Íntegra da fala do ministro Moreira Franco na abertura do 2ª Conferência do
Desenvolvimento (Code/Ipea)
Eu gostaria de pedir a vocês que as minhas homenagens para esta mesa tão ilustre fossem
concentradas e dirigidas ao professor Paulo Singer. Eu sei que não sou novo. Mas quando eu
era estudante, fazia Economia e depois Sociologia, trabalhava no Sebrape como pesquisador,
bolsista da Fapesp, eu tinha como uma das minhas referências o professor Paulo Singer, que já
naquela época era não só uma usina de produção de conhecimento sobre o nosso país, mas,
sobretudo, uma referência que nos indicava os caminhos para o crescimento, o
desenvolvimento econômico e, sobretudo, para a construção de uma democracia no Brasil. Por
isso, não só eu, mas eu creio que todos nós aqui e certamente os mais jovens, aqueles que
estão começando a sua vida intelectual, a sua vida acadêmica nas diversas universidades
espalhadas pelo Brasil, tenho certeza que os pesquisadores do Ipea, todos eles, devem estar se
juntando a mim para prestar essa reverência, esse conhecimento a essa figura tão importante
no pensamento econômico brasileiro. Por isso, eu creio que esse fato nos inspira a todos a dizer
que a 2ª Conferência do Desenvolvimento, organizada pelo Ipea, se dá em um momento que
me parece extremamente oportuno, porque é um momento de grandes desafios.
Nós vemos que a situação econômica no mundo é extremamente complicada. Eu creio que não
é exagero dizer que hoje nós estamos presenciando uma situação em que as instituições
políticas, os políticos, caminham em uma direção. Os negócios, os homens de negócios, as
empresas, o mercado caminha em outra direção. E o povo caminha em uma direção
completamente distinta dessas duas direções. Então, estamos num quadro social, num quadro
institucional, num quadro político profundamente delicado. E nós não temos o direito e a
soberba de achar que essa crise não é uma crise grave, não é uma crise profunda. Nós vemos o
povo na rua nos Estados Unidos, nós vemos o povo na rua em toda a Europa, nós vemos o povo
na rua no Oriente Médio, nós vemos o povo na rua agora na Índia, nós vemos o povo na rua
nos principais países da América Latina, a exceção do Brasil. E aqui nós não temos ainda e não
teremos, dependendo do que nós conseguirmos, do que vocês conseguirem produzir aqui de
caminhos, de alternativas para nós matermos os padrões de mobilidade social, de crescimento
econômico, de desenvolvimento sustentável.
Se nós não tivermos esses caminhos definidos, nós estaremos também ameaçados, porque hoje
vivemos numa sociedade em que a interação não só é um fato, mas é extremamente rápida. Se
nós hoje vivemos nesse ambiente, de confiança e esperança no futuro, nós devemos,
sobretudo, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na minha opinião, por duas razões. A
primeira, teve a coragem de romper um paradigma praticado na política econômica do país
durante décadas, e inclua a própria formulação e aplicação do processo de substituição de
importações em que jamais se pensou na questão da igualdade social. O país precisava crescer,
precisava enriquecer, precisava ter suas contas equilibradas, precisava ter uma balança
comercial adequada, mas jamais se pensou em que medida deveria se evitar um processo
excessivo de concentração de renda, uma busca de igualdade social. A orientação era de que
era preciso crescer para depois dividir. E foi o presidente Lula que teve coragem de dizer que
essa orientação, esse modelo, esse paradigma, essa referência tinha que ser enfrentada,
mudada, e mudou. E disse que era possível desenvolver e distribuir renda ao mesmo tempo. E
nós tivemos, então, avanços sociais significativos. Colocamos mais de 40 milhões de pessoas saindo da pobreza - no mercado de consumo. Organizamos, criamos, constituímos uma nova
classe média que é responsável por colocar na economia brasileira R$ 1,1 trilhão por ano, mais
do que o PIB de Portugal. E esse foi o grande ganho do ponto de vista social.
Mas, ao mesmo tempo, no campo político-institucional, ele trouxe para participar do processo
de decisão do governo os movimentos sociais. Então, hoje nós temos a possibilidade de viver no
país um estilo de democracia, de organização democrática, em que a pluralidade, o diálogo, a
busca de compatibilização de interesses, de caminhos, que permitam garantir igualdade de
oportunidades, diversidade de oportunidades. Esse sentimento, esse compromissos, esses
valores estão presentes, obrigatoriamente, nas decisões de governo. Alguns de nós reclamam
porque isso demora, são reuniões longas, são reuniões de seis, sete, oito (horas), às vezes dois
dias, para se tomar uma decisão. Mas essa decisão é não só a mais correta para o momento,
porque todas as alternativas foram avaliadas, como também aquela que permite moldar, do
ponto de vista político e social, caminhos que não nos levem a conflitos insuportáveis e
intoleráveis. Esse legado é um patrimônio. Esse patrimônio nós não podemos desperdiçar. O
desafio que temos hoje é impedir que essa nova classe média retorne à situação de pobreza.
Mas, ao mesmo tempo, manter uma política de desenvolvimento econômico que permita
garantir que a mobilidade que tivemos nos últimos dez anos permaneça, em que pese as
dificuldades, em que pese todo esse ambiente de crise.
E essa conferência, pela pluralidade, essa conferência, pelo fato de trazer mais de mil
palestrantes, 260 trabalhos inéditos, lançar 80 livros, ou seja, é um volume de produção
intelectual, de reflexão, de pensamento sobre o desenvolvimento econômico do país, e
certamente haverá de inspirar, não digo facilitar, mas pelo inspirar que os nossos economistas,
que os nossos pensadores, que os formuladores da política econômica do país e,
consequentemente, a máquina pública federal, estadual e municipal, mas principalmente a
máquina pública federal, sobretudo as autoridades econômicas, possam encontrar algumas
ideias em tudo que aqui for produzido, para que nós possamos crescer com desenvolvimento
sustentável, garantindo a distribuição de renda e garantindo o equilíbrio social, que permita ter
no Brasil uma sociedade que garanta a todos igualdade de oportunidades, que pratique a
meritocracia como valor fundamental.
Porque essa nova classe média não tem pai economista, não tem pai político, não tem pai
advogado, não tem pai juiz. Ela depende do mérito dela, do trabalho dela, do esforço dela. E
hoje, que já constitui 52% da população brasileira, para que essa maioria dos brasileiros possa
ter esperança que vive numa sociedade que vai lhe garantir, em função do seu esforço pessoal,
condições de vida e de satisfação pessoal dignas, nós precisamos também ter a meritocracia
como um valor. E a diversidade de oportunidades. Se crecermos cmo esses valores, eu não
tenho dúvidas que nós vamos responder a altura a convocação que hoje, cada vez mais, em
função desse conflito econômico, das mudanças que ocorrem no mundo, a convocação que é
feita ao Brasil para sentar ao lado dos grandes países e desenhar ao lado deles um planeta que
viva de maneira sustentável. Mas, sobretudo, que garanta um crescimento que permita aos
povos viverem num ambiente de igualdade, num ambiente de justiça social, num ambiente de
dignidade. Quero aos senhores todos, na pessoal do presidente do Ipea e de sua diretoria,
desejar que esses três dias de produção de intelectual, de reflexão, de trabalho, de conflito de
ideias, sejam extremamente proveitosos para o Brasil.
Muito obrigado e muito sucesso!
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