TEXTO DE SISTEMATIZAÇÃO 04: ENFRENTAMENTO DA EPIDEMIA DA OBESIDADE
Apresentação
A população brasileira apresenta, atualmente, taxas crescentes de prevalência de excesso de peso e
obesidade. Este cenário demanda que o Ministério da Saúde, as secretarias estaduais e municipais de
saúde identifiquem os determinantes e condicionantes que levam à obesidade e desenvolvam ações
tanto de caráter individual quanto coletivo para o enfrentamento desta situação com ações de prevenção
e cuidado. O Ministério da Saúde preconiza a utilização do Caderno de Atenção Básica da Obesidade. Este
é um material que apresenta desde o conceito da obesidade até tratamento e acompanhamento
nutricional, bem como atribuições e competências da equipe de saúde. Este material foi distribuído para
estados e municípios e também está disponível em versão eletrônica no site do Ministério da Saúde
(http://nutricao.saude.gov.br/documentos/doc_obesidade.pdf).
Diante deste perfil epidemiológico e da necessidade do enfrentamento da obesidade e as comorbidades
associadas, A REDENUTRI apresentou como 4o. tema de discussão "Como desenvolver no nível local
atividades voltadas para a prevenção e controle da obesidade e suas comorbidades como diabetes e
hipertensão?”.
Sistematização das discussões
Promoção, proteção à saúde. Vigilância nutricional à atenção nutricional. Essas temáticas foram
abordadas no quarto ciclo de discussões. Os integrantes da REDENUTRI expuseram suas idéias tanto de
forma conceitual quanto compartilharam suas experiências locais. Abaixo um consolidado das principais
opiniões.
Promoção, proteção à saúde
Necessidade da realização de medidas de proteção da promoção da alimentação saudável! A
promoção da alimentação saudável implica no desenvolvimento de mecanismos que apóiem os
sujeitos a adotar modos de vida saudáveis, revendo hábitos alimentares considerados pouco
saudáveis. Isto em um cenário em que a globalização e a urbanização caracterizam-se como
movimentos incessantes e contínuos, altamente dificultadores do estabelecimento de práticas
alimentares saudáveis, e que impactam interesses econômicos contrários à saúde pública. É
fundamental associar medidas de incentivo voltadas ao indivíduo como estratégias de educação
alimentar e nutrição; com medidas de apoio que auxiliem os indivíduos a fazerem suas escolhas
alimentares mais saudáveis, como por exemplo: rotulagem nutricional dos alimentos.
Medidas de proteção à Promoção da Alimentação Saudável implicam em medidas regulatórias
que protegem a população de práticas abusivas, como a regulação de práticas de marketing e
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publicidade de alimentos ricos em açúcar, gorduras e sal, focadas no público infantil!
Necessidade da regulamentação da publicidade de alimentos ricos em açúcar, gorduras e sal.
...O enfrentamento da obesidade ao mesmo tempo em que é complexo é extenso em opções e linhas
de atuação. Deveríamos lutar com todas as forças contra a mídia sobre a alimentação infantil e
adulta, obrigatoriedade de rótulos mais claros para a população. É incrível como a indústria se utiliza
das realidades que são apresentadas. Quando de iniciou a luta pelos rótulos, a indústria começa a
trabalhar o seu marketing em cima das calorias... Temos as bolachas integrais riquíssimas em
gorduras trans e sódio. Prescrevemos para o paciente a bolacha integral e daí também temos que
orientar a olhar o rótulo claro. Porém quando a realidade é diferenciada e não tem opções temos que
influenciar até a compra pelo supermercado para que os pacientes não alfabetizados realmente
tenham a alimentação mais adequada. Esses dias eu me deparei com a bolacha "SABOR INTEGRAL"
achei simplesmente o fim. Continuo pensando que o trabalho de sensibilização é a melhor estratégia,
porém precisamos inovar as técnicas para realmente atingir a população!
Necessidade de aprimorar a qualidade nutricional dos alimentos industrializados, isto é, redução
das quantidades de sódio, gordura e açúcar nos alimentos. A regulação de alimentos precisa
estar harmonizada não somente com questões relacionadas à inocuidade dos alimentos, mas
também com parâmetros nutricionais
A indústria e os setores empresariais do ramo da alimentação agem cotidiana e massivamente
divulgando produtos alimentícios que contribuem para os agravos nutricionais, em especial, a
obesidade. Nossa postura ultimamente tem sido cobrar pela regulamentação de práticas de
marketing e publicidade, o que e extremamente correto e importante. Mas ao mesmo tempo,
uma medida menos forte do que aquilo que pretende combater. O bombardeio de informação
que as crianças e adultos recebem é grande demais, pior ainda para os contextos de baixa ou má
qualidade da escolaridade. A proibição de veiculação de determinadas propagandas para o
público infantil deve ser nossa opção, mas precisamos também de contrapartidas para não
negar apenas, mas valorizarmos hábitos culturais, alimentos regionais e não industrializados.
É importante o desenvolvimento de políticas que garantam preços de alimentos saudáveis mais
acessíveis. Farinhas variadas, óleos prensados a frio (oliva, linhaça, canola...), grãos integrais,
frutas e verduras. As atividades de educação nutricional são realizadas localmente. A
comunidade é informada sobre os mecanismos de ação no organismo desses alimentos em
comparação com uma alimentação rica em açúcares refinados, farinhas refinadas, gorduras e sal.
No entanto, o limitante é a dificuldade de aquisição de alimentos saudáveis. A comunidade com
quem trabalhamos recebe em média de 1 a 2 salários mínimos e muitos tem renda informal,
sendo que alguns meses do ano só conseguem pagar aluguel, água e luz. Essas condições fazem
com que as famílias obtenham o que é mais acessível, mais barato (açúcar branco, farinha
refinada, refrigerantes e suco de pacotinho). A Freqüência do Consumo Alimentar sugerido pelo
SISVAN WEB, que aplicamos, no nosso Município, com adolescentes de sétima e oitava série e
com adultos de 25 a 60 anos, mostra realmente o alto consumo de refinados e refrigerante e o
consumo reduzido de frutas e verduras.
Necessidade de maior investimento na REEDUCAÇÃO ALIMENTAR... Começando pela infância, e
amenizando os problemas alimentares enfrentados em adultos e idosos.
Incentivo ao consumo de frutas, verduras e legumes. Algumas sugestões foram:
o
Implantação de sacolões comunitários com FLV já higienizados e/ou pré-preparados
com o aproveitamento integral do alimento. Este tipo de estabelecimento favoreceria
o aumento do consumo destes alimentos, evitaria desperdícios e geraria renda.
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o
Aumento do número de restaurantes populares, a exemplo dos que já existem.
E, os agrotóxicos nas frutas e verduras?
Muitas vezes reproduzimos os discursos dominantes sem pensarmos nas alternativas que devem ser
pesquisadas e estimuladas. Os alimentos com alto teor de açúcar, gordura e sal são de fácil acesso, ara
as populações com baixa renda o fato de serem baratos contribuem para o consumo destes alimentos ao
invés de FVL. O consumo de alimentos agro ecológicos é uma opção igual (no método) ao orgânico, mas
ao mesmo tempo barata, pois não visa à lucratividade. Cabe pensar então na sua aplicação também no
contexto urbano, junto de setores que estudam isso e considerando as problemáticas relacionadas aos
atravessadores e as políticas públicas que valorizam o agronegócio, um setor que ao contrário do que se
propagandeia contribuem bem menos para a produção de alimentos para o consumo interno em
comparação com a agricultura familiar, segundo o censo agropecuário de 2006.
Da Vigilância nutricional à atenção nutricional
O SISVAN WEB enquanto um instrumento que permite a avaliação precisa do estado nutricional
possibilitando a identificação das unidades básicas de saúde com maiores prevalências de
excesso de peso/obesidade. O SISVAN tem o principal objetivo ser uma ferramenta para a
realização da vigilância alimentar e nutricional no território. Nesta perspectiva há possibilidades
de relatórios das informações registradas até por micro áreas. É uma ferramenta que pode
orientar a ação, quando bem utilizada. As ações da nutrição devem ser organizadas
pela caracterização clara do perfil epidemiológico da comunidade e dos espaços domiciliares com
a identificação de riscos, problemas, prioridades, potencialidades e possibilidades de atuação e
reconhecimento da situação de saúde, alimentação e nutrição das famílias. E, o SISVAN, oferece
a potencialidade para a realização do diagnóstico em nível local para a tomada de decisão.
Para refletir...
Colegas da REDENUTRI,
A equipe de moderação considera que houve escassez na apresentação e discussão sobre atenção
nutricional. Faltam experiências ou o caminho que a rede ofereceu não propiciou a visibilidade das
mesmas. Sabemos que temos materiais de apoio, como por exemplo, os Cadernos de Atenção Básica.
Mas, será que o profissional tem acesso para o uso dos materiais para o planejamento e/ou qualificação
das ações que estão sendo realizadas?
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O papel da assistência social no enfrentamento da obesidade... A necessidade da realização de ações
intersetoriais com a saúde?
A implantação do Programa Bolsa Família e dos CRAS é muito recente, mas o avanço do conhecimento e da
consciência vem se dando até de forma rápida, com o apoio da tecnologia. Aprendi que o que dá resultado é
mesmo o trabalho no corpo-a-corpo, com as pessoas das comunidades, com os encontros dos grupos. Isto
porque as pessoas estão ávidas de conhecimento, nosso povo ainda é muito desinformado e, o que é pior,
segue qualquer informação... Os trabalhos nos grupos de famílias nos Centros de Referência da Assistência
Social (CRAS) são a grande alavanca que dispomos para interferir na realidade tão adversa e difícil.
No futuro próximo talvez vamos presenciar os educadores sociais assistirem aulas com a dona Maria, da
chácara tal, e alavancar programas e projetos pautados na forma como ela falou, e conseguiu passar o
conteúdo para os da comunidade e para os governantes, como os agentes de saúde começaram.
Para refletir!
Há necessidade de integração das ações no nível local para o exercício da intersetorialidade. Precisamos
refletir que a mesma família que está sendo atendida pelo CRAS está sendo atendida pelas Equipes de Saúde
da Família (ESF). Os problemas têm origem comum e se os diferentes profissionais e setores tiverem uma
estratégia articulada poderão contribuir de uma maneira mais consistente e efetiva para o enfrentamento dos
problemas.
Experiências compartilhadas:
Oriento uma escola infantil bem pequena, comunitária. Temos um canteirinho com ervas, umas
bananeiras bem frondosas, um chuchuzeiro que está dando alguns chuchus e as educadoras vão
fazer canteirinhos com pneus...
Estou trabalhando em um pequeno município estou trabalhando com educação nutricional nas
escolas e um projeto de doenças e agravos não transmissíveis. Uso nas escolas um material de
educação nutricional que elaborei. Com os grupos da DANT's doenças e agravos não
transmissíveis, faço palestras, oficinas de culinária, faço atendimento individual e coletivos
também! (Doresópolis/MG).
Sou nutricionista e tenho experiência também em trabalhar em supermercados. Creio que
trabalhos em supermercados orientando o cliente a comprar isso e não aquilo seria de
contrapartida aos interesses no mercado. Seria importante o incentivo ao fortalecimento de
ações para a educação para o consumo saudável através dos rótulos de alimentos, por exemplo.
Nos projetos sócio-educativos os lanches, almoço e café da manhã são nossos pontos altos e o
que muito cuidamos para cativar as crianças e adolescentes. Bolos, sanduíches de legumes, arroz
com legumes e verduras. Conseguimos sensibilizar a equipe a não usar os sucos em pó. Hoje
temos suco natural arrecadado nos mercados. As canjicas de milho e trigo demoraram a ser
aceitas. Hoje variamos a forma, doce e salgada e até salada e a fase da rejeição tem acabado.
Sagu é outro doce muito usado, além da gelatina.
Trabalhamos em uma Regional de Saúde, em Belém-Pará, que atua com 09 municípios da Ilha do
Marajó. São municípios bastante carentes, sob todas as formas, inclusive de profissionais
qualificados para os Programas da Atenção Básica. Nosso caminho para uma melhor nutrição
está sendo trilhado partindo do COMEÇO, da barriga da mamãe. 1ª Etapa - Trabalhamos a
implentação/ implementação de Proame - Programas de Apoio ao Aleitamento Materno
Exclusivo nas UBS e Cursos de Sensibilização em Aleitamento Materno para a IHAC - Iniciativa
Hospital Amigo da Criança onde sensibilizamos os profissionais nos Hospitais Municipais - 2ª
Etapa - Rede Amamenta Brasil - Com Oficinas nas Unidades Básicas de Saúde (que para por 6h) e
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Oficinas da ENPACS - Estratégia Nacional de Promoção da Alimentação Complementar Saudável.
Talvez partindo do início, onde a formação dos hábitos alimentares começa, possamos ter um
futuro melhor com relação à Nutrição de nossa população.
Temos uma ótima oportunidade de trabalhar com a prevenção e controle da obesidade junto ao
Programa de Saúde Escolar. Porém ainda estamos no desenrolar do passo inicial. Creio seja o
diagnóstico
nutricional que
esbarra
na necessidade
de
equipamentos
e
metodologia padronizados para a análise, discussão e interpretação desses dados que efetivem
um delineamento a nível regional e nacional.
Apesar dos grandes avanços na melhoria da qualidade e regionalização da merenda
escolar, ainda observa-se municípios sem a orientação e supervisão de nutricionistas, servindo
biscoito recheado e suco artificial as suas crianças acompanhados de baixa qualidade higiênico
sanitária na manipulação dos alimentos. Ao mesmo tempo, observa-se a ausência ou
insuficiência de atividade física regular a essas crianças, contribuindo para a efetivação desse
panorama de crescente aumento de peso. Creio que essas discussões e trocas de experiências
nos auxiliarão na busca de soluções, assim como no encaminhamento de propostas que auxiliem
nossas políticas públicas voltadas a esse segmento.
Em 2007, começamos um projeto de educação alimentar e nutricional buscando identificar o
comportamento alimentar do nosso público alvo, que são estudantes do ensino médio e técnico.
O estudo foi realizado por três anos. Foi um estudo nutricional e epidemiológico, com 480
adolescentes, em três escolas da capital de São Paulo e três do interior: Ribeirão Preto, Sorocaba
e Mogi das Cruzes. Em paralelo as coletas de dados, realizamos oficinas de educação alimentar e
nutricional com esses adolescentes. Análises preliminares dos dados mostram que os índices de
obesidade e sobrepeso encontrados estão de acordo com os do IBGE.
Acabamos de concluir um curso on line através da UFSC no auto cuidado para o Diabetes
Mellitus, que utiliza a metodologia problematizadora, levando o paciente, em trabalho de grupo,
a se sentir mais responsável pela sua condição "doente" e pelo seu tratamento, o curso será
repassado para os municípios que atuamos enquanto Regional de Saúde/Sespa – Pará. Acredito
na metodologia, pois é a mesma que já utilizamos na área da Amamentação Exclusiva e
Alimentação Complementar Saudável com muito sucesso. Penso que pode ser extensiva para
pacientes com Obesidade e Hipertensão. O trabalho envolve atividades em grupos, leitura de
textos, dramatizações, discussões e principalmente a participação dos pacientes, contando suas
experiências, seus avanços, tornando-os parte de um todo. É uma metodologia fantástica,
quando conhecemos as ferramentas e quando conhecemos o problema que vamos discutir. Vale
a pena conhecer. (Ilha do Marajó, Pará)
Sou pediatra em SP, trabalho com ensino na USP/Centro de saúde Escola do Butantã/FMUSP e
estamos começando com uma experiência na comunidade que trabalhamos. A primeira
experiência foi montar um grupo intitulado "Grupo de discussão sobre Obesidade". Logo no
primeiro grupo fomos surpreendidos por uma criança obesa e com sérios problemas domésticos
que disse não gostar do nome e solicitou a mudança para "Eu me cuido e você". Refletimos e
mudamos nosso foco. No segundo grupo fizemos com crianças somente, eutróficas e obesas. Foi
incrível. Aprendemos muito, pois ficavam sozinhas em casa, cozinhavam e ate trocavam, durante
a discussão, receitas de saladas entre si. A faixa etária dessas crianças era entre 8 a 11 anos.
Fizemos uma dinâmica de recortes de alimentos e discutimos desde compra de supermercado
até alimentação saudável. O que eu e a equipe de pediatras e residentes que participaram
concluímos é que temos muito que aprender para lidar com essa nova demanda, mas só o
aprendizado fora dos consultórios é que pode fornecer idéias para uma abordagem efetiva,
conhecer melhor onde e como podemos atuar.
Equipe de moderadores da REDENUTRI
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Enfrentamento da Epidemia da Obesidade.