos
vários órgãos que compõem o Sistema de Garantia de Direitos.
Por outro lado, e não menos recentes, discussões afloram em torno da redução da
maioridade penal com objetivo de tentar coibir a participação de adolescentes em
crimes. Não será pela redução da maioridade que teremos a redução da violência –
pelo contrário, estaremos a cada dia violentando mais cedo crianças e adolescentes
ao deixarmos de efetivar as medidas protetivas previstas no ECA. E se aqui
defendemos a maioridade, conforme legislação vigente, é porque não percebemos
ainda a completa efetividade no tratamento de crianças e adolescentes como
sujeitos de direitos e por constatarmos que no Brasil existe a certeza da impunidade,
e isso independe de idade.
82
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No início desta pesquisa, tinha em mente alguns posicionamentos consolidados ao
longo da trajetória no serviço público na área da educação e que, ao término deste
trabalho, foram abandonados. Por muitas vezes, no exercício da função de gestor
escolar, encontrei-me – como muitos colegas hoje se encontram – lamentando pela
falta de apoio dos órgãos responsáveis pelo atendimento dos adolescentes e com a
frustração de não conseguir oferecer o melhor para eles.
Embora seja importante discutir a prática da inserção de adolescentes em
cumprimento de medida socioeducativa nas escolas da rede municipal de educação,
no decorrer da pesquisa evidenciou-se que a aproximação teórica e também legal
dos profissionais envolvidos no processo é bastante precária e, em alguns
momentos, preconceituosa. Faz-se urgente uma qualificação para os profissionais,
de modo que a prática da execução da MSE de PSE nas escolas da RME aconteça
de forma estruturada e articulada com os diversos órgãos responsáveis pela
execução do programa.
Na área da educação, setor onde a pesquisadora atua, os profissionais
apresentaram uma compreensão frágil do ECA e de toda a legislação subsidiária, o
que pode ser apontado como o maior dificultador para o avanço do programa. A
experiência vivenciada pelas escolas de receber esses adolescentes, embora tenha
sido apontada pelos diretores como positiva, mostra que muitas ações foram
marcadas pelo improviso e falta de sistematização. Observou-se ainda que não há
uma metodologia ou mesmo uma formação adequada para os profissionais que
atuam com esses adolescentes. O educador de referência, por falta de orientação,
acaba por definir as atividades para o adolescente cumprir, de maneira individual e
nem sempre condizente com a proposta do SINASE.
Ao serem analisados os dados da pesquisa, foi possível perceber que o discurso
teórico dos órgãos gestores do programa socioeducativo está muito distante da
prática. Muito embora o ECA tenha 23 anos de existência e o próprio SINASE, que
vem ao encontro do ECA como um Sistema que traça parâmetros para o
atendimento socioeducativo, já esteja também presente desde 2006, o que se tem
83
de fato é uma realidade marcada por práticas ainda tímidas em termos de garantia e
proteção dos sujeitos de direitos abordados nesta pesquisa.
Um aspecto a se destacar e que merece atenção especial dos órgãos responsáveis
pelo cumprimento da medida socioeducativa de PSC diz respeito ao fato de o
adolescente estar cumprindo medida socioeducativa e não estar de fato matriculado
na escola e cumprindo sua carga horária obrigatória no Sistema Regular de Ensino
como preconiza a LDBEN. Para a pesquisadora, esse ponto é de total violação.
Torna-se imprescindível um maior monitoramento desses adolescentes, uma vez
que, amparados pelo ECA e demais tratativas legais, estão tendo seus direitos
violados e, de certa forma, com a ciência dos órgãos que deveriam estar
promovendo os mesmos direitos.
Não se pode aceitar que, por falta de pessoal para monitorar ou mesmo por uma
resposta negativa do sistema regular de ensino em matricular esse adolescente, ele
fique fora da escola, visto que isso reforça sua situação de exclusão. E como se não
bastasse a violação desse direito constitucional, a escola, no modelo como está
posta, não oferece uma opção de currículo que de fato vá ao encontro desses
adolescentes que, em sua maioria, marcados por uma trajetória de violência e
exclusão, não têm interesse e nem condições emocionais para conviver em um
espaço que não oferece nada além dos currículos pré-estabelecidos pelo próprio
sistema.
Ao estabelecer os princípios norteadores (anexo 1), o SINASE é bem claro ao dispor
as diretrizes pedagógicas do atendimento socioeducativo. Mas o que dizer de um
atendimento pedagógico na execução da medida que não monitora o acesso e a
permanência desse adolescente na escola regular? Parece estranho e até mesmo
incoerente.
O SINASE também dispõe sobre a necessidade da participação dos adolescentes
na construção, no monitoramento e na avaliação das ações socioeducativas. Em
todas as situações observadas na pesquisa, não foi apresentado, seja pelos órgãos
envolvidos ou pelos próprios adolescentes, o Plano Individual de Atendimento - PIA.
84
A falta desse documento reafirma a prática do improviso percebida durante a
pesquisa.
Com base nos depoimentos dos sujeitos envolvidos na pesquisa, o monitoramento
não se mostrou consistente. Várias foram as falas dos sujeitos pesquisados
explicitando que essa prática não existe ou, quando existe, acontece de modo
informal e pelo telefone.
No campo jurídico, percebeu-se um avanço com a efetivação do Centro Integrado de
Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional - CIA e da instalação de um
Núcleo de Atendimento às Medidas Socioeducativas e Protetivas - NAMSEP, ambos
no mesmo local. Esse avanço é comprovado quando se concentram no mesmo
espaço os órgãos que são responsáveis pela responsabilização e acompanhamento
desses adolescentes garantindo maior efetividade no cumprimento das medidas
socioeducativas.
No que tange ao cumprimento da medida socioeducativa de PSC nas escolas
municipais do Barreiro, evidenciou-se uma abertura muito grande por parte dos
profissionais no trato da questão infracional, talvez pelo grande desafio de oferecer
um espaço de socialização e formação para os alunos e adolescentes em conflito
com a lei, de modo a auxiliá-los a se reintegrar à sociedade. Essa abertura e
envolvimento foram demonstrados nas entrevistas e, de maneira geral, nas
observações livres. Muitos foram os relatos positivos que aconteceram em
conversas informais e em depoimento dos próprios jovens de maneira espontânea.
O que falta de fato é maior orientação e ações integradas entre os diversos órgãos
inseridos no Sistema de Garantia de Direitos - SGD.
Além da responsabilização do adolescente, é fundamental a sua inserção social, de
modo que a medida socioeducativa tenha o efeito pedagógico do agir sobre o seu
emocional. O respeito à sua singularidade, a presença educativa e exemplaridade
como condições necessárias na ação socioeducativa, além de fazer parte das
diretrizes do atendimento pedagógico, são princípios de direitos humanos e que
precisam ser valorizados e incorporados em todos os espaços de cumprimento da
medida socioeducativa. Isso representa um passo importante para a construção de
85
um elo de confiança entre os sujeitos envolvidos no cumprimento da medida
socioeducativa e os adolescentes autores de ato infracional.
Ao afirmarmos a necessidade de construção desse elo, não estamos dizendo que
seja desnecessária a diretividade das ações no processo. Cabe ao órgão gestor do
programa, revestido da autoridade competente que lhe foi atribuída, direcionar as
ações garantindo a participação dos adolescentes e estimulando o diálogo
permanente.
Ressalta-se ainda a necessidade da construção de regras claras,
definidas e fundamentadas nas normas vigentes e que devem ser cumpridas por
todos.
É nesse cumprimento de regras que se insere também a necessidade de maior
participação das famílias e comunidade na defesa e promoção dos direitos dos
adolescentes. Somente com a participação da família e da própria comunidade onde
o adolescente reside é que vai se dar o fortalecimento dos vínculos e sua inclusão
na comunidade. É preciso estimular o protagonismo juvenil de modo que esse
adolescente possa se sentir inserido e capaz de contribuir com ações positivas na
comunidade.
Diante disso, apresentamos como estratégia para ampliar a inserção do programa
de PSC nas escolas a melhoria das ações intersertoriais e também maior
participação da comunidade escolar, uma formação básica estimulando e
desenvolvendo a compreensão do ECA e das implicações das medidas
socioeducativas a fim de sensibilizar a comunidade escolar para a importância da
articulação de todos em prol desse sujeito adolescente.
86
PROJETO DE INTERVENÇÃO
1 INTRODUÇÃO
A educação é um grande mecanismo de transformação da sociedade, e a escola,
como instituição formal de ensino, tem como papel principal planejar juntamente com
a comunidade um projeto que vá ao encontro das necessidades da comunidade
onde está inserida. Partindo desse ponto, ou seja, do papel transformador que a
educação tem na sociedade, visamos trazer o cumprimento da medida
socioeducativa de PSC para o interior das escolas, por acreditarmos que será pela
educação
que
esses
adolescentes
terão
novas
oportunidades.
Buscando
oportunizar-lhes atividades que possibilitem seu crescimento e formação cidadã, a
pesquisa nos revelou que, para que o programa de execução de medida
socioeducativa de PSC em escolas seja de fato pedagógico, há necessidade de
formação dos sujeitos envolvidos na execução do programa. Para isso, propomos
uma formação inicial para os gestores escolares e demais sujeitos que lidam
diretamente com esses adolescentes no cumprimento da medida.
Uma das formas de se entender o cumprimento de uma medida socioeducativa é ser
ela uma medida retributiva ao ato praticado, ou seja, o sujeito (adolescente) “paga” o
que deve à sociedade e está livre. Embora essa realidade exista, não é nosso
propósito abordá-la, pois, a partir da Constituição Federal de 1988 e legislações
infraconstitucionais, tais como SINASE e ECA, a medida socioeducativa é para além
de uma simples retribuição ao ato infracional praticado, traz em seu bojo a
necessidade de se (re)educar o adolescente dentro de uma concepção de educação
integral.
Voltando à discussão principal desta pesquisa, o objetivo deste projeto de
intervenção é formar gestores escolares das escolas da Rede Municipal de
Educação para o trabalho com adolescentes em conflito com a lei no processo de
cumprimento de medida socioeducativa.
87
2 JUSTIFICATIVA
A partir da pesquisa realizada, os resultados encontrados apontaram para a
necessidade de qualificação para os sujeitos envolvidos no processo de acolhimento
dos adolescentes autores de ato infracional e execução da medida socioeducativa
de PSC. Percebeu-se que os sujeitos envolvidos no processo, principalmente os
gestores escolares, apresentaram a necessidade de estudar e se aprofundarem
acerca da legislação pertinente ao tema.
2.1
Objetivos:
2.1.1 Geral
Formar gestores escolares das escolas da RME para o trabalho com adolescentes
em conflito com a lei no processo de cumprimento de medida socioeducativa nas
escolas da Rede Municipal de Educação.
2.1.2 Específicos
a) Conhecer a legislação básica que ampara o adolescente autor de ato
infracional (CF/88, ECA, SINASE, Sistema de Garantia de Direitos, etc.);
b) conhecer os órgãos envolvidos no processo de atendimento ao adolescente
infrator e no processo de execução e cumprimento da medida socioeducativa;
c) refletir sobre estratégias que favoreçam o domínio de algumas práticas
pedagógicas ligadas à medida socioeducativa;
d) ter contato com bibliografia sobre o tema, contemplando também estudos de
casos.
3 METODOLOGIA
Inicialmente, a proposta de qualificação será feita em momentos distintos:
1ª etapa: encontro regionalizado (inicial) com os diretores para sensibilização com a
temática, com apresentação em formato de palestra e disponibilização de material
didático em CD room e postagem em ambiente virtual de aprendizagem.
88
2ª etapa: criação de um fórum no ambiente virtual de aprendizagem que, entre os
encontros presenciais, funcionará para a promoção das discussões acerca da
elaboração do relatório final. Esse fórum será coordenado pela pesquisadora com
monitoramento quinzenal.
3ª etapa: encontros mensais com os diretores, de março a junho, para apoio na
elaboração dos relatórios finais.
4ª etapa: encontro regionalizado (final) para conclusão dos trabalhos com
elaboração de um relatório final.
4 CRONOGRAMA DOS ENCONTROS PRESENCIAIS E VIRTUAIS
TEMA
FEV.
Histórico
das
Medidas
socioeducativas (MSE)
x
ECA e MSE
x
SINASE (o que é e a que veio)
Sistema de Garantia de Direitos
SMAAS-CIA/NAMSEP
Conhecendo o programa de
MSE
Trajetória do adolescente infrator
até o cumprimento da medida
Estudos de caso
Análise de dados estatísticos
MAR.
ABR.
x
x
x
x
x
MAIO
JUN.
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
JUL.
x
x
5 FORMATO
Encontros presenciais mensais: 2 horas diárias x 6 meses (12 horas) – local a ser
definido em parceria com a Gerência de Educação do Barreiro. Por se tratar de um
projeto piloto, o Barreiro foi escolhido por ter sido a região pesquisada e ter sido a
regional de atuação profissional da pesquisadora durante vários anos. Para além do
campo profissional, observa-se que o Barreiro é uma regional que possui escolas
que ofertam desde a Educação Infantil até o Ensino Médio, o que permitirá aos
diretores o acesso a dados que envolvem crianças e adolescentes acerca de
medidas protetivas e socioeducativas. Entendemos que o acesso a essas
informações contribuirão de maneira significativa para a construção de projetos
pedagógicos no interior das escolas.
89
Nos encontros de formação (mensais), serão realizadas oficinas teórico-práticas
fundamentadas em vídeos, filmes e experiências de outros municípios e estados.
Encontros virtuais: 3 horas semanais para acesso ao ambiente e participação nas
discussões x 4 meses (48 horas).
Será criado um curso no ambiente virtual de aprendizagem oficial da Prefeitura de
Belo Horizonte, disponível no endereço: www.ead.pbh.gov.br: em SMED/Educação
– Programas e Projetos da Educação – Medidas Socioeducativas.
A plataforma utilizada será o Moodle, e o curso terá o formato de tópicos com as
temáticas inseridas conforme cronograma.
6 RECURSOS
Físicos: liberação de uma sala de aula ou auditório para participação dos sujeitos
envolvidos (aproximadamente 30 pessoas por encontro). Data show, computadores,
arquivos digitais dos materiais que compõem as temáticas.
Virtuais:
ambiente
virtual
de
aprendizagem
disponível
no
endereço:
www.ead.pbh.gov.br e computadores ligados à internet para acesso ao ambiente
virtual de aprendizagem.
Humanos: professora pesquisadora.
7 AVALIAÇÃO
A avaliação dos participantes será processual, por meio da participação nos
encontros e discussões nos fóruns de aprendizagem disponibilizados no ambiente
virtual de aprendizagem.
REFERÊNCIAS
Serão utilizados como referência base os capítulos da dissertação de mestrado da
pesquisadora, bem como a própria bibliografia por ela utilizada.
90
REFERÊNCIAS
Agnaldo Soares Lima, Padre. Representante da Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República. Excertos. Palestra sobre a articulação em rede do
Sistema de Direitos e Garantias do Adolescente em Conflito com a Lei, proferida em
seminário comemorativo do primeiro ano de funcionamento do Núcleo de
Atendimento às Medidas Socioeducativas e Protetivas (Namsep-PBH), do Centro
Integrado de Atendimento ao Adolescente Autor de Ato de Infracional (CIA), em 19
fev. 2013. Belo Horizonte, PBH, 2013.
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Adolescente: orientações para incidir em políticas públicas. Oficina de Imagens
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Horizonte: DOM, 12 nov. 2008.
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Brasil], Brasília, 16 jul. 1990.
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socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional; e altera as
Leis nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (ECA); 7.560, de 19 de dezembro de 1986,
7.988, de 11 de Janeiro de 1990, 5.537, de 21 de Novembro de 1986, 8.315, de 23
de Dezembro de 1991, 8.706, de 14 de setembro de 1993, os Decretos-leis nº 4.048,
de 22 de janeiro de 1942, 8.621, de 10 de janeiro de 1946, e a Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.
Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, 19 jan. 2012.
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dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para
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TJMG - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS. Centro Integrado de
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Belo Horizonte: TJMG, 2010. 19p.
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WAISELFISZ, JulioJacobo. Ministério da Justiça do Brasil. Mapa da violência 2012:
os novos padrões da violência homicida no Brasil. São Paulo: Instituto Sangari,
2011.
98
APÊNDICE A
Identificação e caracterização dos sujeitos entrevistados
Sujeito
Caracterização
Informante 1
Gestor escolar, mestre, licenciado em matemática e física,
quatro anos e meio nesse cargo, oito anos como professor na
RME.
Informante 2
Coordenadora
pedagógica,
especialista,
licenciada
em
geografia, dez anos na RME.
Informante 3
Coordenadora de projetos especiais, especialista, licenciada
em Educação Física, 26 anos na RME.
Informante 4
Coordenadora do programa Escola Aberta, especialista,
licenciada em pedagogia, oito anos na RME.
Informante 5
Coordenadora do programa Escola Integrada, especialista,
licenciada em Letras, 22 anos na RME.
Informante 6
Coordenadora
de
turno,
especialista,
licenciada
em
pedagogia, dez anos na RME.
Informante 7
Professora atuante no programa Escola Aberta, especialista,
licenciada em pedagogia, sete anos na RME.
Informante 8
Professora, especialista, licenciada em letras, 19 anos na
RME. Já atuou como diretora e coordenadora pedagógica.
Atualmente
trabalha
na
coordenação
do
projeto
de
intervenção pedagógica do 3º ciclo.
Informante 9
Gerente regional, especialista, licenciada em Geografia, 26
anos na RME, 15 anos na gerência regional.
Informante 10
Coordenadora técnica SMAAS, psicóloga, 38 anos.
99
APÊNDICE B
Roteiro de entrevistas semiestruturadas aplicadas aos sujeitos envolvidos na
execução da medida socioeducativa de PSC.
SUJEITO SOCIAL:
Nome: --------------------------------------- Cargo/Função: --------------------------------Data da entrevista:___/___/___
DADOS PESSOAIS DO ENTREVISTADO
a) Localização espaço-temporal da atividade profissional (Breve descrição do
cargo/função)
b) Formação acadêmica
c) Idade
CENÁRIO DE ATENDIMENTO EM PSC
CONTEÚDO
a) Quem é o adolescente que está cumprindo a MSE de PSC?
b) Como esse adolescente chega à escola?
c) Como são definidas as ações em relação ao adolescente e quais são os objetivos
dessas ações?
d) Na sua compreensão, o que é atendimento socioeducativo e de PSC?
e) Há objetivos definidos em relação a esse adolescente? Como são estabelecidos
os objetivos?
100
f) Você conhece ou já leu alguma coisa sobre o SINASE? Fale um pouco, caso você
o conheça.
g) O que você espera alcançar com esse adolescente ao final do cumprimento da
MSE de PSC?
h) O trabalho educativo deve visar à educação para o exercício da cidadania. Nesse
sentido, qual é a concepção de cidadania que você procura transmitir?
l) O formato das atividades hoje propostas pela escola para o cumprimento da
medida de PSC contribui para a formação da cidadania dos adolescentes?
Justifique.
j) Na sua compreensão, a medida de PSC, cumprida nas escolas, contribui para que
o adolescente reveja seus atos (reparação)?
MÉTODO
a) Existe na escola o Projeto Político Pedagógico - PPP? Há atividades que
contemplem esses adolescentes?
b) A SMAS, bem como a SMED, fazem monitoramento das atividades desenvolvidas
pelos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de PSC?
c) Existe algum processo
de autoavaliação feito
pelo adolescente para
encaminhamento ao juizado da infância e adolescência?
d) Há algum tipo de envolvimento das famílias no cumprimento da medida
socioeducativa de PSC na escola?
e) Todos os adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de PSC estão
matriculados e frequentes na escola?
f) Entre as atividades desses adolescentes na escola, são contempladas atividades
nas áreas de esporte, cultura e lazer? Quais? Em que periodicidade?
101
g) Qual é o papel do coordenador pedagógico no atendimento socioeducativo?
h) Como e por quem é feito o acolhimento e recepção inicial do adolescente na
escola?
i) O adolescente possui técnico de referência? Quem realiza o acompanhamento
técnico do adolescente?
j) A responsabilidade direta pela execução do programa é da Secretaria de
Assistência Social. As escolas estão diretamente ligadas à Secretaria de Educação SMED. Você sabe se existe algum trabalho articulado entre as duas secretarias? E
com as escolas?
GESTÃO
a) Verifica-se que no município de Belo Horizonte o atendimento em PSC é feito em
grande parte nas escolas. Como é feita a seleção das escolas municipais para
recebimento desses adolescentes?
b) Com quem as Secretarias, gerência regional e escolas se articulam, visando
estabelecer
alianças
para
o
desenvolvimento
das
ações
socioeducativas
(organizações/órgãos governamentais; conselhos de direitos; conselho tutelar; com
os programas das medidas socioeducativas, secretarias e órgãos do Estado; poder
judiciário, MP e Defensoria Pública, empresariado, etc.)?
OUTRAS QUESTÕES
a) O ECA representa uma evolução no processo de efetivação da cidadania. Nesse
aspecto, trouxe avanços ou retrocessos no campo do atendimento?
b) Quais são os desafios no recebimento dos adolescentes para cumprimento das
medidas socioeducativas nas escolas?
c) Que mudanças ainda são necessárias à medida de PSC nas escolas?
102
APÊNDICE C
Roteiro de entrevista semiestruturada aplicada aos gestores da medida
socioeducativa de PSC
SUJEITO SOCIAL:
Nome: --------------------------------------- Cargo/Função:--------------------------------Data da entrevista:___/___/___
DADOS PESSOAIS DO ENTREVISTADO
a) Localização espaço-temporal da atividade profissional (Breve descrição do
cargo/função):
b) Formação acadêmica:
c) Idade:
CENÁRIO DE ATENDIMENTO EM PSC
CONTEÚDO
a) Quem é o adolescente que está cumprindo a MSE de PSC nas escolas da
Regional Barreiro?
b) Como esse adolescente chega à escola?
c) Como são definidas as ações em relação ao adolescente e quais os objetivos
dessas ações?
d) Na sua compreensão, o que é atendimento socioeducativo e de PSC?
e) Há objetivos definidos em relação a esse adolescente? Como são estabelecidos
os objetivos?
103
f) Você conhece ou já leu alguma coisa sobre o SINASE? Fale um pouco, caso você
o conheça.
g) O que você espera alcançar com esse adolescente ao final do cumprimento da
MSE de PSC?
h) O trabalho educativo deve visar à educação para o exercício da cidadania. Nesse
sentido, qual é a concepção de cidadania que você procura transmitir?
l) O formato das atividades hoje propostas pelas escolas para o cumprimento da
medida de PSC contribui para a formação da cidadania dos adolescentes?Justifique.
j) Na sua compreensão, a medida de PSC, cumprida nas escolas, contribui para que
o adolescente reveja seus atos (reparação)?
MÉTODO
a) A SMAAS, bem como a SMED, fazem monitoramento das atividades
desenvolvidas pelos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de
PSC?
b) Existe algum processo de
autoavaliação feito pelo adolescente para
encaminhamento ao juizado da infância e adolescência?
c) Há algum tipo de envolvimento das famílias no cumprimento da medida
socioeducativa de PSC na escola?
d) Todos os adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de PSC estão
matriculados e frequentes na escola?
e) O adolescente possui técnico de referência? Quem realiza o acompanhamento
técnico do adolescente?
104
f) A responsabilidade direta pela execução do programa é da Secretaria Adjunta de
Assistência Social. As escolas estão diretamente ligadas à Secretaria de Educação SMED. Você sabe se existe algum trabalho articulado entre as duas secretarias? E
com as escolas?
GESTÃO
a) Verifica-se que no município de Belo Horizonte o atendimento em PSC é feito em
grande parte nas escolas. Como é feita a seleção das escolas municipais para
recebimento desses adolescentes?
b) Com quem as Secretarias, gerência regional e escolas se articulam, visando
estabelecer
alianças
para
o
desenvolvimento
das
ações
socioeducativas
(organizações/órgãos governamentais; conselhos de direitos; conselho tutelar; com
os programas das medidas socioeducativas, secretarias e órgãos do Estado; poder
judiciário, MP e Defensoria Pública, empresariado, etc.)?
c) A partir de quando as escolas da Regional Barreiro começaram a receber
adolescentes para cumprimento de medida socioeducativa?
d) Atualmente, quantos adolescentes estão cumprindo medida socioeducativa de
PSC nas escolas da Regional Barreiro?
OUTRAS QUESTÕES
a) O ECA representa uma evolução no processo de efetivação da cidadania. Nesse
aspecto, trouxe avanços ou retrocessos no campo do atendimento?
b) Quais são os desafios no recebimento dos adolescentes para cumprimento das
medidas socioeducativas nas escolas?
c) Que mudanças ainda são necessárias à medida de PSC nas escolas?
105
APÊNDICE D
Questionário enviado às escolas
Questionário fechado aplicado aos gestores escolares que recebem e/ou receberam
adolescentes para cumprimento de medida socioeducativa de PSC no período de
2009 a 2012
Escola:...................................................................................................................
1)Cargo/Função:.....................................................Idade:.....................................
2) Sexo: () masculino. () feminino.
3) Há quanto tempo você está/esteve na direção desta escola?..................
4) Há quanto tempo você trabalha nesta escola?................................................
5) Você reside na mesma comunidade onde a escola está localizada?
() Sim. () Não.
6) Você já havia desenvolvido algum trabalho com adolescente autor de ato
infracional antes de assumir a direção desta escola?
() Sim. Onde? ............................................................() Não.
7) Você já ouviu falar no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo-SINASE?
() Sim. () Não.
8) Você conhece as medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do
Adolescente - ECA ?
() Sim. () Não.
9) Ao receber um adolescente para cumprimento de medida socioeducativa de
Prestação de Serviços à Comunidade na escola, o coletivo de professores da escola
é informado?
() Sim. () Não.
10) Há debate entre os professores sobre o que fazer?
() Sim. De quê?..................................... Qual?.........................................
() Não.
11) Quem coordena as atividades desses adolescentes na escola?
() Direção. () Coordenação pedagógica. () Professor.
() Coordenador do programa Escola Aberta. () Outros: .................................
12) Quais atividades são destinadas a esses adolescentes?
106
() Apoio/monitor para oficinas pedagógicas.
() Apoio/monitor de atividades esportivas.
() Limpeza da escola.
() Manutenção da horta escolar.
() Serviços de capina.
() Serviços de manutenção da escola (pequenos reparos).
() Outros .......................................................................................................... ..
13) De que forma os adolescentes cumprem a medida socioeducativa nesta escola?
() Aos finais de semana.
() Variável: às vezes final de semana; às vezes durante a semana.
() Durante a semana.
() Depende do adolescente.
() Outros ............................................................................................................
14) Como é feito o acompanhamento /frequência desses adolescentes?
() Há uma folha de registro específica da escola.
() Há uma folha de registro da Secretaria de Assistência Social.
() É feito através de registros da escola e da Secretaria de Assistência Social.
() Outros ............................................................................................................
15) Há algum tipo de registro das atividades desenvolvidas pelos adolescentes na
escola?
() Sim. De que forma?....................................................................................
() Não.
16) No período de 2009 a 2012, quantos adolescentes em cumprimento de medida
socioeducativa de PSC a escola recebeu?
() Até 3 adolescentes.
() De 4 a 6 adolescentes.
() De 7 a 10 adolescentes.
() Mais de 10 adolescentes.
17) Durante o cumprimento da medida socioeducativa, as famílias dos adolescentes
procuram a escola para acompanhar o processo?
() Nunca. () Às vezes. () Sempre.
18) A medida socioeducativa de Prestação de Serviços à Comunidade é uma das
medidas socioeducativas previstas no ECA. Você tem conhecimento de quem é a
responsabilidade pela execução do programa?
() Sim. () Não.
19) Você já recebeu algum adolescente em cumprimento de medida socioeducativa
de PSC que tenha trazido algum problema para a escola no período de cumprimento
da medida?
107
() Sim. Qual tipo de problema?.........................................................................
() Não.
20) Você acredita que o cumprimento de medida socioeducativa de PSC nas
escolas contribui para o processo de aprendizagem e socialização do adolescente
infrator?
() Sim. () Não.
21) Existe algum tipo de autoavaliação que o adolescente faz quando termina o
cumprimento da medida socioeducativa na escola?
() Sim. () Não.
22) Essa avaliação é registrada em documento?
() Sim. () Não.
23) A escola (gestores) encaminha algum relatório para algum órgão específico
sobre esses adolescentes?
() Sim. Qual órgão?..................................................() Não.
24) A avaliação do adolescente entra no relatório?
() Sim. () Não.
25) Há algum tipo de inserção desses adolescentes no convívio diário com os alunos
do tempo regular de aula?
() Sim. Como?.......................................................................() Não.
26) A Secretaria Municipal de Educação promove alguma formação com esta
temática (Medidas socioeducativas) para os gestores escolares?
() Promove sempre. () Nunca promoveu. () Promove periodicamente.
27) Em sua opinião, a temática “Medidas socioeducativas” deveria ser inserida no
Projeto Político Pedagógico das escolas?
() Sim. () Não.
28) O corpo funcional (direção, professores, demais trabalhadores) da escola resiste
em receber o adolescente em medida socioeducativa?
() Sim. () Não.
29) Os alunos regulares resistem em receber o adolescente em cumprimento de
medida socioeducativa?
() Sim. () Não.
108
Anexo A
Parâmetros da Gestão Pedagógica no Atendimento Socioeducativo28
O adolescente deve ser alvo de um conjunto de ações socioeducativas que
contribua na sua formação, de modo que venha a ser um cidadão autônomo e
solidário, capaz de se relacionar melhor consigo mesmo, com os outros e com tudo
que integra a sua circunstância e sem reincidir na prática de atos infracionais. Ele
deve desenvolver a capacidade de tomar decisões fundamentadas, com critérios
para avaliar situações relacionadas ao interesse próprio e ao bem-comum,
aprendendo com a experiência acumulada individual e social, potencializando sua
competência pessoal, relacional, cognitiva e produtiva.
Os parâmetros norteadores da ação e gestão pedagógicas para as entidades
e/ou programas de atendimento que executam a internação provisória e as medidas
socioeducativas devem propiciar ao adolescente o acesso a direitos e às
oportunidades de superação de sua situação de exclusão, de ressignificação de
valores, bem como o acesso à formação de valores para a participação na vida
social, vez que as medidas socioeducativas possuem uma dimensão jurídicosancionatória e uma dimensão substancial ético-pedagógica. Seu atendimento deve
estar organizado observando o princípio da incompletude institucional. Assim, a
inclusão dos adolescentes pressupõe sua participação em diferentes programas e
serviços sociais e públicos.
O atendimento inicial previsto no ECA, e, portanto, contemplado no SINASE,
refere-se aos procedimentos e serviços jurídicos que envolvem o processo de
apuração de ato infracional atribuído ao adolescente. Esses diferentes atos que
compõem a ação judicial socioeducativa realizados por diferentes órgãos
(Segurança Pública, Ministério Público, Defensoria Pública, Juizado da Infância e
Juventude e Assistência Social) denominam-se de Atendimento Inicial. Assim, após
sua apreensão em flagrante de ato infracional, deverá: ser apresentado à autoridade
28
O atendimento socioeducativo mencionado neste capítulo refere-se ao atendimento prestado pelas
entidades e/ou programas que executam as medidas socioeducativas e internação provisória, tendo
em vista que todas as modalidades de atendimento compõem o Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo (BRASIL.
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente.
Secretaria Executiva Fórum Nacional DCA. Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo – SINASE. Brasília: FNDCA, 2009.).
109
policial, liberado aos pais ou apresentado ao Ministério Público, apresentado à
autoridade
Judiciária,
e
encaminhado
para
o
programa
socioeducativo (internação provisória) para posterior
de
atendimento
aplicação de
medida
socioeducativa. O adolescente acusado de prática de ato infracional deve ter o seu
Atendimento Inicial agilizado, reduzindo-se oportunidades de violação de direitos,
devendo para tanto haver a integração entre os órgãos envolvidos. Contudo, o ECA
não exige que esses serviços aconteçam num mesmo local – condição esta que é
preferencial – cabendo aos órgãos envolvidos sua conveniência e oportunidade.
Portanto, em razão da especificidade, limite de tempo e natureza desse atendimento
inicial, os parâmetros pedagógicos descritos neste capítulo caberão apenas à
internação provisória e às medidas socioeducativas.
Ressalta-se, porém, que os procedimentos e ações desenvolvidas no
Atendimento Inicial realizado até a decisão judicial da aplicação da internação
provisória estão devidamente fundamentados nos princípios dos direitos humanos,
e, sobretudo, estão assegurados e descritos detalhadamente neste documento (no
capítulo 3) e em especial destaque nos princípios gerais do SINASE: I, III, IV, V, VI,
IX, XV, XVI e XVII.
6.1. Diretrizes pedagógicas do atendimento socioeducativo
As entidades de atendimento e/ou programas que executam a internação
provisória e as medidas socioeducativas de prestação de serviço à comunidade,
liberdade assistida, semiliberdade e internação deverão orientar e fundamentar a
prática pedagógica nas seguintes diretrizes:
1. Prevalência da ação socioeducativa sobre os aspectos meramente
sancionatórios
As medidas socioeducativas29 possuem em sua concepção básica uma
natureza sancionatória, vez que responsabilizam judicialmente os adolescentes,
estabelecendo restrições legais e, sobretudo, uma natureza sócio-pedagógica, haja
vista que sua execução está condicionada à garantia de direitos e ao
desenvolvimento de ações educativas que visem à formação da cidadania. Dessa
29
Referindo-se também à internação provisória.
110
forma, a sua operacionalização inscreve-se na perspectiva ético-pedagógica.
2. Projeto pedagógico como ordenador de ação e gestão do atendimento
socioeducativo
Os programas devem ter, obrigatoriamente, projeto pedagógico claro e escrito
em consonância com os princípios do SINASE. O projeto pedagógico deverá conter
minimamente:
objetivos,
público-alvo,
capacidade,
fundamentos
teórico-
metodológicos, ações/atividades, recursos humanos e financeiros, monitoramento e
avaliação de domínio de toda a equipe. Este projeto será orientador na elaboração
dos demais documentos institucionais (regimento interno, normas disciplinares,
plano individual de atendimento). Sua efetiva e consequente operacionalização
estará condicionada à elaboração do planejamento das ações (mensal, semestral,
anual) e consequente monitoramento e avaliação (de processo, impacto e
resultado), a ser desenvolvido de modo compartilhado (equipe institucional,
adolescentes e famílias).
3. Participação dos adolescentes na construção, no monitoramento e na
avaliação das ações socioeducativas
É fundamental que o adolescente ultrapasse a esfera espontânea de
apreensão da realidade para chegar à esfera crítica da realidade, assumindo
conscientemente seu papel de sujeito. Contudo, esse processo de conscientização
acontece no ato de ação-reflexão. Portanto, as ações socioeducativas devem
propiciar concretamente a participação crítica dos adolescentes na elaboração,
monitoramento e avaliação das práticas sociais desenvolvidas, possibilitando, assim,
o exercício – enquanto sujeitos sociais – da responsabilidade, da liderança e da
autoconfiança.
4.
Respeito
à
singularidade
do
adolescente,
presença
educativa
e
exemplaridade como condições necessárias na ação socioeducativa.
Fazer-se presente na ação socioeducativa dirigida ao adolescente é aspecto
fundamental para a formação de um vínculo. A presença construtiva, solidária,
favorável e criativa representa um passo importante para a melhoria da qualidade da
relação estabelecida entre educadores e adolescentes.
Nesse sentido,
a
exemplaridade
é aspecto
fundamental.
Educar
-
111
particularmente no caso de adolescentes, - consiste em ensinar aquilo que se é.
Portanto, a forma como o programa de atendimento socioeducativo organiza suas
ações, a postura dos profissionais, construída em bases éticas, frente às situações
do dia-a-dia, contribuirá para uma atitude cidadã do adolescente.
A ação socioeducativa deve respeitar as fases de desenvolvimento integral do
adolescente levando em consideração suas potencialidades, sua subjetividade, suas
capacidades
e
suas
limitações,
garantindo
a
particularização
no
seu
acompanhamento. Portanto, o plano individual de atendimento (PIA) é um
instrumento pedagógico fundamental para garantir a equidade no processo
socioeducativo.
5.
Exigência
e
reconhecimento
compreensão,
e
respeito
ao
enquanto
elementos
adolescente
durante
primordiais
o
de
atendimento
socioeducativo
Exigir dos adolescentes é potencializar suas capacidades e habilidades, é
reconhecê-los como sujeitos com potencial para superar suas limitações. No
entanto, a compreensão deve sempre anteceder a exigência. É preciso conhecer
cada adolescente e compreender seu potencial e seu estágio de crescimento
pessoal e social. Além disso, devem-se fazer exigências possíveis de serem
realizadas pelos adolescentes, respeitando sua condição peculiar e seus direitos.
6. Diretividade no processo socioeducativo
A diretividade pressupõe a autoridade competente, diferentemente do
autoritarismo que estabelece arbitrariamente um único ponto de vista. Técnicos e
educadores são os responsáveis pelo direcionamento das ações, garantindo a
participação dos adolescentes e estimulando o diálogo permanente.
7. Disciplina como meio para a realização da ação socioeducativa
A disciplina deve ser considerada como instrumento norteador do sucesso
pedagógico, tornando o ambiente socioeducativo um polo irradiador de cultura e
conhecimento e não ser vista apenas como um instrumento de manutenção da
ordem institucional.
A questão disciplinar requer acordos definidos na relação entre todos no
ambiente socioeducativo (normas, regras claras e definidas) e deve ser meio para a
112
viabilização de um projeto coletivo e individual, percebida como condição para que
objetivos compartilhados sejam alcançados e, sempre que possível, participar na
construção das normas disciplinares.
8. Dinâmica institucional garantindo a horizontalidade na socialização das
informações e dos saberes em equipe multiprofissional
Muito embora as ações desenvolvidas pela equipe multiprofissional (técnicos
e educadores) sejam diferenciadas, essa diferenciação não deve gerar uma
hierarquia de saberes, impedindo a construção conjunta do processo socioeducativo
de forma respeitosa, democrática e participativa. Para tanto, é necessário garantir
uma dinâmica institucional que possibilite a contínua socialização das informações e
a construção de saberes entre os educadores e a equipe técnica dos programas de
atendimento.
9.
Organização
espacial
e
funcional
das
Unidades
de
atendimento
socioeducativo que garantam possibilidades de desenvolvimento pessoal e
social para o adolescente
O espaço físico e sua organização espacial e funcional, as edificações, os
materiais e os equipamentos utilizados nas Unidades de atendimento socioeducativo
devem estar subordinados ao projeto pedagógico, pois este interfere na forma e no
modo de as pessoas circularem no ambiente, no processo de convivência e na
forma de as pessoas interagirem, refletindo, sobretudo, a concepção pedagógica,
tendo em vista que a não observância poderá inviabilizar a proposta pedagógica.
10. Diversidade étnico-racial, de gênero e de orientação sexual norteadora da
prática pedagógica
Questões da diversidade cultural, da igualdade étnico-racial, de gênero, de
orientação sexual deverão compor os fundamentos teórico-metodológicos do projeto
pedagógico dos programas de atendimento socioeducativo; sendo necessário
discutir, conceituar e desenvolver metodologias que promovam a inclusão desses
temas, interligando-os às ações de promoção de saúde, educação, cultura,
profissionalização e cidadania na execução das medidas socioeducativas,
possibilitando práticas mais tolerantes e inclusivas.
113
11.
Família
e
comunidade
participando
ativamente
da
experiência
socioeducativa
A participação da família, da comunidade e das organizações da sociedade
civil voltadas a defesa dos direitos da criança e do adolescente na ação
socioeducativa é fundamental para a consecução dos objetivos da medida aplicada
ao adolescente.
As práticas sociais devem oferecer condições reais, por meio de ações e
atividades programáticas à participação ativa e qualitativa da família no processo
socioeducativo, possibilitando o fortalecimento dos vínculos e a inclusão dos
adolescentes no ambiente familiar e comunitário. As ações e atividades devem ser
programadas a partir da realidade familiar e comunitária dos adolescentes para que
em conjunto – programa de atendimento, adolescentes e familiares – possam
encontrar respostas e soluções mais aproximadas de suas reais necessidades.
Tudo que é objetivo na formação do adolescente é extensivo à sua família.
Portanto, o protagonismo do adolescente não se dá fora das relações mais íntimas.
Sua cidadania não acontece plenamente se ele não estiver integrado à comunidade
e compartilhando suas conquistas com a sua família.
12. Formação continuada dos atores sociais
A formação continuada dos atores sociais envolvidos no atendimento
socioeducativo é fundamental para a evolução e aperfeiçoamento de práticas sociais
ainda muito marcadas por condutas assistencialistas e repressoras. Ademais, a
periódica discussão, elaboração interna e coletiva dos vários aspectos que cercam a
vida dos adolescentes, bem como o estabelecimento de formas de superação dos
entraves que se colocam na prática socioeducativa exigem capacitação técnica e
humana permanente e contínua considerando, sobretudo o conteúdo relacionado
aos direitos humanos.
A capacitação e a atualização continuada sobre a temática “Criança e
Adolescente” devem ser fomentadas em todas as esferas de governo e pelos três
Poderes, em especial às equipes dos programas de atendimento socioeducativo, de
órgãos responsáveis pelas políticas públicas e sociais que tenham interface com o
SINASE, especialmente a política de saúde, de educação, esporte, cultura e lazer, e
de segurança pública.
114
6.2. Dimensões básicas do atendimento socioeducativo
As entidades e/ou programas de atendimento que executam a internação
provisória e as medidas socioeducativas devem estruturar-se em seis dimensões
básicas visando à concretização de uma prática pedagógica sustentável e
garantista. Essas dimensões são extensivas a todos os programas de atendimento
que executam a internação provisória e as medidas socioeducativas, guardando as
especificidades na execução do atendimento.
6.2.1. Espaço físico, infraestrutura e capacidade
As estruturas físicas das Unidades de atendimento e/ou programas serão
orientadas pelo projeto pedagógico e estruturadas de modo a assegurar a
capacidade física para o atendimento adequado à execução desse projeto e a
garantia dos direitos fundamentais dos adolescentes.
Em se tratando de medidas em meio aberto (prestação de serviço à
comunidade e liberdade assistida) é importante que se mantenha um local
específico para a sua execução, contando com salas de atendimento individuais e
em grupo, sala de técnicos e demais condições para garantir que a estrutura física
facilite o acompanhamento dos adolescentes e seus familiares.
Para os programas que executam a medida de semiliberdade, a capacidade
não
deverá
exceder
a
vinte
adolescentes
para
que
se
mantenha
um
acompanhamento mais individualizado. O programa de atendimento deverá ser
realizado, preferencialmente, em casas residenciais localizadas em bairros
comunitários, considerando na organização do espaço físico os aspectos logísticos
necessários para a execução do atendimento dessa modalidade socioeducativa
sem, contudo, descaracterizá-la de uma moradia residencial. Também deverá ser
respeitada a separação entre os adolescentes que receberam a medida de
semiliberdade como progressão de medida e aqueles que a receberam como
primeira medida.
Em relação à estrutura física, é condição fundamental que as entidades e/ou
programas de atendimento que executam a internação provisória e as medidas
socioeducativas assegurem:
115
30
A arquitetura socioeducativa deve ser concebida como espaço que permita a
visão de um processo indicativo de liberdade, não de castigos e nem da sua
naturalização.
No caso das entidades e/ou programas de execução de medidas
socioeducativas de internação, a organização do espaço físico deverá prever e
possibilitar a mudança de fases do atendimento do adolescente mediante a
mudança de ambientes (de espaços) de acordo com as metas estabelecidas e
conquistadas no plano individual de atendimento (PIA), favorecendo maior
concretude em relação aos seus avanços e/ou retrocessos do processo
socioeducativo. Sendo assim, são três as fases do atendimento socioeducativo: a)
fase inicial de atendimento: período de acolhimento, de reconhecimento e de
elaboração por parte do adolescente do processo de convivência individual e grupal,
tendo como base as metas estabelecidas no PIA; b) fase intermediária: período de
compartilhamento em que o adolescente apresenta avanços relacionados nas metas
consensuadas no PIA; e c) fase conclusiva: período em que o adolescente
30
Quanto à medida socioeducativa de prestação de serviço à comunidade os aspectos físicos
considerados referem-se ao local de cumprimento da medida socioeducativa.
116
apresenta clareza e conscientização das metas conquistadas em seu processo
socioeducativo. Independentemente da fase socioeducativa em que o adolescente
se encontra, há necessidade de se ter espaço físico reservado para aqueles que se
encontram ameaçados em sua integridade física e psicológica, denominada no
SINASE de convivência protetora.
Um aspecto importante para o SINASE é a definição do número de
adolescentes por Unidade de internação, pois estes necessitam de um nível de
atenção mais complexo dentro do sistema de garantia e defesa de direitos.
Para tanto, é preciso resgatar estudos importantes sobre privação familiar e
sobre as instituições.31 A privação do ambiente familiar e social traz mais problemas
do que benefícios àqueles que são submetidos a ela. Não é possível desconsiderar
que historicamente foi construído um ideário de que a institucionalização era
apropriada para determinado grupo de crianças e adolescentes, aqueles
considerados em situação irregular, justificando a separação da família e da
sociedade dentro do modelo institucional correcional-repressivo. O ECA consagra a
doutrina de proteção integral sendo, a convivência familiar e comunitária um dos
direitos fundamentais e imprescindíveis para o pleno desenvolvimento de toda
criança e adolescente.
O adolescente em cumprimento de medida socioeducativa de internação
recebe como sanção a privação da liberdade do convívio com a sua família e
comunidade. Entretanto, para que se assegure o seu direito de cidadania e os danos
não sejam ainda maiores, a entidade e/ou programa de atendimento deve garantir
que o adolescente tenha acesso aos seus demais direitos.
Um importante passo nesse sentido consiste na mudança, radical, da
estrutura dos grandes complexos e centros de internação, para locais adequados a
um número reduzido de adolescentes onde recebem assistência individualizada,
possibilitando o melhor acompanhamento e sua inserção social e amenizando os
efeitos danosos da privação de liberdade como: ansiedade de separação, carência
afetiva, baixa autoestima, afastamento da vivência familiar e comunitária,
dificuldades de compreender as relações comuns do cotidiano, entre outros.
No SINASE considera-se que Unidade é o espaço arquitetônico que unifica,
concentra, integra o atendimento ao adolescente com autonomia técnica e
31
Bowlby,1996.
117
administrativa, com quadro próprio de pessoal, para o desenvolvimento de um
programa de atendimento e um projeto pedagógico específico. Neste sentido, cada
Unidade terá até quarenta adolescentes, conforme a resolução nº 46/96 do
Conanda,32 sendo constituída de espaços residenciais denominados de módulos
(estruturas físicas que compõem uma Unidade), com capacidade não superior a
quinze adolescentes. No caso de existir mais de uma Unidade em um mesmo
terreno, o atendimento total não poderá ultrapassar a noventa adolescentes. Neste
conjunto de Unidades poderá existir um núcleo comum de administração logística
(vide capítulo 7).
Somente a partir da mudança da estrutura física baseada num projeto
pedagógico e com profissionais capacitados será possível humanizar o atendimento
e transformar as Unidades em ambientes verdadeiramente socioeducativos.
6.2.2. Desenvolvimento pessoal e social do adolescente
Segundo o Paradigma do Desenvolvimento Humano do Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) “toda pessoa nasce com um
potencial e tem direito de desenvolvê-lo. Para desenvolver o seu potencial as
pessoas precisam de oportunidades. O que uma pessoa se torna ao longo da vida
depende de duas coisas: as oportunidades que tem e as escolhas que fez. Além de
ter oportunidades as pessoas precisam ser preparadas para fazer escolhas”.
Portanto, as pessoas devem ser dotadas de critérios para avaliar e tomar decisões
fundamentadas.
As ações socioeducativas devem exercer uma influência sobre a vida do
adolescente, contribuindo para a construção de sua identidade, de modo a favorecer
a elaboração de um projeto de vida, o seu pertencimento social e o respeito às
diversidades (cultural, étnico-racial, de gênero e orientação sexual), possibilitando
que assuma um papel inclusivo na dinâmica social e comunitária. Para tanto, é vital
a criação de acontecimentos que fomentem o desenvolvimento da autonomia, da
solidariedade e de competências pessoais relacionais, cognitivas e produtivas.
Nesse sentido, a elaboração do Plano Individual de Atendimento (PIA)
32
Resolução de 29 de outubro de 1996. Publicada no DOU Seção 1 de 08/01/97. Regulamenta a
execução da medida socioeducativa de internação prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente,
Lei n° 8.069/90.
118
constitui-se numa importante ferramenta no acompanhamento da evolução pessoal
e social do adolescente e na conquista de metas e compromissos pactuados com
esse adolescente e sua família durante o cumprimento da medida socioeducativa. A
elaboração do PIA se inicia na acolhida do adolescente no programa de atendimento
e o requisito básico para sua elaboração é a realização do diagnóstico
polidimensional por meio de intervenções técnicas junto ao adolescente e sua
família, nas áreas:
a) Jurídica: situação processual e providências necessárias;
b) Saúde: física e mental proposta;
c) Psicológica: (afetivo-sexual) dificuldades, necessidades, potencialidades,
avanços e retrocessos;
d) Social: relações sociais, familiares e comunitárias, aspectos dificultadores e
facilitadores da inclusão social; necessidades, avanços e retrocessos.
e)
Pedagógica:
estabelecem-se
metas
relativas
à:
escolarização,
profissionalização, cultura, lazer e esporte, oficinas e autocuidado. Enfoca os
interesses, potencialidades, dificuldades, necessidades, avanços e retrocessos.
Registra as alterações (avanços e retrocessos) que orientarão na pactuação de
novas metas.
A evolução ou crescimento pessoal e social do adolescente deve ser
acompanhado diuturnamente, no intuito de fazê-lo compreender onde está e aonde
quer chegar e seu registro deve se dar no PIA.
6.2.3. Direitos humanos
As entidades e/ou programas de atendimento socioeducativo deverão
oferecer e garantir o acesso aos programas públicos e comunitários (de acordo com
a modalidade de atendimento): escolarização formal; atividades desportivas,
culturais e de lazer com regularidade e frequência dentro e fora dos programas de
atendimento; assistência religiosa; atendimento de saúde na rede pública
(atendimento odontológico; cuidados farmacêuticos; inclusão em atendimento à
saúde mental aos adolescentes que dele necessitem, preferencialmente, na rede
SUS extra-hospitalar; à saúde reprodutiva e sexual, ao tratamento de doenças
crônicas e cuidados especiais à saúde); inserção em atividades profissionalizantes e
119
inclusão no mercado de trabalho, inclusive para os adolescentes com deficiência em
conformidade com o Decreto nº 3.298 de 20 de dezembro de 1999. 33
É necessário, ainda, que os programas de atendimento se organizem de
forma a garantir alimentação de qualidade e em quantidade suficientes; vestuário
para todos que necessitarem em quantidade e correspondente às variações
climáticas, de higiene pessoal em quantidade suficiente (medidas privativas de
liberdade); acesso à documentação necessária ao exercício da sua cidadania e
documentação escolar reconhecida pelo sistema público de ensino, bem como a
inserção de adolescentes ameaçados em sua vida e em sua integridade física, em
programas especiais de proteção.
6.2.4. Acompanhamento técnico
É imprescindível a composição de um corpo técnico que tenha conhecimento
específico na área de atuação profissional e, sobretudo, conhecimento teóricoprático em relação à especificidade do trabalho a ser desenvolvido. Sendo assim, os
programas socioeducativos devem contar com uma equipe multiprofissional com
perfil capaz de acolher e acompanhar os adolescentes e suas famílias em suas
demandas bem como atender os funcionários; com habilidade de acessar a rede de
atendimento pública e comunitária para atender casos de violação, promoção e
garantia de direitos.
As diferentes áreas do conhecimento são importantes e complementares no
atendimento integral dos adolescentes. A psicologia, a terapia ocupacional, o serviço
social, a pedagogia, a antropologia, a sociologia, a filosofia e outras áreas afins que
possam
agregar
conhecimento
no
campo
do
atendimento
das
medidas
socioeducativas.
Para compor a equipe técnica de saúde, a Portaria Interministerial nº 340 de
14/07/200434, que estabelece diretrizes de implementação à saúde do adolescente
em conflito com a lei em regime de internação e internação provisória, recomenda
33
Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a
Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras
providências. Publicado no DOU de 21/12/99.
34
Organiza a atenção à saúde integral dos adolescentes privados de liberdade, que beneficiará
adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação nas 27 Unidades Federadas.
120
como equipe profissional mínima a presença de médico, enfermeiro, cirurgião
dentista, psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, auxiliar de enfermagem
e auxiliar de consultório dentário a fim de garantir os cuidados de atenção à saúde
do adolescente. No caso de adolescente em cumprimento de medida socioeducativa
em meio aberto as equipes devem ser acessadas dentro da perspectiva da
incompletude institucional.
Os programas de atendimento socioeducativo deverão facilitar o acesso e
oferecer – assessorados ou dirigidos pelo corpo técnico – atendimento psicossocial
individual e com frequência regular, atendimento grupal, atendimento familiar,
atividades de restabelecimento e manutenção dos vínculos familiares, acesso à
assistência jurídica ao adolescente e sua família dentro do Sistema de Garantia de
Direitos e acompanhamento opcional para egressos da internação.
6.2.5. Recursos humanos
Os programas de atendimento que executam a internação provisória e as
medidas socioeducativas deverão buscar profissionais qualificados para o
desempenho das funções, utilizando critérios definidos para seleção e contratação
de pessoal, entre eles a análise de currículo, prova escrita de conhecimentos e
entrevista.
Deverão, ainda, oportunizar e oferecer formação e capacitação continuada
específica para o trabalho socioeducativo e em serviço, sendo esta parte da política
de recursos humanos compreendendo minimamente as seguintes ações:
a) capacitação introdutória: é específico e anterior à inserção do funcionário
ao sistema, tendo como referência os princípios legais e éticos da comunidade
educativa e o projeto pedagógico;
b) formação continuada: atualização e aperfeiçoamento durante o trabalho
para melhorar a qualidade dos serviços prestados e promover o profissional
continuamente;
c) supervisão externa e/ou acompanhamento das Unidades e/ou programas:
coordenada por especialistas extrainstitucionais, cria-se um espaço onde os agentes
socioeducativos podem expor suas dificuldades e conflitos nos diversos âmbitos
(afetivo, pessoais, relacionais, técnicos, grupais, institucionais) da prática cotidiana,
com o objetivo de redirecionamento dos rumos, visando à promoção dos princípios
ético-políticos da comunidade socioeducativa.
Incluem-se também o acompanhamento e a participação dos conselhos
121
profissionais (das diferentes áreas do conhecimento que atuam no atendimento),
dos governos federal, estadual, distrital e municipal, dos diversos Conselhos de
controle social e das universidades para a garantia, apoio e a participação na
formação, na capacitação, na elaboração de pesquisas, no monitoramento e na
avaliação institucional.
6.2.6. Alianças estratégicas
As parcerias e alianças estratégicas são fundamentais para a constituição da
rede de atendimento social indispensáveis para a inclusão dos adolescentes no
convívio social. Assim, as entidades e/ou programas de atendimento socioeducativo
devem
buscar
articulação
com
as
organizações
não-governamentais
e
governamentais, as universidades, os conselhos de direitos, os conselhos tutelares,
a mídia, os demais programas socioeducativos, os órgãos das diferentes políticas
públicas e das esferas governamentais (federal, estadual, distrital e municipal), com
os movimentos sociais, o sistema de justiça e com a iniciativa privada, visando o
desenvolvimento de suas ações.
6.3. Parâmetros socioeducativos
Os parâmetros da ação socioeducativa estão organizados pelos seguintes
eixos estratégicos: suporte institucional e pedagógico; diversidade étnico-racial, de
gênero e de orientação sexual; cultura, esporte e lazer; saúde; escola;
profissionalização/ trabalho/previdência; família e comunidade e segurança. Sendo
assim, no detalhamento desses parâmetros será descrito, inicialmente, aqueles
comuns a todas as entidades e/ou programas que executam as medidas
socioeducativas e a internação provisória e em seguida aqueles específicos de cada
modalidade de atendimento socioeducativo.
6.3.1. Eixo – Suporte institucional e pedagógico
6.3.1.1. Comum a todas as entidades e/ou programas que executam a
internação provisória e as medidas socioeducativas
1) estar inscritos no Conselho Municipal/Distrital dos Direitos da Criança e do
Adolescente (CMDCA);
2) ter projeto pedagógico elaborado que contemple basicamente objetivos,
122
público
alvo,
capacidade
de
atendimento,
referencial
teórico-metodológico,
ações/atividades, recursos humanos e financeiros, monitoramento e avaliação;
3) dispor de espaço físico/arquitetônico apropriado para o desenvolvimento da
proposta pedagógica garantista, rejeitando locais provisórios e sem condições para
o atendimento socioeducativo;
4) ter critérios objetivamente definidos quanto a perfil e habilidades
específicas
dos
profissionais,
socioeducadores,
orientadores,
estagiários
e
voluntários que integrem ou venham a integrar a equipe do atendimento
socioeducativo;
5) construir instrumentais para o registro sistemático das abordagens e
acompanhamentos aos adolescentes: plano individual de atendimento (PIA),
relatórios de acompanhamento, controle e registro das atividades individuais,
grupais e comunitárias, dados referentes ao perfil socioeconômico dos adolescentes
e de sua família e outros;
6) consolidar mensalmente os dados referentes a entradas e saídas dos
adolescentes, perfil do adolescente (idade, gênero, raça/etnia, procedência, situação
com o sistema de justiça, tipificação de ato infracional, renda familiar, escolarização
antes e durante o cumprimento da medida, atividades profissionalizantes antes e
depois do cumprimento da medida, uso indevido de drogas e registro da
reincidência);
7) garantir prazos estabelecidos na sentença em relação ao envio de
relatórios de início de cumprimento de medida, circunstanciados, de avaliação da
medida e outros necessários;
8) realizar acompanhamento sistemático por meio de encontros individuais
e/ou em grupos dos adolescentes durante o atendimento socioeducativo;
9) elaborar e acompanhar o desenvolvimento do plano individual de
atendimento, sempre com a participação da família e dos próprios adolescentes
respeitados os prazos legais;
10) favorecer o processo de autoavaliação dos adolescentes em relação ao
cumprimento de sua medida socioeducativa;
11) garantir atendimento técnico especializado (psicossocial e jurídico)
imediato ao adolescente e seus responsáveis logo após a sua apreensão e/ou
admissão no atendimento socioeducativo;
12) articular-se permanentemente com a Vara da Infância e Juventude,
123
Ministério Público e Defensoria Pública e outros Órgãos e Serviços Públicos,
visando agilidade nos procedimentos e melhor encaminhamento aos adolescentes;
13) mapear as entidades e/ou programas e equipamentos sociais públicos e
comunitários existentes nos âmbitos local, municipal e estadual, com a participação
dos Conselhos Municipais de Direitos, viabilizando e/ou oferecendo o acesso
enquanto
oferta
de
política
pública:
alimentação,
vestuário,
transporte,
documentação (escolar, civil e militar), escolarização formal, cultura, lazer,
atendimento na área de saúde (médico, dentista, cuidados farmacêuticos, saúde
mental), atendimento psicológico, profissionalização e trabalho, acionando a rede de
serviços governamental e não-governamental;
14) articular-se com as demais entidades e/ou programas de atendimento
socioeducativo, visando, em caso de progressão e/ou regressão de medida
socioeducativa, assegurar a continuidade do trabalho desenvolvido;
15) garantir a execução do atendimento socioeducativo descentralizado como
forma de estar localmente inserido e de possibilitar melhores respostas no
atendimento aos adolescentes;
16) normatizar as ações dos profissionais (que atuam no atendimento
socioeducativo) e dos adolescentes estabelecendo regras claras e explicitadas para
orientar a intervenção e o seu cumprimento. Para tanto, julga-se necessária a
construção, sempre que possível coletiva, de documentos como: regimento interno,
guia do educador e manual do adolescente e outros que se julgar necessários;
17) garantir encontros sistemáticos frequentes (semanal, quinzenal) da equipe
profissional para estudo social dos adolescentes. No caso do atendimento
socioeducativo contar com a participação de orientadores comunitários e/ou
voluntários, que estes sejam também inseridos nesse processo;
18) garantir recursos financeiros para que adolescentes e familiares possam
participar com frequência das atividades socioeducativas desenvolvidas; e
19) ter sustentabilidade financeira para que oferte atividades que venham a
responder ao proposto no projeto pedagógico.
6.3.1.2. Específico às entidades e/ou programas que executam a medida
socioeducativa de prestação de serviço à comunidade:
1) identificar, nos locais de prestação de serviço, atividades compatíveis com
124
as habilidades dos adolescentes, bem como respeitando aquela de seu interesse;
2) garantir que todos adolescentes tenham profissionais – referência
socioeducativo35 e orientador socioeducativo36 – nos locais de prestação de serviço
acompanhando-os qualitativamente.37
3) acompanhar a frequência do cumprimento da medida no local de prestação
de serviços;
4) realizar avaliações periódicas, no mínimo com frequência quinzenal com a
referência socioeducativa e mensal como os orientadores socioeducativos dos locais
de prestação de serviço. As mesmas não devem estar reduzidas a relatos
documentais. Estes são importantes, mas a interação, o diálogo, o contato pessoal
contribuem significativamente para uma compreensão da abordagem pedagógica
necessária ao acompanhamento dos adolescentes; e
5) garantir que os locais de prestação de serviço comunitário sejam Unidades
que compartilhem dos mesmos princípios e diretrizes pedagógicas do SINASE e
consequentemente das entidades de atendimento socioeducativo.
6.3.1.3 Específico às entidades e/ou programas que executam a medida
socioeducativa de liberdade assistida:
1) garantir uma equipe profissional – técnicos e orientadores sociais –
responsável pelo acompanhamento sistemático ao adolescente com frequência
mínima semanal. Nos casos de Liberdade Assistida Comunitária (LAC), em que
existam técnicos e orientadores comunitários, é obrigatório o acompanhamento
técnico aos orientadores, não excedendo a vinte orientadores por técnico. Cada
orientador comunitário poderá acompanhar simultaneamente até dois adolescentes.
Nos casos de Liberdade Assistida Institucional (LAI) cada técnico poderá
acompanhar simultaneamente vinte adolescentes, no máximo.
35
No caso desta medida, o referência socioeducativo é o profissional de nível superior ou com
função de gerência ou coordenação nos locais de prestação de serviço comunitário(,) que será
responsável geral tanto pelos adolescentes prestadores de serviço comunitário, quanto pelo
funcionário guia.
36
No caso desta medida, é importante ter, também, o orientador socioeducativo, que é o profissional
do local de prestação de serviço diretamente ligado ao exercício da atividade realizada pelos
adolescentes.
37
Conforme citado no capítulo 5.2.1.1, cada referência socioeducativo poderá acompanhar no
máximo dez adolescentes, e um orientador (para) até dois adolescentes simultaneamente, a fim de
garantir a individualização do atendimento que a medida pressupõe.
125
2) assegurar que os encontros entre orientadores sociais comunitários e
adolescentes tenham frequência de, no mínimo, três vezes na semana; e entre
técnico e orientador social comunitário/voluntário encontros com frequência, mínima,
quinzenal.
3) assegurar que os encontros entre orientadores sociais comunitários e
adolescentes tenham frequência de, no mínimo, três vezes na semana; e entre
técnico e orientador social comunitário/voluntário encontros com frequência, mínima
quinzenal.
6.3.1.4. Específico às entidades e/ou programas que executam a medida
socioeducativa de semiliberdade
1) garantir que os encontros (acompanhamento técnico) individuais tenham
frequência mínima quinzenal; e os grupais, frequência mínima semanal;
2) estabelecer uma processualidade na organização (agenda) das atividades
externas
de
cada
adolescente,
de
forma
a
ajudá-lo
a
compreender
a
intencionalidade socioeducativa de tais saídas;
3) articular-se com os demais programas de atendimento socioeducativo
visando, no caso de progressão e/ou regressão de medida socioeducativa,
assegurar a continuidade do trabalho desenvolvido; e
4) organizar o regimento interno, o guia do adolescente e o manual do
socioeducador de modo que esses documentos sejam partes do conjunto
institucional e guardem, entre si, relações de coerência e complementaridade.
6.3.1.5. Específico às entidades e/ou programas que executam a internação
provisória e a medida socioeducativa de internação:
1) organizar o regimento interno, o guia do adolescente e o manual do
socioeducador de modo que esses documentos sejam partes do conjunto
institucional e guardem, entre si, relações de coerência e complementariedade;
2) agilizar o atendimento inicial ao adolescente suspeito de autoria de ato
infracional, fomentando a integração e articulação entre os órgãos executores e o
adolescente e a família;
3) oferecer atividades de espiritualidade, respeitando o interesse dos
126
adolescentes em participar;
4) estabelecer uma progressividade para a realização de atividades externas
dos adolescentes (exceto internação provisória);
5) dispor de programa de acompanhamento aos egressos da medida
socioeducativa
de
internação.
Tal
programa
destina-se
somente
àqueles
adolescentes que o desejarem e que tiveram seu processo de execução extinto;
6) encaminhar os adolescentes que são liberados da internação provisória
sem aplicação de medida socioeducativa aos programas e equipamentos e serviços
sociais públicos e comunitários com a participação da família e de acordo com as
necessidades específicas de cada um; e
7) garantir local adequado e reservado para a visita íntima dos adolescentes
que cumprem medida socioeducativa, assegurando sigilo e proteção da imagem dos
adolescentes e, sobretudo, observando os pressupostos legais no que se refere à
idade dos parceiros, consentimento por escrito dos pais ou responsáveis, garantindo
e condicionando a participação dos envolvidos na prática da visita íntima bem como
de seus familiares em atendimentos individuais e/ou em grupos referentes à:
orientação sexual e reprodutiva, métodos contraceptivos, doenças sexualmente
transmissíveis e AIDS e outros temas pertinentes (exclusivo para internação).
6.3.2. Eixo – Diversidade étnico-racial, gênero e orientação sexual
6.3.2.1. Comum a todas as entidades e/ou programas que executam a
internação provisória e as medidas socioeducativas.
1) assegurar e consolidar parcerias com Secretarias estaduais e municipais,
órgãos, coordenadorias e similares responsáveis pela política pública, ONGs,
iniciativa privada no desenvolvimento de programas que fortaleçam a inclusão
étnico-racial e de gênero nos programas socioeducativos;
2)
incluir
ações
afirmativas,
promover
a
igualdade
e
combater
a
discriminação, o preconceito e a desigualdade racial no âmbito do atendimento
socioeducativo com o objetivo de erradicar as injustiças e a exclusão social;
3) garantir a equidade no atendimento socioeducativo prestado aos
adolescentes de ambos os sexos, principalmente no que se refere à qualidade e
oferta de serviços e atividades;
127
4) promover a autoestima dos adolescentes na sua especificidade de gênero
e étnico-racial, enfatizando a autovalorização e o autorrespeito;
5) implementar ações voltadas à valorização da adolescente, promovendo a
participação familiar e comunitária;
6) configurar um canal de comunicação capaz de estimular e oportunizar a
discussão sobre gravidez, aborto, nascimento de filho, responsabilidade paterna e
materna, nascimento de filho(a), responsabilidade de cuidado com irmãos e filhos,
saída precoce de casa, vida sexual, namoro, casamento e separação, deficiência,
violência física, psicológica, exploração sexual, abandono, trabalho infantil e de
padrões de gênero, raça e etnia e orientação sexual que comumente naturalizam e
justificam a violência, entre outros;
7) capacitar os profissionais que atuam no atendimento socioeducativo sobre
tais temas buscando qualificar a intervenção junto ao adolescente;
8) realizar oficinas pedagógicas com objetivo de trabalhar as diferenças de
raça, etnia e construção de identidade; e
9)
inserir,
obrigatoriamente,
nos
arquivos
técnico-institucionais
dos
adolescentes o quesito cor, permitindo um diagnóstico mais preciso da situação do
adolescente no atendimento socioeducativo
6.3.3. Eixo – Educação
6.3.3.1. Comum a todas às entidades e/ou programas que executam a
internação provisória e as medidas socioeducativas
1) consolidar parcerias com Órgãos executivos do Sistema de Ensino visando
o cumprimento do capítulo IV (em especial os artigos 53, 54, 56, e 57) do ECA e,
sobretudo, a garantia de regresso, sucesso e permanência dos adolescentes na
rede formal de ensino;
2) redirecionar a estrutura e organização da escola (espaço, tempo, currículo)
de modo que favoreça a dinamização das ações pedagógicas, o convívio em
equipes de discussões e reflexões e que estimulem o aprendizado e as trocas de
informações, rompendo, assim, com a repetição, rotina e burocracia;
3) propiciar condições adequadas aos adolescentes para a apropriação e
produção do conhecimento;
128
4) garantir o acesso a todos os níveis de educação formal aos adolescentes
inseridos no atendimento socioeducativo de acordo com sua necessidade;
5) estreitar relações com as escolas para que conheçam a proposta
pedagógica das entidades e/ou
programas que executam o atendimento
socioeducativo e sua metodologia de acompanhamento aos adolescentes;
6) desenvolver os conteúdos escolares, artísticos, culturais e ocupacionais de
maneira interdisciplinar no atendimento socioeducativo; e
7) permitir o acesso à educação escolar considerando as particularidades do
adolescente com deficiência, equiparando as oportunidades em todas as áreas
(transporte,
materiais
acompanhamento
didáticos
especial
e
escolar,
pedagógicos,
currículo,
equipamento
capacitação
de
e
currículo,
professores,
instrutores e profissionais especializados, entre outros) de acordo com o Decreto nº
3.298/99.
6.3.3.2. Específico às entidades e/ou programas que executam as medidas
socioeducativas de semiliberdade e de internação
1) garantir na programação das atividades, espaço para acompanhamento
sistemático das tarefas escolares, auxiliando o adolescente em possíveis
dificuldades, contudo, trabalhando para sua autonomia e responsabilidade;
2) construir sintonia entre a escola e o projeto pedagógico do programa de
internação, sendo as atividades consequentes, complementares e integradas em
relação à metodologia, conteúdo e forma de serem oferecidas (exclusivo para
internação);
3) garantir o acesso a todos os níveis de educação formal aos adolescentes
em cumprimento de medida socioeducativa de internação, podendo, para tanto,
haver Unidade escolar localizada no interior do programa; Unidade vinculada à
escola existente na comunidade ou inclusão na rede pública externa;
6.3.3.3. Específico às entidades e/ou programas que executam a internação
provisória
1) oferecer atividades pedagógicas que estimulem a aproximação com a
escola. Nos casos em que o adolescente esteja regularmente frequentando a rede
129
oficial, é importante que seja estabelecido contato imediato com a escola de origem
para que o adolescente tenha acesso ao conteúdo formal mesmo durante o período
de internação provisória; e
2) desenvolver metodologia específica que garanta abordagens curriculares
correspondentes com o nível de ensino de forma a adequar-se ao tempo de
permanência na internação provisória.
6.3.4. Eixo – Esporte, Cultura e Lazer
6.3.4.1. Comum a todas as entidades e/ou programas que executam a
internação provisória e as medidas socioeducativas
1) consolidar parcerias com as Secretarias de Esporte, Cultura e Lazer ou
similares visando o cumprimento dos artigos 58 e 59 do ECA;
2) propiciar o acesso a programações culturais, teatro, literatura, dança,
música, artes, constituindo espaços de oportunização da vivência de diferentes
atividades culturais e artísticas, e também de favorecimento à qualificação artística,
respeitando as aptidões dos adolescentes;
3) assegurar e consolidar parcerias com Secretarias estaduais e municipais,
órgãos e similares responsáveis pela política pública, ONGs e iniciativa privada no
desenvolvimento e oferta de programas culturais, esportivos e de lazer aos
adolescentes;
4) propiciar o acesso dos adolescentes a atividades esportivas e de lazer
como instrumento de inclusão social, sendo as atividades escolhidas com a
participação destes e respeitados o seu interesse;
5)
assegurar
no
atendimento
socioeducativo
espaço
a
diferentes
manifestações culturais dos adolescentes;
6) possibilitar a participação dos adolescentes em programas esportivos de
alto rendimento, respeitando o seu interesse e aptidão (exceto internação
provisória);
7) promover por meio de atividades esportivas, o ensinamento de valores
como liderança, tolerância, disciplina, confiança, equidade étnico-racial e de gênero;
e
8) garantir que as atividades esportivas de lazer e culturais previstas no
130
projeto pedagógico sejam efetivamente realizadas, assegurando assim que os
espaços físicos destinados às práticas esportivas, de lazer e cultura sejam utilizados
pelos adolescentes.
6.3.5. Eixo – Saúde
6.3.5.1. Comum a todas as entidades e/ou os programas que executam a
internação provisória e as medidas socioeducativas
1) consolidar parcerias com as Secretarias de Saúde visando o cumprimento
dos artigos 7, 8, 9, 11 e 13 do ECA;
2) garantir a equidade de acesso à população de adolescentes que se
encontram no atendimento socioeducativo, considerando suas dificuldades e
vulnerabilidades, às ações e serviço de atenção à saúde da rede do Sistema Único
de
Saúde
(SUS)
que
abordem
temas
como:
autocuidado,
autoestima,
autoconhecimento, relações de gênero, relações étnico-raciais, cidadania, cultura de
paz, relacionamentos sociais, uso de álcool e outras drogas, prevenção das
violências,
esportes,
alimentação,
trabalho,
educação,
projeto
de
vida,
desenvolvimento de habilidades sociais e ações de assistência à saúde, em
especial, o acompanhamento do desenvolvimento físico e psicossocial, saúde
sexual, saúde reprodutiva, prevenção e tratamento de DST e Aids, imunização,
saúde bucal, saúde mental, controle de agravos, assistência a vítimas de violência;
3) oferecer grupos de promoção de saúde incluindo temas relacionados à
sexualidade e direitos sexuais, prevenção de DST/Aids, uso de álcool e outras
drogas, orientando o adolescente, encaminhando-o e apoiando-o, sempre que
necessário, para o serviço básico de atenção à saúde;
4) buscar articulação e parcerias com a Secretaria de Saúde do Município a
fim de receber apoio e desenvolver programas especiais que considerem as
peculiaridades, vulnerabilidades e necessidades dos adolescentes;
5) assegurar ao adolescente que esteja no atendimento socioeducativo o
direito de atenção à saúde de qualidade na rede pública (SUS), de acordo com suas
demandas específicas;
6) garantir o acesso e tratamento de qualidade a pessoa com transtornos
mentais, preferencialmente, na rede pública extra-hospitalar de atenção à saúde
131
mental, isto é, nos ambulatórios de saúde mental, nos Centros de Atenção
Psicossocial, nos Centros de Convivência ou em outros equipamentos abertos da
rede de atenção à saúde, conforme a Lei nº 10.216 de 06/04/2001 38;
7) buscar articulação dos programas socioeducativos com a rede local de
atenção à saúde mental, e a rede de saúde, de forma geral, visando construir,
interinstitucionalmente, programas permanentes de reinserção social para os
adolescentes com transtornos mentais;
8)
assegurar
que
as
equipes
multiprofissionais
dos
programas
socioeducativos – articuladas com a rede local de atenção à saúde e saúde mental –
estejam habilitadas para atender e acompanhar de maneira individualizada os
adolescentes com transtornos mentais que cumprem medida socioeducativa em
meio aberto e/ou fechado respeitadas as diretrizes da reforma psiquiátrica,
recebendo assim tratamento na rede pública de qualidade;
9) assegurar que os adolescentes com transtornos mentais não sejam
confinados em alas ou espaços especiais, sendo o objetivo permanente do
atendimento socioeducativo e das equipes de saúde a reinserção social destes
adolescentes;
10) garantir que a decisão de isolar, se necessário, o adolescente com
transtornos mentais que esteja em tratamento seja pautada por critérios clínicos
(nunca punitivo ou administrativo) sendo decidida com a participação do paciente,
seus familiares e equipe multiprofissional que deverá encaminhar o paciente para a
rede hospitalar;
11)
garantir
uso/dependência
de
que
todos
drogas
os
sejam
encaminhamentos
precedidos
de
para
tratamentos
diagnóstico
preciso
do
e
fundamentados, ressaltando que o uso/dependência de drogas é importante questão
de saúde pública. Nenhuma ação de saúde deve ser utilizada como medida de
punição ou segregação do adolescente;
12) assegurar que as ações de prevenção ao uso/abuso de drogas sejam
incluídas nos grupos de discussão dentro dos programas de atendimento
socioeducativo, privilegiando ações de redução de danos e riscos à saúde; e
13) desenvolver práticas educativas que promovam a saúde sexual e saúde
reprodutiva dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa e os seus
38
Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona
o modelo assistencial em saúde mental. Publicada no DOU de 09/04/2001.
132
parceiros, favorecendo a vivência saudável e de forma responsável e segura
abordando temas como: planejamento familiar, orientação sexual, gravidez,
paternidade,
maternidade
responsável,
contracepção,
doenças
sexualmente
transmissíveis – DST/Aids e orientação quanto aos direitos sexuais e direitos
reprodutivos.
6.3.5.2. Específico às entidades e/ou programas que executam a internação
provisória e as medidas socioeducativas de semiliberdade e de internação
1) assegurar o cumprimento da Portaria Interministerial MS/SEDH/SPM n.
1.426 de 14 de julho de 2004 e da Portaria da Secretaria de Atenção à Saúde nº 340
de 14 de julho de 2004 que estabelece normas para operacionalização das ações de
saúde ao adolescente (exclusivas para internação provisória e internação);
2) implantar e implementar ações no âmbito da promoção da saúde,
prevenção de riscos e assistência a agravos dentro dos princípios da Constituição
Federal de 1988, da Lei Orgânica da Saúde (LOS) 39, da Norma Operacional de
Assistência à Saúde e do ECA;
3) assegurar às adolescentes direito da assistência pré-natal, parto e
puerpério na rede SUS recebendo orientações em relação ao parto, amamentação e
cuidados com o recém nascido e com o bebê; e
4) assegurar o direito à amamentação no prazo mínimo de seis meses após o
nascimento, conforme recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) e
afirmada na 52ª Assembleia Mundial de Saúde em 2002. Aos adolescentes que
estão cumprindo medida em meio fechado deve ser assegurado o direito à
convivência com o(s) filho(s) para visitação a fim de preservar os vínculos afetivos.
Logo, os programas de atendimento socioeducativo deverão disponibilizar espaços
apropriados para essas ações.
6.3.6. Eixo – Abordagem familiar e comunitária
6.3.6.1. Comum a todas as entidades e/ou programas que executam a
internação provisória e as medidas socioeducativas
1) consolidar parcerias com as Secretarias ou órgãos similares responsáveis
39
Lei n.º 8.080 de 19/09/1990, dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação
da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências.
Publicada no DOU de 20/09/1990.
133
pelos programas oficiais de assistência social nos diferentes níveis visando à
inclusão das famílias dos adolescentes em programas de transferência de renda e
benefícios no âmbito dos serviços do SUAS, assegurados por Lei;
2) garantir o atendimento às famílias dos adolescentes estruturado em
conceitos e métodos que assegurem a qualificação das relações afetivas, das
condições de sobrevivência e do acesso às políticas públicas dos integrantes do
núcleo familiar, visando seu fortalecimento;
3) ampliar o conceito de família para aquele grupo ou pessoa com as quais os
adolescentes possuam vínculos afetivos, respeitando os diferentes arranjos
familiares;
4) propiciar trabalhos de integração entre adolescentes e seus familiares que
possam desenvolver os temas referentes à promoção de igualdade nas relações de
gênero e étnico-raciais, direitos sexuais, direito à visita íntima (exclusivo para medida
de internação), discussão sobre a abordagem e o tratamento sobre o uso indevido
de drogas e saúde mental;
5) desenvolver as ações contidas no Plano Nacional de Promoção, Defesa e
Garantia do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e
Comunitária40;
6)
realizar
visitas
domiciliares
a
fim
de
constatar
a
necessidade
socioeconômica e afetiva das famílias e encaminhá-las aos programas públicos de
assistência social e apoio à família;
7) identificar e incentivar potencialidades e competência do núcleo familiar
para o mundo do trabalho articulando programas de geração de renda,
desenvolvendo habilidades básicas, específicas e de gestão necessárias à
autossustentacão;
8) promover ações de orientação e conscientização das famílias sobre seus
direitos e deveres junto à previdência social, sua importância e proteção ao garantir
ao trabalhador e sua família uma renda substitutiva do salário e a cobertura dos
chamados
riscos
sociais
(tais
como:
idade
avançada,
acidente,
doença,
maternidade, reclusão e invalidez, entre outros), geradores de limitação ou
incapacidade para o trabalho;
40
Documento “Plano Nacional de Promoção, Defesa e Garantia do Direito de Crianças e
Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária” (Versão Preliminar para consulta pública – Abril
de 2006).
134
9)
prever
na
metodologia
da
abordagem
familiar
do
atendimento
socioeducativo basicamente: atendimento individualizado, familiar e em grupo;
elaboração de plano familiar de atendimento; trabalho com famílias e grupos de
pares; inclusão de famílias em programas de transferência de renda visando à
provisão de condições de sobrevivência às famílias integradas com políticas de
emprego; visitas domiciliares;
10) adotar sempre que possível e por meio de técnica de mediação de
conflitos, com expressa concordância do adolescente, da família, do ofendido e das
demais pessoas diretamente interessadas, a restauração do dano causado pela
infração; e
11) prever na metodologia da abordagem comunitária dos programas de
atendimento socioeducativo minimamente: espaços de convivência e participação
em atividades de lazer, esporte e cultura com a vizinhança; participação da
comunidade nos espaços do programa socioeducativo; divulgação das ações do
programa nos meios de comunicação comunitária.
6.3.6.2. Específico às entidades e/ou programas que executam a medida
socioeducativa de liberdade assistida
1) construir uma efetiva rede de atendimento social público e comunitário para
encontrar soluções e encaminhamentos das necessidades dos adolescentes e seus
familiares; e
2) possuir um plano de marketing social para divulgação do programa nos
meios de comunicação com o intuito de agregar novos orientadores.
6.3.6.3. Específico às entidades e/ou programas que executam a internação
provisória e as medidas socioeducativas de semiliberdade e de internação
1) prever atividades de integração para as famílias dos adolescentes,
inclusive aqueles oriundos de outros municípios, de modo que a família seja
coparticipante do processo pedagógico desenvolvido no programa de atendimento
socioeducativo;
2) garantir a possibilidade da visita íntima aos adolescentes que já possuem
vínculo afetivo anterior ao cumprimento da medida socioeducativa e com a
135
autorização formal dos pais ou responsáveis do parceiro(a), observando os
pressupostos legais e assegurando, sobretudo, o acesso desses adolescentes a
atendimentos de orientação sexual com profissionais qualificados, acesso aos
demais métodos contraceptivos devidamente orientados por profissional da área de
saúde (exclusivo para internação);
3) discutir nos grupos de orientação de pais a temática relacionada à
sexualidade responsável bem como o respeito às diferentes opções sexuais
(exclusivo para internação).
6.3.7. Eixo – Profissionalização/ Trabalho/Previdência
6.3.7.1. Comum a todas as entidades e/ou programas que executam a
internação provisória e as medidas socioeducativas
1) consolidar parcerias com as Secretarias de Trabalho ou órgãos similares
visando o cumprimento do artigo 69 do ECA;
2) possibilitar aos adolescentes o desenvolvimento de competências e
habilidades básicas, específicas e de gestão e a compreensão sobre a forma de
estruturação e funcionamento do mundo do trabalho. Juntamente com o
desenvolvimento das competências pessoal (aprender a ser), relacional (aprender a
conviver) e a cognitiva (aprender a conhecer), os adolescentes devem desenvolver a
competência produtiva (aprender a fazer), o que além de sua inserção no mercado
de trabalho contribuirá, também, para viver e conviver numa sociedade moderna;
3) oferecer ao adolescente formação profissional no âmbito da educação
profissional, cursos e programas de formação inicial e continuada e, também, de
educação profissional técnica de nível médio com certificação reconhecida que
favoreçam sua inserção no mercado de trabalho mediante desenvolvimento de
competências, habilidades e atitudes. A escolha do curso deverá respeitar os
interesses e anseios dos adolescentes e ser pertinente às demandas do mercado de
trabalho;
4) encaminhar os adolescentes ao mercado de trabalho desenvolvendo ações
concretas e planejadas no sentido de inseri-los no mercado formal, em estágios
remunerados, a partir de convênios com empresas privadas ou públicas,
considerando, contudo, o aspecto formativo;
136
5) priorizar vagas ou postos de trabalho nos programas governamentais para
adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas;
6) equiparar as oportunidades referentes à profissionalização/trabalho aos
adolescentes com deficiência em observância ao Decreto nº 3.298 de 20/12/99;
7) desenvolver atividades de geração de renda durante o atendimento
socioeducativo que venham a ampliar competências,
habilidades
básicas,
específicas e de gestão, gerando renda para os adolescentes;
8) promover ações de orientação, conscientização e capacitação dos
adolescentes sobre seus direitos e deveres em relação à previdência social e sua
importância e proteção ao garantir ao trabalhador e sua família uma renda
substitutiva do salário e a cobertura dos chamados riscos sociais (tais como: idade
avançada, acidente, doença, maternidade, reclusão e invalidez, entre outros),
geradores de limitação ou incapacidade para o trabalho.
6.3.8. Eixo – Segurança
6.3.8.1. Comum a todas as entidades e/ou programas que executam a
internação provisória e as medidas socioeducativas de semiliberdade e de
internação
1) estruturar e organizar as ações do cotidiano socioeducativo e investir nas
medidas de prevenção das situações-limite (brigas, quebradeiras, motins, fugas,
invasões, incêndios, agressões e outras ocorrências desse tipo) compõe o conjunto
de ações fundamentais do núcleo de intervenção estratégica da segurança
preventiva;
2) assegurar que a organização espacial, funcional e a estrutura física das
Unidades de atendimento socioeducativo – orientadas pelo projeto pedagógico –
favoreçam a convivência entre os profissionais e adolescentes em um ambiente
tranquilo e produtivo onde as situações críticas tenham chances reduzidas de
eclosão e proliferação;
3)
estabelecer
procedimentos
operacionais
padronizados
nos
relacionamentos com as Polícias Militar e Civil, com a Defensoria Pública, com o
Ministério Público, com a Justiça da Infância e Juventude assegurando o provimento
de condições adequadas de segurança no atendimento socioeducativo;
4) receber fiscalização periódica e sistemática nos programas de atendimento
137
socioeducativo do Ministério Público, da Justiça da Infância e da Juventude, dos
Conselhos dos Direitos e do Conselho Tutelar;
5) assegurar que o processo de recrutamento e seleção do pessoal dirigente,
técnico e operacional seja orientado pelo projeto pedagógico, e, sobretudo que os
profissionais sejam vocacionados e estejam preparados para enfrentar e resolver as
situações críticas;
6) oferecer periodicamente, no máximo a cada três meses, treinamentos
práticos de segurança, combate a incêndio e a prestação de atendimento de
primeiros socorros para todos os profissionais do atendimento socioeducativo, bem
como equipar a entidade de atendimento de todo material necessário para essas
intervenções quando necessárias;
7) treinar sistematicamente os profissionais do atendimento socioeducativo
para que saibam agir com discernimento e objetividade nos momentos de situaçõeslimites do atendimento e, sobretudo em técnicas de negociação (exclusivo para
medidas socioeducativas privativas de liberdade, incluindo a internação provisória);
8) investir na capacitação introdutória e contínua de todos os envolvidos no
atendimento socioeducativo a partir do diagnóstico das potencialidades e
dificuldades da equipe institucional considerando as competências específicas e
complementares;
9) assegurar revista às famílias de forma humanizada e digna;
10) criar regras e mecanismos ágeis para a substituição de profissionais
quando os mesmos adotarem condutas desleais, retaliadoras, rancorosas,
vingativas, provocativas ou outras atitudes antipedagógicas;
11) estabelecer um fluxo na comunicação com os adolescentes favorecendo o
bom andamento do trabalho socioeducativo e a manutenção de um clima de
entendimento e paz e, sobretudo coibindo e evitando todo e qualquer tipo de
tratamento vexatório, degradante ou aterrorizante contra os adolescentes; e
12) utilizar a contenção do adolescente somente como recurso para situações
extremas que envolvam risco à sua integridade e de outrem.
6.3.8.2. Específico às entidades e/ou programas que executam a internação
provisória e as medidas socioeducativas de semiliberdade e de internação
1) elaborar plano de segurança institucional interno e externo juntamente com
a Polícia Militar visando garantir a segurança de todos que se encontram no
atendimento socioeducativo, bem como orientações às ações do cotidiano, solução
e gerenciamento de conflitos;
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2) garantir segurança externa para o programa, com a atuação diuturna (24h)
de policiais militares fardados, armados e treinados para esse trabalho;
3) determinar com precisão e fazer constar no regimento interno quando e
como acionar a segurança externa para agir internamente (Polícia Militar);
4) adotar as medidas de segurança adequadas considerando três níveis de
riscos para a integridade física, psicológica e moral dos adolescentes: i) no
relacionamento dos adolescentes com os profissionais; ii) no relacionamento direto
entre os adolescentes; iii) no relacionamento direto do adolescente com a realidade
externa ao atendimento;
5) oferecer diferentes atividades socioeducativas (esportivas, culturais, de
lazer, de estudos, entre outras) no período entre o entardecer e o recolhimento bem
como nos finais de semanas e feriados evitando sentimentos de isolamento e
solidão;
6) constar no regimento interno às medidas de contenção e segurança
adotadas pela entidade de atendimento socioeducativo e, sobretudo ser de
conhecimento de todos, devendo todos os profissionais ser preparados para o seu
cumprimento com eficácia;
7) oferecer treinamento prático em segurança para toda equipe dos
programas de atendimento socioeducativo no máximo a cada três meses;
8) mapear, conhecer e ter croquis (de fácil acesso) com o detalhamento dos
diversos espaços e ambientes institucionais, bem como equipamentos e materiais
existentes em cada compartimento das atividades desenvolvidas;
9) assegurar o assessoramento especializado para acompanhamento e
supervisão técnica na área de segurança do atendimento socioeducativo;
10)
analisar
cuidadosamente
com
toda
a
equipe
do
atendimento
socioeducativo os casos de ocorrência e o enfrentamento de situações-limite,
visando a sua compreensão e identificação de falhas ou na atuação da equipe
profissional buscando, assim, ajustes necessários para sua superação;
11) apurar e punir com justiça e equilíbrio todas as responsabilidades
administrativas e criminais o surgimento da situação-limite;
12) assegurar diuturnamente, inclusive nos finais de semanas e feriados, a
presença de profissional responsável pela coordenação da entidade e/ou programa
de atendimento socioeducativo; e
13) garantir aos adolescentes o acesso ao Defensor Público e as informações
relativas à sua situação processual.
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Anexo B
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142
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PÔSSA, Heloísa Augusta Amaral Pimentel. A MEDIDA