SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
PREVALÊNCIA DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA SOBRE A
BIOLÓGICA À LUZ DOS TRIBUNAIS BRASILEIROS
Bruna Alves da Silva1
Geovana da Conceição2
SUMÁRIO
Introdução; 1 Família; 1.1 Conceito; 1.2 Espécies de Família; 2 Afeto Como
Instituidor da Paternidade Socioafetiva; 3 Posse de Estado de Filho; 3.1 Princípio do
melhor interesse da criança; 4 Filiação; 4.1 Conceito; 4.2 Da Paternidade Biológica;
4.3 Da Paternidade Socioafetiva; 5 Posicionamento dos Tribunais Brasileiros acerca
da Prevalência da Paternidade Socioafetiva sobre a Biológica; Considerações finais;
Referências.
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo demonstrar os aspectos e a prevalência da
Paternidade Socioafetiva sobre a Biológica, com base na doutrina e jurisprudência
pátria, visando identificar como o Superior Tribunal de Justiça, Tribunal de Justiça do
Estado de Santa Catarina e do Estado do Rio Grande do Sul, prestam a tutela
jurisdicional sobre o tema. É assunto de alta relevância, tendo em vista as diversas
formas de se constituir família atualmente. É dado ainda, a definição de filiação,
para, após, adentrar-se na questão da paternidade biológica e socioafetiva. O
método utilizado na presente pesquisa será o indutivo e as técnicas de pesquisa
bibliográfica, fichamento e o conceito operacional.
Palavras-chave: Filiação. Paternidade Socioafetiva. Paternidade Biológica.
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo de estudo verificar se o vínculo
socioafetivo se sobrepõe ao biológico, utilizando, além da pesquisa doutrinária, a
jurisprudencial.
1
Acadêmica do 9º período do Curso de Graduação em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí –
UNIVALI. E-mail: [email protected]
2
Professora no Curso de Direito da Univali, na disciplinas de Direito Civil (Obrigações) e Direito
Processual Civil. Mestre em Políticas Públicas pela Univali. Especialista em Direito Processual Civil
com habilitação para o Magistério Superior e advogada militante na Comarca de Itajaí.E-mail:
[email protected]
96
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Inicialmente serão pontuados alguns conceitos básicos relativos ao tema,
para, posteriormente verificar o posicionamento jurisprudencial.
O vínculo socioafetivo é aquele caracterizado pelo afeto, pela relação de
amor e carinho entre as partes. O Superior Tribunal de Justiça reconheceu
repercussão geral acerca do tema, motivo pela qual, a pesquisa é de alta relevância.
Ademais, além deste artigo ser um dos requisitos para a conclusão do curso
de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, também contribui para o
conhecimento de um tema atual.
Para o desenvolvimento da presente pesquisa foi formulado os seguintes
questionamentos: A paternidade socioafetiva se sobrepõe à biológica? É unânime
este entendimento?
Para a elaboração do artigo, o método a ser utilizado será o indutivo e as
técnicas de pesquisa bibliográfica, fichamento e o conceito operacional.
Será verificado como o Superior Tribunal de Justiça e os Tribunais de
Justiça dos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina se posicionam. O
presente trabalho se encerra com as Considerações Finais, nas quais são
apresentados pontos conclusivos destacados, bem como, traz resposta ao
questionamento3.
1.
FAMÍLIA
1.1 Conceito
Para melhor compreensão do tema, se faz necessário estabelecer o
conceito de família:
3
PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica – ideias e ferramentas úteis para o
pesquisador do direito. 9 ed.Florianópolis: OAB/SC, 2005. p. 43.
97
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luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
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Ao longo da evolução da civilização humana surgiram os primeiros laços de
união, que constituíam a família, Arnaldo Rizzardo4 leciona o conceito de família no
Direito Romano:
O termo exprimia a reunião de pessoas colocadas sob o poder
familiar ou o mando de um único chefe - o pater familias -, que era o
chefe sob cujas ordens se encontravam os descendentes e a mulher,
a qual era considerada em condição análoga a uma filha.
Submetiam-se a ele todos os integrantes daquele organismo social:
mulher, filhos, netos, bisnetos e respectivos bens. Estava a família
jure próprio, ou o grupo de pessoas submetidas a uma única
autoridade.
A família é um conjunto de pessoas unidas por laço biológico, por afinidade
e afetividade5, mas, para diversos autores é difícil estabelecer um único conceito,
tendo em vista as várias formas de famílias existentes na atualidade.
Para Maria Berenice Dias6 “é mais fácil identificar a família como pessoas
ligadas pelo vínculo do matrimônio (...), o novo modelo da família funda-se sobre os
pilares da repersonalização, da afetividade, da pluralidade e do eudemonismo”.
O Direito de Família surgiu com o objetivo de regulamentar e resolver os
conflitos da família no âmbito jurídico, uma vez que, a lei a limitava com o
casamento e nunca preocupou-se em defini-la7.
Arnaldo Rizzardo8, define família como “conjunto de pessoas com o mesmo
domicílio ou residência, e identidade de interesses materiais e morais, integrado
pelos pais casados ou em união estável, ou por um deles e pelos descendentes
legítimos, naturais ou adotados”. Verifica-se assim, as diversas espécies de família
que pode-se constituir nos dias atuais.
1.2 Espécies de Família
4
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, Rio de Janeiro, 2011. p.
09.
5
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 6. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais,
2010. p. 43
6
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 6. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais,
2010. p. 42/43.
7
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 6. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais,
2010. p. 42/43.
8
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, Rio de Janeiro, 2011. p.
12.
98
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luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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A Constituição da República Federativa do Brasil9, em seu art. 226, § 1º, 3º e
4º, reconhece como entidade familiar, apenas aquela decorrente do casamento,
união estável e a formada por qualquer dos pais e seus descendentes, conforme a
seguir transcrito:
§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração; § 3º - Para efeito
da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem
e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua
conversão em casamento; § 4º - Entende-se, também, como
entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e
seus descendentes.
Essas espécies de família possuem especial proteção do Estado e são
nomeadas de famílias constitucionais.
A família matrimonial, reconhecida pela Constituição Federal é aquela tida
como tradicional, formada pelo vínculo do casamento. É, portanto, segundo Euclides
de Oliveira10 a “forma tradicional e clássica de constituição da família, o casamento
civil ou o casamento religioso com efeitos civis entre um homem e uma mulher”.
Quanto a União Estável, o título III do Código Civil Brasileiro11 aborda essa
espécie de família, encontrando-se no artigo 1.723 os requisitos para a sua
constituição, o qual assim preceitua: “É reconhecida como entidade familiar a união
estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e
duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.
Já o artigo 1.72612 do mesmo diploma legal prevê a possibilidade da sua
conversão em casamento, a pedido dos companheiros e com o devido assento no
Registro Civil.
Quanto à esta entidade familiar, Silvio de Salvo Venosa13 destaca a
importância da convivência entre homem e mulher, de forma não passageira nem
9
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, ano 1988. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 03/06/2013 Doravante
denominada de Constituição Federal.
10
OLIVEIRA, Euclides de. União Estável: do cuncubinato ao casamento, antes e depois do novo
código civil, 6. ed. atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, ano 2004. p.37.
11
em:
12
em:
BRASIL. Código Civil.
Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Disponível
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 03/06/2013.
BRASIL. Código Civil.
Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Disponível
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 03/06/2013.
99
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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fugaz, em convívio como se marido e esposa fossem para que se caracterize como
união estável.
A Família Monoparental, também reconhecida pela Constituição Federal
está prevista no art. 226, § 4º, que dispõe: “Entende-se, também, como entidade
familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”14.
Acerca desta entidade familiar, Arnaldo Rizzardo15 leciona que:
Constitiui família o grupo de pessoas integrado por um dos pais e
pelos filhos ou demais descendentes. É o que se denomina família
monoparental, de grande importância atualmente, dada a quantidade
dessas família, especialmente formadas por mães e filhos.
Este modelo de família vem crescendo atualmente, tanto por quem opta por
constituir família apenas com um filho, sem a presença de um cônjuge ou pelas
separações e divórcios, em que um dos pais fica com a guarda dos filhos, passando
a constituir uma nova unidade familiar16.
Os outros modelos de famílias também merecem abordagem, mesmo não
estando previstas na Constituição, pois existem de fato, e tanto a doutrina quanto o
Poder Judiciário as reconhecem.
A entidade familiar constituída através da União Homoafetiva, entendida
como aquela constituída entre duas pessoas do mesmo sexo, apesar de não ser
reconhecida pela legislação pátria, tem recebido o amparo nas decisões judiciais,
como ocorreu no REsp 820.47517, em que o Superior Tribunal de Justiça
reconheceu a existência e os direitos advindos desta união.
13
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 9. ed. São Paulo: 2009. p. 37.
14
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, ano 1988. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 03/06/2013.
15
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, Rio de Janeiro, 2011. p.
11
16
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, Rio de Janeiro, 2011. p.
11
17
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 820475. Relator: Ministro Antônio de
Pádua
Ribeiro,
do
Rio
de
Janeiro.
Disponível
em:
www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/6993702/recurso-especial-resp-820475-rj-2006-0034525-4-stj
Acesso em: 11/06/2013.
100
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luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
A família paralela afronta aquele que possui vínculo matrimonial ou por união
estável, isto porque, um dos integrantes participa como cônjuge em outra família18.
Maria Berenice Dias19 anota que, apesar da união paralela ser uma forma de
união baseada no afeto, esta não é reconhecida pela sociedade, e ainda acrescenta:
A repulsa legal aos vínculos afetivos concomitantes não os faz
desaparecer; ao contrário, estimula que se proliferem, Aquele que faz
parte de uma célula familiar precisa assumir obrigações, mas quem
mantém famílias concomitantes acaba livre de quaisquer encargos.
Como forma de união paralela, existe o Concubinato que está previsto no
artigo 1.727 do Código Civil20, que dispõe: “As relações não eventuais entre o
homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato”.
Alguns autores classificam o Concubinato como puro e simples. Euclides de
21
Oliveira
entende que o Concubinato puro corresponde à convivência duradoura de
homem e mulher como uma família de fato, sem impedimentos decorrentes de outra
união e o impuro como quando é adulterino, envolvendo pessoa casada em ligação
amorosa com terceiro, ou com outros impedimentos matrimoniais absolutos.
A Família Anaparental está disciplinada no artigo 69, caput, do Projeto do
Estatuto das Famílias22, que dispõe: “As famílias parentais se constituem entre
pessoas com relação de parentesco entre si e decorrem da comunhão de vida
instituída com a finalidade de convivência familiar”.
Neste modelo, o vínculo parental não se dá por ascendência ou
descendência. Como exemplo de família anaparental, podemos destacar: a) dois
irmãos que residam juntos; b) João e Maria, irmãos, residindo com seu primo
18
SOUZA, Daniel Barbosa Lima Faria Corrêa. Famílias Plurais ou Espécies de Família. Disponível
em: jusvi.com/artigos/39460 Acesso em: 11/06/2013.
19
DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.
86.
20
BRASIL. Código Civil.
Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Disponível
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 03/06/2013 às 19:15.
em:
21
OLIVEIRA, Euclides de. União Estável: do concubinato ao casamento, antes e depois do novo
código civil, 6. ed. atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, ano 2004. p. 73-74.
22
BRASIL.
Estatuto
das
Famílias
–
O
Projeto.
www.recantodasletras.com.br/textosjuridicos/2370913 Acesso em 11/06/2013.
101
Disponível
em:
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
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2236-5044
Francisco; c) tio Donald e seus sobrinhos Huguinho, Zezinho e Luizinho, como é o
clássico exemplo da Disney23.
Quanto à Família Pluriparental, o Projeto do Estatuto das Famílias24 a define
no artigo 69, §2º: “Família pluriparental é a constituída pela convivência entre
irmãos, bem como as comunhões afetivas estáveis existentes entre parentes
colaterais”.
À respeito da família pluriparental, Maria Berenice Dias25 ensina que:
Também se encaixam no conceito de pluriparentalidade os vínculos
que se estabelecem com mais de duas pessoas desempenhando as
funções parentais. Esta é uma realidade cada vez mais presente,
principalmente quando são utilizadas as modernas técnicas de
reprodução assistida, em que mais de uma pessoa faz parte do
processo procriativo. Nada justifica alijar qualquer delas do vínculo
de filiação.
Decorrente do afeto merece igual destaque a chamada família eudemonista,
qual seja, aquela em que as pessoas estão ligadas entre si por vínculos de amor e
de amizade, em que o respeito e a solidariedade sejam as pedras angulares que
norteiem tais relações26.
A Família Unipessoal é a composta por apenas uma pessoa. Recentemente,
o STJ lhe conferiu à proteção do bem de família, como se infere da Súmula 36427:
“O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel
pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas”.
Visto as espécies de família, é necessário abordar os aspectos que fazem a
paternidade socioafetiva prevalecer.
2 AFETO COMO INSTITUIDOR DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA
23
SOUZA, Daniel Barbosa Lima Faria Corrêa. Famílias Plurais ou Espécies de Família. Disponível
em: jusvi.com/artigos/39460 Acesso em: 11/06/2013.
24
BRASIL.
Estatuto
das
Famílias
–
O
Projeto.
www.recantodasletras.com.br/textosjuridicos/2370913 Acesso em 11/06/2013.
Disponível
em:
25
DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.
91.
26
em:
27
em:
em:
CABRAL,
Cassiano
Santos.
Novas
Famílias
Brasileiras.
Disponível
www.gramadosite.com.br/cultura/artigos/cassiano/id:16804 Acesso em: 13/06/2013.
BRASIL.
Superior
Tribunal
de
Justilça.
Súmula
n.
364.
Disponível
www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=89622
Acesso
11/06/2013.
102
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Ao longo do tempo, a possibilidade do divórcio e o reconhecimento de filhos
fora do casamento transformou o que se entendia por família tradicional, uma vez
que, atualmente, há diversas espécies da mesma, como já demonstrado acima.
Na família dos dias atuais, o afeto é a razão de sua própria existência, o
elemento responsável e indispensável para a sua formação, visibilidade e
continuidade28.
Para Carlos Eduardo Pianovski Ruzyk29, “a família é um fenômeno plural,
considerando o espaço e reconhecimento social que as uniões informais vêm
ganhando, deixando o casamento de ser a única formação familiar”.
Jorge Shiguemitsu Fujita30 considera que o afeto já se fazia presente antes
mesmo da Constituição Federal de 1988, pois já se admitia a adoção, reconhecendo
a filiação afetiva acima do vínculo sanguíneo.
Assim, verifica-se que a doutrina considera que a base principal para instituir
o vínculo da família, é o afeto.
3 POSSE DE ESTADO DE FILHO
Segundo o enunciado 256 da Jornada de Direito Civil (I, III, IV e V), a posse
do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de parentesco
civil31.
O estado de filiação nada mais é do que ter um filho como seu, Jorge
Shiguemitsu Fujita32 leciona que “está vinculada ao princípio da aparência, equivale
a um direito ou estado, dando uma segurança a uma situação aparente de relação
paterno-materno-filial”.
28
NOGUEIRA, Jacqueline Filgueiras. A filiação que se constrói: o reconhecimento do afeto como
valor jurídico; São Paulo: Memória jurídica editora, 2001, p.53.
29
RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski. Famílias simultâneas: da unidade codificada à pluralidade
constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p.135.
30
FUJITA. Jorge Shiguemitsu. Filiação. 2. ed. São Paulo: Atlas S.A., ano 2011, p. 106.
31
BRASIL.
Jornada
de
Direito
Civil
(I,
III,
IV
e
V).
www.stj.jus.br/publicacaoseriada/index.php/jornada/article/viewFile/2644/2836.
11/07/2013.
32
Disponível
Acesso
FUJITA. Jorge Shiguemitsu. Filiação. 2. ed. São Paulo: Atlas S.A., ano 2011, p. 117
103
em:
em
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Para Maria Berenice Dias33 o estado de filiação decorre da estabilidade dos
laços de filiação construídos no cotidiano do pai e do filho, e que constitui o
fundamento essencial da atribuição da paternidade ou maternidade.
A posse de estado de filho é um ato de vontade, baseado na afetividade,
colocando em xeque tanto a verdade jurídica, quanto a certeza científica no
estabelecimento da filiação, a pessoa fica reconhecida como filha de alguém, com
todas as características que um vínculo de pai e filho pode proporcionar.34
A posse de estado de filho pode também ser meio de prova para comprovar
a relação de pais e filho35.
Com o estabelecimento da posse de estado de filho, é necessário verificar
se os interesses da criança serão atendidos nesta relação de pais e filho.
3.1 Princípio do melhor interesse da criança e adolescente
Segundo o art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente36, considera-se
criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e
adolescentes, aqueles entre doze e dezoito anos de idade.
O art. 227 da Constituição Federal37 dispõe sobre os direitos da criança:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
33
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 6. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais,
2010. p. 358.
34
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 6. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais,
2010. p. 359.
35
FUJITA. Jorge Shiguemitsu. Filiação. 2. ed. São Paulo: Atlas S.A., ano 2011, p. 121.
36
BRASIL.
Estatuto
da
Criança
e
do
Adolescente.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 03/06/2013.
37
Disponível
em:
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, ano 1988. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 03/06/2013.
104
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
Verifica-se que a lei maior prevê os direitos do menor, garantindo, inclusive,
o direito à convivência familiar. Esta convivência familiar deverá atender os
elementos elencados no artigo acima.
O menor deve ter os direitos tratados com prioridade pelo Estado, sociedade
e família, tanto em relação à elaboração de seus direitos como na aplicação,
principalmente nas relações familiares, visto os destinatários do princípio serem
pessoas em desenvolvimento e dotados de dignidade38.
O princípio do melhor interesse da criança e adolescente visa assegurar
todos os direitos do menor, principalmente daqueles que se encontram em
fragilidade, necessitando de amparo e proteção.
4 FILIAÇÃO
4.1 Conceito
Filiação é a mais próxima, a mais importante, a principal relação de
parentesco é a que se estabelece entre pais e filhos39.
Carlos Roberto Gonçalves40 estabelece a filiação como:
Relação de parentesco consanguíneo, em primeiro grau e em linha
reta, que liga uma pessoa àquelas que a geraram ou a receberam
como se a tivessem gerado. Todas as regras sobre parentesco
consanguíneo estruturaram-se a partir da noção de filiação.
Este mesmo autor acrescenta ainda, que não existe mais a antiga distinção
entre filiação legítima ou ilegítima. Arnaldo Rizzardo41 leciona à respeito dos filhos
legítimos ou ilegítimos:
Legítimos consideram-se os filhos gerados na vigência do casamento
civil de seus pais (...). Ilegítimos, os nascidos fora do casamento civil
de seus pais, os quais, por sua vez, se distinguem em naturais stricto
sensu e espúrios. Naturais são os filhos cujos pais não se achavam
impedidos de se casar um com o outro quando foram concebidos. Os
espúrios, pelo contrário, nasceram ou foram gerados quando seus
pais eram impedidos de se casar entre si, em virtude de ser um deles
38
LÔBO, Paulo. Famílias. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.54.
39
VELOSO, Zeno. Direito Brasileiro da Filiação e Paternidade. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 479.
40
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 102.
41
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, Rio de Janeiro, 2011. p.
342.
105
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
ou ambos já casados (adulterinos), ou porque eram parentes em
linha reta ou em grau proibido (incestuosos).
Neste mesmo turno, Maria Berenice Dias42 ensina que no atual estágio da
sociedade, não mais interessa a origem da filiação. Os avanços científicos de
manipulação genética popularizam a utilização de métodos reprodutivos.
O próprio Código Civil43 menciona as relações de parentesco, o seu art.
1.593 preceitua que: “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de
consangüinidade ou outra origem”.
Para Arnaldo Rizzardo44, o termo 'filiação' encerra a relação que se criou
entre o filho e as pessoas que o geraram. Há um extenso quadro de leis e
regulamentações que tratam desta relação, com direitos e deveres de ambas as
partes.
Assim, verifica-se que há várias possibilidades de vínculo, os quais serão
abordados no decorrer do trabalho, a exemplo do vínculo biológico e socioafetivo.
4.2 Da Paternidade Biológica
Para adentrar-se na questão da paternidade biológica e socioafetiva, se faz
necessária a explanação quanto à filiação, uma vez que esta é a relação jurídica que
existe entre filhos e pais, independentemente de como adveio o descendente45.
Filiação biológica ou natural é a relação que se estabelece, por laços de
sangue, entre uma pessoa e seu descendente em linha reta do primeiro grau. Este
vínculo pode resultar de reprodução natural ou reprodução assistida46.
A reprodução natural é quando resulta de relação sexual entre o homem e a
mulher, tendo a concepção. Na reprodução assistida usa-se técnicas que provoca a
gestação, que poderá ser homóloga ou heteróloga47.
42
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 6. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais,
2010. p. 353.
43
BRASIL. Código Civil.
Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Disponível
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 03/06/2013 às 19:40h.
em:
44
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, Rio de Janeiro, 2011. p.
337.
45
GONÇAVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Direito de Família. São Paulo: Saraiva,
2009. p. 285.
46
FUJITA, Jorge Shiguemitsu. Filiação. 2. ed. São Paulo: Atlas S.A., ano 2011. p. 63.
47
FUJITA, Jorge Shiguemitsu. Filiação. 2ª ed. São Paulo: Atlas S.A., ano 2011. p. 63-64.
106
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
A fecundação será homóloga, se utilizados o óvulo do cônjuge virago e o
sêmen do cônjuge varão, pode haver fertilização mesmo que o marido tenha
falecido, se este deu a sua prévia autorização por escrito (CC, art. 1.597)48. Já na
heteróloga, o material genético fornecido será de uma pessoa.
Quanto à certeza da paternidade biológica, Arnaldo Rizzardo49 explica que
“o fato de nascer o filho enquanto perdura o casamento, ou até certo tempo após a
sua desconstituição, faz presumir que o pai é aquele que convive com a mãe,
porquanto dúvidas inexistem no pertinente à maternidade”.
Se os pais se recusarem a reconhecer o filho, este direito pode ser pleiteado
através de ação judicial, em que poderá ser realizado o devido exame de DNA,
Renato Maia50 explica a necessidade de descobrir o vínculo biológico:
A necessidade de se descobrir o vínculo biológico se deve ao fato de
ter que se efetivar os direitos humanos constitucionais conferidos à
criança e ao adolescente, como a dignidade da pessoa humana, do
respeito, da igualdade, da convivência familiar e comunitária,
conferidos pelo artigo 227 da CF, reafirmados pelo princípio da
identidade biológica constante do artigo 27 do ECA.
Apesar de ser um direito da pessoa saber sua origem genética, esta não é a
única forma de paternidade existente.
4.3 Da Paternidade Socioafetiva
Segundo o artigo 1.593 do Código Civil51: “O parentesco é natural ou civil,
conforme resulte de consangüinidade ou outra origem”.
Jorge Shiguemitsu Fujita52 conceitua a filiação socioafetiva:
Filiação socioafetiva é aquela consistente na relação entre pai e filho,
ou entre mãe e filho, ou entre pais e filho, em que inexiste liame de
ordem sanguínea entre eles, havendo, porém, o afeto como
48
FUJITA, Jorge Shiguemitsu. Filiação. 2ª ed. São Paulo, Ed. Atlas S.A., ano 2011. p. 63.
49
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, Rio de Janeiro, 2011. p.
342
50
MAIA, Renato, Filiação Paternal e seus efeitos. 1. ed. São Paulo: SRS editora, 2008. p. 136
51
Disponível
BRASIL. Código Civil.
Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis2002/l10406.htm. Acesso em: 03/06/2013.
52
FUJITA, Jorge Shiguemitsu. Filiação. 2. ed. São Paulo, Ed. Atlas S.A., ano 2011. p. 71.
107
em:
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
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elemento aglutinador, tal como uma sólida argamassa a uni-los em
suas relações, quer de ordem pessoal, quer de ordem patrimonial.
O afeto ganhou força com a Constituição Federal de 1988, com o Estatuto
da Criança e do Adolescente e com o Código Civil de 2002, pois lhe deram um
suporte jurídico e o colocaram no cenário central das discussões relativamente à sua
verdade: se superior ou não à verdade biológica53.
São ao menos quatro os tipos de paternidade socioafetiva identificados: por
adoção legal; por adoção à brasileira, por criação de filho sem registro civil, o
chamado filho de criação e por reprodução humana assistida54. Neste mesmo
sentido, Jorge Shiguemitsu Fujita entende que, filiação socioafeitva pode ser por
adoção, técnica de reprodução assistida heteróloga ou por doação e, na posse do
estado de filho, representada pela adoção à brasileira e pelo "filho de criação”55.
Maria Berenice Dias56 alerta que, nas demandas judiciais a verdade afetiva
possui preferência:
A partir do momento em que a filiação afetiva prevaleceu sobre a
filiação biológica, todas as demandas envolvendo os vínculos de
filiação passaram necessariamente a dispor de causa de pedir
complexa. Apesar de as ações serem baseadas na realidade
biológica, não é suficiente a prova da verdade genética - mister a
comprovação da inexistência da filiação afetiva. Quer na ação em
que é buscada a identificação do vínculo de filiação, quer sua
desconstituição, a verdade afetiva tem a preferência.
Há uma diferença entre o pai e o genitor, estando a paternidade muito mais
ligada ao serviço do que com a procriação, ou seja, diz respeito muito mais a amar e
servir do que gerar57.
O estabelecimento da filiação é um direito do sujeito e um dever do Estado e
vai se firmar nem que seja pelo afeto, mas atenderá as necessidades do filho58.
53
FUJITA, Jorge Shiguemitsu. Filiação. 2. ed. São Paulo, Ed. Atlas S.A., ano 2011. p. 106.
54
SOUZA, Ionete de Magalhães. Paternidade Socioafetiva. Revista IOB de direito de família, Porto
Alegre: Síntese, v.9, n. 46, fev/mar. 2008, p.91.
55
FUJITA, Jorge Shiguemitsu. Filiação. 2. ed. São Paulo, Ed. Atlas S.A., ano 2011. p. 71
56
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 6. ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais,
2010. p. 359.
57
MAIA, Renato, Filiação Paternal e seus efeitos. 1. ed. São Paulo: SRS editora, 2008. p. 170.
58
MAIA, Renato, Filiação Paternal e seus efeitos. 1. ed. São Paulo: SRS editora, 2008. p. 172.
108
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
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O afeto constituído entre pai e filho independe de qualquer vínculo
consanguíneo.
5 POSICIONAMENTO
DOS
TRIBUNAIS
BRASILEIROS
ACERCA
DA
PREVALÊNCIA DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA SOBRE A BIOLÓGICA
Inicialmente, cabe mencionar que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a
repercussão geral acerca do tema que discute a prevalência ou não da paternidade
socioafetiva sobre a biológica.
A questão chegou à Corte Suprema por meio do Recurso Extraordinário com
Agravo (ARE) 692186, interposto contra decisão do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) que inadmitiu a remessa do recurso extraordinário para o STF. No processo,
foi requerida a anulação de registro de nascimento feito pelos avós paternos, como
se recurso interposto ao Supremo, os demais herdeiros do pai biológico alegam que
a decisão do STJ, ao preferir a realidade biológica, em detrimento da realidade
socioafetiva, sem priorizar as relações de família que têm por base o afeto, afronta o
artigo 226, caput, da Constituição Federal, segundo o qual “a família, base da
sociedade, tem especial proteção do Estado”. A matéria foi levada a exame do
Plenário Virtual pois o relator entendeu que o tema, é relevante sob os pontos de
vista econômico, jurídico e social. Por maioria, os ministros seguiram o relator e
reconheceram a existência de repercussão geral da questão constitucional
suscitada59.
Tribunais brasileiros têm debatido sobre a matéria, destacando-se posições
favoráveis ou não acerca da prevalência da paternidade socioafetiva sobre a
biológica, conforme a seguir se destacará.
Colhe-se importante decisão do Superior Tribunal de Justiça60:
PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO
CIVIL INVERÍDICO. ANULAÇÃO. POSSIBILIDADE. PATERNIDADE
SOCIOAFETIVA. PREPONDERÂNCIA. 1. Ação negatória de
paternidade decorrente de dúvida manifestada pelo pai registral,
59
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo nº 692186. Disponível
em: www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=228595. Acesso em: 04/06/2013.
60
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.244.957, Relatora: Ministra Nancy
Andrighi, de Santa Catarina. Disponível em: www.stj.jus.br. Acesso em: 04/06/2013.
109
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
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quanto a existência de vínculo biológico com a menor que
reconheceu voluntariamente como filha. 2. Hipótese em que as
dúvidas do pai registral, quanto a existência de vínculo biológico, já
existiam à época do reconhecimento da paternidade, porém não
serviram como elemento dissuasório do intuito de registrar a infante
como se filha fosse. 3. Em processos que lidam com o direito de
filiação, as diretrizes determinantes da validade de uma declaração
de reconhecimento de paternidade devem ser fixadas com extremo
zelo e cuidado, para que não haja possibilidade de uma criança ser
prejudicada por um capricho de pessoa adulta que, conscientemente,
reconhece paternidade da qual duvidava, e que posteriormente se
rebela contra a declaração auto-produzida, colocando a menor em
limbo jurídico e psicológico. 4. Mesmo na ausência de ascendência
genética, o registro da recorrida como filha, realizado de forma
consciente, consolidou a filiação socioafetiva - relação de fato que
deve ser reconhecida e amparada juridicamente. Isso porque a
parentalidade que nasce de uma decisão espontânea, deve ter
guarida no Direito de Família. 5. Recurso especial provido.
O apelante registrou a menor como filha de forma consciente, e esta relação
de fato deve ser reconhecida, pois caracteriza a paternidade socioafetiva. “A
paternidade socioafetiva incorporada à personalidade da recorrida, não pode ficar a
deriva, em face das incertezas, instabilidades ou interesses do declarante, mesmo
que vindicados sob o manto da ausência do vínculo biológico61”.
O recurso foi julgado improcedente e o registro civil da apelada não foi
alterado.
Destaca-se jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina
decisão que reconheceu a prevalência da paternidade biológica62:
DIREITO CIVIL - FAMÍLIA - INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE
C/C ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA E ALIMENTOS EXAME DNA POSITIVO - PROCEDÊNCIA PARCIAL EM 1º GRAU INSURGÊNCIA
DO
INVESTIGADO - CERCEAMENTO
DE
DEFESA - AUSÊNCIA DE TESTEMUNHAS E INDEFERIMENTO DE
2º
EXAME
DNA
TESTEMUNHAS
DEFERIDAS
INDEPENDENTEMENTE DE INTIMAÇÃO - NOVA PERÍCIA DESNECESSIDADE - LAUDO REGULAR -RECURSO IMPROVIDO RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE - EXISTÊNCIA DE
PATERNIDADE SOCIOAFETIVA E GENÉTICA - PREVALÊNCIA
DAQUELA - MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA - PATERNIDADE
61
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.244.957, Relatora: Ministra Nancy
Andrighi, de Santa Catarina. Disponível em: www.stj.jus.br. Acesso em: 04/06/2013.
62
SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n. 2005.000406-5,
Relator: Des. Monteiro Rocha, de Araranguá. Disponível em: www.tjsc.jus.br. Acesso em:
04/06/2013.
110
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
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PARA FINS EXCLUSIVAMENTE BIOLÓGICOS - MANUTENÇÃO
DO
REGISTRO
CIVIL
SENTENÇA
REFORMADA.
Processo: 2005.000406-5 (Acórdão). Relator: Monteiro Rocha.
Origem: Araranguá. Órgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Civil.
Julgado em: 19/06/2008. Juiz Prolator: Pedro Aujor Furtado Junior.
Classe: Apelação Cível. Apelação Cível n. 2005.000406-5, de
Araranguá. Relator: Des. Monteiro Rocha.
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina decidiu, neste caso, dar parcial
provimento ao recurso, reconhecendo a paternidade biológica sobre a autora
somente para fins genéticos, sem vínculo parental ou sucessório, mantendo-se a
paternidade socioafetiva até então existente.
Ainda, contrariando a decisão anterior, colhe-se este julgado em que é
possível constatar a prevalência da paternidade socioafetiva em relação à biológica.
Assim, colhe jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande
do Sul63:
APELAÇÃO
CÍVEL.
AÇÃO
NEGATÓRIA
DE
PATERNIDADE.IRREVOGABILIDADE.
PREVALÊNCIA
DA
PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. Da apelação: Restou comprovado
nos autos que o recorrente não é o pai biológico do apelado, mas os
estudos sociais constataram a existência de vínculo socioafetivo. A
relação jurídica de filiação foi construída também a partir de laços
afetivos e de solidariedade. O mero arrependimento não constitui
razão capaz de revogar ato de reconhecimento da paternidade,
efetuado modo espontâneo, que é irrevogável. Do Agravo Retido: A
paternidade é apreciada por diversos meios de prova, sendo
incabível a perícia postulada, inclusive, porque seu resultado não
seria suficiente para afastar o relacionamento paterno filial que se
instaurou no curso do tempo. Apelo e agravo retido desprovidos.
(Apelação Cível Nº 70047722079, Sétima Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Munira Hanna, Julgado em 22/05/2013)
No caso acima, o Recorrente ao registrar a criança, acreditava que esta era
sua filha. Ao ser realizado o exame de DNA, o resultado foi negativo.
No curso do processo, restou evidenciado a relação socioafetiva das partes,
com o estudo social realizado o apelante admitiu gostar muito do menino e continua
63
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 70047722079, Relator: Munira
Hanna, de São Leopoldo. Disponível em: www.tjrs.jus.br. Acesso em: 04/06/2013.
111
SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
luz dos tribunais brasileiros. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e
Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 96-114, 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN
2236-5044
a considera-lo como seu filho. Assim, foi mantida a sentença de primeiro grau, em
que a verdade socioafetiva deve se sobrepor à biológica64.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho teve como objetivo a verificação da prevalência da paternidade
socioafetiva sobre a biológica.
A pesquisa iniciou tratando do conceito de família e as espécies desta, bem
como, institutos decorrentes da formação de família. Ainda, no segundo momento
foram conceituados a filiação e os vínculos biológico e socioafetivo.
Por fim, ao adentrar-se no objetivo da pesquisa, percebeu-se que há
julgados divergentes quanto ao tema, sendo este motivo de grande discussão e
dúvida quanto à prevalência ou não da paternidade socioafetiva em detrimento da
biológica.
No presente artigo, foi demonstrado as espécies de família atualmente,
assim como, o afeto pode instituir o vínculo de filiação. Ainda, foi abordado a posse
de estado de filho, no qual, a pessoa tem um filho como seu, com todas as
consequências que este vínculo possui.
Também, abordou-se na pesquisa o princípio do melhor interesse da
criança, tendo em vista que, num possível processo judicial, a justiça terá que
atender o que melhor respeitar os interesses e direitos da criança e adolescente.
Com a pesquisa, verifica-se que o julgado em que foi reconhecida a
paternidade biológica, foi somente para fins genéticos, pois é direito da criança
saber sua origem genética. Porém, o entendimento dos Tribunais é de reconhecer o
vínculo socioafetivo, pois a relação de afeto é superior a qualquer verdade biológica,
como diz o ditado: “pai é quem cria”.
Assim, partindo-se da pergunta de partida, é possível concluir, que a
paternidade socioafetiva se sobrepõe à biológica, porque mais importante que um
liame biológico é o que tem por base o afeto.
64
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 70047722079, Relator: Munira
Hanna, de São Leopoldo. Disponível em: www.tjrs.jus.br. Acesso em: 04/06/2013.
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SILVA, Bruna Alves da; CONCEIÇÃO, Geovana da. Prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica à
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prevalência da paternidade socioafetiva sobre a biológica