MANDADO DE INJUNÇÃO 712-8 PARÁ
RELATOR
IMPETRANTE(S)
: MIN. EROS GRAU
: SINDICATO DOS TRABALHADORES DO PODER
JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARÁ - SINJEP
: EDUARDO SUZUKI SIZO E OUTRO(A/S)
: CONGRESSO NACIONAL
ADVOGADO(A/S)
IMPETRADO(A/S)
R E L A T Ó R I O
O
SENHOR
MINISTRO
EROS
GRAU:
O
Sindicato
dos
Trabalhadores do Poder Judiciário do Estado da Pará impetra
mandado
de
injunção,
com
o
objetivo
de
dar
efetividade
à
norma inscrita no artigo 37, inciso VII, da Constituição do
Brasil.
2.
Sustenta, preliminarmente, ser parte legítima para
ajuizar o presente writ, em consonância com a jurisprudência
desta
Corte.
No
tocante
ao
mérito,
aduz
que
a
mora
do
Congresso Nacional em regulamentar o preceito constitucional
relativo ao direito de greve no serviço público impede o seu
exercício pela categoria.
3.
Conforme
exposto
na
inicial,
a
entidade
sindical
impetrou mandado de segurança contra ato da Presidência do
Tribunal de Justiça do Estado do Pará, para que se aprove a
revisão
anual
de
remuneração
dos
servidores.
Alega
o
Impetrante que a greve parcial foi desencadeada porque não
houve apreciação da referida ação.
4.
O
Impetrante
comunicação
solicitava
e
o
em
ressaltou
desacordo
reajuste
de
com
105%,
ainda
pedido
o
Pleno
que,
da
sem
prévia
categoria
do
Tribunal
que
de
MI 712 / PA
Justiça
do
Pará
publicou
a
Resolução
009/2004,
mediante
a
qual foi concedido aos servidores o aumento salarial de 9%.
Após
a
declaração
de
ilegalidade
da
greve,
a
direção
do
TJ/PA determinou a suspensão dos pontos e desconto dos dias
parados.
5.
Requer seja concedida autorização aos filiados do
Sindicato
Impetrante
para
que
se
utilizem
da
Lei
Federal
7.783/89, que rege o direito de greve na iniciativa privada,
até o advento da norma regulamentadora.
6.
Solicita ainda seja julgada procedente a ação e,
declarada a omissão do Poder Legislativo, seja determinada a
supressão
da
lacuna
legislativa,
mediante
a
regulamentação
do direito de greve no serviço público. Pede, ao final, seja
reconhecido o direito de greve.
7.
Em
17
de
setembro
de
2.004
indeferi
o
pedido
de
medida liminar sob o fundamento de ser este incompatível com
o
mandado
de
injunção
e
determinei
fossem
solicitadas
informações ao Presidente do Congresso Nacional, assim como
aberta vista à Procuradoria Geral da República.
8.
Congresso
Nas
informações
Nacional
tramitação
naquele
está
órgão
prestadas
consignado
legislativo
pelo
que
Presidente
do
encontram
em
se
projetos
destinados
à
regulamentação da matéria (fls. 66/71).
9.
A
Procuradoria
132/135,
ao
fundamento
apreciados
pelo
Pleno
Geral
de
que
desta
da
casos
Corte
2
República,
(MIs
às
semelhantes
485/MT,
fls.
foram
Ministro
MI 712 / PA
Maurício
Galvão,
Corrêa,
DJ
DJ
02.08.2002;
23.08.2002;
20/DF,
585/TO,
Ministro
Ministro
Celso
de
Ilmar
Mello,
DJ
22.11.1996), manifesta-se pelo conhecimento parcial do writ,
tão-somente
para
declarar
a
mora
legislativa
do
Congresso
Nacional no que concerne à regulamentação do inciso VII do
artigo 37 da Constituição do Brasil.
10.
Solicitei do Congresso Nacional a remessa, ao meu
gabinete, dos textos dos projetos de lei mencionados em suas
informações
informou
a
de
fls.
construção
66/71,
do
que
conjunto
examinei.
normativo
Esse
exame
que
farei
a
alusão ao final do meu voto.
É
o
relatório,
do
qual
deverão
ser
extraídas
cópias para envio aos Senhores Ministros (RISTF, artigo 87,
IV).
3
MI 712 / PA
VOTO
O SENHOR MINISTRO EROS GRAU (Relator): Trata-se de
Mandado
de
Injunção
coletivo
impetrado
por
entidade
sindical. A legitimidade ativa ad causam do ora impetrante é
reconhecida
Tribunal
em
Federal,
consolidada
jurisprudência
a
MI
partir
do
n.
342,
do
Supremo
relator
Ministro
Moreira Alves, do MI n. 362, relator Ministro Néri e do MI
n.
20,
relator
jurisprudencial
irrelevante,
da
ação
Ministro
tem
para
o
Celso
de
prestigiado
efeito
coletiva,
o
de
a
Mello.
doutrina
justificar
fato
Essa
de
a
que
orientação
considera
admissibilidade
inexistir
previsão
constitucional a respeito.
2.
Sendo assim, é processualmente viável o acesso de
entidades de classe, desde que legalmente constituídas e em
funcionamento
há
pelo
menos
um
ano,
à
via
do
mandado
de
injunção coletivo.
3.
Conheço do pedido.
4.
A Constituição
do Brasil reconhece expressamente,
aos servidores públicos civis, o direito de greve (art. 37,
4
MI 712 / PA
VII).
O
direito
de
greve
dos
trabalhadores
em
geral,
assegurado pelo art. 9º da Constituição do Brasil, encontrase
regulamentado
pela
lei
n.
7.783/89,
inaplicável,
no
entanto, aos servidores públicos civis.
5.
VII
No MI n. 20 ficou assentado que a regra do inciso
do
art.
37
da
Constituição
do
Brasil
é
provida
de
eficácia limitada. Vale dizer, sua aplicabilidade depende da
edição
de
ato
legislativo,
requisito
indispensável
à
plena
concreção do preceito constitucional.
6.
Em ocasiões anteriores sustentei que o preceito é
dotado
de
eficácia
desnecessário,
ou
de
outra
nesse
contida.
momento,
forma,
a
Não
obstante,
debatermos
solução
a
ser
no
a
torna-se
questão.
caso
De
uma
encaminhada
operará no sentido de viabilizar o exercício do direito de
que se trata pelos servidores públicos civis. Entendido como
norma de eficácia limitada, o texto normativo constitucional
depende da emissão de normatividade futura, que lhe integre
eficácia,
dando-lhe
capacidade
de
execução.
Reclama-se,
portanto, para fins de plena incidência do preceito, atuação
legislativa que dê concreção ao comando positivado no texto
da
Constituição.
O
Congresso
5
Nacional
atua,
nessas
MI 712 / PA
condições,
desempenhando
concretizante
do
que
a
foi
relevante
nele
---
função
isto
é,
de
no
sujeito
texto
da
Constituição --- proclamado.
7.
Como observou o Ministro Celso de Mello no MI n.
20:
“[e]ssa
Estado
faz
comando
Estado
emergir,
de
em
inércia
favor
constitucional,
atividade
ordem
situação
a
estatal
evitar
frustre,
omissivo,
a
o
devida
que
a
a
do
do
aparelho
de
beneficiário
do
direito
pelo
de
Poder
abstenção
partir
desse
aplicabilidade
e
a
exigir
uma
Público,
em
voluntária
do
comportamento
efetividade
do
direito que lhe foi reconhecido pelo próprio texto
da Lei Fundamental.
O
Poder
vinculado
atividade
Legislativo,
nesse
institucionalmente
governamental
que
à
lhe
contexto,
está
concretização
foi
imposta
da
pela
Constituição, ainda que o efetivo desempenho dessa
incumbência
constitucional
não
prazos pré-fixados” (fls. 27/28).
6
esteja
sujeito
a
MI 712 / PA
8.
Congresso
Esta Corte mais de uma vez reconheceu a omissão do
Nacional
no
que
respeita
ao
dever,
que
lhe
incumbe, de dar concreção ao preceito constitucional. Nesse
sentido vou ainda me valer de afirmação do Ministro Celso de
Mello, como segue:
“Desse
modo,
complementar
forma
Poder
a
reclamada
veemente
e
inexistência
pela
concreta,
Legislativo,
Constituição
a
dentro
da
do
lei
reflete,
inobservância,
contexto
pelo
temporal
referido, do seu dever de editar o ato legislativo
em
questão,
com
evidente
constitucional,
desapreço
frustrando,
pelo
dessa
comando
maneira,
a
necessidade de regulamentar o texto da Lei Maior,
o que demonstra a legitimidade do reconhecimento,
por
esta
Suprema
Corte,
da
omissão
ler
trecho
congressual
apontada” (fls. 30).
9.
Por
oportuno,
permito-me
extremamente
relevante do voto do Ministro Néri da Silveira, ainda no MI
n. 20:
“Tenho,
de
outra
parte,
entendido,
no
que
respeita ao mandado de injunção, que o instituto,
consagrado
entre
os
7
direitos
e
garantias
MI 712 / PA
individuais
e
coletivos,
à
semelhança
do
mandado
de segurança, há de ter eficácia. Se sua natureza
é
a
de
uma
acentuou
de
a
Corte
Ordem)
Suprema
tenha
ação
nº
de
no
Mandado
107,
Corte
tipo
não
declaratório,
de
se
pode
do País decida
eficácia.
quanto a essa
Por
Injunção
(Questão
entender
sem que seu
isso,
hei
me
como
que
a
julgado
posicionado
matéria no sentido de reconhecer a
mora do Congresso Nacional, ou daquela autoridade
a quem incumbe ditar a norma regulamentadora para
tornar
viável
o
exercício
do
direito.
Fixo-lhe,
porém, um prazo, eis que, em mora, é preciso que a
autoridade
dever
ou
previsto
Compreendo,
sem
a
o
órgão
na
Constituição
dessa
edição
legislativo
maneira,
da
norma
e
que,
cumpram
editem
vencido
a
seu
norma.
o
regulamentadora,
prazo
podem
aqueles cujo direito não é exercitado por falta da
norma
e
que
assegure
mandado
o
de
vêm
ao
Poder
exercício
injunção,
do
ter
Judiciário
direito,
a
garantia
pedir
por
do
lhes
via
do
exercício
do direito previsto na Constituição, caso em que o
Tribunal,
em
conhecendo
de
hipótese concreta” (fls. 55).
8
reclamação,
decide
a
MI 712 / PA
10.
Havendo,
portanto,
sem
qualquer
dúvida,
mora
legislativa na regulamentação do preceito do art. 37, inciso
VII, a questão que se coloca é a seguinte: presta-se, esta
Corte,
quando
se
trate
da
apreciação
de
mandados
de
injunção, a emitir decisões desnutridas de eficácia?
11.
Esta
é
a
questão
fundamental
a
considerarmos.
Já
não se trata de saber se o texto normativo de que se cuida --
art.
37,
VIII
---
é
dotado
de
eficácia.
Importa
verificarmos é se o Supremo Tribunal Federal emite decisões
ineficazes;
decisões
Legislativo
que
admissível
o
que
se
cumpra
o
entendimento
bastam
seu
em
solicitar
dever,
segundo
o
ao
inutilmente.
qual,
nas
Poder
Se
palavras
é
do
Ministro Néri da Silveira, "a Suprema Corte do País decid[e]
sem
se
que
o
seu
julgado
Supremo
efetivamente
omissão,
Tribunal
surtam
reiteradas
reiteradas
e
tenha
Federal
efeito,
vezes,
inúmeras
sucessivamente,
eficácia".
vezes
desenvolver
no
como
Ou,
deve
emitir
sentido
se
alternativamente,
dá
repetida.
de
no
Daí
considerações
suprir
caso
porque
a
institutos da greve e do mandado de injunção.
9
decisões
em
que
aquela
pauta,
passo
propósito
a,
dos
MI 712 / PA
12.
A
greve
é
a
arma
mais
eficaz
de
que
dispõem
os
trabalhadores como meio para a obtenção de melhoria em suas
condições de vida. Consubstancia um poder de fato; por isso
mesmo
que,
tal
constitucional
como
positivado
9 o ],
[art.
auto-aplicabilidade
é
recebe
o
princípio
concreção,
inquestionável
no
texto
imediata
—
como
—
sua
direito
fundamental de natureza instrumental.
13.
A
Constituição,
tratando
dos
trabalhadores
em
geral, não prevê regulamentação do direito de greve: a eles
compete decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os
interesses que devam por meio dela defender. Por isso a lei
não
pode
restringi-lo,
constitucionalmente
greves
admissíveis
reivindicatórias,
políticas,
greves
senão
de
todos
greves
protesto 1.
protegê-lo,
de
Não
os
tipos
sendo
de
greve:
solidariedade,
greve s
obstante,
os
abusos
no
seu exercício, como, de resto, qualquer abuso de direito ou
liberdade, sujeitam os responsáveis às penas da lei [§ 2 o do
art.
9o]
—
lei
que,
repito,
não
pode
restringir
o
uso
do
direito. A Constituição [§ 1 o do art. 9 o ] apenas estabelece
que
lei
definirá
os
serviços
1
ou
atividades
essenciais
e
Cf. JO SÉ A FON SO DA SIL VA, Cur so de Dir eit o Co ns titu cio nal Pos iti vo ,
23 a e diç ão, p. 30 3.
10
MI 712 / PA
disporá
sobre
o
atendimento
das
necessidades
inadiáveis
da
comunidade.
14.
O artigo 37, VII, consubstancia norma especial em
relação ao caráter geral 2 do preceito veiculado pelo artigo
9 o , estabelecendo que "o direito de greve será exercido nos
termos
e
limites
definidos
em
lei
específica".
Isso
se
explica por duas razões.
15.
Em primeiro lugar porque na relação estatutária do
emprego
público
capital,
tal
atividade
do
poder
não
como
se
se
econômica
de
fato,
manifesta
realiza
pelos
a
tensão
no
campo
particulares.
greve,
coloca
em
entre
da
trabalho
exploração
Neste,
risco
o
os
e
da
exercício
interesses
egoísticos do sujeito detentor de capital --- indivíduo ou
empresa --- que, em face dela, suporta, em tese, potencial
ou efetivamente redução de sua capacidade de acumulação de
capital.
Verifica-se,
interesses
capitalistas.
dos
Como
então,
oposição
trabalhadores
a
greve
e
pode
os
conduzir
direta
entre
interesses
à
diminuição
os
dos
de
ganhos do titular de capital, os trabalhadores podem em tese
2
Sob re os atr ib utos de ge ner al i dade
voto -vi sta no R E 351. 750 -3.
11
e
esp eci al i dade
da s
l eis ,
meu
MI 712 / PA
vir
a
obter,
efetiva
ou
potencialmente,
algumas
vantagens
mercê do seu exercício.
16.
O
âmbito
não
da
mesmo
qual,
em
correspondem,
senão
o
interesse
não
se
dá
tese,
na
aos
relação
interesses
antagonicamente,
social.
Vale
estatutária,
dos
trabalhadores
interesses
dizer:
a
no
individuais,
greve
no
serviço
público não compromete, diretamente, interesses egoísticos,
mas
sim
os
prestação
tênue,
do
por
capacidade
setor
do
interesses
serviço
exemplo,
de
dos
público.
Por
enquanto
reivindicação
ensino
cidadãos
público.
isso
poder
social,
Como
que
a
de
a
falta
necessitam
é
da
relativamente
fato
greve
da
dotado
de
exercida
no
utilidade
social
somente será sentida a tempo mais longo, as paralisações aí
praticadas permanecem durante largos períodos de tempo, até
que
as
reivindicações
às
quais
estejam
voltadas
sejam
atendidas, quando e se isso ocorra.
16.
Em segundo lugar, a relação
instrumental,
direta
ou
do emprego público é
indiretamente,
da
provisão
de
serviços públicos, cuja continuidade há de ser assegurada em
benefício do todo social.
12
MI 712 / PA
17.
Serviço
público,
na
noção
que
dele
podemos
enunciar, é --- observei alhures 3 --- a atividade explícita
ou
implicitamente
definida
pela
indispensável,
em
determinado
realização
ao
desenvolvimento
e
interdependência
atividade
social
explícita
(DUGUIT)
ou
Constituição
momento
---
da
histórico,
coesão
ou,
em
implicitamente
como
à
e
outros
da
termos,
definida
pela
Constituição como serviço existencial [permito-me enfatizar:
existencial,
não
essencial,
existencial,
dizia,
mais
relativamente
do
à
que
essencial]
sociedade
em
um
determinado momento histórico (CIRNE LIMA).
18.
do
Daí o caráter
artigo
37,
VII,
em
especial --relação
à
de norma especial ---
norma
geral
extraída
do
artigo 9 o da Constituição do Brasil, cujo § 1 o diz que "[a]
lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá
sobre
o
atendimento
das
necessidades
inadiáveis
da
coletividade".
19.
Por
isso
tenho
que
a
Lei
n.
7.783,
de
20.06.89,
atinente à greve dos trabalhadores em geral, não se presta,
sem
determinados
acréscimos,
bem
3
A or dem eco nôm ica d a C ons tit ui ção
Edit ore s, São P au lo, 2.0 06, p. 1 35 .
13
assim
de
1 988 ,
algumas
11 a
reduções
ediç ão ,
do
Ma lhe ir o s
MI 712 / PA
seu texto, a regular o exercício do direito de greve pelos
servidores
públicos.
regulação
Este
peculiar,
mesmo
reclama,
porque
em
certos
"serviços
ou
pontos,
atividades
essenciais" e "necessidades inadiáveis da coletividade" não
se
superpõem
a
"serviços
públicos";
e
vice-versa.
Trata-se
aí de atividades próprias do setor privado, de um lado --ainda
que
essenciais,
voltadas
ao
atendimento
de
necessidades inadiáveis da coletividade --- e de atividades
próprias do Estado, de outro.
20.
Daí
aplicado
ao
porque,
exercício
de
início,
do
não
direito
de
me
parece
greve
no
deva
ser
âmbito
da
Administração tão-somente o disposto na Lei n. 7.783/89. A
esta
Corte
impõe-se
traçar
os
parâmetros
atinentes
a
esse
exercício.
21.
Isso
me
leva
a
alterar
posição
que
anteriormente
assumi, ao afirmar que a norma veiculada pelo artigo 37, VII
é
de
eficácia
contida.
Pois
é
certo
que
ela
reclam a
regulamentação, a fim de que seja adequadamente assegurada a
coesão social. Por isso, ao adotarmos a classificação usual
das
devo
normas
constitucionais
necessariamente
tê-la
segundo
como
14
o
critério
de
eficácia
da
eficácia,
limitada;
e
MI 712 / PA
assim a tenho porque esta é conclusão que necessariamente se
extrai
da
interpretação
Constituição
---
e
isso
da
Constituição
repetirei
no
inúmeras,
seu
todo.
inúmeras
A
vezes
neste Tribunal --- a Constituição não pode ser interpretada
em tiras, aos pedaços 4, porém no seu todo.
22.
Passo
injunção.
Quanto
ao
a
exame
ele,
do
toda
instituto
a
exposição
do
mandado
que
segue
de
neste
apartado do meu voto é extraída de justificativa de autoria
do Professor JOSÉ IGNÁCIO BOTELHO DE MESQUITA a anteprojeto
de lei por ele elaborado, que foi publicado inicialmente no
jornal O Estado de São Paulo, de 26 de agosto de 1989, e,
posteriormente, foi convertido no Projeto de Lei n. 4.679,
de
1.990,
que
justificativa
o
repetiu
[Diário
na
íntegra,
inclusive
do
Congresso
Nacional
eminente
Professor
Titular
de
a
su a
17.04.1990,
página 2.824 e segs.].
23.
Diz
o
da
Faculdade
de
Direito da USP:
4
Vide m eus E nsa io e di scu rso s obre a int erp re taçã o/a pli caç ão d o
dire ito , 3ª e diç ão, Ma lh eir os Ed itor es, São P aul o, 2.0 05 , pp. 4 0 e
127- 8 e A ord em e conô mic a n a C on st itui ção de 19 88 , cit. , p . 1 66.
15
MI 712 / PA
"1.
É
princípio
assente
em
nosso
direito
positivo
que, não havendo norma legal ou sendo omissa a norma
existente, cumprirá ao juiz decidir o caso de acord o
com a analogia, os costumes e os princípios gerais do
direito (Lei de Introdução ao Cód. Civil, art. 4º.;
Cód. Proc. Civil, art. 126). Assim, o que pode tornar
inviável
o
exercício
de
algum
direito,
liberdade
ou
prerrogativa constitucionalmente assegurados não será
nunca a 'falta de norma regulamentadora' mas, sim, a
existência de alguma regra ou princípio que proíba ao
juiz
recorrer
princípios
de
à
analogia,
direito
para
aos
suprir
costumes
a
falta
ou
de
aos
norma
regulamentadora.
Havendo
tal
proibição,
configura-se
a
hipótese
de
impossibilidade jurídica do pedido, diante da qual o
juiz é obrigado a extinguir o processo sem julgamento
de
mérito
(Cód.
Proc.
Civil,
art.
267,
VI),
o
que
tornará inviável o exercício do direito, liberdade ou
prerrogativa assegurados pela Constituição.
O
caso,
pois,
em
que
cabe
o
mandado
de
injunção
é
exatamente o oposto daquele em que cabe o mandado de
segurança. Vale dizer, é o caso em que o requerente
não tem direito de pretender a tutela jurisdicional e
16
MI 712 / PA
em que requerido teria o direito líquido e certo de
resistir
a
essa
pretensão,
se
acaso
fosse
ela
deduzida em Juízo.
Esta constatação --- prossegue BOTELHO DE MESQUITA -- é de primordial importância para o conhecimento da
natureza
deriva
e
a
dos
fins
do
determinação
mandado
dos
de
casos
injunção.
em
que
Dela
se
pode
admitir o mandado de injunção e também dos objetivos
que, por meio dele, podem ser alcançados".
O
mandado
remoção
da
competente
desse
de
injunção
obstáculo
para
a
obstáculo
criado
norma
se
"[d]estina-se,
pela
apenas,
omissão
regulamentadora.
realiza
mediante
supletiva da norma regulamentadora
do
A
a
à
poder
remoção
formação
faltante. É este
o resultado prático que se pode esperar do julgamento
da mandado de injunção.
A
intervenção
supletiva
do
Poder
Judiciário
deve
subordinar-se, porém, ao princípio da independência e
da
harmonia
entre
os
Poderes
(CB,
art.
2º).
A
autorização constitucional para a formação de normas
supletivas não importa permissão ao Poder Judiciário
para
imiscuir-se
competência
dos
indiscriminadamente
demais
17
Poderes.
no
Trata-se
que
é
da
apenas
de
MI 712 / PA
dar
remédio
que
tal
para
omissão
regulamentadora
vigor
no
prazo
que
Antes
de
se
não
prazo
estabelecido,
omissão
omissão
o
incluirá
configure,
tenha
quando
dentro
é
sido
houver,
tribunal
poder
poder
competente.
preciso
elaborada
constitucional
decorrido
do
do
ou
sua
posta
falta,
entenda
não
há
que
competente,
eis
que
a
previsão
norma
em
legalmente
prazo
da
tal
e
ou
na
competente
que
Para
no
razoável.
falar
em
demora
se
constitucional
e
assim
também a provisória impossibilidade do exercício dos
direitos, liberdades ou prerrogativas garantidos pelo
preceito
para
ainda
os
não
direitos,
constitucionais
não
regulamentado.
O
liberdades
é
a
e
que
é
danoso
prerrogativas
demora,
em
si
mesma
considerada, mas a demora incompatível com o que se
possa
ter
como
previsto
e
programado
pela
Constituição.
[...]
O
cabimento
isto,
um
dispositivo
do
ato
mandado
de
de
injunção
resistência
constitucional,
que
ao
pressupõe,
por
cumprimento
do
não
tenha
outro
fundamento senão a falta de norma regulamentadora.
[...]
18
MI 712 / PA
O
conteúdo
mandado
e
de
os
efeitos
injunção,
e
da
bem
decisão
assim
os
que
julga
efeitos
do
o
se u
trânsito em julgado, devem ser estabelecidos a partir
de
uma
clara
injunção
determinação
exatamente
constitucional.
do
o
escopo
que
Pelo
do
mandado
falta
que
do
no
de
texto
dispositivo
constitucional consta, sabe-se quando cabe o mandado
de injunção, mas não se sabe para o que serve; sabese qual o problema prático que visa a resolver, mas
não se sabe como deverá ser resolvido.
[...]
O
que
cabe
constranger
ao
órgão
alguém
constitucional,
a
mas,
da
jurisdição
dar
não
cumprimento
sim,
suprir
a
ao
falta
é,
pois
preceit o
de
norma
regulamentadora, criando, a partir daí, uma coação da
mesma
natureza
daquela
regulamentadora.
O
anticonstitucional)
que
ilícito
é
algo
estaria
contida
na
constitucional
que
só
poderá
norma
(o
ato
existir
depois de julgado procedente o mandado de injunção e,
por isto, não constitui matéria que possa ser obje to
de decisão no julgamento do próprio mandado.
Fixados
estes
compreensão
da
limites
desponta
hipótese
19
da
o
problema
norma
que
da
será
MI 712 / PA
supletivamente
formulada
pelo
tribunal.
Deverá
ela
regular apenas o caso concreto submetido ao tribunal,
ou abranger a totalidade dos casos constituídos pelos
mesmos
elementos
objetivos,
embora
entre
sujeitos
diferentes? Dentre essas alternativas, é de se optar
pela última, posto que atividade normativa é dominada
pelo
princípio
possibilidade
da
de
regulamentadoras
concretos
isonomia,
se
criarem
diferentes
Também
ao
aqui
é
exclui
tantas
quantos
submetidos
constitucional.
que
sejam
mesmo
preciso
a
normas
os
casos
preceito
ter
presente
que não cumpre ao tribunal remover um obstáculo que
só
diga
respeito
ao
caso
concreto,
mas
a
todos
os
casos constituídos pelos mesmos elementos objetivos".
24.
O que deve ser regulado, no caso de que tratamos,
é --- alterada parcialmente a dicção de MAURICE HAURIOU 5 --a
coerência
servidor
entre
público
interdependência
o
e
exercício
as
social,
do
condições
que
a
direito
de
necessárias
prestação
greve
à
pelo
coesão
continuada
e
dos
serviços públicos assegura.
5
Not es d'a rrê ts sur déc isi ons du Con sei l d 'Ét at et d u
Conf lit s, tom e tr oisi ème , S ire y, P aris , 1 .92 9, pá g. 174 .
20
T rib una l
des
MI 712 / PA
25.
A
mora,
nitidamente,
programado
de
pela
no
caso,
mora
é
evidente.
incompatível
Constituição
do
com
Brasil
o
no
Trata-se,
previsto
seu
art.
e
37,
inciso VII.
26.
Salvo
a
hipótese
de
---
como
observei
anteriormente 6, lembrando FERNANDO PESSOA --- transformarmos
a Constituição em papel "pintado com tinta" e aplicá-la em
"uma coisa em que está indistinta a distinção entre nada e
coisa
nenhuma",
formação
constitui
supletiva,
no
dever-poder
caso,
da
deste
norma
Tribunal
a
regulamentadora
faltante.
27.
O
argumento
de
que
a
Corte
estaria
então
a
legislar --- o que se afiguraria inconcebível, por ferir a
independência
e
harmonia
entre
os
poderes
[art.
2o
da
Constituição do Brasil] e a separação dos poderes [art. 60,
§ 4 o , III] --- é insubsistente.
28.
Pois
é
certo
formular
supletivamente
que
a
este
norma
6
Dir eit o,
con ceit os
e
n orm as
Trib una is, Sã o Pa ulo, 1. 988 , p . 12 4.
21
Tribunal
exercerá,
regulamentadora
jur ídi cas ,
E di tora
de
Re vis ta
ao
que
do s
MI 712 / PA
carece
o
art.
37,
VII
da
Constituição,
função
normativa,
porém não legislativa.
29.
Explico-me.
30.
A
classificação
mais
freqüentemente
adotada
das
funções estatais concerne aos ofícios ou às autoridades que
as
exercem.
Trata-se
da
classificação
que
se
denomina
orgânica ou institucional. Tais funções são, segundo ela, a
legislativa,
a
pretendermos
classificá-las
teremos:
a
executiva
função
e
a
jurisdicional.
segundo
normativa
---
o
de
Se,
critério
produção
porém,
material ,
das
normas
jurídicas [= textos normativos]; a função administrativa --de execução das normas jurídicas; a função jurisdicional --de aplicação das normas jurídicas.
31.
Na
menção
aos
Poderes
Legislativo,
Executivo
e
Judiciário estamos a referir centros ativos de funções --da
função
legislativa,
jurisdicional.
decorre
assim
da
Essa
aplicação
alinhadas
não
da
função
classificação
de
em
um
critério
razão
aspectos materiais.
22
da
executiva
de
e
da
funções
subjetivo;
função
estatais
estão
consideração
de
elas
seus
MI 712 / PA
32.
Entenda-se por função estatal a expressão do poder
estatal --- tomando-se aqui a expressão “poder estatal” no
seu aspecto material --- enquanto preordenado a finalidades
de interesse coletivo e objeto de um dever jurídico.
33.
A consideração do poder estatal desde esse aspecto
liberta-nos
da
tradicional
classificação
das
funções
estatais segundo o critério orgânico ou institucional. Nesta
última,
porque
perspectiva
executiva
o
poder
subjetiva,
e
a
estatal
alinham-se
jurisdicional,
respectivamente,
os
às
Poderes
é
a
visualizado
função
quais
desde
a
legislativa,
são
Legislativo,
a
vocacionados,
Executivo
e
Judiciário.
34.
Afastado,
classificação
das
contudo
funções
o
critério
estatais,
tradicional
cumpre
de
fixarmo-nos
naquele outro, que conduz à seguinte enunciação:
[i] função normativa - de produção das normas
jurídicas [= textos normativos];
[ii]
função
administrativa
normas jurídicas;
23
-
de
execução
das
MI 712 / PA
[iii] função jurisdicional - de aplicação das
normas jurídicas.
35.
A
função
função
normativa.
legislativa
Maior
é
porque
maior
e
abrange
menor
a
do
produção
que
de
a
atos
administrativos sob a forma de leis [lei apenas em sentido
formal, lei que não é norma, entendidas essas como preceito
primário que se integra no ordenamento jurídico inovando-o];
menor
porque
jurídicas
a
função
contidas
normativa
em
lei,
abrange
mas
não
também
apenas
nos
normas
regimentos
editados pelo Poder Judiciário e nos regulamentos expedidos
pelo Poder Executivo.
36.
Daí
legislativa
que
a
função
[enquanto
normativa
produção
de
compreende
textos
a
função
normativos],
a
função regimental e a função regulamentar.
37.
Quanto à regimental, não é a única atribuída, como
dever-poder, ao Poder Judiciário, visto incumbir-lhe também,
e
por
imposição
supletivamente,
injunção,
a
nas
norma
da
Constituição,
hipóteses
de
a
concessão
regulamentadora
de
do
formular
mandado
reclamada.
Aqui
de
o
Judiciário --- na dicção de JOSÉ IGNÁCIO BOTELHO DE MESQUITA
24
MI 712 / PA
---
remove
competente
essa
o
obstáculo
para
remoção
editar
a
criado
pela
norma
realizando-se
omissão
do
regulamentadora
mediante
a
sua
poder
faltante,
formulação
supletiva.
38.
De resto, é ainda certo que, no caso de concessão
do mandado de injunção, o Poder Judiciário formula a própria
norma
aplicável
ao
caso,
embora
ela
atue
como
novo
texto
normativo.
39.
Apenas
para
explicitar,
lembro
que
texto
e
norma
não se identificam 7. O que em verdade se interpreta são os
textos
normativos;
normas.
A
norma
é
da
interpretação
dos
a
interpretação
do
textos
texto
resultam
normativo.
as
A
interpretação é atividade que se presta a transformar textos
--- disposições, preceitos, enunciados --- em normas.
40.
norma.
produzir
O Poder Judiciário, no mandado de injunção, produz
Interpreta
a
norma
inevitável,
porém,
o
de
no
direito,
decisão
caso,
na
sua
totalidade,
aplicável
seja
essa
à
norma
para
omissão.
tomada
É
como
texto normativo que se incorpora ao ordenamento jurídico, a
7
Vide meu E nsa io e discu rso s obr e a inter pre taç ão /ap lica ção d o dir ei t o,
cit. , p p. 80 e ss .
25
MI 712 / PA
ser
interpretado/aplicado.
Dá-se,
aqui,
algo
semelhante
ao
que se há de passar com a súmula vinculante, que, editada,
atuará como texto normativo a ser interpretado/aplicado.
41.
Ademais, não há que falar em agressão à "separação
dos poderes", mesmo porque é a Constituição que institui o
mandado
de
"separação
injunção
dos
e
poderes"
não
existe
provinda
do
uma
assim
direito
chamada
natural.
Ela
existe, na Constituição do Brasil, tal como nela definida.
Nada
mais.
harmonia
que
está
No
entre
Brasil
os
escrito
vale,
poderes
na
e
em
matéria
de
“separação
Constituição,
de
não
independência
e
dos
o
esta
poderes”,
ou
aquela
doutrina em geral mal digerida por quem não leu Montesquieu
no original.
42.
De resto, o Judiciário está vinculado pelo dever-
poder de, no mandado de injunção, formular supletivamente a
norma regulamentadora faltante. Note-se bem que não se trata
de simples poder, mas de dever-poder, idéia já formulada por
JEAN DOMAT 8 no final do século XVII, após retomada por LEÓN
8
Oeu vre s d e J . DO MAT, Pa ris , F irm i n Di dot Pè re et F ils, 1. 829 , p . 3 6 2
e ss .
26
MI 712 / PA
DUGUIT 9 e,
entre
nós,
por
BARBOSA 10,
RUI
mais
recentemente
por CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO 11.
43.
A este Tribunal incumbirá --- permito-me repetir -
-- se concedida a injunção, remover o obstáculo decorrente
da omissão, definindo a norma adequada à regulação do caso
concreto, norma enunciada como texto normativo, logo sujeito
a interpretação pelo seu aplicador.
44.
No
julgada
caso,
procedente
o
a
Sindicato
ação
e,
impetrante
declarada
a
solicita
omissão
do
seja
Poder
Legislativo, determinada a supressão da lacuna legislativa,
mediante
a
público,
autorizando-se
da
Lei
n.
regulamentação
7.783,
até
a
o
do
direito
utilização
advento
de
de
de
lei
greve
normas
no
serviço
análogas
própria;
pede,
às
ao
final, seja reconhecido o direito de greve.
45.
Não se
aplica
ao direito de greve dos servidores
públicos, repito-o, exclusivamente, e em sua plena redação,
a Lei n. 7.783/89, devendo o Supremo Tribunal Federal dar os
parâmetros
definidos
do
por
seu
esta
exercício.
Corte
de
Esses
modo
parâmetros
abstrato
e
hão
de
geral,
ser
para
regular todos os casos análogos, visto que norma jurídica é
9
El pra gma tis mo j urid ico , M adr id , Fran cis co Bel tr án , 1. 924 , p . 1 11 .
Com ent ári os à C o nsti tui ção Fe der a l Br asi lei ra, vo l ume I, col igi dos e
orde nad os por H om ero Pir es, Sã o Pa ulo, Sa rai va & Ci a., 1.9 32, p. 1 53 .
11
“Ve rba de re pr es enta ção ”, in RT 5 91/4 3, jan eir o de 1.9 85.
10
27
MI 712 / PA
o
preceito,
regular
o
abstrato,
genérico
comportamento
que se integra
social
e
inovador
de
---
sujeitos
no ordenamento jurídico 12 e
tendente
associados
a
---
não se dá norma
para um só.
46.
No
mandado
de
injunção
o
Poder
Judiciário
não
define norma de decisão, mas enuncia a norma regulamentadora
que
faltava
direito
que,
de
no
futuro,
para,
greve
que
dos
tange
que
estendida,
no
às
versem
por
caso,
tornar
servidores
hipóteses
situações
despacho
viável
o
exercício
públicos.
E
nada
de
outras
monocrático
do
obsta
impetrações,
análogas,
a
relator,
do
a
no
elas
seja
essa
mesma
regulação, nos termos do disposto no artigo 21 do Regimento
Interno desta Corte.
47.
esta
Temos
Corte,
assegurar
a
então
das
como
medidas
continuidade
indispensável
a
da
serem
a
tomadas
prestação
do
definição,
no
sentido
serviço
por
de
público;
somente assim poderá ser conferida eficácia ao disposto no
art. 37, VII.
12
Vide meu O direito posto e o direito pressuposto, 6ª edição, Malheiros Editores,
São Paulo, 2.005, p. 239.
28
MI 712 / PA
48.
Boa parte da filosofia do serviço público encontra
inspiração
no
princípio
da
sua
continuidade,
isto
é,
continuidade do serviço público 13.
49.
A
continuidade
do
serviço
público
é,
na
França,
afirmada como princípio com valor constitucional ainda que a
Constituição
não
lhe
referência 14
faça
Aliás,
a
idéia
de
continuidade é inerente, mesmo no medievo, ao empreendimento
de
atividades
que
assumissem
modernamente
denominamos
Charles
rei
IX,
de
a
serviço
França,
de
configuração
público.
1.560,
Uma
do
que
ordenança
estabelecia
que
de
aos
titulares de direitos de pedágio [droicts de Peage] incumbia
a
conservação
das
13
pontes,
em
boa
e
devida
reparação
caminhos
e
passagens;
[=
isso
em
não
bom
sendo
estado]
feito,
o
Nes te sen tid o, J UAN ALF ONS O S ANT A MARÍ A P AST OR, Pr i ncip ios de de rec h o
admi nis tra tiv o,
S.A. ,
1. 999 ,
HÉLÈ NE
v olum en
p.
329.
P AU LIA T,
Vid e
Gran ds
Coli n, 2. 000 , p.
II,
Ma dri d,
C ent ro
JE AN- F RANÇ OIS
s er vic es
de
Est udio s
LAC HAU ME,
2e
publ ics ,
R amó n
CLAU DIE
é dit ion,
A rec es ,
BOI TEA U
Par is ,
et
Ar ma nd
275 e ss; FR ANC IS DEL PÉR É, Le s affa ire s cou ran ts
en
Belg iqu e - O bse rv atio ns s ur l a lo i de co nti nui té d u serv ice pub lic , in
“Ser vic e
Pu bli c
Édou ard
et
li ber tés
Ch arl ie r”,
-
Par is,
Mé lang es
o ffe rts
Éd itio ns
de
au
Pro fes seu r
l’U nive rsi té
Ro b ertet
de
l’En sei gne men t M o dern e, 1.9 57, p. 51 e ss .; CEL SO ANT ÔNI O B AND EIR A DE
MELL O,
Cur so
Malh eir os,
de
2 .00 1 ,
dir eit o
p.
a dmi ni stra tiv o,
4 1-4 2.
Vid e
tb
V ide
13 a
e diçã o,
LI NOT TE,
São
DID IE R,
Pa ul o,
MES T RE,
ACHI LLE et R OMI , RAPH AËL , Se rvi ce s publ ics et d roi t publ ic e con omi qu e,
troi siè me édi ti on , Pa ris , L ite c, 1 .995 , p p. 72- 75 .
14
Cf. a Dec is ão 7 9 -105 DC, do Con se lho C ons tit uc ion a l, Re c. 3 3, R JC I 71 ( 25. 7. 79) , i n Les g ran des dé c isio ns du Co nse il con sti tu tio nne l, 8 e
édit ion , D all oz , Pari s, 1.9 95] .
29
MI 712 / PA
produto das receitas do pedágio seria tomado pelos agentes
do reino [Procureurs] e aplicado à reparação e conservação
devidas 15. O mesmo preceito é reproduzido, no século XIX, no
artigo 42 do cahier des charges [conjunto de disposições que
definem
as
condições
da
concessão
de
serviço
público]
aplicável à concessão de transporte ferroviário entre Paris
e Lyon: “Le chemin de fer et toutes ses dépendances seront
constamment
entretenuus
circulation
soit
en
bon
toujours
état
facile
et
et
de
manière
sûre.
que
L’état
la
dudi t
chemin et de ses dépendances sera reconnu annuellement, et
plus
souvent,
plusieurs
frais
soit
en
d'urgence
commisaires
d’entretien
et
que
ceux
extraordinaires,
compagnie” 16.
la
cas
d'accidents,
désignera
de
o
soit
entièrement
modelo
par
un
l'administration.
réparation,
resteront
Outrossim,
ou
de
à
Les
ordinaires,
la
cahier
ou
charge
des
de
charges
para a concessão de pontes, aprovado pela circular de 7 de
maio
de
1.870,
circulação
estabelecia,
viesse
a
ser
em
seu
artigo
interrompida,
o
26,
que,
se
a
concessionário
deveria prover, por sua conta, um serviço de travessia por
15
Vide
I EAN
conf ere nce
DE
de s
LAON ,
Le
o rdon nan ces
c orp s
DV
ro yav x ,
et
DR OIC T
Fra nç ois,
Co vst ume s
con ten ant
o bser vee s
av
la
R oya um e
de F ran ce, MD C, p . 36 1.
16
Cf.
tome
GAB RI EL
D UF OUR,
tr ois ièm e,
Tr ait é
deux ièm e
g éné ral
é dit ion ,
de
Par is,
213- 214 .
30
d ro it
a mi nist rat if
Co til lon
Édi teu r,
app liq u é ,
1.8 54,
p.
MI 712 / PA
balsa; e, mais, se a ponte viesse a ser destruída, ainda que
em razão de força maior, o concessionário seria obrigado a
reconstruí-la,
sem
direito
a
reclamar
qualquer
indenização
do Estado 17.
50.
Estreitamente
serviço
público,
o
vinculado
princípio
da
à
sua
própria
essência
continuidade
do
expressa
exigência de funcionamento regular do serviço, sem qualquer
interrupção
além
das
assim
é
previstas
na
regulamentação
a
el e
aplicável 18.
51.
E
porque
serviço
público
é
atividade
indispensável à consecução da coesão social e a sua noção 19
há
de
ser
construída
sobre
as
idéias
de
por
todas,
a
coesão
e
de
observação
de
interdependência social.
52.
Basta
neste
passo,
MAURICE HAURIOU 20: as condições fundamentais de existência do
17
Vid e L ÉON AU CO C, Con fér enc es su r l’ad min ist rat io n et l e d roi t
admi nis tra tif , de uxiè me édi tio n, P aris , D uno d E di te ur, 1.8 82, p. 5 051;
18
RE NÉ CHA PUS , Dro it adm ini str ati f géné ral , tom e 1 , 9 e éd iti on, P ari s ,
Mont chr est ien ,
1 .995 ,
p.
5 37
e
540 .
Qua nto
à
rela ção
e n tre
cont inu ida de e pe rman ênc ia do s erv iço, J EAN -FR ANÇ OI S LACH AUM E, CL AUD I E
BOIT EAU et HÉ LÈ NE PAU LIA T, ob. c it ., p . 2 75.
19
Noção de serviço público.
20
Ob. cit., loc. cit.
31
MI 712 / PA
Estado exigem que os serviços públicos indispensáveis à vida
da nação não sofram interrupção.
53.
ser
Isto posto, a norma, na amplitude que a ela deve
conferida
no
âmbito
do
presente
mandado
de
injunção,
compreende conjunto integrado pelos artigos 1 o ao 9 o , 14, 15
e
17
da
Lei
atendimento
n.
7.783/89,
das
com
as
peculiaridades
alterações
da
greve
necessárias
nos
ao
serviços
públicos, que introduzo no art. 3 o e seu parágrafo único, no
art.
4o,
parágrafo
no
parágrafo
único
e
no
único
art.
do
14 21.
21
art.
7o,
Este,
no
pois,
art.
é
o
9o
e
seu
conjunto
"Ar t.
1º
É
asse gur ado
o
d irei to
de
g rev e,
com pet ind o
aos
trab alh ado res dec idir sob re a op ortu nid ade de e x ercê -lo e so bre os
inte res ses qu e de vam por me io de le def end er.
Pará gra fo
ú nic o.
O
dire ito
de
grev e
ser á
e xerc ido
na
fo r ma
esta bel eci da ne st a Le i.
Art. 2 º Pa ra os fins d est a Lei , consi de ra- se le gíti mo e xer cíc io do
dire ito de g rev e a sus pen são col et iva, tem por ári a e pací fic a, p arc ia l,
de p res taç ão pe ss oal de ser viç os a emp reg ado r.
Art. 3º F rus tra d a a ne goc iaç ão ou v eri fi cad a a imp oss ib ili dad e de
recu rso s v ia ar bi tral , é fa cul ta da a c ess açã o p ar ci al d o t rab alh o.
Pará gra fo ún ic o. A enti dad e pa tro n al cor res pon de nte ou os emp re gad or es
dire tam ent e int er essa dos s erã o not ific ado s, co m ant eced ênc ia mí nim a d e
72 ( set ent a e d ua s) h ora s, da pa ra lisa ção .
Art. 4º C abe rá à enti dad e si ndi c al co rre spo nde nte conv oca r, n a fo rm a
do s eu es tat uto , ass em blé ia ger a l qu e def ini rá a s re iv ind ica çõe s da
cate gor ia e del i bera rá s obr e a para lis açã o pa rci al da pre sta ção de
serv iço s.
§ 1º O est atu to da e nti dad e s ind i cal dev erá pr eve r as for mal ida des de
conv oca ção e o q uoru m p ara a del iber açã o, tan to d a de fla gra ção qu a nto
da c ess açã o d a gr eve.
§
2º
Na
f alt a
de
en tid ade
sind ica l,
a
as semb léi a
ger al
dos
trab alh ado res
in tere ssa dos
del ib erar á
pa ra
os
fins
pre vis tos
no
'cap ut, co nst it ui ndo com iss ão de n egoc iaç ão.
Art.
5º
A
ent idad e
sin dic al
ou
comi ssã o
espe cia lme nte
e l eita
repr ese nta rá o s inte res ses dos t raba lha dor es n as nego cia çõe s ou na
Just iça do Tr ab al ho.
Art. 6º Sã o a ss eg urad os aos gr ev is tas, de ntr e o ut ro s di rei tos :
32
MI 712 / PA
I - o e mpr ego de mei os pac ífi cos ten den tes a per suad ir ou ali cia r o s
trab alh ado res a a deri rem à gre ve ;
II - a arr eca da çã o de fu ndo s e a l ivre di vul gaç ão d o mo vim ent o.
§
1º
Em
n enh um a
hipó te se,
os
meios
ado tad os
por
em pre gad os
e
empr ega dor es p od erão vio lar ou cons tra nge r os d irei tos e ga ran t ias
fund ame nta is de o utre m.
§ 2º É veda do às empr esa s ado tar m eios p ara c ons tra nger o e mpr ega do ao
comp are cim ent o ao tra ba lho , b em c omo ca paz es de f rust rar a di vul ga ção
do m ovi men to.
§ 3º As m ani fes t açõe s e ato s de pers uas ão uti liz a dos p el os g rev is tas
não pod erã o i mpe d ir o ac ess o a o t raba lho ne m c aus a r am eaç a o u d ano à
prop rie dad e o u pe ssoa .
Art. 7º O bse rva da s as c ond içõ es pr evis tas n est a L ei , a pa rti cip açã o em
grev e
s usp end e
o
co ntr at o
de
t rab alh o,
d even do
as
rel a ções
obri gac ion ais , d u rant e o p erí odo , ser r egi das pel o aco rdo , co nve nç ão,
laud o a rbi tra l ou dec isã o d a J us ti ça d o T rab alh o.
Pará gra fo ú nic o. É ved ada a re sci s ão de con tra to d e trab alh o du ran te a
grev e, exc eto n a ocor rên cia da h ip ótes e p rev ist a no art . 1 4.
Art. 8 º A Just iç a do Tra bal ho, p or ini cia tiv a de qualq uer d as pa rtes
ou d o Min ist éri o Púb li co do Tra b alho , dec idi rá s obre a pr oce dên c ia,
tota l ou pa rci al , ou imp roc edê nc ia das r eiv ind ic açõe s, cu mpr ind o ao
Trib una l p ubl ic ar , de im edi ato , o comp ete nte ac ór dã o.
Art. 9 º D ura nte a gre ve, o si n dica to ou a co m issã o de neg oci a ção,
medi ant e
ac ord o
com
a
en ti da de
pa tro nal
ou
dire tam ent e
co m
o
empr ega dor , ma nt e rá em ati vid ade e quip es d e em pre ga dos c om o pro pós i to
de a sse gur ar a re gula r c ont inu id ad e da pr est açã o do ser viç o p úbl ic o.
Pará gra fo ún ico . É ass egu rad o ao e mp reg ado r, enqu ant o per dur a r a
grev e, o dir eit o de co ntr ata r d i reta men te os se r viço s nec ess ári os a
que se ref ere e st e ar tig o.
Art. 14 C ons tit ui abus o do dir eit o de gr eve a in obs ervâ nci a da s no rm as
cont ida s na pre s ente Lei , em es peci al o com pro m etim ent o da reg u lar
cont inu ida de na p rest açã o do ser vi ço p úbl ic o, bem c omo a man ute nçã o da
para lis açã o ap ós a cele br açã o d e aco rdo , co nve n ção o u de cis ão da
Just iça do Tr ab al ho.
Pará gra fo
úni co .
Na
vig ênc ia
de
a cor do,
co nv ençã o
ou
s ent en ça
norm ati va nã o c o nsti tui a bus o d o exe rcí ci o d o d irei to de gr eve a
para lis açã o q ue :
I - ten ha por o bj etiv o e xig ir o cu mpri men to de cl áu sula ou co ndi çã o;
II - sej a mo tiv a da pe la sup erv en iênc ia de f ato n ovo o u a con tec im ento
impr evi sto qu e mo difi que su bst an ci alme nte a rel aç ão de tra bal ho.
Art. 15 A res pon sabi lid ade pel os atos pra tic ado s , ilí cit os o u cr imes
come tid os, no c ur so da gre ve, ser á apur ada , co nfo rm e o ca so, seg und o a
legi sla ção tr ab al hist a, civ il ou p enal .
Pará gra fo ún ico . Deve rá o Min ist ér io P úb lic o, de o fíci o, re qui sit ar a
aber tur a do com p eten te i nqu éri to e ofer ece r de n únci a qu and o ho u ver
indí cio da pr át ic a de de lit o.
Art. 17 . Fi ca v e dada a p ara lis aç ão da s a tiv ida de s, po r i nic iat iv a do
empr ega dor , com o ob jet iv o d e f rust rar n ego cia ç ão o u dif icu lta r o
aten dim ent o d e re ivin dic açõ es do s resp ect ivo s e mp re gado s ( loc kou t) .
Par ágr afo
ún ic o.
A
prá ti ca
ref eri da
no
cap ut
a ss egu r a
ao s
trab alh ado res o d irei to à p erc epç ã o do s s alá rio s d uran te o p erí odo de
para lis açã o".
33
MI 712 / PA
normativo
reclamado,
no
quanto
diverso
do
texto
dos
preceitos mencionados da Lei n. 7.783/89:
"Art.
3º
Frustrada
a
negociação
ou
verificada
a
impossibilidade de recursos via arbitral, é facultada
a cessação parcial do trabalho.
Parágrafo
ou
os
único.
A
empregadores
entidade
patronal
diretamente
correspondent e
interessados
serão
notificados, com antecedência mínima de 72 (setenta e
duas) horas, da paralisação.
Art.
4º
Caberá
à
entidade
sindical
correspondente
convocar, na forma do seu estatuto, assembléia geral
que
definirá
deliberará
as
sobre
reivindicações
a
paralisação
da
parcial
categoria
da
e
prestação
de serviços”;
“Art. 7 o [...]
Parágrafo único. É vedada a rescisão de contrato de
trabalho
durante
a
greve,
exceto
na
ocorrência
da
hipótese prevista no art. 14”;
“Art. 9º Durante a greve, o sindicato ou a comissão
de
negociação,
mediante
34
acordo
com
a
entidade
MI 712 / PA
patronal ou diretamente com o empregador, manterá em
atividade
equipes
assegurar
a
de
regular
empregados
com
continuidade
o
da
propósito
de
prestação
do
serviço público.
Parágrafo único. É assegurado ao empregador, enquanto
perdurar a greve, o direito de contratar diretamente
os serviços necessários a que se refere este artigo”;
“Art.
14
Constitui
abuso
do
direito
de
greve
a
inobservância das normas contidas na presente Lei, em
especial o comprometimento da regular continuidade na
prestação
do
serviço
público,
bem
como
a
manutenção
da paralisação após a celebração de acordo, convenção
ou decisão da Justiça do Trabalho”.
54.
Em face de tudo, conheço do presente mandado de
injunção,
para,
regulamentadora
remover
o
do
reconhecendo
direito
obstáculo
supletivamente,
tornar
de
a
greve
criado
viável
falta
por
o
no
de
serviço
essa
exercício
norma
público,
omissão
do
e,
direito
consagrado no artigo 37, VII da Constituição do Brasil, nos
termos do conjunto normativo enunciado neste voto.
35
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mandado de injunção 712-8 pará relator