EDUCAÇÃO E PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL: UMA RELAÇÃO
INDISPENSÁVEL PARA A SUPERAÇÃO DO FRACASSO ESCOLAR
AMUDE, Amanda Mendes – UEM
[email protected]
SILVA, Gescielly Barbosa da
[email protected]
ARAÚJO, Vanessa Freitag – UEM
[email protected]
MORGADO, Suzana Pinguello - UEM
[email protected]
Área Temática: Teorias, Metodologias e Práticas
Agência Financiadora: Não contou com financiamento.
Resumo
Este trabalho aborda como temática a atuação do psicólogo escolar, tendo como
questionamento central a maneira como o psicólogo escolar deve intervir sobre as queixas e
encaminhamentos referentes aos problemas de ensino-aprendizagem atribuídos ao educando,
na medida em que as explicações dadas para tais problemas são de cunho subjetivo,
individualista, neurológico e familiar, entre outros, o que mostra uma tendência a naturalizar
aquilo que é historicamente determinado. Desta forma, o objetivo central deste trabalho é
fazer pontuações a respeito da postura que o psicólogo escolar deve adotar mediante a
produção do fracasso escolar traduzido pela aprendizagem conceitual não efetiva dos alunos,
tendo como premissa que este fracasso é um produto histórico e não algo individual e
desvinculado da sociedade. Para tanto, será utilizado como referencial teórico-metodológico a
abordagem Histórico-cultural, bem como os autores que compartilham da mesma abordagem
teórica: Boarine, Bock, Facci, Galuch e Sforni, Meira, Nagel, Saviani, Souza, Rego e
Tanamachi, os quais dão respaldo para as análises feitas de que há a necessidade do psicólogo
escolar compreender o fracasso como um produto histórico, que surgiu e se mantém em
função de condições sociais-históricas determinadas, mostrando-se, então, como um reflexo
da sociedade vigente, o que reforça a relevância de uma postura crítica de atuação, por meio
da qual prioriza-se uma análise que supere a dicotomia fracasso escolar- realidade objetiva.
Desta maneira o trabalho também aborda as características dos indivíduos que pertencem a
sociedade capitalista, na medida em que as respostas ao fracasso escolar não são encontradas
no indivíduo, mas sim no seu contexto histórico social; aponta os pressupostos liberais
presentes no dia-a-dia da escola, já que a escola é um sistema menor dentro de um sistema
maior - a sociedade e aborda a produção do fracasso escolar.
Palavras-chave: Educação; Fracasso Escolar; Práxis; Psicologia Histórico-Cultural.
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Introdução
Ao longo da história da educação brasileira o fracasso escolar recebeu diferentes
significados, no entanto pode-se destacar três expressões do fracasso de acordo com Galuch;
Sforni (2008): o fracasso traduzido pela falta de vagas; a reprovação e a evasão como
sinônimo de fracasso e, o fracasso camuflado no sucesso aparente, que marca o momento
atual. De acordo com as autoras, os estudantes até adentram a escola, no entanto a
aprendizagem dos conceitos não se torna efetiva. Não nos cabe aqui, neste artigo, adentrar na
aprendizagem conceitual, sendo assim, quando mencionarmos o termo fracasso escolar
estaremos fazendo menção aos insucessos dos alunos no processo de ensino.
Desta forma, no contexto escolar, a maioria dos encaminhamentos destinados aos
psicólogos refere-se aos problemas de ensino-aprendizado atribuídos a criança, sendo que as
explicações dadas para tais problemas são de cunho subjetivo, individualista, neurológico e
familiar, entre outros. Todas estas justificativas apresentam uma tendência à naturalização
daquilo que é historicamente determinado (SOUZA, 2000).
Por vivenciarmos um período pautado no imediatismo, corre-se o risco de buscar
intervenções e soluções rápidas e práticas para o fracasso escolar, no entanto, serão soluções
não efetivas. Meira (2003) enfatiza a necessidade da postura crítica do psicólogo, que deve
buscar a compreensão deste fracasso como um produto histórico e não como algo individual e
desvinculado da sociedade.
Desta forma, serão abordadas, inicialmente, as características dos indivíduos que
pertencem à sociedade capitalista, na medida em que as respostas ao fracasso escolar não
serão encontradas no individuo, mas sim no seu contexto histórico social. Na seqüência serão
apontados os pressupostos liberais presentes no dia-a-dia da escola, já que a escola é um
sistema menor dentro de um sistema maior, a sociedade. Posteriormente será discutido sobre a
práxis do psicólogo escolar, e por último, será abordado o tema da queixa escolar.
Características da sociedade capitalista
Para que o fracasso escolar seja compreendido e sanado faz-se necessário verificar as
condições materiais nas quais ele surge e se mantém. Sendo assim, serão levantadas as
características de uma sociedade pautada pelo ideário liberal, a sociedade capitalista.
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Este ideário liberal gera na sociedade um individualismo e uma impessoalidade que se
convertem em indiferença, como coloca Boarine (1992), e suscitam uma insatisfação, por
meio da qual ninguém satisfaz ninguém, o que dá lugar a um novo estado de subjetividade
coletiva, a solidão. Nagel (2005) acrescenta ao nosso estudo a banalização da violência
urbana, os conflitos domésticos e o insucesso na escola como os comportamentos atuais que
resultam da liberdade para agir sem limites, sem normas e que dá a cada um o direito de
decidir ou agir de acordo com seu interesse individual.
Nagel (2005) ainda menciona a criação de uma sociedade formada por indivíduos
hedonistas, que buscam o prazer imediato; niilistas, sem perspectiva e visão de futuro,
descomprometidos, desmotivados e não dispostos à refletir; indivíduos alienados;
consumistas, individualistas, que menosprezam as relações humanas, a não ser quando se
torna conveniente; além de banalizarem a morte e a não valorizarem o outro enquanto seu par
social. Pode-se, ainda, dizer que se trata de um individuo pautado no senso comum, que
exclui o conhecimento científico; defende a subjetividade e os estilos pessoais; defende a
idéia de relatividade; enfatiza a diversidade sem limites e nem contradições; convive com a
fragmentação sem contestação; não pensa por idéias, mas por emoções; rejeita normas e
tradições; não estabelece vínculos e compromissos e, não se percebe enquanto ser social,
acreditando ser independente e autônomo da sociedade.
Para exemplificar o que foi dito até agora não faltam exemplos: a TV, a internet, os
games e o sexo como satisfação do prazer efêmero; o assassinato de pais e familiares, os maus
tratos à empregada doméstica confundida com profissional do sexo, o pouco caso dos
políticos com o salário-mínimo, as sub-condições de espera nas filas dos hospitais, os
assassinatos entre as famílias como banalização do outro e da morte. Tudo isto caminha junto
com o sujeito que desenvolve depressões, estados de pânico, irritabilidade, déficit de atenção,
apatia, ausência de motivação para qualquer atividade, além da indisponibilidade para refletir,
fenômenos com os quais a educação está convivendo e estão sendo foco de atenção (NAGEL,
2005).
Liberalismo na escola
Não da para descontextualizar a escola da sociedade na qual está inserida, o que fica
muito visível com a colocação de Nagel (2003, p. 2) de que “do mercado a pedagogia, o
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discurso liberal é incorporado sem constrangimento.” Desta forma, os princípios liberais são
canalizados para a escola e transfiguram-se em métodos, técnicas, recursos, alternativas e
didáticas para o ensino. Na lógica liberal, “o sucesso, ou o insucesso de cada indivíduo é visto
como dependendo diretamente das deliberações íntimas, sem o aconselhamento de terceiros”
(NAGEL, 2003, p. 3). Desta forma, a descontextualização do indivíduo de sua sociedade e de
seu tempo faz desaparecer a consciência do homem como ser social, tendo como didática
contemporânea um ensino centrado apenas no aluno, nos seus interesses e nas experiências
pessoais, na qual a autonomia tem lugar de destaque como pré-requisito para a criatividade,
para o desenvolvimento pessoal e para o sucesso do empreendedor de amanhã. Fica evidente,
aqui, o caráter inconstante do conteúdo científico, na medida em que os conhecimentos são
provisórios, pois se formam por meio de uma construção subjetiva e não significam
apropriação da realidade, todos possuem o mesmo valor e não apresentam diferenças quanto a
qualidade, nem quanto ao seu poder explicativo.
Nagel (2005) explica que a pedagogia liberal tem como pressuposto básico a iniciativa
pessoal, a autonomia intelectual, a liberdade de pensamento, de expressão, de aprender
sozinho e de escolher os métodos, bem como o assunto que interessa a cada um. Desta forma,
o desenvolvimento do aluno é determinado por ele mesmo, respeitando sempre a sua
subjetividade, o que nos leva a perceber a negação de qualquer forma de centralização.
Como pode-se verificar, a escola está impregnada com os valores e conceitos que
embasam a vida do consumidor capitalista, o que traz a conotação direta da educação ser mais
uma mercadoria a venda. Outra afirmação que pode ser feita a respeito da educação, é que
esta está direcionada para a adaptação do homem e não para sua humanização.
Práxis do psicólogo crítico
De acordo com Bock (2000) é comum encontrarmos no discurso psicológico a
atribuição do sucesso e do insucesso na escola ao indivíduo. A pergunta que surge é: Por que
isso acontece? E a resposta é facilmente encontrada quando se faz uma retomada histórica a
cerca do surgimento da psicologia no Brasil. Sendo assim, Facci (2004) nos acrescenta que a
psicologia surgiu atrelada aos interesses do capitalismo, partindo de uma visão organicista,
clínica e psicometrista, que selecionava os mais aptos, depositando no aluno a culpa pelo não
aprender, além de psicologizar as questões educacionais e fazer uso de práticas individualistas
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e ajustatórias com ênfase nos procedimentos remediativos (modelo médico) para solucionar
os problemas escolares.
Nesse sentido, é possível entender que o enfoque clínico utilizado no trabalho de uma
considerável parte dos psicólogos escolares é resultado de uma realidade histórica e social.
Meira (2003) acrescenta ao nosso estudo que este enfoque clínico poderia, ainda, estar
expressando os resultados de uma formação universitária não-crítica e que não estabelece uma
íntima relação entre a teoria e a prática.
Entende-se que o enfoque clínico contribuiu e contribui para a manutenção da
ideologia liberal, a ideologia dominante, por meio da qual o indivíduo é responsabilizado pelo
seu sucesso ou pelo seu fracasso. Esse modelo sustenta “[...] os processos de culpabilização
dos alunos pela via da psicologização dos problemas educacionais” (MEIRA, 2003, p.22).
Em outras palavras, o homem é deslocado de sua realidade social e cultural e é
analisado por meio de um recorte. Por meio deste recorte o psiquismo é percebido como algo
inerente e natural ao homem, que apenas precisa de um meio propício para desabrochar, o que
aconteceria se os indivíduos se desenvolvessem numa estufa e não houvesse interferência de
seus pares durante sua formação. Boarine (1992) destaca que ao descontextualizar os demais
acontecimentos envolvidos no contexto da aprendizagem, a culpa recai sobre o mundo
subjetivo e individual, o que coloca os pais e os professores, bem como os alunos, em uma
postura cômoda, na medida em que os isenta da responsabilidade e impossibilita as possíveis
mudanças, restando apenas a contemplação.
Por essa circunstância destaca-se a necessidade do rompimento com o modelo clínico
de atuação profissional voltado para o diagnóstico e tratamento de problemas que são
supostamente do aluno. Ao romper com esse modelo, tem-se um redimensionamento do olhar
da psicologia escolar para os processos educacionais, o que permite ao psicólogo observar e
compreender o fracasso escolar “[...] a partir de uma análise aprofundada do fenômeno
educacional como síntese de múltiplas determinações e que se situa em um contexto histórico
concreto” (SAVIANI, 1994, p.27)”.
Este redimensionamento do olhar do profissional ganhou forças no Brasil há
aproximadamente 20 anos por meio da psicologia de postura crítica, que analisa o psiquismo
humano decorrente do contexto histórico e considera o processo educacional como produtor e
produto de condições materiais determinadas. Desta maneira, como pontua Souza (2000), o
foco volta-se para o processo de escolarização e não para os problemas de aprendizagem,
3038
deslocando o eixo da análise do indivíduo para a escola e o conjunto das relações
institucionais, históricas, psicológicas e pedagógicas que se fazem presentes e constituem o
dia-a-dia escolar. Desta forma, pode-se perceber que esta práxis é respaldada por
fundamentos teóricos consistentes, que tentam superar a visão positivista e idealista por meio
do materialismo histórico dialético e da visão de homem de Marx, que acredita que a única
forma de compreender a sociedade e a história é a partir da realidade concreta, que é
transformada pelo homem, e que também o transforma.
Como se pode perceber, ao se partir dessa visão a culpa já não está mais situada no
indivíduo, ou seja, este já não é mais o único responsável por sua atuação. Logo, se a criança
não tem o êxito esperado no desempenho escolar, isso não se resume a uma causa focada no
indivíduo ou em sua família, pois é a partir de uma considerável coleta de dados que se pode
entender melhor a múltiplas determinações presentes no processo do fracasso escolar. Tal
fracasso é, então, um processo desenvolvido nas condições sociais, nas relações, e é a partir
da compreensão desse processo que se pode vislumbrar possibilidades de desenvolvimento de
todos os envolvidos, tornando-se a melhor forma de gerar possíveis caminhos a serem
trilhados.
Saviani (1994) acrescenta ao nosso tema estudado que ao partir desse parâmetro o
objeto de estudo em questão é pautado no encontro entre o sujeito e a educação. Nesse sentido
o compromisso social da psicologia escolar está em contribuir com a escola para que ela
cumpra de fato seu papel de socializadora do saber e de formadora crítica, como indica Meira
(2003, p. 58): “O psicólogo escolar pode assim ajudar a escola a remover os obstáculos que se
interpõem entre os sujeitos e o conhecimento, favorecendo processos de humanização e
desenvolvimento do pensamento crítico”.
Tendo uma atitude baseada em tal enfoque o psicólogo estará com consistência teórica
e crítica no que diz respeito a sua atuação. Essa atitude tem sido adotada nos últimos anos por
alguns dos profissionais da psicologia educacional, no entanto essa parcela ainda é um pouco
restrita (FACCI, 1998).
Facci (1998) sinaliza que é responsabilidade da psicologia escolar tentar sanar o
preconceito frente aos fracassos escolares, que culpabilizam os alunos e suas famílias, além de
construir um processo pedagógico qualitativamente superior, que trabalhe com os educadores
uma compreensão crítica do psiquismo, do desenvolvimento humano e de suas articulações
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com a aprendizagem e as relações sociais, para que estes possam perceber como os
conhecimentos psicológicos são importantes para o cumprimento da função social da escola.
Ainda com relação ao fracasso escolar, Boarine (1992) frisa a importância de trabalhar
sempre com a escola, a família e a sociedade, na medida em que o aluno pertence a uma
família, tem produções na escola e esta, por sua vez, não está isolada, assim como a família,
das relações sociais pertinentes a um momento histórico. Amude (et al., 2006) sinaliza a
necessidade de não se perder de vista que a escola, a família e todos os indivíduos envolvidos
nestas instituições fazem parte desta sociedade da qual falamos, portanto, não estão isentos
dos encaminhamentos e sentimentos produzidos por ela. E pelo fato do fracasso escolar ser
uma questão histórico-social, não se orienta por leis universais e imutáveis, nem se resolve
naturalmente por geração espontânea. É por isso que Souza (2000) aponta como objetivo da
psicologia escolar o desvelamento dos processos de escolarização que produziram esta criança
que tem na apatia e na intolerância à escola uma forma de comunicação, ou na agressividade a
sua maneira de refletir as práticas pedagógicas produzidas. Pode-se acrescentar, também,
neste grupo a não aquisição dos conceitos.
Nesse sentido, se a atuação do psicólogo não estiver respaldada num forte referencial
teórico, esse profissional pode correr o risco de adotar um discurso crítico, mas sem alcançar a
consistência teórica e filosófica necessária (MEIRA, 2003). A conseqüência disto é uma
atuação imediatista, pautada muitas vezes em opiniões ditadas pelo senso comum.
A produção do fracasso escolar
Uma demanda freqüentemente feita ao psicólogo escolar refere-se à queixa escolar
(SOUZA, 2000). E sob o olhar de uma abordagem crítica em psicologia, é necessário pensar
que quando existem dificuldades no processo de ensino-aprendizagem, professores, alunos e
todas as pessoas envolvidas devem ser consideradas como fazendo parte de uma realidade, a
qual necessita de uma intervenção. Neste sentido, Tanamachi & Meira (2003), explicitam que
compreendem a “queixa”, como um resumo de diversas determinações, e o psicólogo deve
exercer o papel de mediador na busca da superação de tal queixa, e, conforme o mencionado
anteriormente, cabe a este também compreender o que está por detrás desta queixa, o que
encontra-se implícito na mesma, e uma maneira de se fazer isso é através de uma investigação
3040
desenvolvida em conjunto com toda a instituição. Desse modo, a “queixa” não é depositada
em ninguém e sim analisada a partir do contexto em que foi produzida.
Com base nessa perspectiva, pode-se afirmar que o objeto do psicólogo escolar dentro
de uma instituição de ensino é o encontro entre os sujeitos e a educação, e o objetivo de seu
trabalho é contribuir da melhor forma possível para a construção de um processo educacional
que possibilite a socialização do conhecimento produzido historicamente, contribuindo assim
para uma formação ética e política dos sujeitos. O psicólogo é visto, então, como um
profissional capaz de auxiliar a escola a superar os problemas que impedem a ocorrência do
processo de ensino-aprendizagem, colaborando para a formação de cidadãos através de
práticas educativas voltadas aos processos de humanização.
Toda instituição apresenta suas peculiaridades, suas problemáticas e necessidades, mas
segundo Tanamachi & Meira (2003), existem alguns elementos que podem servir como
norteadores para o planejamento de intervenções fundamentadas numa visão crítica. Nessa
perspectiva, em todo e qualquer trabalho, o psicólogo necessita de uma fundamentação teórica
e prática que fundamente seu trabalho, e em instituições de ensino este necessita ter um maior
domínio acerca das teorias de aprendizagem e práticas pedagógicas.
De acordo com o discutido até o momento, o psicólogo escolar, inserido no processo
de ensino-aprendizagem necessita conhecer e compreender tanto as teorias que fundamentam
a psicologia, quanto a educação. O psicólogo precisa estar a par desse processo, o qual pode
ser traçado por diversos caminhos. O professor, por exemplo, sujeito ativo nesse processo é
quem deve decidir quais os conteúdos deverão ser ensinados e como serão ensinados. Precisa
estar atendo as formas como os alunos aprendem e também como e porque não conseguem
aprender, daí o fato do professor se constituir como um mediador no referido processo.
Neste sentido, é fundamental que o professor, de acordo com Vigotski, se atente ao
nível de desenvolvimento atual e a zona de desenvolvimento próximo. Segundo Rego (1995)
o primeiro refere-se ao nível de desenvolvimento da criança que foi obtido a partir de um
processo de desenvolvimento que já ocorreu, e o segundo diz respeito àquilo que a criança
consegue fazer com o auxílio de outras pessoas. Dessa maneira, muitas vezes quando os
alunos não conseguem realizar sozinhos determinadas atividades se deve ao fato de que
algumas capacidades cognitivas não se encontram totalmente formadas, e assim necessitam
do auxílio do professor para aprender determinado conteúdo.
3041
Tem-se então, que o processo de aprendizagem é algo complexo, que acontece quando
professores e alunos se encontram, e a forma que se dá esse encontro irá influenciar na
apropriação dos conhecimentos e na formação de valores e conceitos. Assim, o psicólogo
escolar necessita compreender primeiro que a aprendizagem é um processo, o qual para
acontecer depende da socialização dos conhecimentos e também do grau de motivação, e tal
processo é definido pelas relações sociais, mas cada indivíduo atribui um sentido particular a
suas vivências e experiências.
Com base nessa concepção crítica de psicologia escolar, Tanamachi & Meira (2003),
mencionam que para que a psicologia possa contribuir para a construção da cidadania dentro e
fora da escola, é necessário elaborar metodologias de trabalho, formas de intervenção. Dessa
maneira, o psicólogo escolar passa a intervir como um elemento mediador, que juntamente
com professores, alunos, funcionários, equipe pedagógica e comunidade poderá analisar os
conteúdos e os métodos de ensino adotados pela escola.
Como metodologia de trabalho, pode-se explicitar que esta deve compreender quatro
aspectos fundamentais: avaliação da realidade escolar, discussão dos resultados obtidos
através dessa avaliação e a partir desses dados pode-se elaborar e executar um plano de
intervenção. Uma avaliação adequada constitui-se como o primeiro passo para a articulação
de um bom plano de ação, o qual necessita contemplar objetivos, métodos e estratégias. O
segundo momento do trabalho está relacionado à discussão dos resultados obtidos na
avaliação, e tal discussão preferencialmente deve ser feita com toda comunidade escolar. Já, o
terceiro momento diz respeito à elaboração do plano de intervenção, o qual deve responder às
questões levantadas no momento da avaliação. E o quarto momento constitui-se no processo
de intervenção.
Os psicólogos podem elaborar suas propostas de trabalho de acordo com inúmeros
fatores, sendo influenciados principalmente pelos fundamentos teóricos e práticos que
norteiam suas práticas e pela política educacional da instituição em que se encontram
inseridos, mas o que é imprescindível é que no desempenho de sua função estejam
contribuindo para que ocorram práticas de ensino contextualizadas, e comprometidas com o
processo de humanização.
Nesse contexto, o psicólogo não se pode deixar levar apenas pela crítica em relação a
toda e qualquer dificuldade de aprendizagem apresentada pela criança que chega até ele, pois
assim estará contribuindo em grande escala para o fracasso escolar, para que ocorra a
3042
culpabilização do indivíduo por seu sucesso ou fracasso dentro do contexto escolar. Sua visão
acerca de homem e de sociedade necessita ser mais abrangente e crítica, considerando o
indivíduo como um ser que constrói e é construído pelas relações sociais, conforme o já
mencionado por Tanamachi & Meira (2003).
Neste sentido, a psicologia histórico-cultural afirma que o homem se torna humano a
partir do momento em que se apropria do conhecimento produzido historicamente, e ao se
apropriar do conhecimento consegue enxergar a realidade da forma como realmente é, e assim
pode transformá-la de acordo com seus desejos e necessidades, as quais se modificam ao
longo do tempo. E se estas se modificam o homem também se modifica, e essa capacidade de
modificar o que está posto é algo maravilhoso, pois tem-se assim a possibilidade de superar a
realidade vivenciada.
Considerações finais
Para concluir, percebe-se que os indivíduos são culpabilizados pelo fracasso escolar, e
o discurso social que explica estes fatos é a falta de preparação e capacitação dos indivíduos.
Neste mesmo contexto os alunos, ou os pais e/ou professores, são focados individualmente
como os grandes vilões do elevado índice de reprovação, evasão e não apreensão dos
conteúdos produzidos socialmente e transmitidos de geração em geração, não sendo levado
em conta as múltiplas determinações presentes no processo de formação do fracasso escolar.
A teoria Histórico-cultural nos permite alegar que o fracasso escolar é um reflexo da
sociedade vigente - a sociedade capitalista - e que seriam necessárias mudanças estruturais
para a superação deste problema, na medida em que o fracasso é produto de uma realidade
objetiva e não se trata, então, de um problema individual, como alguns profissionais
costumam diagnosticar. Neste sentido, a psicologia escolar tem como compromisso auxiliar a
escola na superação destes problemas que impedem a efetivação do processo de ensinoaprendizagem e facilitar para que a escola cumpra seu papel de formar indivíduos por meio de
práticas educativas voltadas aos processos de humanização. Isso será vislumbrado apenas
quando os profissionais adquirirem e trabalharem em prol de uma visão crítica. Apenas por
meio da prática embasada por uma teoria consistente e sustentável que o psicólogo escolar
terá uma atuação sólida, visto que é essa base que respaldará sua prática profissional.
3043
Desta maneira, apenas por meio de um respaldo teórico com vistas à compreensão do
movimento social da humanidade, que vislumbre a compreensão de um todo constituído por
partes tão diferentes entre si, mas que apesar das diferenças atuem num espaço físico comum
e pertencem a um momento histórico específico determinado por contingências anteriores, é
que o profissional da Psicologia escolar poderá direcionar sua prática para que ela não gere
intervenções não efetivas, mas ao contrário, produza prognósticos seguros, confiáveis e
positivos, que gerem o desenvolvimento e a superação das situações problemas.
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