TAXA DE ESTRATIFICAÇÃO DO CARBONO ORGÂNICO COMO
INDICADOR DE QUALIDADE DE UM SOLO ARGIUDOLL TÍPICO
ORGANIC CARBON STRATIFICATION RATIO AS QUALITY INDICATOR FOR A TYPIC
ARGIUDOLL SOIL
(1)
Alejandro O. Costantini (1) Helvécio De-Polli (2)
Instituto de Suelos. CIRN. INTA. Las Cabañas y De los Reseros s/n. Hurlingham. Buenos
Aires. Argentina. E-mail: [email protected]
(2)
EMBRAPA – Agrobiologia. BR 465, km 7. Seropédica. RJ. Brasil. E-mail:
[email protected]
Resumo
Este trabalho realizou-se baseado em dados de carbono orgânico (CO) obtidos em
experimentos anteriores, com a finalidade de estudar o comportamento dos diferentes usos do
solo no tocante à taxa de estratificação do CO, calculado pelo quociente dos valores de CO
superficial e subsuperficial, e analisar sua utilidade como indicador de qualidade de solo. As
determinações foram realizadas em parcelas experimentais em Marcos Juárez, na região
central da Argentina, sobre um solo Argiudoll típico. Analisou-se o efeito de diferentes sistemas
de preparo de solo e rotações na estratificação do carbono orgânico. Também foram feitas
comparações com pastagens. Observou-se uma tendência de acréscimo na taxa de
estratificação do carbono orgânico sob plantio direto e principalmente, nas situações de
pastagem. A taxa de estratificação do carbono orgânico mostrou potencial para ser um bom
indicador de qualidade de solo, porém mais estudos são requeridos para que possa ser
utilizado para orientação dos agricultores.
Abstract
This work was based in an organic carbon data set obtained in some previous trials in order to
study the effect of different land uses on organic carbon stratification ratio, and to analyze its
usefulness as soil quality indicator. The treatments were established in experimental plots in
Marcos Juárez, central Argentina region, on a Typic Argiudoll soil. The effect of different tillage
systems and rotations on organic carbon stratification ratio was studied. Comparisons with
pastures were also made. There was a trend to increase organic carbon stratification ratio with
no-tillage and principally in pasture situations. Organic carbon stratification ratio would be a
good soil quality indicator but more studies are required for its use at farming level.
Introdução
O conceito de qualidade de solos tem reconhecido a matéria orgânica como um
atributo importante, que tem controle de muitas funções chave do solo (Doran e Parkin, 1994).
Estes autores têm definido a qualidade do solo como “a capacidade de um solo para sustentar
a atividade biológica, manter a qualidade ambiental e promover a saúde de plantas e animais”.
Nos últimos tempos pode-se achar numerosa bibliografia sobre o tema de indicadores
de qualidade do solo. A “Environmental Agency” (2006) do Reino Unido menciona os requisitos
que deve cumprir um indicador, os que deveriam estar baseados nas funções do solo, sendo
as mais importantes aquelas de interação ambiental, produção de alimentos e fibras, e alicerce
para o habitat ecológico e biodiversidade.
O grande desafio é o desenvolvimento de metodologias para a avaliação da qualidade
do solo e ambiente sob influência do homem. Mendes et al., (2006) mencionam para os
atributos físicos do solo (o que pode ser aplicado, por extensão, a outras características), que
apresentam algumas vantagens relacionadas com o baixo custo, metodologias simples e
rápidas, e relação direta com outras características químicas e biológicas do solo, o que os
torna úteis para ser usados como indicadores.
Mesmo que a matéria orgânica do solo (MO) seja afetada pelo manejo, alguns autores
frisam que outras frações orgânicas, tais como a biomassa microbiana, são melhores
indicadoras do que o carbono orgânico, já que estas medições se antecipam quanto a sua
capacidade de predizer certos processos que acontecem no solo (Powlson et al., 1987,
Costantini et al, 1996). Leifeld e Kogel-Knabner (2005) estudaram fracionamentos físicos de
MO do solo, mencionando que eles geram uma grande contribuição ao conhecimento da MO
como um importante elemento dos agroecossistemas. Todavia, pensam que é questionável
que alguma destas medições possa ser usada como um indicador, seja porque consomem
muito tempo, seja pela sua variabilidade, e mencionam que medições muito mais simples como
o CO do solo, ou sua taxa de estratificação, como citado por Franzluebbers (2002), foram
também para eles altamente sensíveis.
Um dos problemas ao avaliar os indicadores de qualidade de solos é que muitos têm
sido desenvolvidos para molisolls, e de fato, muitas regiões da Terra possuem solos com alto
potencial produtivo sem pertencer a esta ordem de solos (Franzluebbers et al., 2002). Neste
sentido surge como chave definir o papel da matéria orgânica a respeito da produtividade
agrícola e qualidade ambiental (Sojka e Upchurch, 1999).
Franzluebbers (2002) apresenta a hipótese de que a taxa de estratificação do CO pode
ser usado como um indicador de qualidade de solos ou do funcionamento do ecossistema. A
determinação do CO é mais fácil do que a de outras frações de C, tem baixo custo e existem
maior número de laboratórios disponíveis com capacidade para realizá-lo. Assim sendo, o
objetivo deste trabalho foi estabelecer se esta taxa de estratificação se comporta como um
indicador adequado das mudanças que estejam sendo produzidas no conteúdo e distribuição
da matéria orgânica dos solos por causa do manejo, com a finalidade de recomendar este
indicador aos produtores para sua orientação. Para atingir o objetivo deste trabalho foram
utilizados dados de uma região central da Argentina, já publicados anteriormente.
Material e Métodos
Todos os dados foram obtidos na localidade de Marcos Juárez, na região central da
Argentina, sobre um solo Argiudoll típico, manejado com diferentes sistemas de preparo de
solo e rotações, em experimentos de longo prazo, assim como em solos sob pastagem.
As metodologias empregadas para a obtenção dos dados e a descrição dos
experimentos podem ser encontradas em Costantini et al., (1996, 2006 e 2007) e Cosentino et
al. (1997). Partindo dos dados pré-existentes foram calculados os quocientes correspondentes
aos valores de CO medido, entre seu valor superficial e o subsuperficial, o que foi chamado de
taxa de estratificação. Quando os dados originais tinham mais de um dado subsuperficial,
escolheu-se aquele de maior profundidade, embora se deva esclarecer que nunca se tomaram
os valores das amostragens que estavam abaixo dos 20 cm de profundidade. Os resultados
foram analisados estatisticamente por meio da análise da variância e quando diferenças
significativas foram achadas, utilizou-se o teste de Tukey (P<0.05)
Resultados e Discussão
Em um trabalho que comparava três sistemas de preparo de solo (plantio direto,
preparo reduzido e preparo convencional) sob monocultura de milho pelo período de 6 anos
(Cosentino et al., 1997), o CO permitiu diferenciar o sistema que mais contribuiu na
manutenção do seu conteúdo (plantio direto) dos outros que não apresentaram diferenças
significativas entre eles. Este comportamento foi válido seja na amostragem de 0-5 cm como na
amostragem de 5-15 cm. Quando se analisou o quociente entre os valores de CO obtidos nas
duas profundidades (Tabela 1), pôde-se observar que o plantio direto (PD) apresentou maior
quociente do que os outros sistemas de preparo que, embora não tenha apresentado diferença
estatisticamente significativa, mostrou uma tendência no PD a uma maior taxa de estratificação
da matéria orgânica, concentrando na superfície os valores maiores e apresentando, portanto,
um quociente superior a 1, o que não aconteceu nos outros sistemas analisados.
Tabela 1. Taxas de estratificação expressas pela razão dos valores de C orgânico (CO) entre
0-5 e 5-15 cm para os três sistemas de preparo de solo estudados
Sistema de Preparo
CO 0-5 cm / CO 5-15 cm
Plantio Direto
1,16 a
Preparo Reducido
0,98 a
Preparo Convencional
0,99 a
Em outro trabalho com o mesmo tipo de solo, comparando os conteúdos de CO em
três momentos de amostragem sob PD e Preparo Reduzido (PR), com a mesma rotação de
cultivo, Costantini et al. (2006) encontraram diferenças significativas em todos os momentos de
amostragem entre PD e PR para os primeiros 5 cm, porém, em geral, esta tendência
desaparecia nas camadas inferiores até chegar aos 20 cm. Quando se calcularam as taxas de
estratificação de CO entre as camadas de 0-5 e 10-20 cm não se acharam diferenças
significativas entre os sistemas de preparo, mesmo com valores maiores do quociente em PD,
e em termos gerais, maiores do que no caso anterior. Pode-se atribuir este efeito ao maior
número de anos de manejo utilizando sistemas de preparo conservacionista (que foram 11
neste caso, comparados com os 6 do caso anterior), principalmente no caso do PD (Tabela 2).
Tormena et al. (2004) acharam valores maiores em sistemas sob plantio direto quando
comparados a plantio direto mas com escarificação antes da cultura de verão (ou seja com
maior revolvimento do solo), em concordância com o achado neste trabalho. Os valores de taxa
de estratificação obtidos por eles foram também semelhantes aos deste estudo.
Tabela 2. Valores médios de três momentos de amostragem (pré-plantio, floração e póscolheita) das taxas de estratificação expressas pela razão do C orgânico (CO) entre 0-5 e 10 20 cm para os dois sistemas de preparo de solo estudados.
CO 0-5 cm / CO 10 - 20 cm
Plantio Direto
1,58 a
Preparo Reducido
1,36 a
Em um último experimento realizado também no Argiudoll típico de Marcos Juárez
(Costantini et al., 2007), se compararam sistemas de cultivo sob PD (rotação milho – trigo/soja
– soja), com situações sob pastagem de diferente antiguidade (10, 30 e 100 anos). Os
conteúdos de CO dos sistemas sob cultivo foram menores, e significativamente diferentes, do
que aqueles que estavam sob pastagem. Quando se calcularam as taxas de estratificação do
CO entre 0-5 e 10-20 cm observaram-se maiores valores nos sistemas de pastagem respeito
aos cultivados, os que não apresentaram diferenças entre as rotações estudadas. Os sistemas
sob pastagem apresentaram razões CO 0-5 / CO 10-20 maiores do que qualquer outra das
situações, o que concorda com o achado por Franzluebbers (2002) (Tabela 3).
Tabela 3. Taxas de estratificação expressas pela razão dos valores de C orgânico (CO) entre
0-5 e 0 -20 cm para as duas rotações de cultivo sob plantio direto e os três lotes sob pastagem.
CO 0-5 cm / CO 10 - 20 cm
Rotação de cultivos
1,25 a
Monocultivo
1,21 a
Pastagem 10 anos
1,51 b
Pastagem 30 anos
2,60 c
Pastagem 100 anos
1,60 b
Como se pode observar neste trabalho, os valores do quociente de CO oscilaram entre
mínimos muito próximos a 1 e máximos de 2,6 em uma das situações de pastagem,
apresentando tendências semelhantes às expressas por Franzluebbers (2002), mesmo que em
geral com valores menores. Este autor trabalhou com solos muito diferentes aos deste estudo,
seja do ponto de vista das suas características intrínsecas, seja nas suas condições climáticas
onde se localizam e, em geral, ele encontrou grandes diferenças entre os conteúdos de CO
superficial e subsuperficial entre PD e preparo convencional (PC) nos solos de regiões quentes,
apresentando o primeiro uma grande estratificação. Este fato foi menos notável no solo de
região fria por ele estudado a ponto que não existiam diferenças significativas entre PD e PC.
Neste trabalho, realizado em solos de grande aptidão agrícola e em condições
climáticas menos extremas das apresentadas no trabalho de Franzluebbers (2002), não se
apresentaram diferenças estatisticamente significativas entre PD e os outros sistemas de
preparo, mesmo tendo apresentado uma tendência à estratificação no PD.
Os valores maiores do quociente CO superficial / CO subsuperficial se apresentaram nos solos
sob pastagem, em concordância com o mencionado por Franzluebbers (2002), sendo que a
estratificação da matéria orgânica do solo é normal em vários ecossistemas naturais. Quanto
aos solos cultivados, nenhum se aproxima a valores próximos de 3 como se menciona nesse
trabalho, mas deve-se levar em conta que estes valores foram achados em solos de regiões
quentes, com pouca capacidade de conservar a matéria orgânica e que apresentavam uma
forte degradação. Nenhuma destas circunstâncias corresponde à do solo estudado. Isto
poderia indicar que menores valores no quociente implicariam que a degradação do solo que
se produz sob preparo convencional, por exemplo, não seria tão prejudicial neste caso como o
que seria em outras regiões, com solos mais pobres. Este raciocínio poderia se explicar bem
nos diferentes âmbitos do Pampa, onde, por exemplo, os solos do oeste apresentam maior
fragilidade se comparados com os do Pampa Ondulado. Todavia isto deve ser objeto de futuros
estudos.
A análise do quociente poderia revalorizar a utilização das medições de carbono
orgânico como indicador de qualidade de solos, que mesmo apresentando menor sensibilidade
do que outras variáveis estudadas, tais como biomassa microbiana (Costantini et al. 1995,
1996) possui as vantagens da sua facilidade de medição, pouco requerimento de equipamento
de laboratório, repetitividade e possibilidade de armazenar as amostras por algum período de
tempo antes de serem enviadas ao laboratório.
Conclusões
Para o solo estudado, sob diferentes manejos, observa-se uma tendência ao acréscimo
na taxa de estratificação do CO na medida que aumentam os anos de plantio direto, e mais
ainda, nos casos de solos sob pastagem.
É preciso maior investigação sobre diferentes tipos de solo, clima e manejo, porém, se
estas tendências forem comprovadas, a taxa de estratificação do CO poderia ser utilizada
como um indicador de mudanças no solo produzidas como conseqüência de seu manejo.
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