A história da Humanidade
– Certo. Agora tenho uma pergunta muito importante. Procurei muito, pelo mundo,
respostas às minhas perguntas, mas só consegui encontrar aqui na Sinagoga, um lugar
freqüentado apenas por Judeus. No que é que o Judeu difere do resto da Humanidade? D’us
quer dar do Seu bem apenas para este Povo ou para todos? Será que toda a Humanidade é
sócia de D’us na busca do mundo ideal, ou apenas os Judeus? E se for apenas este Povo,
para que D’us criou todos os outros povos?
– Agora você tocou numa questão muito profunda e muito válida. Parabéns! Para
responder, devemos ter uma pequena noção da História do mundo dentro de uma visão
global e abrangente, e não apenas parcial, a partir de um fato isolado, como se os
acontecimentos não tivessem qualquer relação entre si. Ao contrário, na História da
Humanidade tudo se encaixa perfeitamente. Trata-se de um projeto com início, meio e fim,
com objetivos concretos e meios inteligentes para alcançá-los. Por sua vez, a Torá garante:
É um final feliz. Tomemos como base o raciocínio do Rabino Moshe Chaim Luzzatto, em
seu livro Derech Hashem, “O Caminho de D’us”. Devemos saber que D’us criou o mundo
para o homem, e ponto final. Aliás, no início só existia um homem; portanto, não existia o
conceito de povo. E ele não era Judeu, mas sintetizava toda a Humanidade.
– Então houve um plano original? E D’us mudou de plano no meio do caminho?
– Mudar, não mudou. Mas, no início, quando D’us criou o mundo, tinha em mente colocar
um teste para que o homem pudesse, por esforço próprio, adquirir o bem Divino,
valorizando, assim, este presente. É como no caso de um atleta olímpico: ele não quer
receber uma medalha de presente; quer conquistá-la, passar por todas as dificuldades
necessárias. Portanto, D’us colocou um teste: a proibição de comer o Fruto da Árvore da
Sabedoria, antes de dar do Seu bem por completo para o homem. Este bem seria dado de
qualquer forma, caso o homem passasse ou não no teste, mas a maneira de adquiri-lo seria
diferente. Havia, portanto, dois caminhos para D’us concretizar o Seu objetivo. Um, caso o
homem passasse no teste, e outro, caso ele falhasse.
– Chamemos de “Plano A” e “Plano B”.
– Excelente colocação, assim será mais fácil explicar.
– E qual a diferença entre eles?
– No “Plano A”, caso Adão passasse no teste, o mundo já teria alcançado o seu objetivo
naquele momento. D’us já teria dado o Seu bem para o homem de forma definitiva, pois
este o teria conquistado por mérito próprio. Assim, Adão e todos os seus descendentes
jamais morreriam; eles viveriam eternamente desfrutando a vida que D’us lhes deu. Esta
vida – a vida ideal – seria bem diferente daquela que conhecemos. O homem só conheceria
um único caminho: o da verdade. Não haveria dúvidas sobre ela. Não haveria diferentes
pontos de vista, uma vez que todos enxergariam o mundo a partir do ângulo Divino. Os
prazeres, obviamente, seriam imitar as qualidades de D’us. Ao invés de receber tudo para
si, o homem teria prazer em dar para os outros, fazer bondade constantemente e cumprir os
Mandamentos de D’us, ou seja, o contrário do que vemos hoje no mundo.
O “Plano B” é a realidade na qual vivemos. Adão falhou no teste ao comer o Fruto da
Árvore da Sabedoria e, portanto, não pôde receber o bem de D’us, pois não o mereceu.
Então a Humanidade tem que passar por um longo processo, a História, tal qual a
conhecemos, até chegar ao seu objetivo final. O homem quis se assemelhar a D’us a ponto
de poder discernir, segundo a sua própria visão, o que é bom do que não é. Por isso comeu
o Fruto da Árvore da Sabedoria e passou, então, a ter seus próprios pontos de vista. Deste
modo, atualmente, para alguns, por exemplo, o vermelho é bonito, enquanto que para
outros não. Mas para receber o bem que D’us nos concede é preciso anular as nossas
crenças particulares e voltar a enxergar apenas a vontade de Dele11. A volta a este estado de
perfeição é a missão, até hoje, de toda a Humanidade.
Depois do fracasso do primeiro homem, a Humanidade passou a ter pela frente outros
obstáculos e dificuldades com o intuito de tornar o ser humano, uma vez que os superasse,
merecedor da vida ideal de forma definitiva. A partir de então, o sistema psicológico
humano passou a incorporar valores subjetivos, imaginações, ou “Coach Hadimion”, em
Hebraico. Antes do pecado de Adam, fumar um cigarro significaria apenas tragar a fumaça
produzida por um canudo de tabaco. Depois disso, o homem poderia pensar que, fumando
um Marlboro, tornar-se-ia um “cowboy” livre para ir aonde quisesse, sem nenhuma
preocupação12. Pura imaginação! Em outras palavras, se Adam não pecasse, as agências de
propaganda não teriam muito trabalho, apenas o de anunciar as qualidades objetivas de um
11
12
Ramban, Bereshit.
Rav. Karaguila. Palestra sobre “realidade e imaginação”
produto. Esta força da imaginação tornou o homem muito mais vulnerável ao erro, pois este
passou a acreditar que aquilo que é negativo é atraente, e o que é positivo é repulsivo. Por
exemplo, quando alguém vê uma pizza na vitrine, mesmo que não seja casheri, tem a ilusão
de que ela vai proporcionar-lhe um prazer imenso; mas, quando ele come um pedaço, logo
vê que não era tudo aquilo, ou até passa a não agüentar mais comer.
Portanto, tudo ficou mais obscuro e o próprio corpo passou a se apresentar como um
obstáculo. O homem passou a ter preguiça e vontade de fazer coisas erradas. Hoje em dia,
as pessoas acreditam que receber muito dos outros, passar o tempo sem fazer nada, e dar
pouco de si para o próximo é bom, e que o contrário é ruim.
Mesmo assim, o homem preservou a sua capacidade de ser eterno, porém a sua existência
passou a ser constituída de três estágios: O primeiro é a vida tal qual a conhecemos. O
homem nasce, passa por uma série de testes e obstáculos e, após um tempo, morre,
momento no qual passa para o segundo estágio. Aqui, a alma separa-se do corpo e passa
por um período de preparação para o terceiro e definitivo estágio. Nesta segunda etapa, a
alma, puramente espiritual, e sem o limite do corpo material, ganha força e consegue
enxergar a verdade de forma muito nítida. No terceiro e último estágio, finalmente a alma
se reencontrará com o corpo dentro do mundo ideal. Então o objetivo de D’us conceder
eternamente do Seu bem para o homem será concretizado. Vemos, então, que o objetivo
final do mundo não se alterou com o pecado de Adão; todavia, o mundo teve que passar por
uma longa etapa, que é o mundo tal como o conhecemos, para chegar ao seu objetivo final.
– E este teste foi tão difícil assim?
– Adão era o exemplo da perfeição de um homem, pois foi moldado diretamente por D’us.
Logicamente, os seus obstáculos deveriam estar à sua altura. Que tal trilharmos uma
viagem pelo tempo, para observar em detalhes o que aconteceu?
– Ótima idéia!
– Cá estamos... Coloque os seus óculos especiais para entender o que está acontecendo.
Obviamente eles não são suficientes para entender tudo. O que vemos é apenas uma
matéria-prima bruta, o início de toda a Criação, pouco concreta e muito abstrata. É o que,
na Torá, D’us chamou de Tohu. Podemos sentir um amor incrível, ofuscante, uma vontade
infinita de D’us fazer o bem – algo que nenhum ser humano jamais presenciaria – pairando
pelo ar. E isso é concretizado por uma luz extremamente forte, muito mais potente do que a
luz do Sol. Ainda bem que nossos óculos protegem bem os nossos olhos. Desse amor – o
amor de D’us – surge o homem, para receber toda esta bondade. Mas antes dele, D’us deu
forma àquela primeira matéria-prima e criou todo o meio-ambiente em que vivemos: Os
Mares, os Continentes, o Céu, os animais e todo o restante da Natureza para servirem o
homem e este pudesse receber o bem de D’us, a Vida.
Conseguimos, então, enxergar os primeiros gestos de afeto entre D’us e o homem, um amor
indescritível nos primeiros instantes de vida do ser humano. Não há nada que possa
interferir neste relacionamento tão profundo. Surge também, desse mesmo amor, a primeira
mulher. Esta é uma maneira pela qual D’us concede ao ser humano a oportunidade de
experimentar amar alguém, assim como Ele faz com as Suas criaturas.
Em meio a todo este amor, surge o primeiro teste, que definiria para sempre qual seria o
rumo da Humanidade. Enxerguemos, pois, este momento. D’us, na maior atenção e torcida
pelo bom desempenho da Sua criatura, fica na “expectativa” pelo resultado do teste; porém,
o homem não tem sucesso; ele falha, e então o projeto de D’us toma outro rumo, o “Plano
B”.
– Perfeito! Isto quer dizer que o objetivo de D’us é voltado para toda a descendência de
Adão, o primeiro homem, ou seja, toda a Humanidade. Então, qual a diferença entre os
Judeus e os demais povos?
– Continuemos o nosso raciocínio. Depois do primeiro pecado, D’us deu mais um prazo
para que a Humanidade voltasse, como um todo, ao seu estado original, sem a necessidade
de dividi-la. Paciente, D’us esperou para ver se isso aconteceria, se os homens iriam
conseguir relacionar-se com o seu Criador da maneira correta, se saberiam receber o bem
Divino, se viveriam ou não uma vida verdadeira. Contudo, isso também não aconteceu.
– Então, no início da História a Humanidade não evoluiu.
– Pois é. O homem, teimoso, voltou a errar. Na décima geração a partir de Adão, a
Humanidade chegou a tal estágio de afastamento da verdade, que D’us aniquilou todos os
humanos da terra, deixando vivos apenas o único homem justo e sua família, Noach, para, a
partir deles, repovoar a Terra. Portanto, todos os humanos que existem são filhos de Noach.
Ele teve três filhos: Shem, Ham e Yefet. De Shem saíram os Semitas, que são o Povo
Judeu e os Árabes. De Ham provavelmente saíram o antigo Egito e os povos Africanos. De
Yefet saíram, dentre outros, o império Grego, os Persas e os Germânicos. Mesmo assim, o
prazo para o homem voltar ao seu estado ideal ainda não havia terminado.
– E quando isso aconteceu?
– Passadas mais algumas gerações, a Humanidade voltou a afastar-se muito do Seu Criador.
Planejaram construir uma torre, a Torre de Babel, com a pretensão de desafiar D’us.
– Que bobagem!
– Sim, a bobagem foi tão grande que, neste momento, D’us disse: “Basta! Agora as coisas
vão ter que mudar. O homem, como um todo, não conseguirá voltar ao mundo ideal. Não
atingirei o Meu objetivo assim. Vou dividir a Humanidade em várias facções, vários povos
com diversas funções. Verei como se comporta cada grupo de indivíduos e, a partir das
suas características, vou agrupá-los em diferentes Nações. Não é mais possível existir o tão
sonhado mundo sem fronteiras idealizado por filósofos e artistas. Mas será que alguém,
neste povoado chamado mundo, está apto a conduzir a Humanidade rumo ao seu objetivo
final? Alguém aqui é correto e verdadeiro o suficiente para liderar todo o processo que
culminará no mundo ideal, onde Eu poderei finalmente entregar o Meu bem para a
Humanidade por seu próprio mérito?”.
D’us então notou que apenas um indivíduo, Abraham, possuía as características necessárias
para isso13. Ele não foi viciado pela geração de sua época, nem mesmo por seus pais, ou por
sua família. Chegou, por raciocínio lógico, à verdade do mundo, e comportava-se de acordo
com ela, de maneira extremamente positiva. Em um mundo tão conturbado onde, em
algumas regiões, fazer bondade era proibido, ele construiu dentro de si um homem íntegro,
que buscava o dia inteiro, e todos os dias, fazer o bem para as demais pessoas e mostrarlhes a verdade do mundo.
– Então foi dele que saiu o Povo que encabeçaria o mundo rumo ao seu objetivo?
– Nem todos os seus descendentes tiveram esse mérito, porque alguns se desviaram do seu
caminho. Mas Abraham teve Yitschak como filho fiel aos seus ensinamentos; este, por sua
vez, teve Yaacov, também dentro do caminho da verdade. Passadas estas três gerações,
estava selado que toda a descendência de Yaacov teria garantida a responsabilidade de
encabeçar a Humanidade rumo ao seu objetivo. Esta é a origem e missão do Povo Judeu na
Terra.
13
Ver em Moshe Chaim Luzzatto, “Derech Hashem” (“O Caminho de D’us”).
– E isso os faz melhores do que os demais?
– De forma alguma! Muito se fala que os Judeus são o “Povo Escolhido”, o que causa
muito anti-semitismo, mas é preciso entender exatamente qual é a sua função no mundo. A
principal função do Povo Judeu é refletir a luz Divina para o resto da Humanidade14. Para
que isso ocorra, é preciso anular a sua própria luz. Os Judeus não devem querer se
promover aos olhos do mundo, mas promover D’us. Por meio dos seus atos, os Judeus têm
o potencial de fazer o mundo compreender que Ele existe e que tudo existe graças à Sua
infinita bondade. Assim, todos receberão do bem Divino que ficou oculto desde o pecado
de Adão. Não é por acaso que os Judeus nunca deixaram de existir desde a sua formação.
Isso seria impossível, pois o mundo perderia o seu sentido. Sem os Judeus, o mundo não
chegará ao seu objetivo final, a Humanidade nunca terá a respostas às perguntas
fundamentais, e isso só será possível se houver agentes – no caso os Judeus – para
transmitirem isso para o resto do mundo.
No entanto isso não quer dizer, de forma alguma, que os Judeus são mais fortes,
inteligentes e orgulhosos. Muito pelo contrário. Na realidade, o Judeu deve anular-se por
completo, a fim de dar espaço para que D’us apareça. Assim, o Povo é comparado,
freqüentemente, com a Lua15, pois ela não tem luz própria; a sua única função é refletir a
luz do Sol. Do mesmo modo, a única função do Judeu é refletir a luz Divina. Por isso,
quando um cientista Judeu descobre uma fórmula, quando um escritor recebe um Prêmio
Nobel, ou quando o exército Israelense vence uma guerra, não existe motivo algum para se
orgulhar da sua própria glória, pois a mensagem real consiste em dizer: “D’us É quem
comanda tudo e concedeu essa vitória”. Sem Ele, o Povo Judeu seria absolutamente nada.
Além disso, deve-se saber que os Judeus não devem desprezar, e nem anular, as qualidades
das pessoas das outras Nações. Existe uma preocupação especial em não se misturar a eles
para preservar a função destinada ao Povo Judeu; mas deve-se honrar e rezar pelo bemestar das demais Nações.
O Povo Judeu carregou a sua missão ao longo de toda a sua História. No entanto, seria
impossível que ela se concretizasse sem que, antes, o próprio povo acreditasse e se
comportasse de acordo com as regras Divinas. Seria como querer ensinar alguma coisa a
14
15
Palestra do Rav. Sitruk: “Le Soleil et la lune”.
Idem
alguém sem estar por dentro do assunto ou sem poder dar o exemplo pessoal. Uma vez que
o povo se aperfeiçoasse internamente, não precisaria fazer mais nada; os seus próprios atos
já inspirariam o resto da Humanidade.
Ciente disso, com certeza um Judeu deve sentir uma enorme felicidade por pertencer a este
Povo. Você mesmo já mencionou, algumas páginas atrás, como um ser humano deve
impressionar-se com o valor que D’us dá a ele. Afinal, o homem é o único, em toda a
Criação, que recebe toda a bondade de D’us. E dentre dos humanos, quantos Judeus
existem? Poucos, cerca de 0,2%. Se já é um privilégio ser humano, ser Judeu e carregar
toda esta responsabilidade, deve proporcionar uma alegria e auto-estima imensa. Mesmo
nas situações de sofrimento pelas quais os Judeus passam; estes devem ficar felizes pelo
simples fato de pertencerem a este Povo. Até mesmo no Holocausto oJJudeu podia sentir-se
melhor do que o Nazista, pois é melhor possuir a moral do que a força.
– Concordo plenamente, mas e quanto às outras Nações; quais seriam as suas contribuições
para o Projeto Global? Elas também receberão o bem de D’us?
– Todos podem participar do projeto, todavia apenas os Judeus como povo receberam,
desde a época da divisão dos povos e das suas tarefas, esta função central. Além deles,
nenhum outro povo poderia ter este mérito. Porém, individualmente as pessoas
conservaram a capacidade de se converterem ao Judaísmo e se tornarem membros do Povo
Judeu. Caso queira permanecer fora dele, ainda assim, um indivíduo tem os seus
obstáculos, testes, leis de conduta e, conseqüentemente, a sua recompensa; porém numa
escala menor.
Na realidade, as demais Nações podem contribuir de forma positiva, quando elas fazem
com que a História e a Humanidade evoluam em termos morais, na cultura e nas ciências,
ou de forma negativa.
– Como assim, de forma negativa?
– Por exemplo, para fazer avançar o Seu projeto, D’us muitas vezes utiliza-se de más
intenções de outras Nações para que estas persigam o Povo Judeu quando este se afasta do
caminho correto e deixa de cumprir a sua missão. Quando todos os demais recursos se
esgotam, quando os Judeus não assumem as suas responsabilidades por amor e percepção
da verdade, D’us envia estes sofrimentos para que o povo volte às suas origens, ao seu
caminho correto. Se não fosse assim, o Povo Judeu se perderia, e o mundo já não faria mais
sentido; não haveria mais quem conduzisse a Humanidade rumo ao seu objetivo final.
– Você pode citar exemplos de quando isso aconteceu?
– A história do Povo Judeu está permeada de muito sofrimento. Façamos um resumo da sua
História: o que você conhece da História dos Judeus?
– Tenho uma vaga noção.
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A história da Humanidade – Certo. Agora tenho uma pergunta muito