DITADURA MILITAR EM LONDRINA E O MOVIMENTO ESTUDANTIL A
PARTIR DO JORNAL POEIRA
Isabela Veglieri Pereira
Rafael Fernandes Speglic
(Pibid/História/Uel)
Dr. Marco Antônio Neves Soares
(Coordernador)
Ms. Danillo Brito
(Supervisor)
Resumo: O seguinte trabalho busca, dentro do espaço da sala de aula,
analisar conceitos e entendimentos básicos referentes ao período da Ditadura
Militar imposta em 1964 no Brasil. Contudo, dentro da perspectiva de histórica
local, pensaremos essas questões de forma menos ampla, saindo do âmbito
nacional e pensando a partir das especificidades regionais. A partir da análise
da fonte, no caso trechos selecionados do jornal Poeira (jornal do movimento
estudantil de Londrina, organizado pelos estudantes da UEL), mais
especificamente as edições do ano de 1976, buscaremos trabalhar com os
alunos uma a compreensão de uma totalidade mais abrangente dos problemas
da época. Fugindo um pouco da sempre presente dicotomia entre esquerda e
direita e das lutas políticas do momento, será trabalhada a ideia de que lutas
mais comuns, como a exigência do passe universitário e a crítica a constante
privatização do Ensino estavam em pauta. Ademais, um paralelo com o quadro
atual será utilizado para buscar a conexão entre passado e presente tão
importante para o raciocínio histórico dos jovens. O movimento dos “20
Centavos” ocorrido em 2013 serve como exemplo para mostrar que problemas
que o Brasil enfrentava na mão dos militares, continua enfrentando hoje, com a
democracia. Assim, objetiva-se que o aluno se aproprie de um conhecimento
reflexivo e dialógico para com seu cotidiano, criando uma maior empatia com a
disciplina História.
Palavras-chave:
estudantil.
Ditadura
Militar;
Londrina;
jornal
Poeira;
movimento
Financiamento: CAPES/PIBID
2747
Introdução/justificativa
O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência (PIBID)
realizou um projeto entre diversas escolas de Londrina, no Paraná, com o
seguinte tema: "A Ditadura Militar em Londrina". Coordenados pelos
professores doutores Marco Antônio Neves Soares, Márcio Santana e Marlene
Cainelli, os bolsistas foram divididos entre cinco colégios estaduais e tinham a
proposta de investigar com os alunos a forma como a cidade deles (Londrina)
também sofreu com a Ditadura Militar.
Este ano, 2014, a sociedade brasileira rememora os 50 anos do início do
regime militar no Brasil. Sabemos que de qualquer maneira, independente da
perspectiva, o governo militar não se deu em caráter legal. Ainda assim há
controvérsias dentro de nossa sociedade referentes a esta discussão. Para
Rollemberg,
Se o movimento que derrubou o governo institucional foi repudiado
por parte da sociedade civil, por outro lado, foi saudado com
entusiasmo por segmentos sociais – não exclusivos das classes
dominantes – que com eles se identificaram. (2003, p.46)
Além desta divisão social no que concerne a aceitação ou não da
população do governo militar, é importante mencionar ainda como este governo
constantemente tentou legitimar a sua existência. Utilizando o termo proposto
por Maria José de Rezende, houve no país uma constante busca de “pretensão
de legitimidade”. A autora indaga...
Por que razão a ditadura militar assentava a sua pretensão de
legitimidade na formulação de um suposto ideário de democracia?
Seguindo a perspectiva de que a única legitimidade possível é a
democrática, a questão poderia ser respondida da seguinte forma: o
regime via-se desafiado pela necessidade de justificar todos os seus
atos e ações através da elaboração de um sistema de idéias e
valores sobre uma supositícia democracia, a qual era mostrada como
o fundam ento de todo processo alavancado pelas novas condições
que se estabeleciam. (2013, p. 35).
Desta forma, as opiniões sobre o golpe militar no Brasil cresceram
divididas dentro da população. Termos que se confrontam vem à tona
2748
constantemente, tais como: Golpe, revolução, governo, regime, esquerdistas,
conservados, etc. De qualquer forma, é um momento controverso no seio de
nossa sociedade e que até hoje gera acaloradas discussões. Entretanto,
apesar da importância que possui este “momento de memória” (50 anos desde
1964), o intuito deste trabalho não é de forma alguma relativizar ou neutralizar
ambos os lados da discussão. Segundo Marcelo Badaró Mattos, “podemos
dizer que o governo Goulart e o golpe de 1964 constituem-se hoje no marco
inicial de nossa História do Tempo Presente” (2008, p. 246). Desta forma,
devemos evidenciar que além da complexidade e divergência da temática, ela
faz parte de um passado ainda não cicatrizado dentro de nossa sociedade.
Ressaltamos ainda que o foco deste trabalho não se limitou ao amplo
contexto de regime militar no Brasil. Buscamos igualmente focar como este
período se manifestou na região de Londrina. A partir do jornal Poeira tentamos
explicar como problemas enfrentados pelo país na década de 70 ainda hoje
estão aflorados nas lutas sociais e populares.
Esta percepção vem da
necessidade de aproximar os alunos do conteúdo histórico, afim de que
percebam que a História ensinada em sala de aula dialoga constantemente
com o presente deles.
Objetivos/Resultados
Tentamos, dentro deste trabalho, do planejamento das aulas-oficina
segundo direcionamento das propostas de Isabel Barca, de todo o
planejamento e interação dentro da sala com os alunos, atentar ao fato de que,
ainda hoje como democracia, o país enfrenta problemas similares aos
criticados pelo Jornal Poeira, documento este utilizado como “fonte
historiográfica” nas aulas. Isabel Barca, em sua aula oficina explica:
O estudante, neste modelo teórico, não é como uma tabula
rasa, mas pelo contrário, leva à escola seus próprios
conhecimentos, com os quais é necessário estabelecer um
diálogo a fim de promover a progressão do conhecimento
histórico, caracterizada pelo desenvolvimento de uma estrutura
cognitiva que mune o aluno da capacidade de pensar
historicamente. (BARCA, 2001)
2749
A “fonte historiográfica” deste trabalho - o jornal Poeira - foi resultado do
esforço dos estudantes da Universidade Estadual de Londrina, em um
momento de extrema repressão e censura ideológica por parte do governo
militar. A ideia aqui buscada é a de sair um pouco da discussão dualista entre
esquerda e direita, governo legítimo ou não, e mostrar algo mais cotidiano
deste momento tão marcante de nossa história.
Dentro desse contexto, o trabalho se iniciou com várias observações
feitas no Colégio Estadual Tsuru Oguido em turmas variadas. Decidimos então,
desenvolver as atividades com o 8ºA. No decorrer da aplicação de quatro
aulas,
trabalhamos
questões
como
movimento
estudantil,
ditadura,
manifestações, repressão, censura.
Começamos as atividades aplicando um questionário de conhecimento
prévio para os alunos de modo que pudéssemos analisar qual a aproximação
deles com o assunto. Acreditamos ser importante transcrever tais questões, no
sentido de evidenciar o foco do trabalho feito nas aulas-oficina.
1.Já ouviu falar sobre ditadura militar? O que você acha que
foi?
2.Você acha que a ditadura aconteceu também em Londrina?
Explique a sua resposta.
3.Dentro da política, você sabe o que é “esquerda” e
“direita”?
4.Conhece o movimento estudantil? Sabe o que foi?
Explique.
5.Você acha que movimentos sociais exigindo passe livre e
criticando a educação acontecem apenas hoje ou aconteceram
também no passado? Explique.
6.Você se lembra do “movimento dos 20 centavos” que
passou na mídia ano passado? Se sim, do que se lembra?
Vale destacar, principalmente nas questões 2,4,5 e 6, que tentamos
investigar o conhecimento que os alunos teriam das questões que
trabalharíamos no decorrer das aulas seguintes.
A partir das informações obtidas nesses questionários, preparamos a
aula que teve enfoque em movimentos sociais que buscavam passe e
2750
educação gratuitos, de maneira a fazer com que eles entendessem que mesmo
em épocas bastante distintas com realidades diferentes, alguns desses
movimentos ainda continuam a acontecer. Apenas cabe mencionar que, devido
a questões „burocráticas‟, os alunos ainda não tinham estudado Ditadura Militar
no programa regular de aulas. Desta forma, utilizamos um primeiro momento
para fazer uma breve aula expositiva, explicando (mas ainda de forma
interativa com os grupos) os principais acontecimentos e o que foi, de fato, o
período da ditadura militar. Assim, propiciamos uma base para que os alunos
pudessem refletir as questões a serem propostas.
As aulas se deram em forma de oficina, e os alunos foram colocados
em pequenos grupos de modo que pudessem exprimir suas opiniões e nós
pudéssemos intermediar suas ideias. Após muita explicação e interação, foi
passado à eles uma atividade que consistia na análise de documentos, no
caso, documentos do Jornal Poeira que trouxeram questões sobre censura e
liberdade na época da ditadura militar e outro
documento
do
Jornal
Poeira
em
contraposição com uma foto do retirada da
internet que tinham como objetivo fazer com
que os alunos relacionassem essas imagens,
construindo assim um diálogo entre todas as
imagens e também delas com a temática em
questão,
no
caso,
Ditadura
Militar
em
Jornal Poeira, 13ª ed. Junho de 1976.
Londrina e o movimento estudantil a
partir do jornal Poeira.
Com
a
primeira
questão,
tentamos trazer aos alunos a reflexão
sobre a censura na época. Como
mostra a imagem ao lado, o Poeira
era um jornal “difícil, mas possível”.
Pedimos
aos
alunos
então
que
Jornal Poeira 13ª ed. Junho de 1976.
interpretassem este termo.
2751
Na segunda atividade, trouxemos uma tirinha da Mafalda, presente na
mesma edição, de junho de 1976. Nesta atividade, propusemos a reflexão
acerca da ideia de liberdade.
A terceira e ultima atividade buscou a abordagem das movimentações
sociais em busca do passe livre, tanto na época da ditadura, como sugere o
documento do jornal Poeira, como a imagem retirada da Web, que remete ao
“movimento dos 20 centavos” ocorrido em 2013.
Jornal Poeira 13ª ed. Junho de 1976.
Movimento dos 20 centavos em São Paulo.
(imagem retirada da web).
Por fim, aplicamos o questionário de metacognição para analisar as
respostas obtidas antes e depois das atividades. Algumas respostas são
importantes para exemplificar os resultados obtidos.
A aluna M.E.M.S. na pergunta 1, no primeiro questionário, respondeu
“Não lembro”. Já no questionário de metacognição sua resposta foi: “Sim, você
não podia dar a sua opinião sobre os presidentes senão você era morto.”
Na pergunta 5, sua primeira resposta foi: “Não me lembro”. Na
metacognição, a resposta foi: “Aconteceram também no passado, só que meio
diferente por jornais anônimos por que a ditadura não deixava você expreçar a
sua opinião”.
O aluno D.B. na pergunta 1, no primeiro questionário respondeu “Não”.
Na metacognição, respondeu: “Sim, um golpe militar aplicado por Castelo
Branco”.
2752
A aluna B.C.A. primeiramente respondeu “Não” ou “Não sei” em 5 das 6
respostas. Depois, respondeu, na 1: “Sim, um ditador que falava as regras e se
alguém desobedecesse iria preso ou seria morto.” Na 4: “Sim, o movimento
estudantil foi organizado pelos universitários”. E na 6: “Sim, que a população foi
protestar nas ruas não só sobre os 20 centavos, mas sobre a educação
também.”
Considerações finais
A oficina ministrada, sem cargas pesadas para os alunos e com a
participação ativa dos mesmos se reflete nos resultados que obtivemos. Os
alunos
apresentaram
uma
melhora
significativa
em
suas
respostas,
conseguindo até mesmo criar um raciocínio crítico e uma capacidade
associativa de passado e presente. Devemos ressaltar que no momento do
questionário, a maioria dos alunos não sabia praticamente nada sobre Ditadura
Militar. Segundo o currículo nacional, o oitavo ano ainda não tem contato com a
temática em questão. Ainda assim podemos inferir um crescimento importante,
pois a qualidade das respostas, em comparação com o que foi passado em
sala de aula, e dinamizado com os grupos durante a oficina, foi elevada.
No totalizante das respostas, observamos que, mesmo que a resposta
não estivesse “correta”, percebemos que muitos alunos que antes haviam
escrito apenas “Não” ou “Não sei”, pelo menos ao final da aula, tentaram
escrever e dialogar com aquilo que haviam aprendido. Notamos respostas bem
maiores, mostrando uma tentativa e uma vontade de responder a atividade.
Assim, percebemos que a dinâmica da aula-oficina criando um ambiente mais
estimulante e propício para que o aluno se aproprie do conhecimento em sala
de aula.
Pedimos de maneira informal, para que o aluno que quisesse, colocasse
a opinião no verso da folha de metacognição. Uma dentre elas, se destacou...
“Eu acho que essas aulas ajudam e muito ainda mais nesse conteúdo
tão complexo e também é bom sair um pouco do tradicionalismo do colégio
para alguma coisa mais legal e interessante” (A.P.C, 13 anos).
2753
Ao final de todas as atividades conseguimos perceber como a mudança
de padrão de aula interfere na aprendizagem do aluno, uma vez que a partir do
momento que o aluno consegue fazer uma interação e se comunicar
ativamente com o professor, o mesmo se sente estimulado e traz seus próprios
conhecimentos e questionamentos para que o professor seja o mediador e
consequentemente incentivador desse conhecimento já presente nos alunos.
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2755
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DITADURA MILITAR EM LONDRINA E O MOVIMENTO