Olhar e ver
Rev. Medicina Desportiva informa, 2012, 3 (3), pp. 30–31
Amiotrofias no contexto
desportivo (1/3)
Dr. Camões-Barbosa, A.
Médico interno de Medicina Física e de Reabilitação. Hospital de Santo António dos Capuchos, Centro
Hospitalar de Lisboa Central.
observamos o desenvolvimento
muscular, procurando atrofias e
notando se tem ou não fasciculações. O exame da força muscular
deve estar interligado com a pesquisa de atrofias. No sentido de se
excluírem síndromes neurológicos
mais complexos é necessário ainda
testar o tónus e os reflexos3.
1.1. Exame postural
Resumo ABSTRACT
O exame médico desportivo deve incluir a avaliação postural estática e dinâmica nos
planos frontal e sagital. A análise do componente muscular é feita através da observação
da existência de eventuais atrofias musculares e da força muscular, sendo esta avaliada
pela observação de eventual contração muscular e pela existência de movimento contra
resistência da força da gravidade ou do examinador. Em futuros artigos abordar-se-ão as
amiotrofias dos membros superiores e inferiores.
The sports medical examination must include the evaluation of the static and the dynamic posture
on the sagittal and frontal planes. The analysis of the muscular component is done by the observation of eventual muscle atrophies and of the muscle strength, which is evaluated by the observation
of an eventual muscle contraction and by the existence of movement against the resistance of the
gravity or of the examiner. In future papers the muscle atrophies of the superior and inferior limbs
will be discussed.
Palavras-chave Keywords
Exame postural, atrofia muscular
Postural exam, muscle atrophy
Introdução
O exame motor é um dos componentes do exame médico-desportivo
onde se pode encontrar dismetrias
dos membros, desvios raquidianos
e amiotrofias. A sua avaliação tem
interesse para a decisão da aptidão
para a prática de exercício e também
para a perspetiva clínica. A amiotrofia é definida como a atrofia do
tecido muscular (a – privação + mys –
músculo + trophe – nutrição)1. As suas
causas podem ser várias e incluem
as doenças do neurónio motor (e.g.
esclerose lateral amiotrófica), da
junção neuromuscular (e.g., miastenia gravis), do músculo (e.g., distrofia
miotónica), doenças metabólicas (e.g.,
diabetes mellitus), envenenamentos
(e.g., chumbo), infeções (e.g., poliomielite), envelhecimento (sarcopénia)
e síndromes paraneoplásicas (e.g.,
linfoma). Contudo, a etiologia mais
frequente nos atletas são as neuropatias periféricas, que cursam com
amiotrofias habitualmente assimétricas e bem localizadas2. Segundo
Krivickas et al., que realizaram um
estudo de revisão em 346 atletas,
num período de 23 anos, as lesões
nervosas periféricas mais frequentes
30 · Maio 2012 www.revdesportiva.pt
Destina-se essencialmente à avaliação da coluna vertebral e do alinhamento dos membros inferiores.
Devem ser documentadas as assimetrias:
. no plano frontal, de pé,
de frente (pés, joelhos, triângulos
de figura, espinhas ilíacas ântero-superiores, mamilos e ombros)
de costas (calcâneos, pregas poplíteas e glúteas, espinhas ilíacas
póstero-superiores, triângulos de
figura, ângulo inferior das omoplatas e bending teste) (Figura 1)
. no plano sagital são documentadas as anomalias também de pé e
de perfil.
foram as do membro superior (86%),
correspondendo maioritariamente
a neuropatias do nervo mediano e
radiculopatias cervicais. As mononeuropatias dos nervos axilar, cubital
e supra-escapular também foram
frequentes. São menos prevalentes
no membro inferior, destacando-se as
neuropatias peroniais e radiculopatias lombossagradas2.
O objetivo deste tema é a descrição do exame motor do atleta na
perspectiva das amiotrofias que
mais frequentemente se podem
encontrar. Dada a extensão do
tema, este artigo foi dividido em três
partes, sendo a primeira dedicada
à introdução ao exame motor, a
segunda às amiotrofias do membro
superior e a terceira às amiotrofias
do membro inferior.
1. Exame motor do atleta
O exame motor começa sempre pela
observação do doente despido de
roupa exterior, em posição ortostática. Em primeiro lugar, devemos
avaliar a postura preferencial, procurando desvios estáticos da coluna
ou atitudes-padrão. De seguida,
Figura 1
Em seguida, realiza-se a avaliação
dinâmica:
.n
a avaliação da coluna cervical
o utente aproxima o mento ao
esterno, o pavilhão auricular ao
acrómio e o mento ao acrómio
.n
a avaliação da coluna dorsolombar o utente realiza inclinações
laterais, rotações para a direita
e esquerda, mede-se a distância
dedos-solo (Figura 2) e, por fim,
pode executar-se o teste de Schober (Figura 3).
minimizados os movimentos compensatórios. É importante explicar
antes o modo de realização do teste,
exemplificando-o de forma passiva.
Caso haja assimetria, o teste deve
ser realizado primeiro no lado presumivelmente não afetado.
A avaliação clínica da força
muscular baseia-se na escala de
seis níveis proposta por Daniels,
Williams e Worthingham, em 1958,
que se encontra na tabela seguinte4.
Grau de força
muscular
profunda)4. Por norma procura-se
primeiro o nível 3 e se for obtido
passa-se para os níveis 4 e 5, progressivamente e sem alteração da
posição articular.
Nalguns grupos musculares, como
nos dedos, não é possível usar-se
a noção de peso para a avaliação
(movimento antigravítico). Assim,
os níveis 3, 4 e 5 distinguem-se pelo
conceito de resistência e referência
contralateral4.
Descrição
0
Nenhuma contração muscular
1
Contração muscular visível ou palpável com os dedos, mas sem movimento
2
Movimento da articulação em toda a amplitude com gravidade anulada
3
Movimento da articulação em toda a amplitude contra a força da gravidade
4
Movimento da articulação em toda a amplitude contra a gravidade e resistência manual média oferecida pelo examinador
5
Movimento da articulação em toda a amplitude contra a gravidade e resistência manual máxima oferecida pelo examinador
A valoração pode ser mais detalhada usando-se os sinais ‘+’ e ‘–‘, que servem para corrigir
a grande diferença de forças entre dois níveis consecutivos. Por exemplo, se um doente
apresenta contração muscular do punho com a gravidade anulada, mas não completa o arco
de movimento, pode ser-lhe atribuído um ‘2-‘. Se completar o movimento do punho com
a gravidade anulada e contra a ação de pequena resistência, mas não conseguir qualquer
movimento contra a gravidade, pode ser classificado com um ‘2+’.
Figura 2 – Distância dedos-solo.
Figura 3 – Índice de Schober (assinala-se
ponto A com caneta dermográfica sobre
a linha média ao nível da linha que une
as duas espinhas ilíacas póstero-superiores; de seguida, assinala-se um ponto
10 cm acima e pede-se ao sujeito (de pé),
que faça a flexão máxima anterior do
tronco. Mede-se então a distância A–B,
que deve ter variação superior a 5 cm).
Baseia-se na observação de eventual
contração muscular e na existência
de movimento contra resistência
da força da gravidade ou do examinador. A resistência por oposição
manual depende do sexo, idade,
profissão do examinador e do peso
do utente. O membro contralateral
é a referência por excelência. A oposição manual deve situar-se o mais
distante possível do pivot articular
(Figura 4)4.
Bibliografia
1. Stedman Dicionário Médico. 25.ª ed. Editora
Guanabara Koogan. Rio de Janeiro. 1996.
2. Krivickas LS, Wilbourn AJ. Peripheral nerve
injuries in athletes: a case series of over 200
injuries. Semin Neurol. 2000;20(2):225-32.
3. Seydel H, Ball J, Dains J, Benedict G. Mosby’s
guide to physical examination. 5.ª ed. Mosby.
St. Louis. 2003.
4. Daniels L, Williams M, Worthingham C. Le
testing. 2.ª ed. Maloine. Paris. 1958.
1.2. Pesquisa de amiotrofias e teste
de força muscular
Antes da avaliação muscular deve
realizar-se o exame articular, no
sentido de se determinar a normalidade das amplitudes de movimento da articulação. O modo de
execução deve ser confortável para
o utente, reprodutível e devem ser
Figura 4.
O nível 1 identifica-se por palpação do ventre muscular ou do tendão (no caso de os músculos serem
impalpáveis devido à sua situação
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