stf.empauta.com Brasília, 19 de agosto de 2007 Correio Braziliense - Brasília/DF Colunas e editoriais Estupidificação da soberania nacional OPINIÃO Maurício Corrêa Advogado A Lei dos Estrangeiros prevê três situações em que estrangeiros residentes no país podem ser mandados embora. São elas a deportação, a expulsão e a extradição. Se o estrangeiro se acha aqui de forma irregular, pode ser deportado. Se outro teve conduta imprópria - por exemplo, falsificou documento -, sujeitar-se-á à expulsão. Se mais outro cometeu crime em seu país, e seu país requer do governo brasileiro que o faça retornar, o instituto aplicável é a extradição. Extraditar uma pessoa é, pois, devolvê-la ao país em que tenha sido praticado o ilícito penal. O Brasil tem tradição de boa acolhida aos estrangeiros. Além da imigração regular, a Constituição Federal faculta o direito de asilo ao estrangeiro que, por motivos políticas, não deseja permanecer em seu país. Tal instituto teve origem na América Latina em conseqüência de instabilidade política. Por causa dessa insegurança institucional, com troca freqüente de chefes de governo, perseguidos políticos acabavam fugindo, passando a viver em outros países do continente. O Brasil também é membro fundador do Comitê Executivo da Acnur ( Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados) . O estatuto do refugiado define-o como aquele que é perseguido por convicções religiosas, raça, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas. O instituto teve origem logo após a Segunda Guerra Mundial. Como é sabido, Hitler desfechou cruel perseguição aos judeus, que se tornaram apátridas. Com a expulsão dos judeus em 1938, seus bens foram confiscados. Na fronteira da Polônia, os expulsos, desolados e famintos, aguardavam o ingresso em território polonês. Muitos se suicidaram. Entre os expulsos havia um casal, cujo filho de 17 anos, Herstf.empauta.com schel Grynszpan, residia em Paris. Bert, sua irmã, da fronteira, mandou-lhe mensagem em que narrava todo o martírio. Falou do calvário de que padeciam e, ao final, dizia que haviam perdido tudo. Ficaram sem um centavo. Pedia que lhes mandasse algum dinheiro. Herschel tomou conhecimento mais circunstanciado da tragédia pela leitura de um jornal local escrito em iídiche. Ficou sabendo de todo o horror que se abateu sobre os judeus. Grynszpan ensandeceu-se. Comprou uma arma e a carregou. Planejava matar o embaixador alemão na França. Recebido pelo porteiro da embaixada, disse-lhe que tinha um documento importante para entregar ao embaixador. Foi recebido pelo terceiro-secretário Ernst von Rath. À pergunta de von Rath do que queria, respondeu com a descarga da pistola. "Em nome de 12 mil judeus perseguidos, aqui está o documento", teria dito Herschel. Von Rath não morreu na hora. Dois projéteis o atingiram. Levado para o hospital, dois dias depois veio a falecer. Se a situação dos judeus já era crítica, após esse fato ganhou proporções inimagináveis. Incentivado por Goebbels, as SS, acompanhadas por milhares de fanáticos, iniciaram a depredação de milhares de lojas de judeus. Centenas morreram. Quase todas as sinagogas da Alemanha foram incendiadas. A torá, a menorá e outros símbolos sagrados dos judeus foram profanados. Cemitérios judaicos foram violados. O episódio ficou conhecido como A noite do cristal. O nome se originou da quebradeira de vitrines, cristais e porcelanas das lojas de judeus. Rubem Moller, sobrevivente da expulsão, de apenas 9 anos, foi morar em Kaufering, perto do campo de concentração de Dachau. Na ocasião, ao passar ao lado da cerca de arame farpado do campo, ouviu o diálogo de uma garota de cerca de 7 anos, que se dirigia à mãe: "Mutti, was für Menschen sin die"? ( Mãe, que tipo de pessoas são eles? ). A mãe respondeu: "Das sind keine Menspg.3 stf.empauta.com Brasília, 19 de agosto de 2007 Correio Braziliense - Brasília/DF Colunas e editoriais Continuação: Estupidificação da soberania nacional chen, das sind Juden. " ( não são pessoas, são judeus) . O episódio serve para explicar por que os organismos de defesa dos direitos humanos se apressaram em criar mecanismos de proteção de perseguidos dos regimes totalitários. O Brasil é um país em que vige o Estado de Direito Democrático. Como sabido, governo é uma coisa e Estado é outra. A Constituição que estrutura o Estado assegura o respeito aos direitos de todos, inclusive dos estrangeiros. A dupla de cubamos desertada da Vila Olímpica, que se recolheu em Araruama, aguardava a legalização de sua permanência no país. Embora achando que estavam livres, na verdade estavam sob liberdade vigiada. Confirma o presidente da OAB do RJ que houve comunicação do pedido de asi- stf.empauta.com lo ao Ministério da Justiça. O que o governo brasileiro fez com os dois cubanos é inominável. Não foram expulsos, deportados ou extraditados - não seria o caso. Estavam, sim, presos por ordem do governo brasileiro a pedido de Fidel. O governo brasileiro agiu como troglodita dos direitos humanos. Igualou-se à vileza dos tiranos da pior espécie. Acumpliciou-se com a ditadura fidelista, despachando para Cuba, na calada da noite, os dois boxeadores que buscavam a liberdade. Isso é ignominioso. Subserviente, curvou-se o Itamaraty à política de eterna bajulação de seu titular. É triste regressão à era das cavernas. pg.4