Conversas fruitivas de ateliê
por Josué Mattos
Paisagens à margem é resultado de um diálogo de longa data. Surgiu por volta de 2004, a
partir de encontros sistemáticos em ateliê coletivo. Situado na Rua Cunha Gago, no bairro de
Pinheiros, o ateliê existiu até o momento em que a casa foi demolida, incluída no avassalador
projeto de revitalização dessa área da cidade de São Paulo. No entanto, outros vínculos
permitiram que os artistas mantivessem diálogos em torno de interesses comuns em poéticas
visuais. Esses vínculos resultaram em grupos de estudos, exposições e encontros informais,
reunindo múltiplos olhares sobre a produção artística contemporânea. Para além da ideia de
buscar o lugar da pintura e da fotografia, os artistas estimulavam a investigação de
convergências e divergências a partir das quais poderiam encontrar aproximações simbólicas
entre seus trabalhos. Contudo, daí a imaginar que essas conversas tentavam potencializar o
aspecto pictórico da fotografia e vice-versa pode ser um grande engano. Em realidade, a
consequência do encontro desses artistas instigou o estreitamento do diálogo dessas duas
categorias artísticas, sem as resumir em uma metalinguagem. Assim como também não existia
a intenção de identificar especificidades capazes de desvincular uma da outra, algo recorrente
quando ambas se confrontaram pela primeira vez, na ocasião do surgimento da fotografia.
Por tudo isso, esse diálogo torna-se pouco compreensível à primeira vista, já que é no
distanciamento formal e no resíduo dessas linguagens simbólicas que está o interesse da
exposição. Assim, diante de tal conversa intraduzível, por não buscar clareza e sim confronto
entre artificialidade, camuflagem, paisagens bucólicas, concretas e territórios limiares, os
artistas propõem atritos que geram ruídos tão disléxicos quanto as relações e intervenções do
homem na paisagem. Afinal, estar à margem não parece deslocar a paisagem do lugar que ela
ocupa no mundo. Ela mantém-se o que é. Em compensação, o contrário é visto no conjunto de
16 obras reunidas na exposição: a margem passa a ser a linha imaginária construída ao longo
da história, separando artificialmente o homem do que o circunda.
Para além desses ruídos, é precisamente na ideia de pesquisa, troca e diálogos entre artistas
que Paisagens à margem parece se aproximar de exposições propostas nos anos 1980 por
Leda Catunda, Sergio Romagnolo, Mônica Nador e Ana Tavares. Pois tanto os jovens artistas da
exposição Paisagens à margem quanto os mencionados acima, todos foram motivados pela
amizade e interesse em aprofundar suas pesquisas em poéticas visuais quando propuseram
exposições capazes de mostrar o resultado de produções consequentes, atreladas às conversas
e trocas em seus ateliês.
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Conversas fruitivas de ateliê por Josué Mattos Paisagens à margem