CONSELHO NACIONAL DE ÉTICA PARA AS CIÊNCIAS DA VIDA
POSIÇÃO DO CNECV SOBRE
O PROCEDIMENTO A ADOPTAR EM CASO DE
FETOS VIVOS RESULTANTES DE ABORTAMENTO
28/CNECV/99
O CNECV foi consultado pelo Hospital Distrital de Faro acerca do procedimento a
adoptar perante a existência de fetos vivos resultantes de abortamento eugénico
quando este, nos termos da Lei 90/97, de 30 de Julho, é praticado às 24 semanas
de gestação.
Em resposta, o CNECV esclareceu:
1. A posição deste Conselho acerca da problemática referente à interrupção
voluntária da gravidez encontra-se exposta no Parecer emitido em 10 de Janeiro
de 1997, com base no Relatório da mesma data (Relatório-Parecer 19/
CNECV/97 sobre os Projectos de Lei relativos à Interrupção Voluntária da
Gravidez). Este documento foi publicado em Documentação, volume IV, CNECV
(1997).
2. Da leitura do referido Relatório-Parecer se conclui que o Conselho não levantou
objecções à extensão dos prazos para as causas de exclusão de ilicitude, dado
que a questão ética de fundo é a da própria interrupção da gravidez e não a da
fase da vida prénatal em que é praticada. Todavia, o Conselho chamou a
atenção para o facto de tal alargamento de prazos suscitar problemas de técnica
médica e de interpretação e aplicação de direito. É o que se expõe com maior
pormenor no ponto 11. do Relatório, ao afirmar-se que “poderá acontecer que o
feto abortado esteja vivo e seja necessário deixá-lo morrer, por omissão de
cuidados adequados , o que tecnicamente se aproxima muito do infanticídio, se é
que não configura esse delito”, para o qual, como sabemos, não há exclusão de
ilicitude.
3. Do pedido de parecer dirigido a este Conselho extrai-se a informação de que tal
situação (feto abortado vivo, portador de malformações) é, infelizmente, real,
confirmando-se assim as dificuldades previstas no Relatório-Parecer
19/CNECV/97 e que não foram tidas em conta pelo legislador. Afigura-se
desejável, obviamente, envidar todos os esforços no sentido de a prevenir,
nomeadamente através de:
a) diagnóstico mais precoce da causa de exclusão de ilicitude (antes das 16-20
semanas);
b) certificação médica exacta da natureza e gravidade da malformação e sua
comprovação por exame necrópsico do feto;
R. Prof. Gomes Teixeira, Edifício da PCM, 6º andar, sala 618,
tel. 351.213927688, fax 351.213927975/76.15, E.mail: [email protected]
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c) informação completa e isenta, da grávida, sobre a natureza e consequências
da malformação, de modo a permitir-lhe tomar uma decisão autónoma e livre
sobre uma eventual interrupção da gravidez; esta informação terá
necessariamente de incluir, se o diagnóstico for estabelecido apenas às 22-24
semanas, a possibilidade de o feto abortado estar e permanecer vivo;
d) inscrição, no processo clínico, de todos estes dados.
4. No caso de, apesar de tudo, não se ter podido evitar a situação em causa, existe
conflito entre o dever médico de tentar salvar a vida do feto e o direito da mulher
à interrupção da gravidez. Tal conflito não é, certamente, de resolução fácil, mas
afigura-se que o direito reconhecido pela lei acabará por prevalecer sobre a
deontologia profissional. Parece que, a ser assim, os médicos que praticaram,
em tais condições, o abortamento de acordo com a lei em vigor devem abster-se
de solicitar a colaboração de todo e qualquer profissional de saúde sem
intervenção no processo de interrupção e tomar sobre si a responsabilidade ética
da omissão de cuidados que ultrapassem os básicos.
5. Sobre este assunto poderá consultar-se com proveito o Conselho Nacional de
Ética e Deontologia da Ordem dos Médicos e deverá solicitar-se ao legislador
que precise o enquadramento legal destas situações.
Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, em Lisboa,
12 de Outubro de 1999
Prof. Doutor Luís Archer
Presidente do Conselho Nacional de Ética
para as Ciências da Vida
R. Prof. Gomes Teixeira, Edifício da PCM, 6º andar, sala 618,
tel. 351.213927688, fax 351.213927975/76.15, E.mail: [email protected]
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Posição do CNECV sobre o Procedimento a Adoptar em caso de