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I caderno
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sexta-feira, 19/2/88
Coluna do Castello
Ulysses s a b e * ^
por que tem pressa
esde ontem o sr.
D
Ulysses Guimarães,
presidente da Consti-
tuinte, está testando a
viabilidade da sua promessa de promulgar a
nova Constituição no dia
21 de abril. O quórum
na quinta-feira como no
fim de semana, desejado por ele, dificilmente será alcançado. Se o for, será uma
espantosa demonstração de prestígio pessoal e de poder de mobilização que até hoje
nenhum dirigente do Congresso teve, pelo
menos desde que esse Poder se instalou em
Brasília.
Não desiste o presidente da Assembleia
de realizar o que até aqui tem sido irrealizável, salvo nos raros dias de crise institucional resultante, por exemplo, da renúncia do
sr. Jânio Quadros — que desencadeou o
processo de implantação em curto prazo, do
sistema parlamentarista de governo — ou da
deposição do sr. João Goulart. Mas é justificável que ele queira acelerar ao extremo os
trabalhos da Constituinte, retardados por
fatores conhecidos, cuja responsabilidade
não lhe cabe. A Constituição deve ser
votada num prazo razoável para que a
Assembleia não decaia no conceito publico
a ponto de perder a credibilidade.
Fez bem o sr. Ulysses Guimarães em
observar que o presidente José Sarney não
irá permitir que os "três patetas" (os ministros militares de 1969) ressurjam no cenário
nacional, encarnados nos atuais ministros
do Exército, da Marinha e da Aeronáutica,
cuja lealdade, aliás, ressaltou. Nem os oficiais-generais querem repetir a performance
daquele ano sinistro nem o presidente José
Sarney, por mais insatisfeito que esteja com
tendências dos constituintes, quererá ou
poderá insuflar decisões discricionárias como a edição de atos institucionais de um dos
quais resultou a emenda n° 1, da responsabilidade dos referidos "três patetas". O presidente da Constituinte, no seu estilo bem
conhecido, aliás, aludiu ao fato de que o
presidente da República tem à sua retaguarda, no gabinete presidencial, o retrato do
liberal dom Pedro IV, de Portugal, e não o
de dom Pedro I, do Brasil, que dissolveu a
Constituinte e outorgou uma Constituição.
Não haverá no quadro brasileiro de
hoje vocação ditatorial na chefia do poder
civil ou no comando das Forças Armadas
para repetir aventuras históricas, independentemente da análise do que representaram na época os atos que o sr. Ulysses
Guimarães condena com tanta ênfase e boa
inspiração. Por aí a Constituinte poderá
continuar seus trabalhos. Nem os chefes
militares a ameaçam nem o presidente,
ainda que se irrite com decisões da Assem-
bleia ou com agressões da nova oposição
que se erigiu dentro do PMDB e do PFL ao
seu governo, dispõe de ânimo e de poder
para induzir quem quer que seja a se rebelar
contra as decisões soberanas da Constituinte.
Da crítica que o sr. José Sarney fez a
um dispositivo constitucional, anote-àe que
ela recebeu a concordância expressa do sr.
Ulysses Guimarães, que revelou ter conversado com o sr. Bernardo Cabral sobre a
necessidade de, no segundo turno, ressalvar
da proibição constitucional as prisões disciplinares e administrativas. O presidente terá
sido bem inspirado na sua crítica, embora
sua manifestação tenha sido tomada como
disposição de ir ao confronto com a Assembleia que ameaça decidir politicamente contra suas aspirações e, em matéria de princípios, contra suas ideias. Como se sabe, ele
abriu mão da faculdade de enviar à Constituinte um anteprojeto, que poderia ser
aceito ou recusado, e tem-se posto à margem dos debates, salvo quando definiu por
conta própria seu desejo de governar por
cinco anos.
Mas o sr. Ulysses Guimarães, que é um
político sensível e compreende as emoções
do presidente diante de acusações ou insinuações que afetam seu círculo familiar e
sua honra pessoal, sabe também que a
opinião pública é a verdadeira dona da
soberania transferida pelas circunstâncias ao
Congresso-Constituinte. Por isso mesmo,
ele percebe que já não pode ser retardada a
votação do texto constitucional, tanto que
se propõe a conduzi-la "na marra", à semelhança do ex-deputado Leonel Brizola, que
abandonou a Camará para convocar o povo
a fazer "na marra" as reformas de base. As
intenções são outras, evidentemente, mas
em ambas as proposições está latente o
convencimento de que o povo está impaciente com o resultado de operações políticas.
Não parece provável que o presidente
da Constituinte reúna seus presididos além
dos rotineiros dias entre terça e quinta-feira,
conforme a capacidade dos constituintes de
comparecer a Brasília, capital que os liberou, por históricas e conhecidas razões, de
aqui residir. Mas, findo o período de festas,
que, começando no Natal vai ao fim do
carnaval, os meses de março, abril, maio e
junho são os mais produtivos na vida política do país. Em julho há o tradicional
recesso, com as férias das crianças, mas em
agosto, setembro, outubro e novembro,
volta-se a trabalhar. Nos dois períodos, há
pequenos interregnos, como a Semana Santa e a Semana da Pátria.
Mas, dado o reconhecimento de que
nada acontecerá daqui por diante sem acordo das principais correntes, é provável que
no primeiro semestre o sr. Ulysses Guimarães consiga entregar um texto para a indispensável revisão do português por professores já mencionados no noticiário. Antes
disso, só por milagre o sr. Ulysses Guimarães convenceria seus pares a trabalhar de
domingo a sábado para atender ao anseio
nacional por uma nova Constituição. Mas
ele Sabe por qúe o tenta.
Carlos Castello
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