ANOTAÇÕES EM PRONTUÁRIOS DE ENFERMAGEM: influências no processo de produção e interpretação de sentido das mensagens Natália Fernandes 1,2 Ludmilla Costa Coelho 2,3 Mariana Rocha Nascimento 2 Anneliese Maria Bento Gama de Carvalho 4 Resumo: As anotações e registros de enfermagem são formas de comunicação verbal escrita utilizada no ambiente hospitalar. Elas devem descrever a realidade observada e são extremamente importantes para a elaboração e a continuidade da assistência nos ambientes de atenção à saúde. Esta revisão da literatura teve como objetivo identificar os fatores que dificultam ou, até mesmo, impossibilitam a produção e interpretação de sentido das anotações registradas em prontuários de enfermagem, assim como a validação desses documentos. Embora não exista uma padronização universal relacionada à execução das anotações de enfermagem, os princípios básicos de uma anotação em prontuário de referência são conhecidos. Sugere-se a conscientização dos profissionais da saúde, através da educação continuada. Palavras Chaves: Registros de enfermagem; Comunicação. 1. INTRODUÇÃO O prontuário deve ser escrito de forma legível e com uma A comunicação verbal é fundamental para a constante troca grafia correta, sendo utilizadas somente as abreviações aprova- de informações característica dos ambientes de atenção à saú- das pela instituição e padronizadas na literatura (OCHOA-VIGO; de. A interpretação de um texto que contenha elementos verbais e PACE; SANTOS, 2003). As anotações de enfermagem nele con- não verbais, tais como desenhos, abreviações (CARVALHO, 2005) tidas devem ser metodologicamente estruturadas e apresentar depende da percepção da realidade de cada profissional, o que informações descritivas de forma clara, completa e objetiva pode levar a conflitos de entendimento. O uso e o domínio da lin- (SANTOS; PAULA; LIMA, 2003). guagem verbal escrita podem se tornar facilitadores da assistência à saúde do cliente (DOBBRO; SOUSA; FONSECA, 1998). Assim, diante do exposto, pode-se dizer que os registros realizados em instituições de saúde merecem ser tomados como Formas de comunicação verbal escrita utilizadas no am- objeto de estudo e pesquisa, no que concerne à análise das abre- biente hospitalar são as anotações e registros de enfermagem viações, das siglas, das anotações e de qualquer outro registro (MATSUDA et al., 2006), que, segundo Santos, Paula e Lima escrito. Essa análise deve abranger o conteúdo e a legibilidade, (2003), representam mais de 50% das informações contidas no uma vez que alguns estudos demonstraram que o fato de os prontuário do cliente. profissionais de saúde não seguirem as orientações estipuladas Para Matsuda et al. (2006), as anotações ou registros de pela literatura (MATSUDA et al., 2006), ou pela própria instituição enfermagem descrevem a realidade observada e, por isso, são em que trabalham, pode desencadear a dificuldade de legibilida- extremamente importantes para a elaboração e a continuidade de e comunicação (OCHOA-VIGO; PACE; SANTOS, 2003). da assistência nos ambientes de atenção à saúde. Muitas ve- Acredita-se que um estudo nesse campo pode ajudar a zes, esses documentos também são utilizados como fonte de compreender melhor os fatores que levam às dificuldades de informação para a realização de auditorias e pesquisas. interpretação dos registros de enfermagem no ambiente hospita- Os registros de enfermagem são instrumentos que facilitam o trabalho dos profissionais no cuidado do cliente, poden- lar, ambulatorial e domiciliar, bem como trazer contribuições para essa área de estudo e pesquisa, dentro do mundo acadêmico. do ser utilizados para avaliar as intervenções e a qualidade da O objetivo deste trabalho foi identificar os fatores que difi- assistência como um todo (VITURI; MATSUDA, 2008). Portanto, cultam ou, até mesmo, impossibilitam a produção e interpreta- é necessário que as anotações das informações relacionadas ção de sentido das anotações registradas em prontuários de ao cuidado sejam efetuadas frequentemente, sempre seguindo enfermagem, assim como a validação desses documentos. um referencial teórico (MATSUDA et al., 2006). Para o desenvolvimento deste trabalho foi realizada uma 114 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON 2013/1 - NÚMERO 7 - ISSN 2176 7785 revisão integrativa da literatura nacional e internacional dispo- fermagem (SAE) é uma atividade privativa do enfermeiro, sendo nível até o momento. determinada pela resolução do COFEN-272 de 27 de agosto de 2002 (CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 2002). 2. REVISÃO DA LITERATURA O Processo de Enfermagem (PE) é a abordagem sistemática O processo de comunicação da assistência de enfermagem, que utiliza o método científico e as A comunicação pode ser definida como um processo de teorias de enfermagem para a solução de problemas na realidade interação, onde ocorre a transmissão e a recepção de informa- profissional, proporcionando, assim, o relacionamento dinâmico ções entre as pessoas (STEFANELLI, 1993). entre o enfermeiro e o cliente (TANNURE; GONÇALVES, 2008). Segundo Potter e Perry (2004), para que a comunicação Para Tannure e Gonçalves (2008), o processo de enferma- aconteça é necessária a existência de um emissor ou remetente, gem é constituído por cinco etapas, a saber: (i) a investigação que é aquele que envia a mensagem; um receptor, que é o que ou histórico de enfermagem, onde ocorre a coleta de dados do recebe a mensagem; e uma mensagem, que compreende a in- cliente através da anamnese e do exame físico; (ii) o diagnóstico formação enviada do emissor para o receptor. de enfermagem, que é feito a partir da análise e interpretação Essas trocas são realizadas por meio das linguagens verbal dos dados coletados na primeira etapa; (iii) o planejamento de e não verbal (OLIVEIRA et al., 2005). A linguagem verbal é repre- enfermagem, que determina quais diagnósticos, e com isso, sentada pela escrita e pela fala (palavras ou recursos lingüísti- quais intervenções de enfermagem deverão ser priorizadas; cos) e a linguagem não verbal, pelos enunciados não lingüísti- (iv) a intervenção ou implementação de enfermagem, onde são cos, tais como desenhos, fotos, pinturas, expressão corporal, prescritos os cuidados de enfermagem a partir dos diagnósticos isto é, sons não verbais e as imagens (CARVALHO, 2005). elaborados; (v) e a evolução ou avaliação de enfermagem que Silva (2002) relata que o sentido não é trazido pela linguagem consiste no acompanhamento das respostas do cliente aos cui- verbal e não verbal sozinhas, tratando-se de um processo que dados prescritos pelo enfermeiro, através da análise direta do envolve uma construção essencialmente feita por meio de intera- seu estado geral, relatos, ou informações sobre o progresso do ções sociais e cognitivas, ou seja, é necessário que uma pessoa cliente contidas no prontuário de enfermagem. tenha um conhecimento prévio da linguagem utilizada, bem como O cumprimento de todas as etapas descritas acima é funda- dos elementos conceituais (significados), para que aconteça a in- mental para a tomada de decisões relacionadas ao cuidado do terpretação e compreensão das informações recebidas. cliente, sendo indispensável o registro adequado de suas fases Diante da necessidade da contextualização para a produ- nos prontuários de enfermagem (OSAWA, 1988). ção do sentido, as linguagens verbal e não verbal não podem Prontuário de Enfermagem ser consideradas fechadas, definitivas, livres de outras interpre- O prontuário pode ser definido como uma série de docu- tações que não as do sujeito que as interpreta. Esses elementos mentos e informações que agrupam fatores médicos e sociais verbais e não verbais contribuirão para a construção e produção de um cliente. Ele é extremamente importante para o ensino, de sentido (CARVALHO, 2005) e, conseqüentemente, para a in- para pesquisas e para a proteção tanto dos clientes, quanto dos terpretação do material registrado (anotações verbais e/ou não membros da equipe de saúde (MATSUDA et al., 2006). verbais) em prontuários de enfermagem. Os fatores fundamentais para a construção de um prontuário Assim, é importante pensar no receptor (leitor pretendido) completo são “o número de identificação; dados do paciente; an- da mensagem para que o emissor possa organizá-la de forma tecedentes pessoais e familiares; diagnóstico; tratamento clínico e familiar e com linguagem adequada ao contexto em que essa cirúrgico; exames complementares; e relatórios.” (FERNANDES; pessoa (o leitor) estará inserida. Se houver sucesso nesse pro- PINHEIRO, 2005, p.51). cesso, espera-se que a informação enviada seja decodificada de maneira correta (POTTER; PERRY, 2004). Anotações de Enfermagem Para Fernandes e Pinheiro (2005), os registros ou anotações O entendimento e planejamento da comunicação são extre- de enfermagem trazem informações diárias sobre as respostas mamente importantes para a execução do trabalho do enfermei- do paciente ao tratamento a que está submetido e devem ser ro, tanto na interação profissional- cliente quanto na formulação realizados de forma contínua e progressiva. As anotações têm, e escrita das anotações ou registros de enfermagem (OLIVEIRA assim, a finalidade de avaliar a assistência de enfermagem, et al., 2005). cumprindo seus objetivos de relatar por escrito as informações SAE e Processo de Enfermagem observadas pelo profissional ou relatadas pelo cliente, proporcio- A implementação da sistematização da assistência de enPÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON 2013/1 - NÚMERO 7 - ISSN 2176 7785 l 115 nando a coleta de dados para aprendizagem, possíveis diagnós- O enfermeiro deve incorporar somente aquelas abrevia- ticos e formulação de intervenções de enfermagem, bem como ções aprovadas no local de trabalho específico. Termos para avaliação da assistência de enfermagem como um todo. como gíria, clichês e rótulos devem ser evitados, a não Critérios para a realização das anotações nos prontuários ser no contexto de uma citação direta do cliente/familiar. de Enfermagem Segundo Ochoa-Vigo, Pace e Santos (2003, p.185-186), Segundo Castilho e Campedelli (1989), os registros de en- existem critérios fundamentais para a realização de registros de fermagem são instrumentos legais, devendo conter a data na pri- enfermagem, quais sejam: meira anotação do dia e ser precedidos pelo horário da realização 1. Realizado de modo objetivo, sem preconceito, valores, de cada glosa. Os autores enfatizam que esses documentos não julgamentos ou opinião pessoal. Informações subjetivas devem ser rasurados e, em caso de erro, deve-se escrever a pala- fornecidas pelo cliente, seus familiares ou outros mem- vra “digo” entre vírgulas, logo após o termo equivocado. bros da equipe da saúde devem ser consideradas, utili- Smeltzer et al. (2000) relatam a necessidade de anotações zando-se aspas para esses tipos de informações; completas e exemplificam que durante a escrita de intervenções 2. Descrições ou interpretações de dados objetivos de- de enfermagem todas as atividades a serem realizadas devem vem ter apoio em observações específicas e concretas ser identificadas, assim como o profissional que deverá executá- das situações do cliente; -las. Os autores ressaltam, também, a importância da coleta de 3. Devem ser evitadas generalizações, inclusive termos dados de todas as fontes disponíveis, seguido pelo seu registro vagos, como “bom”, “regular”, “comum”, “normal”. Tais no prontuário do cliente. descrições tornam-se abertas a múltiplas interpretações, A relação entre o erro e o método baseadas no ponto de referência do leitor; Konh, Corrigan e Donaldson (2000) declaram que os profis- 4. Os achados devem ser descritos do modo mais com- sionais de saúde estão sujeitos aos erros, que são inerentes ao pleto possível, o que inclui a definição de características processo cognitivo humano e, por isso, devem ser desenvolvidos como forma, tamanho, cor, textura e temperatura, especi- métodos para que esses equívocos sejam prevenidos e sua inci- ficando os dados de modo concreto e objetivo; dência reduzida, trazendo, assim, segurança para o cliente. 5. Documentar os dados de modo claro e conciso, evi- Para evitar possíveis falhas nos registros de enfermagem, tando informações supérfluas, frases longas e ausentes Melo e Pedreira (2005) enfatizam a necessidade da padroniza- de referências coerentes; ção das nomenclaturas, símbolos e dos métodos utilizados para 6. Escrever de modo legível, com tinta indelével. Os erros as anotações nos prontuários de enfermagem. na documentação devem ser corrigidos de modo a não As anotações de enfermagem devem ser realizadas com letra ocultar o registro inicial. O método comumente utilizado legível para que sejam evitadas as interpretações equivocadas que inclui o traçado de uma linha sobre o item incorreto, a podem trazer comprometimento da assistência oportuna e ade- escrita de “registro incorreto”, e a efetivação do registro. quada ao cliente (OCHOA-VIGO et al., 2001). O uso de corretores, borrachas ou linhas cruzadas para ocultar o registro não é permitido, por suas implicações 3. RESULTADOS legais; Após a análise da amostra selecionada, as variáveis 7. O registro deve estar gramatical e formalmente correto. foram esquematizadas no QUADRO 1. 116 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON 2013/1 - NÚMERO 7 - ISSN 2176 7785 Vários são os fatores que podem levar à dificuldade na inter- enfermagem foi outro fator observado. Trata-se de um procedimen- pretação e validação dos prontuários. Dentre eles, destaca-se o to totalmente desaconselhado em razão de propiciar a inclusão de predomínio do sistema de registro manual na prática de enferma- informações inverídicas nessas lacunas, resultando no comprome- gem, que, além de gerar registros ilegíveis, exige maior tempo de timento dos processos de apuração legal ou ética dos registros de formulação, levando ao distanciamento do enfermeiro em relação enfermagem (OCHOA-VIGO; PACE; SANTOS, 2003). aos cuidados do cliente (SANTOS; PAULA; LIMA, 2003). Segundo Ochoa-Vigo, Pace e Santos (2003), o uso das si- Outro fator relacionado ao sistema de registro manual que glas é outro fator que dificulta a interpretação, pois siglas não influencia na validação das informações relatadas pela enfer- regulamentadas inseridas nos registros podem dificultar a leitura magem é a existência de múltiplos prontuários por cliente e de e levar a múltiplas significações. Matsuda et al. (2006, p.419) prontuários abertos sem anotações realizadas, problemas pos- exemplificam: “AVC (Acidente Vascular Cerebral ou Acesso Ve- sivelmente solucionáveis através da adoção de registros eletrô- noso Central) e SV (Sonda Vesical ou Sinais Vitais)”. nicos (ALBUQUERQUE; NÓBREGA; GARCIA, 2006). Machado (2010, P.53) percebe a grande quantidade de Matsuda et al. (2006) descrevem a ocorrência de rasuras resul- siglas utilizadas como outro fator que pode dificultar a inter- tantes da correção através da escrita da palavra correta por cima pretação dos registros de enfermagem e exemplifica algumas da errada, ou pelo uso de corretivos líquidos. Além das implicações das siglas mais encontradas em registros de uma Unidade de legais trazidas pelo ato de rasurar, há aquelas que requerem da- Terapia Intensiva: “PVP em VJID (punção venosa profunda em quele que lê o prontuário, a capacidade de tentar compreender o veia jugular interna direita), AP com MVUA (ausculta pulmonar que foi reescrito (LUZ; MARTINS; DYNEWICZ, 2007). com murmúrios vesiculares universalmente audíveis) e RCR 2T A existência de espaços em branco permeando os registros de BNF(ritmo cardíaco regular em dois tempos)”. PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON 2013/1 - NÚMERO 7 - ISSN 2176 7785 l 117 Muitas siglas ou abreviações apresentam significados diferen- tes profissionais nos diversos setores da instituição (POTTER; tes de região para região e mesmo entre as unidades de serviço PERRY, 1998). Esses documentos são imprescindíveis para a hospitalar (OCHOA-VIGO; PACE; SANTOS, 2003). Assim, devido continuidade do cuidado, sendo utilizados, também, como in- ao uso de siglas e abreviações não padronizadas, os registros efe- dicadores da qualidade assistencial e como documentos em tuados pela equipe podem trazer diferentes interpretações, geran- processos legais, auditoria e pesquisas (MATSUDA et al., 2006). do dúvidas e riscos ao cliente, não atuando como meios de comu- Devido à importância desses documentos para a assistên- nicação seguros (ORIÁ; MORAES; VICTOR, 2004). cia de enfermagem como um todo, as possíveis falhas que po- Como observado por Ochoa-Vigo et al. (2001), quando o dem prejudicar a interpretação e a validação desses documen- registro de informações relacionadas ao cliente é realizado de tos foram o principal objeto de questionamento desse estudo. forma incompleta, a objetividade e a especificidade da transmis- Houve concordância entre alguns resultados encontrados pelos são de mensagens pode ser afetada, prejudicando, assim, sua autores dos artigos utilizados na amostra. Entretanto, a frequên- evolução, fator dependente da interpretação dos registros de cia de cada acontecimento e o seu grau de importância foram parâmetros objetivos previamente observados. interpretados de formas variadas. Matsuda et al. (2006, p.418) indicam a prática freqüente da Para Ochoa-Vigo, Pace e Santos (2003), Oriá, Moraes e anotação de termos considerados ambíguos, passíveis de in- Victor (2004) e Matsuda et al. (2006), o uso de siglas e abrevia- terpretações variadas, subjetivos e dependentes do julgamento ções não padronizadas é um fator que prejudica a leitura dos do indivíduo que decifra a mensagem, termos que podem tra- prontuários de enfermagem. A implantação do processo de en- zer prejuízos à equipe de saúde e principalmente ao cliente. Os fermagem, juntamente com a educação continuada são fatores autores exemplificam: “discreta taquipnéia”, “boa saturação” e cruciais para que sejam adotadas somente as siglas que pos- “levemente hipertenso”. sam ser compreendidas por todos os profissionais que prestam A falta de informações necessárias à identificação do profissional que efetuou o registro de enfermagem, foi percebida por cuidado ao cliente e que sejam aprovadas pela instituição de saúde (OCHOA-VIGO; PACE; SANTOS, 2003). Matsuda et al. (2006), que ressaltam que se houver necessidade Smeltzer et al. (2000) sugerem o estabelecimento de regras de revisão do prontuário devido a ações jurídicas, tanto a institui- quanto ao uso de siglas com o objetivo de criar uma linguagem ção de saúde, quanto seus colaboradores e clientes serão pos- comum que aumente a comunicação entre os colegas e facilite sivelmente lesados. Para Luz, Martins e Dynewicz (2007, p.353) a decodificação de informações padronizadas. a falta do “hábito do uso do carimbo e assinatura” para identi- As rasuras podem afetar tanto a interpretação quanto a va- ficação do profissional que realiza a anotação de enfermagem lidação dos prontuários de enfermagem (LUZ; MARTINS; DY- está em desacordo com aquilo que é preconizado pelo Conse- NEWICZ, 2007, MATSUDA et al., 2006). Segundo Potter e Perry lho Federal de Enfermagem, em sua resolução 191/96 para as (1998), as rasuras podem sugerir a tentativa de acobertamento anotações de enfermagem. de informações, sendo a correção precoce dos erros importan- Matsuda et al. (2006) percebem que a presença de erros te. As autoras sugerem que para a correção de erros, a sentença ortográficos nas anotações de enfermagem é um problema fre- incorreta deve ser riscada com uma única linha e em seguida qüente que, além de possibilitar prejuízos ao cliente, é vista pelo a palavra “erro” deve ser escrita juntamente com as iniciais do receptor da mensagem como um fator desestimulante à leitura. profissional que realiza o registro. Para Venturini e Marcon (2008), outro empecilho para a va- Para Castilho e Campedelli (1989), os erros devem ser corri- lidação do prontuário é a ausência de registros da data de re- gidos utilizando a palavra “digo” entre vírgulas, logo após o termo alização de procedimentos invasivos. Em auditoria, a ausência incorreto, e a informação verdadeira deve ser registrada a seguir. desse tipo de registro pode significar que um procedimento não foi realizado (LUZ; MARTINS; DYNEWICZ, 2007). Os registros ilegíveis são alguns dos principais aspectos a ser considerados nas anotações da enfermagem (MATSUDA et al., 2006). Um registro mal feito pode ser interpretado de forma 4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Os registros e relatórios da enfermagem contêm informações relacionadas aos cuidados prestados ao cliente, sendo uma ferramenta que possibilita a comunicação da equipe de saúde, devendo ser passíveis de interpretação por diferen- errônea, ou seja, uma anotação inadequadamente redigida pode levar a uma assistência de enfermagem defeituosa (POTTER; PERRY, 1998). Santos, Paula e Lima (2003) alegam que a utilização do sistema de registro manual pode levar à ilegibilidade. Albuquerque, Nóbrega e Garcia (2006) vão além, alegando que o sistema de 118 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON 2013/1 - NÚMERO 7 - ISSN 2176 7785 registro manual leva à existência de mais de um prontuário por 5. CONCLUSÕES cliente e a prontuários abertos sem anotações redigidas. Esses Através da construção da presente revisão integrativa da li- autores sugerem a adoção do sistema de registro eletrônico teratura referente aos fatores que influenciam o processo de pro- como um meio para solucionar os problemas acima descritos. dução e interpretação de sentido das mensagens redigidas nos Smeltzer et al. (2000, p. 29-30) discorrem sobre as vantagens prontuários de enfermagem, foi possível perceber a importância do sistema de registro eletrônico: “estes parecem economizar tem- dos registros para a continuidade da assistência de enferma- po, melhorar a monitorização das questões de melhoria de qualida- gem nas instituições de saúde. de e tornar mais fácil o acesso às informações do paciente”. Ao longo desse estudo foi possível compreender a importân- Ochoa-Vigo et al. (2001) descrevem a falta de informações cia das informações contidas nos prontuários para a continuida- completas no prontuário do cliente como um fator que interfere de e avaliação do trabalho de todos os membros da equipe de na interpretação das mensagens escritas. saúde. Portanto, quanto mais e melhor a equipe da enfermagem Venturini e Marcon (2008) relatam que a ausência de informações completas relacionadas a um procedimento invasivo podem significar a não realização do mesmo. registrar suas ações, mais estará valorizando o seu trabalho, além de garantir ao cliente uma assistência de qualidade. Após a análise das variáveis verificamos a existência de uma Potter e Perry (1998, p.130) exemplificam uma situação em grande variedade de fatores que podem dificultar ou impedir a que a eficiência da assistência é prejudicada devido à falta do interpretação, ou, até mesmo, gerar interpretações dúbias das registro de uma informação vital: mensagens transmitidas através do prontuário de enfermagem. A enfermeira Jackoway teve um dia cheio em sua unidade Muitas vezes, o método utilizado para se ocultar erros de médica. Parecia que todos os seus pacientes queriam fazer pe- registros anteriores não é padronizado, variando de instituição didos ao mesmo tempo. Assim, ela se esqueceu de registrar a para instituição. Quanto à correção de erros, a própria literatura administração de um medicamento à sua paciente, Sta Sloan. especializada sugere diferentes procedimentos. Após a mudança de turno, o enfermeiro Kaiser prepara os me- Portanto, a adoção do sistema de registro eletrônico pode dicamentos para a Sta Sloan e observa que não há registro da contribuir para minimizar a lacuna entre a teoria e a prática, por dose anterior no prontuário da paciente. A enfermeira Jackoway meio do desenvolvimento de sistemas que permitam um maior não está mais disponível para atestar o erro e a paciente não envolvimento com a assistência de enfermagem e diminuam os consegue se lembrar dos medicamentos que tomou. possíveis erros relacionados ao sistema de registro manual e o Potter e Perry (1998, p.134) afirmam, ainda, que a omissão tempo gasto com as anotações. de informações afeta o valor legal das anotações realizadas pela Acredita-se que a implementação da educação em serviço equipe de enfermagem, destacando que “uma omissão delibe- para os profissionais da saúde permitiria o acesso a materiais rada dos fatos pode, em última instância, levar à perda da licen- de estudo sobre essa questão, bem como possibilitaria a capa- ça de trabalho ou mesmo à prisão”. citação e a conscientização quanto à importância da redação Matsuda et al. (2006) enfatizam que a utilização de termos adequada dos registros e anotações de enfermagem. Dentre subjetivos deve ser evitada. Para isso, o enfermeiro deve utilizar muitos outros benefícios, a educação continuada do profissio- medidas precisas ao comunicar dados e sempre se questionar nal da Enfermagem possui papel fundamental na busca pelo quanto à subjetividade ou objetividade dos dados a serem redi- desenvolvimento da habilidade do profissional no momento de gidos (POTTER; PERRY, 1998). registrar por escrito o cuidado prestado ao cliente. Luz, Martins e Dynewicz (2007) e Matsuda et al. (2006) perceberam a ausência de registros de informações relacionadas à REFERÊNCIAS identificação do profissional que realiza o registro (nome com- ALBUQUERQUE, CC; NÓBREGA, MML; GARCIA, TR. Termos de linguagem de enfermagem identificados em registros de uma UTI neonatal. Revista Eletrônica de Enfermagem, p.336-348, 2006. Disponível em: http:// www.fen.ufg.br/revista/revista83/v8n3a04.htm. Acesso em 05 fev.2010. pleto, número do COREN, carimbo e assinatura), como um fator que influencia a validação dos registros de enfermagem. Alguns fatores foram percebidos isoladamente por alguns autores, como os espaços em branco permeando os registros de enfermagem, observados por Ochoa-Vigo, Pace e Santos (2003), e a presença de erros ortográficos, que foi abordada por Matsuda et al. (2006). CARVALHO, Anneliese Maria Bento de. Linguagem verbal e não verbal no texto publicitário: construção da referenciação e produção de sentido. 2005. 181f. Dissertação (Mestrado em Língua Portuguesa) – Faculdade de Letras, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2005. PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON 2013/1 - NÚMERO 7 - ISSN 2176 7785 l 119 CASTILHO, V.; CAMPEDELLI, M.C. Observação e registro: subsídios para o sistema de assistência de enfermagem. In: CAMPEDELLI, M.C (Org.). Processo de enfermagem na prática. São Paulo: Ática. 1989. 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NOTAS 1 Aluna do Curso de Odontologia do Centro Universitário Newton Paiva. 2 Enfermeiras graduadas pela Universidade Fundação Mineira de Educação e Cultura. 120 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON 2013/1 - NÚMERO 7 - ISSN 2176 7785 3 Aluna do curso de pós graduação lato sensu do Instituto de Ensino e Pesquisa Albert Einstein. 4 Professora visitante da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais, doutora em linguística pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON 2013/1 - NÚMERO 7 - ISSN 2176 7785 l 121