Sumário
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Apresentação 11
1. Primeiras reflexões: a base, o ponto de partida 15
1.1. Uma escola justa em uma sociedade injusta? 17
1.2. O que seria a escola justa: a contribuição de Dubet 19
1.3. A justiça (na escola) como reconhecimento (da diferença)
com redistribuição/igualdade (de saberes) e paridade
de participação 23
1.4. Ações possíveis: o incalculável do ofício de ensinar 27
2. Justiça: contornos de uma pesquisa teórica 31
2.1. A justiça é o outro 39
2.2. A justiça anormal: a justiça reflexiva 43
3. O debate, primeiros resultados e descobertas 53
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4. Procurando percepções sobre a escola justa, encontramos
percepções sobre a injustiça 69
4.1. Injustiça no mundo 78
4.1.1. Macrojustiça ou microjustiça? 78
4.1.2. Onde as injustiças acontecem? 81
4.1.3. Respeito/desrespeito ao princípio da igualdade 84
4.1.4. Quem sofre a injustiça? 87
4.2. Injustiça na escola 89
4.2.1. Quem sofreu a injustiça? 96
4.2.2. Algumas pesquisas sobre a injustiça na escola 98
4.3. E o mérito? Onde está? 102
4.4. Apontamentos para uma escola justa 112
4.4.1. Igualdade, igualdade de direitos, igualdade
de deveres, igualdade de direitos e deveres 112
4.4.2. Respeito, reciprocidade 114
4.4.3. Mérito, valorização, qualidade do ensino 115
4.4.4. Diálogo, participação 115
5. Considerações finais 123
Referências 131
Anexos 147
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1. Primeiras reflexões: a base, o ponto de partida
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O tema? Violência nas escolas! A proposta? Talvez para sair da
sensação de eterna repetição que, por momentos, nos invade em relação ao tema, tentaremos elaborar a relação entre violência e justiça
(injustiça) e pensar, além dos diagnósticos necessários, mas, principalmente, muito além do pânico cotidiano que nos cerca, imaginar,
talvez, uma escola sem violência, uma escola justa. Quem sabe? Talvez essa inversão possa ser útil, essa inversão de perspectiva que vai
na contramão, no contrapelo, no arrepio, talvez possa ser útil. Este
texto recupera um pouco da discussão que desenvolvi em meus cursos de graduação do curso de Pedagogia de 2006 e 2007, em torno da
pergunta: o que é uma escola justa? A relação entre justiça e violência
aparece explicitada na seguinte definição, que nos diz que “violento”
é aquilo que é contrário ao direito e à justiça:
Violência significa: 1) tudo o que age usando a força para ir contra a natureza de algum ser (é desnaturar); 2) todo ato de força contra a espontaneidade, a vontade e a liberdade de alguém (é coagir, constranger, torturar,
brutalizar; 3) todo ato de violação da natureza de alguém ou de alguma
coisa valorizada positivamente por uma sociedade (é violar); 4) todo ato de
transgressão contra o que alguém ou uma sociedade define como justo e
como um direito (CHAUI, 1999, p. 5).
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F. SCHILLING
Seria possível imaginar uma escola justa, que se realiza como um
direito, e que, assim, se opõe à violência? É possível imaginar uma
escola justa numa sociedade injusta? Em exercício de imaginação (de
liberdade), as(os) alunas(os) consideraram, no primeiro dia do curso, que a escola justa seria aquela livre/democrática/inclusiva/pluralista/acolhedora/aberta aos questionamentos/que valoriza o professor/com papéis definidos/igualitária/flexível/com autonomia/
pública/laica/sem preconceito/reflexiva/curiosa/utópica.
Porém, o que é justo, o que é justiça e qual é a relação entre esses
termos e a educação? Como ocorre esta definição?
Para iniciar, cabe uma breve retomada sobre qual seria a relação
entre escola/educação e violência. Para Adorno (1995)1, a principal tarefa da educação seria a de construir um mundo que pudesse opor-se
a novos Auschwitz, ou seja, caberia à educação a recusa da violência.
Tal oposição, tal recusa implicaria em poder construir novas palavras
para opor-se à banalidade do mal, ao terror. Mesmo que essas palavras sejam a da antipoesia, o do pensar-se contra si mesmo.2 Seria, assim, tarefa da educação mobilizar-se a favor da justiça e da realização
do(s) direito(s), para recusar a violência.
Em tempos difíceis para todos os que trabalham com educação,
talvez o maior desafio seja o do debate sobre como unir a reflexão sobre os tempos contemporâneos, sobre a violência, com o conceito de
cidadania democrática que pressupõe uma constituição de prováveis
sujeitos éticos, livres, dotados de palavra, racionais e sensíveis, com
direito a ter direitos. Esta utopia estará definitivamente comprometiADORNO, Theodor. A educação após Auschwitz. Disponível em: <http://www.educacaoonline.pro.
br/index.php?option=com_content&view=article&id=179:educacao-apos-auschiwitz&catid=11:sociologia&Itemid=22>. Acesso em: 25 fev. 2012. p. 1-8.
1
Ver Educação e crise, ou as vicissitudes do ensino, de Shoshana Felman (2000), artigo do livro Catástrofe e representação, de Nestrovski e Seligmann-Silva.
2
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EDUCAÇÃO E DIREITOS HUMANOS
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da? Como fazer para que o nosso cotidiano não seja povoado de lugares que emudeçam, e que, ao contrário, contemple as várias possibilidades de discursos, o debate, o dissenso e a fala sobre o que preocupa
e o que nos acontece no espaço público e em público? Como trazer
para a escola a temática dos direitos humanos, o que implica na política, na tensão entre igualdade e diferença, entre os vários grupos de
direitos e deveres? O que seria, em suma, uma escola justa?
1.1. Uma escola justa em uma sociedade injusta?
Uma primeira questão a ser debatida: se a sociedade é desigual e
injusta, é possível sequer imaginar uma escola igualitária e justa?
Seria possível imaginar que as funções da escola, de integração,
distribuição e subjetivação, não reproduzissem cega e mecanicamente
os preconceitos, a pobreza e a injustiça da sociedade em geral?
Indo além: o que acontece hoje com as escolas, vistas por muitos
analistas como perdendo sua centralidade em relação a estas funções,
vivendo, assim, como outras instituições centrais da modernidade, situações de crise? A escola, como meio de confinamento central (quando universalizada), que, ao definir e inventar um lugar – a infância e a
adolescência –, com seus tempos específicos de preparação (aposta no
futuro), de modelagem dos imaturos em um meio separado dos adultos, ao concentrar, distribuir no espaço, com sua ordenação específica
do tempo, com sua forma tão peculiar, com suas disciplinas/disciplina, tão eficazes em alguns momentos históricos na produção dos
homens e mulheres necessários para uma sociedade, estaria passando
por crises de seus modelos, parecendo hesitante, perdendo funções.
Que lugar a escola pode ocupar, na sua tarefa de reprodução da
sociedade (tal como é), quando esta sociedade parece revolucionar-se
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novamente, mudar seus regimes de controle social e de produção dos
sujeitos? Pensamos com Deleuze (2006, p. 220):
Não se deve perguntar qual é o regime mais duro, ou o mais tolerável,
pois em cada um deles que se enfrentam as liberações e as sujeições. Por
exemplo, na crise do hospital como meio de confinamento, a setorização, os
hospitais-dia, o atendimento a domicílio puderam marcar de início novas
liberdades, mas também passaram a integrar mecanismos de controle que
rivalizam com os mais duros confinamentos. Não cabe temer ou esperar,
mas buscar novas armas.
Para que os impasses dos debates atuais não nos paralisassem, resolvemos trabalhar com uma pergunta que consideramos chave: “há
alguma coisa que pode ser feita agora?” (APPLE, 1989, p. 181). Esta pergunta nos permite pensar – não nos cabe temer ou esperar – e, assim,
buscar novas armas. Perceber que estes momentos de crise também são
aqueles em que há possibilidades de liberdade antes não percebidas.
Retomamos, na discussão sobre o lugar da escola, com sua função de
reprodução da sociedade, as possibilidades que esta tem de “produção”, de “resistência”. Se é verdade que o sistema educacional tende a
reproduzir as desigualdades (e as injustiças) sociais, econômicas, culturais, esta reprodução nunca se faz sem conflitos e contradições.
Mesmo quando a educação “funciona” para sustentar a manutenção de
nosso presente modo de produção, as razões disso são altamente mediadas
e sempre envolvem mais do que simples funcionalidade. Em grande parte,
isso se deve ao fato de que não se pode ler a cultura e a política como se
fossem imagens especulares que passivamente refletissem os interesses da
classe dominante (APPLE, 1989, p. 181).
E mais:
[...] se vemos a cultura e a política como locais de lutas, então o trabalho
contra-hegemônico dentro dessas esferas torna-se muito importante. Se a
forma e o conteúdo culturais e o estado (assim como a economia) são ine-
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