SÉRIE CONSELHOS DE DEUS
EM TEMPOS DE ADVERSIDADE
Estudo 1: Tempo de Frustração
ESTUDO BÍBLICO
1 Introdução
Hoje vamos estudar o que Deus tem a nos dizer diante da frustração causada pela privação
de uma necessidade ou por um desejo intenso não realizado. O primeiro livro de Samuel começa
com uma história linda e muito bem contada. Primeiramente são apresentados os personagens do
enredo e, em seguida, narra-se a angústia de Ana. A narrativa cresce em tensão até um desfecho
surpreendente com uma linda e inspirada oração.
2 Análise do texto bíblico
Leia a história de Ana de uma só vez. No grupo também leia todo o texto por inteiro. De
preferência, peça apenas a uma pessoa para ler o texto e, se possível, em uma versão de fácil entendimento. A história é muito bem construída e vale a pena ter uma visão geral dos acontecimentos
sem fragmentá-los.
1
Havia certo homem de Ramataim, zufita, dos montes de Efraim, chamado Elcana, filho de Jeroão, neto de Eliú e bisneto de Toú, filho do efraimita Zufe. 2 Ele tinha duas mulheres: uma se chamava Ana, e a outra Penina. Penina tinha filhos,
Ana, porém, não tinha.
3
Todos os anos esse homem subia de sua cidade a Siló para adorar e sacrificar ao
SENHOR dos Exércitos. Lá, Hofni e Finéias, os dois filhos de Eli, eram sacerdotes
do SENHOR. 4 No dia em que Elcana oferecia sacrifícios, dava porções à sua mulher Penina e a todos os filhos e filhas dela. 5 Mas a Ana dava uma porção dupla,1
porque a amava, apesar de que o SENHOR a tinha deixado estéril. 6 E porque o SENHOR a tinha deixado estéril, sua rival a provocava continuamente, a fim de irritála. 7 Isso acontecia ano após ano. Sempre que Ana subia à casa do SENHOR, sua rival a provocava e ela chorava e não comia. 8 Elcana, seu marido, lhe perguntava:
“Ana, por que você está chorando? Por que não come? Por que está triste? Será
que eu não sou melhor para você do que dez filhos?”
9
Certa vez quando terminou de comer e beber em Siló, estando o sacerdote Eli
sentado numa cadeira junto à entrada do santuário do SENHOR, 10 Ana se levantou
e, com a alma amargurada, chorou muito e orou ao SENHOR. 11 E fez um voto, dizendo: “Ó SENHOR dos Exércitos, se tu deres atenção à humilhação de tua serva,
te lembrares de mim e não te esqueceres de tua serva, mas lhe deres um filho, então eu o dedicarei ao SENHOR por todos os dias de sua vida, e o seu cabelo e a sua
1
Uma observação é necessária quanto a este termo “porção dupla”, pois algumas versões afirmam que Ana recebia
“apenas uma porção”. O texto original traz uma expressão difícil que a maioria dos estudiosos entendem se referir a
uma porção dobrada (ou maior). Contudo, a tradução grega (da LXX) sugere uma leve alteração que significa “apenas
uma porção”. Desta discrepância surgem as variações na tradução deste versículo em diferentes versões. Se a dúvida
surgir no seu grupo, explique que este é um ponto difícil de tradução que exige maiores estudos. Para o entendimento
do texto, o essencial é perceber que Elcana realmente amava sua esposa Ana, mesmo sendo estéril.
2
barba nunca serão cortados”.
12
Enquanto ela continuava a orar diante do SENHOR, Eli observava sua boca. 13
Como Ana orava silenciosamente, seus lábios se mexiam mas não se ouvia sua
voz. Então Eli pensou que ela estivesse embriagada 14 e lhe disse: “Até quando
você continuará embriagada? Abandone o vinho!”
15
Ana respondeu: “Não se trata disso, meu senhor. Sou uma mulher muito angustiada. Não bebi vinho nem bebida fermentada; eu estava derramando minha alma
diante do SENHOR. 16 Não julgues tua serva uma mulher vadia; estou orando aqui
até agora por causa de minha grande angústia e tristeza”.
17
Eli respondeu: “Vá em paz, e que o Deus de Israel lhe conceda o que você pediu”.
18
Ela disse: “Espero que sejas benevolente para com tua serva!” Então ela seguiu
seu caminho, comeu, e seu rosto já não estava mais abatido.
19
Na manhã seguinte, eles se levantaram e adoraram o SENHOR; então voltaram
para casa, em Ramá. Elcana teve relações com sua mulher Ana, e o SENHOR se
lembrou dela. 20 Assim Ana engravidou e, no devido tempo, deu à luz um filho. E
deu-lhe o nome de Samuel, dizendo: “Eu o pedi ao SENHOR”.
21
Quando no ano seguinte Elcana subiu com toda a família para oferecer o sacrifício anual ao SENHOR e para cumprir o seu voto, 22 Ana não foi e disse a seu marido: “Depois que o menino for desmamado, eu o levarei e o apresentarei ao SENHOR, e ele morará ali para sempre”.
23
Disse Elcana, seu marido: “Faça o que lhe parecer melhor. Fique aqui até desmamá-lo; que o SENHOR apenas confirme a palavra dele!” Então ela ficou em casa
e criou seu filho até que o desmamou.
24
Depois de desmamá-lo, levou o menino, ainda pequeno, à casa do SENHOR, em
Siló, com um novilho de três anos de idade, uma arroba de farinha e uma vasilha
de couro cheia de vinho. 25 Eles sacrificaram o novilho e levaram o menino a Eli,
26
e ela lhe disse: “Meu senhor, juro por tua vida que eu sou a mulher que esteve
aqui a teu lado, orando ao SENHOR. 27 Era este menino que eu pedia, e o SENHOR
concedeu-me o pedido. 28 Por isso, agora, eu o dedico ao SENHOR. Por toda a sua
vida será dedicado ao SENHOR”. E ali adorou o SENHOR. (1 Samuel 1:1-28, NVI).
2.1
Contexto histórico
A história de Ana se passa no período da história de Israel em que o povo já tinha tomado
posse da terra prometida e vivia sob o governo de juízes. Na verdade, este já é o final deste período
dos juízes, pois será Samuel (filho de Ana) que fará a transição para a monarquia em Israel. Nesta
época dos juízes, o contexto político era conturbado, pois
a ameaça do domínio filisteu pairava sobre Israel. Estabelecidos na planície marítima a sudoeste da Palestina, eles começaram a invadir as terras israelitas nos dias
de Sansão. O povo de Deus carecia de uma liderança centralizada e não conseguia
expulsar os invasores.2
Eli era sacerdote de Israel e juiz na cidade de Siló, centro religioso do país. Nesta época,
Siló era a sede do tabernáculo. Como você bem sabe, o tabernáculo era um
santuário portátil no qual Deus habitou entre os israelitas estando eles no deserto.
2
SCHULTZ & SMITH, Panorama do Antigo Testamento, p.75.
3
Foi usado por muito tempo depois que os israelitas entraram em Canaã. Durante o
período dos juízes esteve em Siló (Js 18:1).3
Contudo, embora o tabernáculo indicasse a presença de Deus entre seu povo, Israel vivia
um tempo de decadência espiritual. Os sacerdotes Hofni e Finéias, filhos de Eli, trataram com irreverência o santuário e roubavam continuamente do povo em suas ofertas (1Sm 2:12-17, 22-25).
A apostasia em Israel havia alcançado o nível mais baixo nos dias de Eli. Ele fracassou em ensinar seus filhos a reverenciar a Deus, da maneira como Deus havia
claramente instruído os filhos de Israel (Dt 4-6). [Eles] “não se importavam com o
Senhor” (1Sm 2:12) e profanaram o santuário com atos imorais e vulgares, comuns na religião dos cananeus.4
Este período dos juízes demonstra que a presença de Deus (no tabernáculo) pode se tornar
algo trivial em nossas vidas e que não gera mais em nós o devido temor e o zelo por uma vida santa.
REFLEXÃO: Você ainda se maravilha com a presença de Deus ou ela se tornou trivial para você?
2.2
A frustração de Ana
Por conta de sua esterilidade, Ana acumulava tensões em sua vida, o que a levava a viver
em frustração. Frustração é o “estado daquele que, pela ausência de um objeto ou por um obstáculo
externo ou interno, é privado da satisfação de um desejo ou de uma necessidade” (Aurélio). A impossibilidade de gerar filhos era fato notório na sociedade daquela época. No caso de Ana, portanto,
sua frustração decorria de inúmeros conflitos:





Conflito pessoal: incapacidade de gerar e dar descendentes a Elcana
Conflito familiar: dividir o marido com uma mulher fértil que a hostilizava
Conflito social: as mulheres obtinham seu próprio valor tendo filhos
Conflito religioso: a esterilidade era considerada uma punição divina
Problemas físicos e emocionais: “chorava e não comia” (sintomas de depressão)
REFLEXÃO: Que adversidades têm levado você à frustração?
2.3
2.3.1
Como Ana lida com sua frustração?
Busca a presença de Deus
A viagem de Elcana e sua família foi provavelmente para celebrar uma das festividades judaicas. No entanto, Ana sai da festa e vai ao tabernáculo para um encontro íntimo com Deus. Ela
deixa a agitação e o barulho da festa para olhar a agitação e a dor da sua alma. Este movimento de
auto-análise, embora muito dolorido, permitiu que Ana se colocasse diante de Deus de maneira humilde e dependente. Buscar a presença de Deus a livrou das neuroses e complexos decorrentes da
frustração.
Penina também se sentia frustrada por ser a segunda esposa e não ter a preferência e a atenção da esposa amada. Ela, contudo, reage à frustração com agressividade, oprimindo e irritando
sua rival Ana. Veja a correta atitude recomendada pelo apóstolo Pedro:
Humilhai-vos, pois, debaixo da potente mão de Deus, para que a seu tempo vos
exalte (1Pe 5:6).
Quando humilhamos a nós mesmos sob a poderosa mão de Deus, aceitamos de
boa vontade a sua disciplina em nosso benefício e para a sua glória. Então agrade3
4
DOUGLAS, O novo dicionário da Bíblia, v.2, p.1553.
SCHULTZ & SMITH, Panorama do Antigo Testamento, p.76.
4
cidos reconhecemos a sua libertação, que sempre vem a seu tempo e à sua maneira.5
REFLEXÃO: Diante do desejo reprimido, como você tem reagido? Como Penina (oprimindo quem
convive com você) ou como Ana (se humilhando debaixo da potente mão de Deus)?
2.3.2
Derrama-se na presença de Deus
Ana se coloca diante de Deus “com amargura de alma”. Ela mesma descreve seus sentimentos ao sacerdote Eli: “venho derramando a minha alma perante o Senhor” (v. 15), e “pelo excesso da minha ansiedade e aflição é que tenho falado até agora” (v. 16).
Este derramar é uma ação definitiva e completa, onde nada fica guardado. Ana se esvazia,
confiando no caráter amoroso de Deus. Leia 1Pe 5:7: “lançando sobre ele toda vossa ansiedade,
porque ele tem cuidado de vós.” O significado original para o termo “lançar’ é literalmente “jogar
fora”. Para receber o que Deus tem para nós, precisamos jogar sobre ele nossa ansiedade.
Deus quer nos dar tudo, mas não estará em condições de fazê-lo se as nossas mãos
estiverem cheias. (Santo Agostinho)
REFLEXÃO: Como você apresenta sua ansiedade diante de Deus? Derramando-se de uma só vez ou
em conta-gotas para assegurar o controle da situação?
2.3.3
Consagra seu desejo a Deus
Em sua oração Ana faz um voto de que se Deus lhe permitisse conceber um filho, ela o dedicaria a Deus por toda a sua vida. Ter um filho era o seu maior desejo, mas ela consagrou as primícias (os primeiros frutos) de seu ventre ao Senhor. Segundo a lei de Moisés, Ana fez um voto nazireu (Nm 6:1-21), pois:
Nazireu é aquele que se separa para obra de Deus, por voto penitencial ou devocional, por tempo determinado. Três eram as suas obrigações. Abster-se de bebidas alcoólicas, porque o seu prazer deveria estar no Senhor. Não cortar os cabelos,
em sinal de humildade, lealdade, obediência, padecendo opróbrio pelo Senhor.
Evitar contato com os mortos, porque o Senhor é santo.6
Ana cumpre o voto quando Samuel é desmamado. Ela volta a Siló com uma oferta especial
para o cumprimento de um voto, e ela diz ao sacerdote Eli que o menino era a resposta de sua oração e ela o trazia “como devolvido ao Senhor”. Este é o verdadeiro significado da mordomia: entender que todas as bênçãos que vêm de Deus são para servi-lo e glorificá-lo. Oferecer a Deus aquilo que nos é mais caro faz parte de uma dinâmica de relacionamento de dependência total de Deus e
confiança no seu cuidado. Deus quer tomar o lugar daquilo que toma lugar no seu coração.
REFLEXÃO: O que tem frustrado você? Falta de tempo, dinheiro, emprego? Você estaria disposto a
dedicar isto que você ainda não recebeu ao Senhor?
2.4
A celebração de Ana
O ânimo de Ana foi restaurado na presença do Senhor (v.18). Ela entregou seu fardo e “seu
rosto já não estava mais abatido”, pois aprendeu a esperar e confiar no Senhor.
Quando sua oração foi respondida, ela cumpriu seu voto (v.27). Deus tinha um chamado e
um propósito especial para Samuel. Ele foi um instrumento providencial na restauração espiritual de
Israel e na transição do governo dos juízes para a monarquia. Pela sua fidelidade, Ana foi abençoa5
6
SWINDOLL, Renove a sua esperança, p. 223.
Bíblia Viva Nova, com 2.21, p.151
5
da com mais três filhos e duas filhas (1Sm 2:20-21).
Tendo em vista esta grande transformação em sua vida (da frustração à bênção), Ana compôs um cântico de triunfo e gratidão, profetizando o reino de Cristo e os caminhos da providência
divina. Leia seu cântico em 1Sm 2:1-10.
REFLEXÃO: Como posso também celebrar vitória sobre minhas frustrações?
3 Bibliografia
BÍBLIA Vida Nova. São Paulo: Vida Nova, sd.
DAVIDSON, F. O novo comentário da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 1987. 2 vol.
DOUGLAS, J. D. O novo dicionário da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 1988. 2 vol.
LEWIS, C. S. Um ano com C. S. Lewis: leituras diárias de suas obras clássicas. Viçosa: Ultimato,
2005.
SCHULTZ, Samuel J.; SMITH, Gary V. Panorama do Antigo Testamento. Curso Vida Nova de
Teologia Básica v.2. São Paulo: Vida Nova, 2005.
SWINDOLL, Charles R. Renove sua esperança. Belo Horizonte: Atos, sd.
WALTON, John H. O Antigo Testamento em tabelas e gráficos. São Paulo: Vida Nova, 2001.
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