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FUMPROARTE
A Visão da Comunidade Cultural de Porto
Alegre. Relatório de Pesquisa1
Pesquisadoras: Martha Lauermann
Simone Derosso
Estagiárias: Carolina Canazaro
Taís Campelo
Prefeitura Municipal de Porto Alegre
Secretaria Municipal da Cultura
Assessoria de Estudos e Pesquisas
1
Artículo cedido por las autoras al Portal Iberoamericano de Gestión Cultural para su publicación en el Boletín GC:
Gestión Cultural Nº 11: Participación Ciudadana, abril de 2005. ISSN: 1697-073X.
Resumo
Esta pesquisa teve objetivo de avaliar a relação estabelecida entre a
comunidade cultural de Porto Alegre e o FUMPROARTE, Fundo de Apoio ArtísticoCultural da Prefeitura Municipal, que em seus 10 anos de existência já financiou 385
projetos de diferentes áreas artísticas, selecionados através de concurso público.
Para esta avaliação, optou-se pela utilização de metodologia qualitativa
através do grupo focal, por acreditar que este método viabiliza a compreensão dos
discursos enunciados pela classe artística, em relação ao FUMPROARTE e seu
funcionamento. Foram formados cinco grupos de discussão, considerando diferentes
níveis de conhecimento e de relação com o Fundo, bem como de representatividade
das diversas áreas culturais.
Cada grupo refletiu, de alguma forma, a sua condição em relação ao
FUMPROARTE, destacando -se algumas categorias: a CAS (Comissão de Avaliação e
Seleção) em sua atribuição de definir os projetos a serem financiados; a
“Burocracia”, referida como os procedimentos legais exigidos pelo Concurso; e o
“Recurso”, valor destinado ao Fundo pelo orçamento do Município. Também foram
destacados pelos grupos: o “Teto”, limite máximo para o custo dos projetos;
“Divulgação e Distribuição” dos produtos culturais, e a questão do “Profissionalismo”
dos artistas e produtores envolvidos nos projetos beneficiados.
A análise observou que, via de regra, as opiniões decorrem da forma como os
participantes se relacionam com o FUMPROARTE, com o mercado e com a
comunidade cultural de Porto Alegre.
1.
Introdução
A partir do início das atividades do Fundo Municipal de Apoio à Produção
Artística e Cultural (FUMPROARTE), em 1994, a Secretaria Municipal da Cultura de
Porto Alegre (SMC) estabeleceu mais um elo com a comunidade cultural do
Município, através da implantação de um mecanismo de financiamento que suprisse
as demandas solicitadas por esta comunidade.
A reivindicação na época era de que o poder público criasse meios legais para
subsidiar projetos culturais. Essa demanda foi atendida com a criação do
FUMPROARTE2 , que ocorreu após ampla discussão entre Executivo e Legislativo
2
Através da Lei 7.328/93, regulamentada pelo Decreto 10.867/93.
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2
Municipais, contando com setores da comunidade cultural. O modelo adotado pelo
FUMPROARTE é do financiamento direto, diferenciado da maioria das leis de
incentivo do nosso país, que operam com a lógica da renúncia fiscal. A escolha dos
projetos beneficiados se dá através de concurso público, por intermédio da
Comissão
de
Avaliação
e
Seleção
(CAS),
composta
por
dois
terços
de
representantes eleitos pela comunidade cultural. O outro terço é composto por
técnicos indicados pela SMC Possibilita, também, que qualquer cidadão possa
acompanhar a distribuição da verba pública, através de reuniões abertas, o que
torna a relação mais transparente e democrática.
Desde sua implantação, a gerência do FUMPROARTE tem buscado formas de
valorizar e estreitar a relação com a comunidade cultural, seja através da
organização de debates por áreas da cultura, como ocorreu em 1998, ou em
reuniões mais amplas, como em 1999. Editou também um livro em comemoração
aos cinco anos de funcionamento, no qual artistas com projetos financiados,
membros da CAS e do Comitê Assessor – outra instância do concurso, responsável
pela avaliação dos aspectos legais dos projetos – puderam registrar suas opiniões.
Em 2001, ao aproximar-se dos 10 anos de existência, solicitou à Assessoria de
Estudos e Pesquisas (ASSESPE) da SMC uma pesquisa que pudesse aprofundar a
discussão e servisse de subsídio para sua reavaliação e aperfeiçoamento.
Os objetivos da pesquisa foram então delimitados:
-
Avaliar a relação estabelecida entre a comunidade cultural e o FUMPROARTE;
-
Apreender as diferentes visões dos artistas sobre o Fundo;
-
Colher sugestões sobre o FUMPROARTE, que possibilitem melhorias no seu
funcionamento;
-
Divulgar os resultados da pesquisa para a comunidade cultural, viabilizando a
continuidade dessa discussão.
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3
2.
Metodologia de Pesquisa
A Assessoria considerou que a pesquisa qualitativa seria o caminho mais
apropriado para alcançar os resultados esperados pelo Fundo, pois é um recurso
que oferece respostas mais consistentes quando abordados níveis de realidade
difíceis de serem quantificados. Partindo do pressuposto que o assunto é complexo
e também subjetivo, optou-se pela utiliz ação da técnica do grupo focal, por
acreditar que este método viabiliza a compreensão do significado e intenção do
discurso da classe artística. Tal técnica prevê a formação de grupos de discussão,
dispostos em torno de uma mesa, em local reservado e apropriado para gravação
das conversas, posteriormente transcritas.
Cada grupo foi constituído por aproximadamente oito pessoas, e os debates
duraram em torno de duas horas. Todos os participantes estavam cientes de que o
material gravado seria analisado, resultando posteriormente num relatório, tendo
assinado documento autorizando tais procedimentos.
Os critérios indispensáveis para a seleção da amostra foram:
1. Que os participantes tivessem conhecimento, mesmo que mínimo, do
funcionamento do FUMPROARTE (tendo alguma relação com o mesmo, seja
como proponente ou como membro da CAS)
2. Que os grupos representassem a diversidade das áreas culturais de Porto
Alegre, oportunizando condições para que as mais variadas visões sobre o
seu funcionamento viessem à tona.
Foram
constituídos
cinco
grupos
de
discussão,
com
as
seguintes
características:
1. Pessoas que tiveram seus projetos desclassificados pelo Comitê Assessor
na primeira etapa de análise, por não atenderam as exigências formais;
2. Pessoas que tiveram seus projetos analisados pela CAS (análise do
mérito), mas não receberam financiamento;
3. Pessoas que tiveram projetos aprovados e financiados;
4. Integrantes ou ex-integrantes da CAS;
5. Pessoas com uma trajetória profissional consolidada e visibilidade no
cenário cultural da cidade.
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4
Foi acordado no início de cada reunião que não haveria inscrição para o uso
da palavra e que cada participante deveria se pronunciar a seu tempo, evitando
simultaneidade das falas. Não houve nenhum tipo de interferência por parte da
coordenação em definir itens de discussão ou posicionamento durante a realização
dos encontros, pois a intenção era constatar em cada grupo a importância dos
assuntos referentes ao FUMPROARTE. Diante disso, o resultado dos debates foi
surpreendente: os cinco grupos elegeram praticamente os mesmos assuntos,
embora com abordagens distintas.
Os assuntos mais debatidos foram: a “CAS”, em sua tarefa de definir os
projetos a serem financiados; a “Burocracia”, os procedimentos legais do Fundo; e a
“Verba”, com suas limitações e implicações. Não sem importância, foram também
destacados pelos grupos: o “Teto”, limite implícita para o custo máximo dos
projetos; “Divulgação e Distribuição” dos produtos FUMPROARTE - de certa forma
associada
ao
“RIP”
-
Retorno
de
Interesse
Público 3 ;
e
a
questão
do
frente
ao
“Profissionalismo/Profissionalização”.
Cada
grupo
refletiu,
de
alguma
forma,
a
sua
condição
FUMPROARTE. Como exemplo, destacamos a ênfase que alguns grupos deram ao
assunto “burocracia”. Pode-se pensar que a tônica dos dis cursos dos dois primeiros
diz respeito à dificuldade em ultrapassar a etapa de análise dos aspectos formais
dos projetos. Já no grupo 3, formado por pessoas cujos projetos foram financiados,
esse tema apareceu com menor destaque, sendo considerado parte do processo,
vindo a subsidiar a análise de projetos pela Comissão. O grupo 4, de representantes
da CAS, associou o cumprimento dos aspectos formais à profissionalização,
permitindo a realização de projetos cada vez mais elaborados. Por fim, o grupo 5
aproxima-se dos primeiros em relação às críticas feitas à “burocracia”, sendo que
em alguns momentos a considera necessária.
3
Retorno de Interesse Público (RIP): item obrigatório dos projetos submetidos ao FUMPROARTE, definido como
“cotas de doações, apresentações públicas gratuitas ou outras formas, dependendo da natureza do projeto.
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5
Nossa intenção no relatório é analisar, portanto, como cada grupo vê e se
relaciona com o FUMPROARTE, através dos temas definidos pelo s próprios grupos. É
mostrar a multiplicidade de opiniões em cada grupo e também as diferenças entre
os mesmos.
3. Debates
3.1. Grupo 1
Os componentes do grupo 1 centraram seus comentários e críticas
especialmente sobre o assunto que lhes atingiu diretamente: questões técnicas de
elaboração dos projetos. Isto porque problemas formais como erro de cálculo nos
custos, ausência de documentos ou de assinaturas exigidas pelo edital im pediram o
encaminhamento dos seus projetos à etapa seguinte, de análise do mérito artísticocultural pela CAS, e portanto, eliminaram sua possibilidade de concorrer ao
financiamento do FUMPROARTE. Assim sendo, sua reivindicação é por maior
flexibilidade para com todos os trâmites, normas e inclusive prestação de contas - a
chamada “burocracia”, exigida tanto para “entrar” no concurso quanto para
“executar” o trabalho - a fim de serem contempladas as situações peculiares e
específicas de cada área e de cada projeto.
Por outro lado, reclamam à Comissão maior especificidade nos critérios de
seleção de projetos, ou seja, critérios menos amplos que delimitem o que
“realmente quer” o FUMPROARTE, com detalhamento dos itens “clareza e coerência,
previsão de custos, retorno de interesse público e mérito”. Um componente afirma
que o artista “se justifica demais e a Comissão se justifica de menos”, referindo -se
à dificuldade em elaborar os projetos de forma a agradar aos avaliadores.
“Justificativa é uma palavra muito genérica... Que tipo de justificativa tu tens que
privilegiar? Porque aí tu vais direcionar o teu projeto em função dos objetivos do
edital”.
Também questionam o próprio FUMPROARTE, perguntando se este tem como
objetivo financiar artistas “iniciantes” ou “veteranos”. A idéia corrente é de que o
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6
Fundo privilegia artistas que já tenham visibilidade profissional, em detrimento dos
que estão iniciando no mercado.
É interessante observar que as pessoas que pedem ora por flexibilidade (na
parte burocrática), ora por critérios mais definidos, menos amplos (na análise do
mérito4 ) são as mesmas. Alguns integrantes percebem a contradição, alegando que
não desejam mais regras, e sim mais informação. Tal contradição demonstra que
este grupo apresenta elevado grau de desconhecimento das normas e do processo
de funcionamento do FUMPROARTE. É possível concluir que, por mais manuais de
instruções que sejam feitos (a exemplo dos existentes para preenchimento do
formulário de apresentação de projetos e prestação de contas), a informação maior
provém das reuniões abertas do Fundo e de comentários informais intracomunidade.
A existência de um “teto” (valor máximo para aprovar projetos, que inexiste
enquanto norma escrita, mas é prática reconhecida até por alguns componentes da
CAS) também é tida como uma política informal, que vem desqualificar a arte, não
colaborando para a profissionalização dos artistas. As pessoas travam, então, um
debate sobre a avaliação realizada pela CAS, se deve ser quantitativa (privilegiar
um maior número de projetos, em função da disponibilidade do recurso) ou
qualitativa (independente do custo), além da possibilidade de pesar os dois quesitos
ao mesmo tempo. Surgem opiniões opostas sobre a utilização de um “teto” como
critério de avaliação: “se é R$ 100.000 o teu projeto e é o mais interessante
artisticamente, vai toda a grana para o teu projeto, não precisa contemplar
cinqüenta projetos só porque é público”. Contrapondo-se a esta opin ião, um dos
componentes do grupo acredita ser importante o estabelecimento de um “teto”
como forma do FUMPROARTE dizer “que tipo de categoria ou molde de trabalho
pode e quer apoiar”. Continua, dizendo que o teto serviria para que o artista adeqüe
os custos de seu projeto à realidade brasileira: “a gente não pode sonhar que está
num país muito rico e que se tenha à disposição milhões para ficar gastando com
qualquer sonho disparatado da criação artística”. O grupo discute, portanto, se para
a aprovação de projetos a CAS deve considerar os custos, o que segundo alguns
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7
seria realizar uma “avaliação burocrática”, ou considerar somente o mérito
(“avaliação artística”).
Também discutem com ênfase as relações arte x comércio. A maioria
demonstra acreditar que a arte é desvinculada de aspectos considerados comerciais,
o que a isentaria da necessidade de cumprir quaisquer trâmites ou justificativas,
verbais ou escritas. O comércio é aqui entendido enquanto o mundo do dinheiro,
mundo de atividades e relações consideradas inferiores à prática da arte. No
processo de seleção do FUMPROARTE, acreditam em grande parte terem seus
projetos medidos por tais critérios, ficando o mérito relegado a um segundo plano –
“criar um texto pra dizer, pra comprovar que aquilo que tu estás fazendo é bom, daí
não é arte, é produto, é comércio”.
O grupo enxerga erros na verificação de documentos por parte da CAS
(referindo-se a algo que é responsabilidade do Comitê Assessor), seja dizendo que
esta encontra problemas inexistentes (como a ausência de uma assinatura que
alegam ter sido feita), seja desclassificando os projetos em função da falta de uma
fotocópia da carteira de identidade, considerada um detalhe, quase dispensável
(“isso não pode barrar o projeto em si, com certeza eu acho que isso é o máximo de
sugestão que a gente possa dar aqui”). Para tal sugerem que a CAS analise os
projetos e, em caso de erro, entre em contato com o proponente, oferecendo um
prazo para a regularização. Outra proposta é de que o mérito seja analisado
anteriormente, como primeira etapa (“nas artes cênicas, há tempos se pede isso”),
e que depois se considere a parte legal. Acreditam que o FUMPROARTE é
burocrático porque esta é uma decisão da Prefeitura ou da SMC, não vinculada à
legislação. Sobretudo, fica clara a opinião do grupo de que questões burocráticas
não devem se aplicar aos artistas.
4
Cabe observar que as pessoas que compõem esse grupo não participaram (ao menos enquanto proponentes) da
segunda etapa do processo, ou seja, da análise do mérito, sobre a qual versam grande parte de suas críticas.
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8
Alguns componentes do grupo se referem ao Fundo como mais uma opção de
financiamento, existindo críticas à “falta de profissionalismo” dos artistas.
Comentam que a arte no Brasil e principalmente em Porto Alegre ainda é tratada
com muito amadorismo (opiniões que parecem criar um embate entre os que
pensam o artista distanciado da burocracia, e entre os que enxergam a arte de
forma mais profissional tendo que conviver com a burocracia, da mesma forma que
o fazem outros setores da sociedade). Também se referem ao apoio do poder
público à classe artística como insuficiente. Expressam que a CAS não favorece a
profissionalização dos artistas ao “subfaturar” o valor dos cachês e ao cortar custos
previstos para ensaio e preparação corporal, ao mesmo tempo em que não apoia
que diversas tarefas do projeto sejam realizadas pelo mesmo artista (que muitas
vezes desempenha diferentes papéis: arranjador, diretor, músico, produtor, etc.).
Foi dito que o FUMPROARTE “é um reflexo da organização da categoria”,
através do número de projetos aprovados por área. Citam, como exemplo, as áreas
da música e de artes cênicas, consideradas mais organizadas, tendo mais projetos
aprovados do que as áreas da dança e das artes plásticas.
Ao não serem classificados para a etapa seguinte, reclamam do custo e do
tempo investidos na elaboração do projeto preparado para o Fundo, sem o retorno
esperado. Muitos demonstram elaborar projetos artísticos somente para concorrer
ao FUMPROARTE, como se fosse a única opção de trilhar o caminho artístico. Um
dos componentes contrapõe-se a essa visão, afirmando que o artista precisa
“investir” em si mesmo e em sua carreira, fazendo do FUMPROARTE uma das
opções, não a única.
É grande a reclamação com relação aos contemplados pelo Fundo, dizendo
que as pessoas são “as mesmas” em todos os editais 5 . Também foi citado que
algumas pessoas são privilegiadas por “saber fazer os projetos”, outras por
descobrirem
supostas
“fórmulas”6
para
a
aprovação.
Chamam
(direta
5
ou
Considerando a impressão de haveria uma concentração dos recursos em poucos “favorecidos” expressa pela maioria dos grupos,
a Gerência do FUMPROARTE realizou um levantamento visando estabelecer o números de projetos financiados por proponente,
cujas conclusões desmentem essa impressão.
6
Segundo o grupo existem quesitos implícitos definidos pela CAS, componentes de uma “fórmula”, que condicionam a aprovação de
projetos.
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9
indiretamente) estas supostas informações de favoritismo, alegando que não são
privilegiados pelas mesmas, por não terem amigos na CAS ou no PT7 .
Outra discussão pertinente é se o Retorno de Interesse Público (RIP) deve ser
medido em quantidade ou qualidade. Questionam se o FUMPROARTE deveria
subsidiar projetos que não tenham RIP quantitativo de público, ao mesmo tempo
em que se preocupam com a banalização da arte através da produção de projetos
de valor artístico “discutível”, mas que agradam a um público mais abrangente.
Debatem se o poder público deve investir ou não em projetos “comerciais”, ou se
estes caberiam à iniciativa privada. Também nesta questão surgem dúvidas quanto
ao funcionamento do Fundo, com relação aos critérios existentes para o RIP, com o
que seria considerado ideal para a CAS.
Para terminar, percebe-se esse grupo permeado por um sentimento de
exclusão,
já
que
seus
membros
demostram
não
conhecer
claramente
o
funcionamento do Fundo e não saber como dirimir suas dúvidas (daí o tom de
desabafo da conversa), ou seja, não sabem como proceder com relação ao
FUMPROARTE. Mais do que tudo, pode-se pensar qual é a posição desse grupo
dentro da própria comunidade cultural (alguém diz: “afinal de contas, nós somos
comunidade também”), já que alegam não ter o mesmo “acesso à CAS” que outros,
nem saber qual o caminho a seguir. Também enxergam a CAS como órgão distante
de si (“quem é essa CAS?”, “esses da CAS”), parecendo não identificá-la como parte
da
comunidade
cultural,
a
mesma
de
que
teoricamente
participam.
Ao
FUMPROARTE, é interessante pensar em como maximizar sua relação com a
comunidade cultural, dando resposta ao desafio apresentado por um componente
do grupo, que diz: “vamos ver se agora existe abertura para discutir”.
3.2. Grupo 2
Os componentes do grupo 2 superaram a primeira etapa do concurso (análise
formal), vindo a ser avaliados no mérito, mas não obtiveram financiamento para
seus projetos. Talvez por isso, seu discurso ficou centrado em críticas às exigências
7
Partido dos Trabalhadores, que dirigiu Prefeitura Municipal de Porto Alegre no período 1989-2004.
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10
formais de ingresso e a um suposto favoritismo adotado pela CAS na escolha dos
projetos.
De maneira geral, os componentes desse grupo acreditam que o aspecto
burocrático do concurso, ou seja, as exigências formais para ingresso e também
para prestação de contas, é muito rígido. Semelhante ao Grupo 1, é interessante
observar que, embora tenham vivenciado as exigências legais somente na fase de
elaboração do projeto, tecem várias críticas ao processo de execução do mesmo, ou
seja, à prestação de contas, como se utilizassem opiniões e experiências de
terceiros para manifestar seu descontentamento em relação ao FUMPROARTE.
Consideram a desclassificação de projetos por questões legais (falta de documentos,
erro de cálculo, etc.) um “desperdício de boas idéias”. Chama a atenção que,
embora tenham superado a primeira etapa do concurso, sentem as exigências
burocráticas como uma “desco nsideração” do FUMPROARTE para com os artistas, e
a desclassificação por erros formais como um “desmerecimento ao seu esforço em
elaborar o projeto”. Um dos membros expressou: “no momento em que um projeto
é rejeitado por um erro de cálculo, me parece que estão ralando alguém, ralando
uma idéia”.
Acreditam que o FUMPROARTE deve ser mais flexível em relação às regras,
“correr mais riscos, acreditar mais no proponente, pois este quer investir tudo em
seu trabalho, diferentemente de outras áreas (não culturais) que visam lucro”.
Quanto à liberação das parcelas do recurso estar vinculada à aprovação da
prestação de contas durante a execução do projeto (situação não vivenciada por
eles), afirmam que “a distribuição de verbas deve ser feita com mais generosidade
e menos desconfiança”, e “acho que tem que vir uma verba e não precisa ser tão
burocrático, comprovar cada prego, cada tudo”. Neste sentido também discordam
da exigência de definição prévia dos custos, pela possibilidade de defasagem dos
valores no momento de sua execução.
Esses discursos defendem que a intenção de implementar um projeto artístico
deve ser apoiada integralmente pelo FUMPROARTE, independente de previsões de
custos e prazos e de acompanhamento da execução do projeto. Acreditam existir
uma especificidade na arte e no fazer artístico que justificaria a implantação de
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11
outra lógica de funcionamento do Fundo, ou seja, que o FUMPROARTE, por ser um
Fundo de cultura, deveria renunciar ao controle burocrático. Como no Grupo 1,
aparece a tendência de personalizar a relação do proponente/contribuinte com o
poder público, e as sugestões gravitam em torno da idéia de que o FUMPROARTE
altere seu funcionamento para atender, caso a caso, as necessidades de cada
proponente: a CAS avaliar o mérito antes da parte legal; o FUMPROARTE avisar o
proponente dos erros para que estes possam ser corrigidos e o projeto possa seguir
concorrendo, ou ainda, a planilha de custos ser mais flexível, podendo ter seus
valores atualizados durante a execução. Segundo alguns membros do grupo, estes
procedimentos
evitariam
que
projetos
interessantes
fossem
eliminados
ou
sofressem defasagem de custos, “já que os artistas em geral não são especialistas
em questões burocráticas”.
Essas críticas contundentes com relação à questão legal podem indicar a
insatisfação dos participantes por terem se submetido à etapa obrigatória dos
trâmites
burocráticos,
considerada
árdua
e
dispensável.
Neste
sentido,
é
interessante observar que o segundo assunto mais discutido pelo grupo referiu-se a
suposto s favorecimentos da CAS na escolha dos projetos, surgindo opiniões de que
“sempre os mesmos artistas ganham”, por serem pessoas ligadas à Administração
ou bem relacionados com a CAS. “Quem é conhecido do pessoal tem mais
facilidade, porque já tem um trabalho que o pessoal simpatiza mais” ou “dizem por
aí que só os peixes ganham o FUMPROARTE”. Questiona-se o porquê de alguns
oficineiros da Descentralização 8 serem também financiados pelo FUMPROARTE, e o
fato de alguns proponentes com projetos aprovados, mas em atraso na sua
execução, terem novos projetos financiados pelo Fundo. Um componente diz que
alguns proponentes encontraram uma “fórmula” que garante aprovação, que
consiste, por exemplo, em propor peças de teatro com custo baixo, em lugares
pitorescos ou inusitados; outra pessoa sugeriu que a CAS reconsidere o que acredita
ter sido o critério adotado para a não seleção do seu projeto, qual seja, o fato do
proponente “ter condições de realizar seu projeto independente do apoio do Fundo”.
8
Artistas que ministram oficinas das diversas especialidades artísticas no âmbito do projeto de Descentralização da Cultura,
promovido pela SMC.
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Observa-se que o tom dos discursos é de indignação e de sentimento de exclusão,
conforme demonstram as seguintes manifestações: o Fundo “tenta aparentar
seriedade através da burocracia exigida”, mas se contradiz ao financiar sempre os
mesmos artistas – “Eu acho que nem todo mundo entra todos os anos... as pessoas
têm paciência e saco de fazer isso uma ou duas vezes, a não ser o Vitor Ramil, que
todo ano entra, todo ano ganha”. O sentimento de exclusão também fica
evidenciado na fala: “eu me sinto discriminada pelo FUMPROARTE, e por essa
questão toda, lamentavelmente, adoraria fazer parte...”
O inconformismo causado pela “rejeição” de seu trabalho artístico pelo
FUMPROARTE trouxe à tona comentários sobre conceitos de arte e cultura. Um
membro questiona o julgamento feito pela Comissão – ao não aprovar projetos que
apresentam ênfase em áreas como saúde e educação, por não serem co nsiderados
estritamente artístico-culturais – afirmando: “se cultura não é o conjunto de hábitos
e costumes de uma sociedade, eu não sei o que é”.
Surgiram críticas à CAS, direcionadas ao fato de seus membros julgarem
qualquer projeto, independente de sua área de conhecimento (acreditam que a
especificidade das áreas culturais exige segmentação do júri por especialidade). Um
componente defendeu inclusive a necessidade de uma super-especialização do
julgador – para julgar música nativista9 , somente músico especializado neste estilo
musical. Outras questões apontadas foram a ausência de representantes de
algumas áreas, a importância e responsabilidade do cargo de avaliador, que não
deveria ser encarado somente como um “bico”, visando receber os jetons
correspondentes à participação. Também apresentaram a sugestão de que o júri
mude a cada ano, não ficando claro se esta opinião demonstra o desconhecimento
do processo de eleição dos membros da CAS, ou se refere aos representantes do
poder público, indicados pelo Gabinete. Quanto ao desempenho destes, houve
comentários relacionados à não especialidade de um dos membros na área julgada
e os critérios utilizados para o julgamento.
Para evitar “favoritismos” e trazer “neutralidade e isenção” ao processo de
seleção dos projetos, acreditam como ideal trazer críticos de fora de Porto Alegre
9
Termo utilizado para definir certo gênero de música regional do Rio Grande do Sul.
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13
para compor a Comissão. Não houve comentários sobre a responsabilidade e
oportunidade da comunidade cultural porto-alegrense eleger dois terços dos
representantes da CAS.
Com relação à profissionalização e custos do projeto, acredita-se que o
FUMPROARTE é um Fundo de Cultura e por isso não deve pagar baixos cachês aos
artistas. Houve críticas a cortes nos custos dos projetos, realizados pela Comissão,
considerados excessivos e não fundamentados em análise de preços de mercado, o
que acreditam provocar um “subfaturamento” do valor artístico, especialmente dos
cachês. Afirmam que cada área artística tem sua especificidade, o que exige uma
análise de custos diferenciada, e que dentro da mesma área também existem níveis
de complexidade diferentes que devem ser observados. Segundo um componente, a
pessoa mais qualificada para prever custos de mercado no projeto não seria o
artista, e sim o produtor cultural. Parece existir a noção de que ao artista cabe
somente criar, produzir arte, não precisando se envolver em nenhuma outra etapa
do processo (trâmites legais, ele ições, etc.). Um dos componentes afirmou ter
conhecimento de que alguns proponentes prevêem itens supérfluos na planilha de
previsão de custos, ou custos superfaturados, onde embutem os 20% de sua
responsabilidade na parte concernente ao FUMPROARTE. Contrapondo-se a esta
opinião, surgiram outras falas afirmando que o Fundo serve para “valorizar e
profissionalizar as áreas culturais”, que “a gente geralmente trabalha por um valor
inferior ao que nós merecemos” e “vamos receber como gente grande já que a
gente trabalha como gente grande”.
Embora não diretamente ligada à experiência vivida pelos participantes do
grupo, surgiu no debate a questão da divulgação e distribuição dos produtos
culturais financiados pelo FUMPROARTE, considerada difícil em função do mercado
restrito e do não envolvimento do Fundo nas etapas de “pós-produção”. Afirmam a
importância da CAS aprovar custos com mídia para divulgar os projetos, para que
estes realmente atinjam o público e não sirvam somente “à vaidade do artista em
dizer que gravou um disco ou fez uma exposição”. Reforçam que, se o produto
cultural não atingir a população, o investimento no projeto caracteriza “desperdício
de dinheiro público”. Outro fato apontado, e considerado contraditório por um dos
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componentes, é a exigência da inclusão da logomarca FUMPROARTE no produto
cultural “para divulgar o Fundo”, já que acreditam que a Comissão veta “custos para
mídia nos projetos”, item considerado pela CAS “dispensável”. Também reivindicam
que o FUMPROARTE não se restrinja a cumprir o que foi previsto no projeto e sim
amplie seu apoio na divulgação e ampliação do mesmo, promovendo outros shows
ou apresentações ao longo do ano, no estilo “Festival FUMPROARTE”. Um dos
componentes do grupo, referindo-se à área das artes cênicas, diz que o
FUMPROARTE deveria investir em um “trabalho de continuidade”, em “teatro de
pesquisa”, através da disponibilização de mais recursos para os atores e
companhias, o que possibilitaria o desenvolvimento de um trabalho coletivo a longo
prazo. Enfim, solicitam que o poder público amplie as formas de apoiar as áreas
artístico -culturais.
Surgiram também comentários sobre a relação público e resultados, ou seja,
se uma grande afluência de público é parâmetro de efeito positivo do trabalho
artístico -cultural, e se caberia ao FUMPROARTE financiar projetos que garantam
afluência de grande público, quantitativamente, ou projetos que podem ser mais
restritos em termos de público, mas que visem a formação de hábitos culturais.
A falta de compreensão sobre como as pessoas conseguem aprovação de
seus projetos é explicada pelo “favorecimento a determinados artistas”, “escolhidos”
para integrarem o “seleto grupo”. “Eu tinha me proposto anteriormente a não
participar mais do FUMPROARTE, porque claro, tu fazes um projeto, tu não entras,
tu fazes dois, tu não entras, tu ficas magoada realmente, porque tu acreditas
naquilo que tu estás fazendo”. A tônica dos discursos poderia ser sintetizada através
da fala de um dos participantes: “até agora, nunca foi bom para mim, e eu lamento
muito, porque eu gostaria de, realmente, fazer parte desse seleto grupo de pessoas
que recebe alguma coisa e que pode fazer [o projeto]”.
Percebe-se que, apesar da maioria das pessoas se posicionar criticamente em
relação aos assuntos, levantando os mais variados problemas em relação ao Fundo
e sugerindo caminhos para solucioná-los, não se consideram como possíveis
agentes de mudança. Ao contrário, em seu discurso transferem ao poder público, no
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caso o FUMPROARTE, a responsabilidade de encaminhar a solução para os
problemas detectados.
3.3. Grupo 3
O Grupo 3 expressa opiniões bastante moderadas em comparação aos dois
anteriores. Observa-se que seus integrantes possuem maior informação, talvez por
já terem vivenciado o processo de avaliação dos projetos até a última etapa.
Questionam o funcionamento do Fundo, mas propõem, ao mesmo tempo, melhorias
e desafios, querendo aprender mais, para realizar melhores projetos. Aceitam a
burocracia e a lei como partes do processo, não diminuindo a importância dessas no
processo de seleção ou de execução dos projetos. Demonstram, portanto, interesse
em aprimorar seu trabalho e sua relação com os procedimentos que não são “arte”.
Neste sentido, um componente diz que o FUMPROARTE criou uma
profissionalização que não existia, propiciando ao artista realizar um trabalho que o
mantenha financeiramente. Acrescenta, porém, que o Fundo não torna ninguém
profissional, somente favorece que isso ocorra.
Com relação às dificuldades em elaborar o projeto destinado à apreciação da
CAS, foi exemplificado que, ao fazê-lo direcionado à avaliação multidisciplinar, ou
seja, mais “criterioso”, “explicativo”, “didático” e “com menos termos técnicos”, o
mesmo ficou claro para a Comissão. Tal atitude demonstra plena aceitação com
relação ao seu caráter multidisciplinar. Porém, a maioria do grupo propõe que as
áreas sejam avaliadas pelos respectivos especialistas, dizendo que tal medida
favoreceria cada área em específico. Opinam pela div isão das áreas culturais por
Edital, facilitando o processo de análise, pois seriam avaliados projetos somente de
algumas áreas, implicando em menor número de projetos inscritos por edital.
O grupo também reclama que a verba é restrita e que a aprovação de
projetos muito caros torna a disputa entre as diversas áreas desigual.
Com relação aos aspectos formais do projeto, um dos componentes diz que,
especificamente no caso do cinema, há maior “dificuldade em montar uma planilha
de custos correta”, considerando os projetos desta área mais complexos do que os
demais. Sobre os aspectos burocráticos, opinam que a existência de determinados
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16
itens no Edital, como Justificativa e Objetivos10 , propiciam melhor avaliação por
parte da Comissão, sendo portanto pontos positivos, e não exigências infundadas do
FUMPROARTE. Não consideram a burocracia um empecilho à elaboração dos
projetos, bastando seguir o Edital para obter sucesso e alcançar a próxima fase de
avaliação. “As pessoas falam em burocracia imensa e descomunal porque não
querem cumprir o Edital, e aí responsabilizam o FUMPROARTE”. Um dos
componentes considera que existe certo grau de dificuldade na elaboração do
projeto, mas que as reclamações contra o Fundo provém da frustração de pessoas
cujos projetos foram desclassificadas na primeira fase.
Com relação à prestação de contas, sugerem um manual de rotinas1 1 ,
semelhante ao manual para preenchimento do edital. Foi dito que “a prestação é
trabalhosa, mas não impossível”, e que um manual contribuiria para a formação de
produtores executivos, (profissionalização) e maior familiaridade por parte do
artista com relação à parte burocrática, “pois se ele errar não tem desculpa”, ao
mesmo tempo em que livraria o artista da “pecha” de só pensar em arte e não se
envolver em questões burocráticas.
O grupo é unânime na posição sobre a distribuição/divulgação dos produtos
culturais, pontuando a questão como um dos grandes problemas do FUMPROARTE.
Debatem sobre o papel do Fundo e sua abrangência; se deve ou não contemplar a
etapa de pós-produção. Dizem que a implantação de tal política por parte do Fundo
se faz necessária, requerendo que o mesmo assuma a “paternidade” dos projetos
financiados; ao mesmo tempo concluem que o FUMPROARTE não tem interesse em
participar dessa etapa, considerada por todos tão difícil.
É geral a idéia de que cabe ao Fundo divulgar os trabalhos “pois estaria
divulgando-se por conseqüência”, sendo corrente que a pós-produção “não pode”
ser feita pelo artista, devido às inúmeras dificuldades enfrentadas, como:
desconhecimento do processo de produção, inabilidade, incapacidade e falta de
prática, além dos fatores externos ditados pelo mercado e pela cidade, com sua
limitada capacidade de absorção de produtos culturais. De acordo com os artistas,
10
11
Este item deixou de ser exigido pelo Edital do concurso.
O manual para prestação de contas se encontra disponível desde junho de 2001.
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17
esta divulgação inclusive facilitaria ao proponente a aquisição dos 2 0% restantes, já
que poucos conhecem a “marca” do órgão financiador FUMPROARTE.
Como outra alternativa, um dos componentes propõe que o FUMPROARTE
condicione a aprovação de projetos à realização de atividades junto a escolas,
igrejas, centros comunitários e Coordenação da Descentralização, o que seria uma
forma do proponente “circular” seu trabalho. Outra opinião expressa que tais
atividades são de responsabilidade do proponente, elaborando projetos que tenham
alcance de público.
A divulgação/distribuição é com certeza uma demanda importante da
comunidade cultural, mas que extrapola os limites do FUMPROARTE. Por mais que
este se disponha a trabalhar com a pós-produção dos projetos, tal tarefa é demanda
para uma política cultural mais ampla da cidade.
A CAS é o principal foco do debate no grupo. Acredita-se que a Comissão
“não vê com bons olhos” a previsão de gastos com produtores para gerenciar a
parte formal do projeto, pois tem interesse que “o proponente se dedique ao
projeto”. Discordam desse ponto de vista, alegando que tal produtor se faz
realmente necessário para que o proponente possa se dedicar à arte.
Opinam também sobre a pouca qualificação da CAS, alegando que:
-
O caráter multidisciplinar da Comissão favorece o julgamento com base
em opiniões pessoais, privilegiando projetos de artistas reconhecidos, não
analisando o mérito do projeto em si;
-
o grande número de projetos impede uma boa apreciação, por isso,
pedem por uma Comissão mais numerosa, além de no mínimo dois dos
três relatores serem da área específica do projeto;
-
o relator não leva em consideração a dificuldade do mercado cultural,
quando não aprova projeto de proponente que já tenha recebido outro
financiamento;
-
o membro da CAS que julga os projetos de sua área pode sofrer de
“excesso de especialismo”, ou seja, tornar-se ‘bitolado’ ou refratário a
quaisquer inovações artísticas (esta opinião contraria a idéia de que a uma
maior especialização irá qualificar a CAS).
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18
Exemplificam as colocações com “falhas cometidas por membros da CAS”
possibilitando-nos dividir as idéias apresentadas entre as que implicam em
mudanças no funcionamento do Fundo, daquelas que só podem ser resolvidas
através da melhor organização da comunidade cultural.
Ao mesmo tempo em que chamam a atenção para a falta de qualidade da
CAS, demonstram grande desconhecimento quanto ao processo da eleição. Um dos
membros reconhece a precariedade da mobilização da comunidade cultural, que
representa a maioria da Comissão: “a gente fica falando dessas pessoas, mas elas
estão lá porque eu não quis ir, ou porque tu não quiseste ir. A gente fica falando,
mas na hora de ir quem é que não vai querer concorrer e vai querer analisar?”.
3.4. Grupo 4
O grupo 4 foi formado por membros e ex-membros da Comissão de Avaliação
e Seleção (CAS) do FUMPROARTE, eleitos pela comunidade cultural ou indicados
pela SMC. Portanto, seus componentes têm um forte grau de inserção no
processo 1 2 . Tal característica contribuiu para um posicionamento firme não só em
relação a pontos considerados estratégicos, como o montante da verba para
financiar projetos e questões específicas da própria Comissão, mas também em
relação ao modelo de funcionamento do Fundo, que é considerado exemplar para
outras esferas públicas.
Quanto a esta questão, um dos integrantes do grupo acredita ser o
FUMPROARTE o mais aperfeiçoado mecanismo de financiamento cultural existente
no país, por sua “independência” e “transparência”, e também pelo fato de que a
própria comunidade cultural tem poder decisório na escolha dos projetos: “Todo o
processo é aberto... Eu vejo por outros conselhos de julgamento, qualquer outro, é
totalmente fechado, tu não vais ter nunca a possibilidade de ficar sabendo o que
está acontecendo, e eu acho isso maravilhoso”. Outra opinião nesse sentido: “No
FUMPROARTE, [é] a comunidade cultural distribuindo verba para a comunidade
cultural, monitorada pela comunidade cultural”.
12
Um dos integrantes do grupo chegou a participar do processo de criação do FUMPROARTE, em 1993.
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19
Considerando as características democráticas da constituição do Fundo, (dois
terços da Comissão composta por representantes da comunidade cultural, reuniões
abertas, acesso aos pareceres), comentam que possíveis críticas existentes sobre
um
suposto
“clientelismo”
ou
“favoritismo”
no
FUMPROARTE1 3 ,
advém
do
desconhecimento do processo ou de “maledicências”, que devem ser rebatidas
através de maior divulgação e esclarecimento sobre seu funcionamento.
Embora os participantes enfatizem a importância do FUMPROARTE no
fomento à cultura de Porto Alegre (um deles acredita possuir “impacto” superior ao
produzido pelas Leis de Incentivo à Cultura 1 4 ), consideram que uma de suas
grandes “fragilidades” é o montante de recursos disponibilizado para financiamento,
que não consegue acompanhar o aumento quantitativo e qualitativo dos projetos
que concorrem a cada edital. Afirmam que, embora os critérios de escolha dos
projetos pela CAS sejam “a seriedade, o comprometimento, o embasamento e,
acima de tudo, o seu mérito”, a limitação do recurso total do FUMPROARTE
condicionou uma espécie de “teto de financiamento” (falam em “até R$ 50.000”) ao
qual os proponentes procuram adequar o valor de seus projetos, prejudicando ou
desmotivando a participação de projetos de maior custo. Quando estes concorrem,
são analisados com especial critério pelos membros da CAS, pois acredita-se que
devam justificar a não aprovação outros, mais baratos: “É natural que se aumente a
exigência, quer dizer, na medida em que o projeto é maior,... a complexidade dele é
maior, então aumenta a exigência na hora de tu analisares”.
Apesar deste cuidado, um participante lembra que nenhum projeto é
desconsiderado somente por ter um custo elevado, pois “quando o mérito é bom e
ele está caro, é feita uma proposta de que se abaixe o preço, e o proponente aceita
ou não”. Observa-se que este grupo, à semelhança de todos os outros, também
admite a existência de um “teto”, embora afirme que este resulte não de uma
orientação explícita, mas sim de uma “prática” que foi se estabelecendo em função
da verba disponível. Entendem o “teto” como um dos critérios “a considerar” na
13
Alguém diz ter ouvido boatos do tipo: “somente são aprovados projetos que possuam alguma ligação com o PT”, ou “é preciso
pagar para que o projeto seja aprovado”.
14
Designação genérica dos atuais sistemas brasileiros de financiamento à cultura por patrocínio privado incentivado
mediante renúncia fiscal de impostos federais ou estaduais.
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20
avaliação dos projetos. Defendem a necessidade de se rever esta prática, através
do aumento do recurso a ser disponibilizado.
Sugerem então alternativas para aumentar a verba, seja por decisão política
da própria PMPA ou pressão da comunidade cultural, através de instâncias culturais
como o Conselho Municipal de Cultura 1 5 e o Orçamento Participativo 16 . Esta última
alternativa é considerada a mais viável, embora julguem difícil competir com
prioridades como habitação e saneamento. Propõem a realização de pesquisas de
análise da inserção e importância do FUMPROARTE nas ações culturais em Porto
Alegre, com o intuito de respaldar e legitimar um maior aporte de recursos ao setor.
Outras sugestões apontadas exigiriam uma parceria do FUMPROARTE com a
iniciativa privada, esta doando recursos que seriam distribuídos pelo Fundo entre os
projetos, com possibilidade de abatimento no imposto. Também surgiu a idéia do
FUMPROARTE montar e divulgar uma espécie de “balcão” de projetos aprovados
com o objetivo de captar patrocínio, em troca oferecendo às empresas a
possibilidade de associar seu nome aos projetos.
Com relação à proposta de aumento do recurso atual do FUMPROARTE houve
comentário de que esta alternativa também tem limitações a longo prazo, e que por
isso o ideal seria que outras esferas do poder público (outros Municípios, Estado e
União) adotassem o modelo de financiamento direto, o que ampliaria as opções de
financiamento aos artistas.17
Neste grupo, o tema “verba” aparece acompanhado de várias sugestões que
incluem desde a participação e o comprometimento da comunidade cultural, o
aumento do recurso público pelo poder público e/ou a participação da iniciativa
privada. Também se observa a ampliação do debate sobre política cultural para
além das fronteiras do FUMPROARTE e do próprio Município de Porto Alegre.
15
Conselho de representação mista, nos moldes da CAS (governo e comunidade organizada) que tem a finalidade
de formular políticas públicas para a cultura no Município.
16
Sistema de discussão, formulação e acompanhamento da execução orçamentária do Município de Porto Alegre
diretamente pela população reunida em plenárias e conselhos de delegados, implantada na gestão do Partido dos
Trabalhadores.
17
Alguns Municípios do Estado, como Caxias do Sul, implantarem fundos nos moldes do FUMPROARTE. Na gestão
de Olívio Dutra (1999-2002), o Governo do Estado do Rio Grande do Sul obteve do Legislativo a aprovação de Lei
autorizando o funcionamento do FAC - Fundo de Apoio à Cultura, de formato semelhante, mas que nunca entrou
em funcionamento.
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21
Sobre a crescente qualificação dos projetos concorrentes a cada edital, foi
comentado que esta deve ser creditada às exigências legais que possibilitaram a
realização de espetáculos e produtos culturais “cada vez mais elaborados ao longo
dos anos”, ou seja, possibilitaram uma crescente profissionalização do mercado
cultural. Apesar das queixas de alguns segmentos artísticos em relação ao aspecto
burocrático do FUMPROARTE, colocam que “é a forma de poder avaliar, nós
precisamos saber como esse projeto v ai ser executado e se ele é realmente passível
de ser executado”. Dizem que graças a ele os proponentes elaboram o projeto
pensando na viabilidade, pois depois precisam prestar contas de sua realização, o
que “dá segurança” aos componentes da CAS em suas escolhas. Defendem a idéia
que o fazer artístico deva conciliar “o sabor de aventura” da arte com o cuidado em
formular um projeto com objetivos, metas e resultados consistentes e exeqüíveis.
Alguém expressa a seguinte opinião: “Vamos ser artistas no produto, mas não na
forma de fazer o produto”.
Surgiram também discussões sobre se a ação do FUMPROARTE deveria ser
diretiva, com o intuito de incrementar as áreas culturais mais carentes. Um membro
sugeriu a elaboração de pesquisas para detectar as necessidades de cada área
cultural, que embasariam as Coordenações da SMC e Conselho de Cultura para
indicarem ações específicas a serem implementadas pelo Fundo, com o objetivo de
sanear deficiências. Contrapondo-se a essa ação, outros reafirm aram o caráter nãodiretivo do Fundo, que financia os melhores projetos apresentados a cada edital,
independente da área cultural estar desenvolvida ou não: “O FUMPROARTE é um
Fundo que vai ser dividido entre os melhores projetos apresentados... nós não
podemos criar projetos, nós temos que julgar os melhores”.
Um dos componentes citou como exemplo a área da dança, que tem poucos
projetos aprovados pelo FUMPROARTE porque participa quantitativamente menos do
que outras áreas, e tem muitos de seus projetos desclassificados ainda na primeira
fase do concurso. Segundo ele, isso demonstra de alguma maneira o grau de
(des)organização da comunidade cultural, pois quanto mais organizada a área, mais
apresenta projetos e, sobretudo, mais se apropria e participa do processo de
escolha dos membros da CAS.
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22
Também nesse grupo a CAS foi o assunto mais discutido. Um dos
participantes a considera “o primeiro, e na verdade o único mecanismo permanente,
renovável, representativo ao mesmo tempo da comunidade cultural e do governo,
que tem a possib ilidade de discutir a cultura de um município como um todo e, ao
mesmo tempo, de gerar investimento direto”.
Consideram que a grande fragilidade do FUMPROARTE, mais significativa que
a pouca verba disponível, é “depender demais das pessoas” que estão fazendo parte
da CAS em dado momento, e isso significa que “uma determinada área que está
desorganizada, num determinado momento passa a ser sub-representada, o que
pode gerar distorções que vão se refletir necessariamente no resultado da seleção”.
Falam sobre a necessidade de qualificação da CAS, considerando que a única
maneira de consegui-la é através da organização das áreas culturais. Abordam
então a participação das entidades culturais no processo, afirmando que algumas
sequer vivenciam o processo eletivo, e outras não renovam nomes, chegando a
indicar seus funcionários (por exemplo, a secretária da instituição). Diante do
pequeno número de entidades participantes no processo eleitoral, perguntam -se
sobre qual o papel do poder público, se este deve ou não “aparelhar” as reuniões,
instigando a comunidade cultural a uma maior participação no processo. Voltam
então a considerar que cabe à comunidade cultural a tarefa de se organizar para ser
bem representada na Comissão. Em relação ao descaso de alguns seto res, alguém
afirma : “parece que o pessoal não entende que isto é um direito bárbaro que a
gente recebeu... e que a área da gente está tendo a possibilidade de ser
representada... e o que eu ouço é: meu valor de parecer é mais alto do que isso, ou
por este valor não saio de casa” (relativo à questão do jeton).
Questionam se o FUMPROARTE convida a todas entidades ou se caberia a
estas
a
iniciativa,
ou
seja,
manifestam
dúvidas
sobre
a
quem
cabe
a
responsabilidade sobre as eleições1 8 .
18
Nos artigos 16 e 17 do Decreto Nº 10.867, que regulamenta a Lei Nº 7.328 de criação do FUMPROARTE, consta que a Secretária
Municipal da Cultura tem a atribuição de publicar em jornal de grande circulação a convocação para a eleição dos 12 representantes
do setor artístico-cultural. As entidades culturais, para integrar o colégio eleitoral, deverão cadastrar-se na Secretaria Municipal da
Cultura, que tornará pública a relação dos credenciados antes da reunião de eleição dos representantes, cabendo à Secretária a
homologação do cadastro.
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23
Quanto às queixas que dizem escutar da comunidade artística, pelo fato da
CAS ser uma Comissão multidisciplinar, (considerada por um dos integrantes como
extremamente positiva), sugerem a ampliação do número de membros especialistas
– 2 ou 3 da área de cada projeto – com o objetivo de qualificar a seleção. Outra
alternativa seria encomendar parecer a especialista que não participa da CAS, ou
então o próprio relator aprofundar-se na área a ser julgada, através de pesquisas
em livros e na internet. Um dos integrantes opina que para poder realizar a tarefa
de maneira qualificada, os representantes escolhidos pela comunidade cultural
“devem ter certa condição” para entender e corresponder às exigências da
atividade.
Quanto às dificuldades enfrentadas no exercício da função, referem -se
sobretudo à falta de tempo para análise de todos os projetos concorrentes à seleção
final (muitas vezes se confia somente na opinião do relator ou na folha-resumo do
projeto, como subsídios para a votação). “Fica a vontade de conhecer mais
determinados pro jetos. Isso dá uma certa insegurança, uma certa angústia na hora
de ir para a final com um projeto que pode parecer muito bom e você está
confiando, claro, no relator, nos três relatores ou quatro até, mas fica aquela idéia
muito vaga para a gente”.
Como sugestão para maior conhecimento dos projetos não relatados, avaliam
a possibilidade de se inteirarem dos mesmos antes da seleção final, o que
demandaria mais tempo e dedicação (poderia-se, porém, gerar um caráter de
“funcionário do FUMPROARTE” aos membros da CAS, o que consideram não
recomendável). Outra idéia seria estabelecer uma reunião privada e prévia à
seleção final, para discutir os projetos, o que contraria o caráter “aberto” e
“democrático” do Fundo, que é bastante valorizado. Observa-se que os membros
deste grupo expõem suas dificuldades enquanto ocupantes da função de avaliadores
dos projetos do FUMPROARTE, e admitem a questão da subjetividade e possível
falibilidade da avaliação, independente de quem for o julgador.
Por fim, consideram necessária uma maior divulgação e visibilidade dos
trabalhos financiados pelo Fundo, e da própria marca FUMPROARTE. Um membro do
grupo diz: “uma das coisas mais importantes que falta para o FUMPROARTE é
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cacarejar depois de colocar o ovo”. Ainda em relação à divulgação, comentou-se a
pertinência e utilidade dos cursos de formulação de projetos que estão sendo
ministrados sistematicamente pela Gerência do Fundo, por possibilitarem a
participação de pessoas com “qualidade artística em potencial”, mas que não são
profissionais da cultura.
O grupo foi bastante objetivo na definição dos assuntos considerados cruciais
para o aperfeiçoamento do FUMPROARTE: aumento de verba e qualificação da CAS.
Interessante partir da própria CAS a reflexão sobre seu papel e importância, e as
dificuldades que advém da função de membro da Comissão. Chama também
atenção a necessidade de maior visibilidade dos trâmites do processo eleitoral à
própria comunidade cultural, o que poderia qualificar o processo.
Discutem
a
quem
cabe
as
responsabilidades
para
a
melhoria
do
FUMPROARTE, chamando a atenção o papel assumido – ou a ser assumido – por
alguns setores da comunidade cultural, e a atuação do poder público na condução
da política cultural.
3.5. Grupo 5
O grupo 5 é formado por pessoas com uma trajetória profissional consolidada
e visibilidade no cenário cultural de Porto Alegre. Cabe acentuar que todos os
participantes concorreram ao financiamento do FUMPROARTE, sendo que alguns não
tiveram seus projetos aprovados; o que fez surgir comentários embasados pelas
mais diversas percepções do Fundo e de sua importância para a cidade. As
discussões aqui centram-se em Verba, CAS e Divulgação/Distribuição.
A maioria do grupo procura deixar claro que, mesmo com as críticas que
possam surgir (ao longo do debate), as qualidades do FUMPROARTE sobrepõem-se,
por ser uma política de incentivo com funcionamento “aberto, democrático e
transparente”. Parece existir uma certa homogeneidade nas opiniões desse grupo,
embora um dos componentes faça o contraponto, utilizando-se de falas agressivas,
justificadas com a expressão: “também o FUMPROARTE é agressivo com os
artistas”.
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25
Muitos salientam a importância do Fundo, mesmo observando que este não
está contemplando as expectativas da classe artística, principalmente com relação à
verba disponível. Um dos participantes diz que, levando em conta o orçamento da
Prefeitura, a verba destinada ao Fundo é “pobre”, sendo consenso que essa quantia
não se justifica quando se gasta o dobro somente com o Porto Alegre em Cena1 9 .
Também é dito que o processo de escolha dos projetos acaba sendo uma “briga
democrática - porque supostamente é para todos - por migalhas”. Afirmam que a
verba é incompatível com o número de projetos concorrentes (dizem que o número
de projetos aumentou, a verba estagnou e o dólar subiu). Outro comentário é que a
verba restrita é uma questão política e “não de caixa da Prefeitura”.
Ocorre, a partir daí, um debate sobre a questão do proponente ter que arcar
com 20% do custo do projeto. Surgiu a opinião de que o projeto deveria ser
financiado integralmente, já que a parte que cabe ao proponente costuma ser
embutida em itens do projeto que, na prestação de contas, são comprovados com
“notas frias, para justificar serviços não realizados”. A mesma pessoa diz que o
proponente “é obrigado a dizer que tem uma contrapartida de 20%, quando na
verdade ele tem que buscar essa contrapartida de diversas mane iras”. Outro
discorda, dizendo que a intenção do poder público é propiciar ao artista uma relação
com o mercado e o conhecimento de outras formas de captação de verba, fazendo
com que o mesmo “batalhe e sinta-se responsável” por seu projeto.
Ainda sobre verba, reconhecem a existência de uma política informal da CAS
que criou um “teto” de financiamento, privilegiando projetos de menor custo, “não
levando em conta a qualidade e o retorno público dos mesmos”. Um componente
observa a “tentativa de implantação” desta política ao longo das últimas edições,
dizendo que “a CAS tem de tomar cuidado para não estabelecer este critério na
cabeça dos proponentes”. De acordo com muitas outras opiniões (deste e de outros
grupos), tal critério já está estabelecido, e os proponentes já se adaptaram a estes
valores.
Foi ressaltado que os custos mais baixos se tornaram referência para os
demais, estabelecendo os parâmetros com relação aos “valores de mercado”, e que
19
Festival de Artes Cênicas, Dança e Música produzido anualmente pela Prefeitura de Porto Alegre.
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tal idéia visa transformar todos os projetos em “R$ 1,99”20 (o componente
denominou essa prática de “lei do imbecil”). Sugere, portanto, que a CAS repense o
que considera “valor de mercado”. Assim como em outros grupos, reivindicam que
os artistas recebam no FUMPROARTE uma remuneração “real” sobre o trabalho
artístico. Reconhecem a necessidade de avaliar “preços de mercado” também para
os itens técnicos. Todos concordam que esse critério informal deve ser revisto,
fazendo com que a qualidade seja o foco de análise, além de proporem reuniões
entre os proponentes e a CAS, antes do julgamento do processo, para que todos
tomem ciência do edital (o “todos” aqui referido parece ser as duas partes em
questão, talvez pedindo por uma medida educativa para a CAS, para que esta não
exija quesitos sobre os quais o próprio Edital não versa). Tal reunião, ao menos
entre a CAS e a Gerência do FUMPROARTE, já existe.
Houve manifestações sobre a necessidade de incrementar os recursos do
FUMPROARTE,
além
de
se
reconsiderar
o
financiamento
a
fundo
perdido
(característica que a longo prazo identificam como um problema). Sugerem a
abertura de uma linha de crédito para projetos que tenham “viabilidade comercial”
(utilizando o PortoSol, instituição de crédito municipal). Parte do grupo acredita que
a Prefeitura deveria ter uma participação percentual sobre a venda de produtos
financiados (verba que reverteria para financiar mais projetos), pois não considera
justo que os artistas recebam o financiamento, o lucro sobre o trabalho (nos casos
em que este existir) e ainda direitos totais sobre a reprodução do mesmo. Um
componente diz que financiar a fundo perdido é uma “boa intenção” que pode
inviabilizar o FUMPRO ARTE, ocasionando uma eterna dependência da comunidade
cultural. Foi sugerido que a parceria Prefeitura-proponente não encerre no final do
projeto, já que pode resultar em retorno financeiro para o Fundo, beneficiando um
número maior de artistas. Observa-se que a maior preocupação deste grupo é com
a continuidade do serviço que o FUMPROARTE presta à cidade.
20
Nome comum adotado por estabelecimentos comerciais que proliferaram no Brasil após o Plano Real (1994),
vendendo somente produtos de baixo custo (“a R$ 1,99”).
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27
Outra parte do grupo fez críticas com relação à linha de crédito, dizendo que
pode vir a dificultar ou até impedir que artistas já conhecidos tenham projetos
financiados (ou seja, o FUMPROARTE considerá-los “auto -suficientes”), além de
inviabilizar a “médio prazo” os projetos que não tenham apelo comercial. Ressaltam
que a dificuldade em financiar projetos artísticos é a mesma para artistas iniciantes
e consagrados.
É interessante observar que os membros do grupo pedem em diversos
momentos para que o currículo seja avaliado juntamente com o mérito dos projetos
(o que é de fácil compreensão, frente à sua posição no mercado cultural), no
entanto, esta não é uma visão unânime. Um membro elogia o trabalho de Vitor
Ramil, ao mesmo tempo afirmando que a falta de qualificação da Comissão é o que
faz com que o mesmo ganhe - “muitas vezes acaba funcionando um mero critério
de reconhecimento de mídia, de reconhe cimento do nome do cara que tá
concorrendo e não do projeto... cito o caso do Vitor Ramil..., que é uma pessoa
admirável, um artista admirável, mas obviamente, quando ele concorre e chega na
etapa final, essa sua trajetória e seu reconhecimento público levam as pessoas que
não conhecem a área da música a votar nele porque é o Vitor Ramil”.
Alguém também expressa que, de acordo com declaração da Secretária da
Cultura, o Fundo tem como objetivo incentivar artistas iniciantes, deduzindo então,
que os que têm experiência e currículo não terão oportunidade – “tu não podes ter
espetáculo caro, tu não podes ter currículo, tu não podes ser artista. Então
chegamos a conclusão de que o FUMPROARTE não é para artistas”. Observa-se que,
enquanto o grupo 1 diz que os artistas sem currículo não são favorecidos - “são
sempre os mesmos, os queridinhos” - esse grupo, composto pelos que têm
currículo, reclama que são justamente os que não terão oportunidade de
financiamento. Outro membro diz que “é preciso ficar claro que todos precisam do
FUMPROARTE. Até mesmo o Vítor Ramil, tão citado, não conseguiria ter feito quatro
discos se não fosse o FUMPROARTE”.
Assim como no grupo 1, um componente reclama que os projetos são
aprovados muitas vezes por modismos, como as peças de teatro “não sei onde”
(“na rua, em cima das árvores, em cima da Usina, em qualquer lugar,
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28
pendurado...”). Referindo-se aos primeiros editais, diz que qualquer projeto que
falasse em “periferia” era aprovado.
Com relação à prestação de contas, esse grupo apresenta as mais diversas
opiniões. É considerada por alguns componentes como “dolorosa, difícil”, enquanto
outros acreditam ser fácil (alguém diz que “é das mais fáceis”, dando a entender
que conhece a dinâmica de outras formas de financiamento), mas com alguns
detalhes de excessiva burocracia. Ainda existem aqueles que co ncordam com a
existência de um controle rígido, por se tratar de dinheiro público. Manifestam-se,
tal qual o grupo 3, a favor da contratação de contadores, que possam se dedicar à
execução artística do projeto, ou uma cartilha de orientação para a prestação de
contas.
Pode-se entender tais afirmações como pedindo por flexibilidade no processo
de prestação de contas, ao mesmo tempo em que pedem por outros critérios
quando da avaliação do mérito.
Um membro também diz que os recursos administrativos (meio de
contestação que o proponente possui, caso não concorde com o motivo da
desclassificação de seu projeto por erro formal) são “pró-forma”, ou seja, não são
avaliados caso a caso, e supõe que “ao longo da história do Fundo nenhum foi
deferido”.21
Ainda com a perspectiva de que o FUMPROARTE deva manter uma relação
mais longa com os produtos artísticos que financia, sugerem que a CAS aco mpanhe
a repercussão dos projetos (o Retorno de Interesse Público), para ver se realmente
atingiram suas metas, propondo uma avaliação posterior à execução do trabalho.
Outra opinião é que o Fundo condicione a aprovação de um segundo projeto ao
resultado do trabalho anterior, considerando sua repercussão e alcance. Propõem
também que os produtos financiados sejam vendidos por valor inferior “ao de
mercado”, possibilitando maior acesso aos mesmos, e que a Prefeitura “crie” outros
pontos de venda, além da Livraria Ilhota.
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A pessoa diz que foi aconselhada a entrar com recurso para incluir fotocópia da carteira de identidade no projeto e assim passar à
fase seguinte, de análise do mérito. Este tipo de recurso (inserção de documentos após a entrada do projeto no Protocolo Central)
não é permitido.
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Sugerem que a CAS analise o plano de divulgação dos projetos, verificando
sua coerência, já que a divulgação é necessária tanto para o artista quanto para o
Fundo. Um componente do grupo diz que o artista deve criar meios de viabilizar a
produção, e se este não sabe fazê-lo, deveria poder orçar no projeto a contratação
de uma empresa. Não é cogitada a aprendizagem do processo de produção por
parte do proponente.
Discutem então sobre a responsabilidade do FUMPROARTE em constituir uma
política de divulgação e distribuição. Alguns membros acham que o Fundo deve
planejar e financiar a pós-produção, enquanto outros acreditam que deve participar,
ajudando a classe artística, já que esta não sabe como realizá-lo. Outros ainda
dizem que o tema faz parte de uma discussão sobre política cultural mais ampla,
envolvendo a SMC, a SEDAC22 e outros órgãos representativos do Estado, não
sendo diretamente ligada ao Fundo, que já cumpre o papel que lhe cabe.
Debatem sobre a divulgação do acervo cultural financiado pelo FUMPROARTE
estar restrita à Porto Alegre, considerando que esta posição não incentiva a
expansão do processo. Dizem que o acervo deve “aparecer” mais, devendo ser
permitido empréstimo do material e difusão do mesmo dentro e fora do Estado. Um
membro contrapõe, dizendo que o produtor deve ter um certo controle sobre a
circulação de sua obra, devendo definir com o financiador até onde este pode
intervir (havendo um acordo específico para cada caso).
O grupo fala muito sobre a CAS, inicialmente constatando a desorganiz ação e
a falta de representatividade das entidades que compõem a comunidade cultural,
considerando que a falta de qualidade da CAS é falha desta mesma comunidade (a
APTC-ABD2 3 é citada como exceção). É o primeiro grupo (não contando o n? 4, de
membros da CAS, além de uma voz isolada no grupo 3) que assume como sua a
responsabilidade
pelos
erros
e
acertos
da
Comissão
de
Avaliação,
não
responsabilizando unicamente o poder público ou as normas do FUMPROARTE.
Avaliam que o poder público “não tem” outra forma de constituir a Comissão
(falando da composição da CAS: um terço de membros da SMC e dois terços da
22
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Secretaria de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul.
Associação dos Profissionais Técnicos Cinematográficos do Rio Grande do Sul e Brasileira de Documentaristas.
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30
comunidade cultural), e que a própria comunidade deve se instrumentalizar melhor
para contribuir com a qualificação da CAS.
As críticas são muito mais direcionadas a erros individuais de algum
representante do que ao seu funcionamento, demonstrando indignação com a falta
de conhecimento (“falta de qualidade”) de determinados integrantes da Comissão.
Alegam que os membros da CAS utilizam critérios técnicos de forma
“leviana”, pois julgam da mesma forma os custos de projetos diferentes, ou seja,
não possuem critérios claros de avaliação, o que demonstra desconhecimento das
áreas a serem julgadas. Um dos componentes afirma ainda que os membros
compõem uma “comissão de censura” que, de forma “incompetente”, decide quem
deve ou não receber financiamento. Outra reclamação é de que o Fundo não
entende o processo de criação da arte, exigindo que o proponente “planeje tudo e
comprove tudo”, o que impede modificações “necessárias” no espetáculo, mesmo
que seja “48 horas antes da estréia”. O grupo identifica na prática do FUMPROARTE
uma “política cultural informal”, considerada ao mesmo tempo positiva e negativa.
Ao mesmo tempo em que não delimita o campo da arte, possibilitando todo o tipo
de expressão, abre caminho para uma avaliação subjetiva de tais projetos. O grupo
1 também toca na questão da subjetividade existente no FUMPROARTE, ora
negando-a, ora pedindo que seja maior.
Sobre o caráter multidisciplinar da Comissão, dizem que a proposta é válida,
mas es barra, na prática, na necessidade de maior qualificação dos membros, a fim
de entender as especificidades de cada projeto e de cada área cultural. Novamente
comentam que, às vezes, o julgador sorteado acaba votando pelo currículo ou pela
projeção
do
proponente,
ocorrendo
uma
espécie
de
“tietagem”.
Um
dos
componentes diz que o motivo desta “ignorância” é a impossibilidade de saber tudo
de todas as áreas.
Sugerem, portanto, que a CAS tenha um júri especializado (onde cada
projeto seja julgado por pessoas da área), além da segmentação dos Editais por
área, o que facilitaria o julgamento. Alguém posiciona-se contra estas propostas,
perguntando se trazer membros da mesma área realmente qualificaria o
julgamento, enquanto outra aponta que, em um Edital segmentado, cada área teria
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de esperar vários semestres para ser contemplada, além da imensa dificuldade em
definir o valor do recurso destinado a cada uma. Sugerem que todos os integrantes
da Comissão leiam todos os projetos para a seleção final e que o FUMPROARTE
aumente o valor do jeton, “para que pessoas mais qualificadas” e portanto,
supostamente mais atarefadas profissionalmente, possam ser estimuladas a
participar da Comissão. Comentaram que os pareceres devem versar somente sobre
o projeto e citaram observações “desrespeitosas e mordazes” dos membros da
Comissão em relação aos proponentes.
Sobre a dinâmica do Fundo, um membro do grupo diz que não faz sentido
julgar todas as áreas em conjunto, sugerindo sua divisão em vários Fundos (“Fumpro-teatro, Fum-pro-cinema, Fum-pro-música”, etc.), respeitando as diferenças de
cada área.
Embora os componentes do grupo tenham apresentado sugestões ao
FUMPROARTE a fim de aperfeiçoar seu sistema, também percebem a importância da
organização e participação da própria comunidade, especialmente no que diz
respeito à qualificação da CAS. Demonstram consciência de não serem espe ctadores
do processo, mas sim, donos de uma das principais responsabilidades quanto aos
meios e resultados do Fundo, juntamente com o poder público.
4. Considerações Finais
Através dos debates realizados para esta pesquisa e posterior análise dos
depoimentos (transcrição, leituras e depuração dos dados), foi possível delim itar
alguns aspectos principais da relação existente entre a comunidade cultural de Porto
Alegre e o FUMPROARTE, incluindo aí as mais diversas opiniões sobre o
funcionamento do Fundo. A análise observou que, via de regra, as opiniões
decorrem da forma como os participantes se relacionam com o FUMPROARTE, com o
mercado e sua inserção na comunidade cultural.
As considerações finais reúnem quatro grandes temas: Profissionalismo ou
Profissionalização, CAS, Burocracia e Política Cultural. Esta se referindo ora
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especificamente ao FUMPROARTE, ora mais ampla a outros projetos e estratégias
governamentais, reunindo idéias como verba disponível, divulgação, distribuição dos
produtos culturais, inserção no mercado, etc.
Cabe a ressalva de que, enquanto pesquisadores, não podemos nos dizer
isentos de impressões sobre o objeto de pesquisa, ao mesmo tempo em que
almejamos o distanciamento necessário a fim de avaliarmos o material da fo rma
mais imparcial possível. Assim sendo, após o cuidadoso depurar das informações,
reservamos a este espaço algumas considerações a respeito do relacionamento
exposto por esta pesquisa. Um dos objetivos desta foi encontrar caminhos para a
qualificação do processo de funcionamento do Fundo (em todas as suas fases e
considerando todas as instâncias e setores envolvidos), buscando identificar
medidas viáveis para contribuir no aperfeiçoamento da relação “comunidade x poder
público”. Durante aproximadamente um ano realizamos discussões sobre os dados
apresentados e sobre formas de tornar realidade as mudanças propostas,
juntamente com a gerência do FUMPROARTE. A atuação da As sessoria não se
restringiu à apresentação e análise de dados, mas sim em uma interação que viesse
a contribuir com a qualificação tão mencionada neste trabalho. Ao mesmo tempo
em que percebemos uma determinada relação estabelecida, também observamos
realidades passíveis de mudanças. E trabalhamos para mudá-las, afinal, somos ao
mesmo tempo poder público e público da arte.
Encontramos a temática “profissionalismo” inserida em boa parte dos
depoimentos, sob diversos prismas, quando falam dos cachês pagos pelo
FUMPROARTE, que consideram baixos (“quem menos recebe é quem produz
realmente, que é o ator ou a companhia”); da especificidade do trabalho do artista,
que de acordo com muitos não deve englobar o “fazer projetos: programar,
projetar, dir igir, criar [projetos], tem um nome, tem um profissional para isso”; da
falta de responsabilidade dos próprios artistas (“a gente deixa sempre pro último
dia, pra última hora... pra entregar o projeto”) e do desconhecimento do mercado
de arte (seu funcionamento, barreiras, formas de inserção, etc.) por parte do
criador, o que dificulta a execução e divulgação do seu trabalho. Todos almejam
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maior profissionalismo, seja do próximo, seja de si mesmo, seja do poder público,
ou da própria comunidade cultural em que se está inserido.
A CAS foi um dos temas mais debatidos nos grupos. Sua qualificação envolve,
necessariamente, a participação de todos os envolvidos (comunidade cultural e
poder público). Muitas críticas ao seu funcionamento e composição foram feitas,
acompanhadas de sugestões reais de mudança. É possível observar, nas opiniões,
duas vertentes: os que acreditam que os problemas da CAS advêm da forma como
o FUMPROARTE está constituído (multidisciplinariedade da comissão, falta de verba,
excesso de subjetividade) e aque les que vêem dificuldades na falta de qualificação
das pessoas que a compõem, portanto, problema da comunidade cultural e da SMC.
Resta-nos constatar que muito ainda falta para que o procedimento de eleições para
a CAS e da escolha dos projetos seja melhor apreendido, resultando em maior
clareza do processo, participação e engajamento, para que a seguir, sejam tomadas
medidas reais de mudança a seu respeito.
Conforme
exposto pelos grupos ao longo da pesquisa, é necessária uma
maior qualificação da comunidade cultural na sua relação com a CAS. É esta
comunidade que, no FUMPROARTE, tem mais direitos e deveres do que
normalmente teria em outros órgãos de financiamento da cultura: é ela quem
escolhe seus representantes, maioria na Comissão de Avaliação e Seleção. Esta se
auto-regula, ou seja, discute a cada edital seu regimento interno e, finalmente,
escolhe os trabalhos a serem financiados. Diante disso, acreditamos que a
comunidade
cultural
pode
efetivamente
ocupar
o
espaço
que
é
seu
no
FUMPROARTE, mas para s
i so precisa conhecê-lo melhor, para, juntamente com a
Administração Municipal, refletir sobre as mudanças necessárias para maior
qualificação de todo o processo. Com isso queremos chamar a atenção para o fato
de que todos têm o seu papel, e que a comunidade cultural não pode se esquivar do
seu, assumindo uma postura crítica e distante. Foi surpreendente observar que,
apesar de muitas vezes bastante dividida em suas opiniões e desconhecedora de si
mesma, a comunidade cultural, de maneira geral, não reconhece os membros da
CAS como seus representantes.
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O Funcionamento do FUMPROARTE é debatido por todos os grupos, advindo
daí uma das maiores fontes de reclamação: a burocracia. Muitos debates
aconteceram entre nós, inclusive, sobre o que é realmente necessário em termos
legais para que o FUMPROARTE permaneça sério e aberto a todos os artistas. Cabe
dizer que, ao mesmo tempo em que não se pode fugir de certas exigências legais –
necessárias para garantir idoneidade ao processo – serão adotadas, já em função
desta pesquisa, mudanças com relação à parte burocrática.
O FUMPROARTE é subjetivo em sua avaliação de mérito, bem como a própria
arte o é, e negar tal característica é condená-lo a adotar mais regras e normas
burocráticas. É essa “abertura” que muitas vezes é alvo de críticas, mas queiramos
ou não, ser aberto implica em compreender importâncias subjetivas em projetos
culturais com significados e importâncias também subjetivos. A arte o é, os projetos
o são e os avaliadores (em grande parte artistas) com certeza o são. É esta
subjetividade que deve balancear-se com a burocracia de um Fundo cultural que se
utiliza de verba pública e, portanto, tem como responsabilidade prestar contas à
população, tanto com relação aos recursos investidos, quanto à qualidade dos
produtos culturais oferecidos. É sem dúvida uma equação difícil, que esta pesquisa
tem por objetivo expor, já que foram aqui contempladas as mais diversas
percepções sobre a existência do Fundo, a comunidade cultural e a relação existente
entre ambos.
Como último item, algo que perpassa os assuntos aqui expostos: a Polít ica
Cultural em âmbito municipal. Poucos a abordaram de forma direta, mas a maior
parte dos temas discutidos apresentam-se imbricados e deságuam nesta imensa
categoria de análise, sendo possível dizer que todos, de alguma forma, esperam
mudanças nesta política. Quem realmente está a par dos direcionamentos políticos
da cultura na cidade? Foi possível verificar que, mesmo ao perceber a necessidade
da ação, todos têm dificuldades em fazê-lo, não sabendo quando, nem onde, nem
de que forma. O FUMPROARTE representa um dos aspectos da dinâmica cultural da
cidade e, apesar de ter sua visibilidade questionada, é para aí que muitos artistas
direcionam seus anseios e expectativas com relação às mais diversas medidas que
acreditam ser necessárias por parte do poder público.
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Finalmente, cabe ressaltar algo que já foi apresentado no início deste
trabalho, com relação à metodologia de pesquisa: os grupos, mesmo livres de
temáticas limitantes e de mediadore s, concentraram suas falas em torno de um
mesmo grupo de temas, nos possibilitando reunir as proposições em categorias.
Apresentaram, portanto, em sua maioria, as mesmas preocupações e os mesmos
problemas a serem resolvidos. Pode-se a partir daí, considerar determinadas
demandas como relevantes para o meio cultural de Porto Alegre: necessidade de
qualificação da CAS, profissionalização dos artistas, formas de divulgar e distribuir
os produtos FUMPROARTE, além de sugestões que visem tornar o Fundo mais ágil,
etc. Um dos maiores resultados da pesquisa foi a descoberta destas demandas e o
quanto são importantes, já que aparecem tanto nas falas do proponente nunca
contemplado pelo Fundo quanto nas colocações do artista que trabalha e vivencia o
circuito cultural da cidade há décadas.
Diante disso, novas discussões sobre o tema FUMPROARTE devem considerar
as demandas apontadas pela comunidade cultural nesta pesquisa.
É através da análise mais profunda destas reivindicações que devemos,
então, de forma conjunta e ocupando os devidos espaços de poder dentro do
processo, buscar os meios de realização dos objetivos e necessidades, tanto do
poder público quanto da comunidade. Encontrar uma forma de tornar o
FUMPROARTE mais próximo, cada vez mais eficiente e mais voltado às necessidades
de artistas e público – do poder público e do meio cultural – é um dos objetivos
deste processo de debate, que teve início com a criação do próprio Fundo, e que
busca ampliar-se, almejando a inserção cada vez maior da sociedade.
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FUMPROARTE A Visão da Comunidade Cultural de Porto Alegre