_____________________________________________________________Mesopotâmia
1. Mesopotâmia
1.1.
Introdução Histórico Temporal
1.1.1. Contextualização Geográfica
A Mesopotâmia, como a própria tradução do nome indica, era uma região situada
entre dois rios, nomeadamente o rio Eufrates e o rio Tigre. A capital da Mesopotâmia
era a Babilónia, tendo de seguida como cidades principais, Ur e Susa.
Por se encontrar no meio de dois rios, o seu solo era fértil proporcionando condições
ideais para o desenvolvimento da agricultura. A sua localização também proporcionava
as actividades de pesca e da pecuária. Desta forma o povo vivia essencialmente do
cultivo, criação de gado, pesca e comercialização de bens.
Situada no actual Irão, a Babilónia encontrava-se sensivelmente 96,56 km a sul da
actual cidade de Bagdad. Podemos visualizar nos seguintes mapas as localizações
geográficas das cidades acima mencionadas.
Figura 1.1 – Mapa Antiga Mesopotâmia (Extraído de Estrada, 2000)
1
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Figura 1.2 – Mapa Actual zona da Mesopotâmia
(Extraído de http://go.hrw.com/atlas/span_htm/iraq.htm)
1.1.2. Os Vários Povos
A Mesopotâmia era governada através de várias aldeias, que à medida do seu
crescimento se tornaram cidades-estado. Sendo uma terra de solo produtivo, encontravase bastante desenvolvida ao nível da agricultura e comércio, o que se traduzia em toda a
sua actividade financeira. Consequentemente, esta região produtiva foi alvo de cobiçada
ao longo dos milénios por diversos povos.
Tal cobiça deu origem a numerosas conquistas, tendo sido ocupada por muitos
povos ao longo dos tempos. Ao contrário do que poderíamos esperar (com base no que
aconteceu na História mais recente da Humanidade), à medida que as várias ocupações
se iam realizando, a cultura do povo, em vez de dizimada e oprimida, era salvaguardada
e acolhida como uma riqueza, pelos novos habitantes.
Uma das realidades que mais sustenta esta percepção é o facto de todos esses povos,
apesar de cada um ter o seu dialecto próprio, terem partilhado da mesma escrita. Esta
escrita denominou-se cuneiforme devido a ser realizada em placas de barro, sendo por
isso necessária a utilização de estiletes, que tinham o formato de cunha.
2
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A conservação de uma única escrita ao longo de tantas conquistas evidencia a
unidade cultural que aí vigorava, o que nos permite hoje falar da civilização
mesopotâmica ou, de forma equivalente, da civilização babilónica. Desta forma não é
necessário referir constantemente qual dos povos ocupava a região num determinado
momento.
Podemos contudo listar, por ordem cronológica para facilitar a compreensão do
desenvolvimento da história desta Civilização, alguns dos povos que a ocuparam. Assim
sendo, podemos destacar:
•
Por volta de 4000 a.C. a Mesopotâmia era habitada pelos Sumérios;
•
Em 2400 a.C. aproximadamente, foi conquistada pelos Acádios, sendo
posteriormente conquistada por uma série de povos, de entre os quais podemos
enumerar os Elamitas, Amorritas, Hititas, Cassitas, Assírios e Medos.
•
Em 539 a.C. foi conquistada pelo rei da Pérsia, deixando de estar em seu poder
a partir de 330 a.C.
•
Em 330 a.C. foi conquistada por Alexandre o Grande, o qual naquele tempo
tentava expandir e unificar todos os países vizinhos, por forma a obter um só
estado, dividido e governado através de várias cidades-estado, que seguiriam todas
um mesmo esquema político de acordo com o que o rei proferisse.
•
Ficou nesse momento a fazer parte do território Grego, integrando-se no que
hoje denominamos a Grécia Helenista.
•
Contudo esta dependência perdeu-se sete anos mais tarde, aquando da morte
do seu conquistador. Alexandre, não conseguia deixar de tentar conquistar novos
territórios, o que ia contra o facto do seu exército estar exausto e saturado de se
encontrar longe das suas famílias e em digressão há já sete anos consecutivos.
Alexandre faleceu após uma batalha sangrenta travada na Índia, a seguir à qual
tomara a resolução de voltar com os seus homens às respectivas casas.
3
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•
Quando Alexandre faleceu, o seu império foi dividido em quatro grandes áreas
e entregues cada uma a um dos seus melhores generais. A área relativa à
Mesopotâmia foi entregue ao general Selêuco, daí o período de 300 a.C. até à era
cristã ser denominado por Período Selêucida.
De qualquer modo, e como veremos de seguida, esta “divisão” por povos, não é
significativa na avaliação das fontes históricas daqui provenientes, pelo que será
posteriormente introduzida uma separação por períodos cronológicos não interligados
de forma intrínseca com esta ordem.
1.2. A Matemática na Mesopotâmia
1.2.1. Exemplares de Artefactos Arqueológicos
A grande maioria dos artefactos arqueológicos que chegaram até à actualidade e nos
colocam a par do que eventualmente se conhecia, e aplicava naqueles tempos, são
placas de barro gravadas com escrita cuneiforme.
Ao longo dos tempos foram encontradas milhares destas placas, embora no início o
seu conteúdo fosse totalmente desconhecido, uma vez que ainda não fora feita a
decifração da escrita utilizada. Contudo, e apesar de não conhecerem o seu conteúdo,
estas foram sendo guardadas em várias colecções, muitas das quais particulares. Apesar
desta observação não parecer relevante, na realidade é nela que reside a explicação do
nome de cada placa. Por exemplo, a placa Plimpton 322 possui esse nome porque faz
parte da colecção Plimpton, na qual tem a numeração 322 – voltaremos posteriormente
a falar nesta placa.
A interpretação da escrita cuneiforme só teve lugar no séc. XIX, pelo que o estudo
da civilização Mesopotâmica é bastante recente. A decifração desta escrita deve-se a
Henry Rawlinson, cônsul britânico em Bagdad no seu tempo. Foi ele que descobriu a
rocha de Behistun, situada a Sudoeste do actual Irão. Nesta rocha estavam gravados em
três línguas diferentes o mesmo texto (persa antigo, elamítico e acádio). Henry
4
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Rawlinson escalou até ao local onde se encontrava a dita rocha, ou seja a 90m acima do
solo, copiando o seu conteúdo. Mais tarde, com base nos seus conhecimentos e na
comparação das traduções das várias escritas, conseguiu entre 1835 e 1851 decifrar a
escrita cuneiforme. Só a partir desta altura se começaram a entender os conteúdos de
algumas das diversas placas até então encontradas.
Existem ainda milhares de placas por decifrar, o que se deve não somente à recente
decifração da escrita, mas principalmente à diversidade dos conteúdos das placas (como
veremos no sub-capítulo que se segue), e da necessidade de se fazer uma interligação
com a sociologia da época. Na realidade, a informação nelas contidas têm um valor
muito relativo se não se tiver em conta a integração cultural e respectiva reinterpretação
dos conteúdos.
1.2.2. Conteúdos Relevantes de Algumas Placas – A Placa de Larsa
À medida que foram decifrando e interpretando os conteúdos das placas, começaram
a ter noção da sua riqueza e diversidade temática. Na realidade existem placas que
contêm apenas simples contagens do número de tijolos colocados por um trabalhador
num dia de serviço, até placas sobre dados da astronomia, tabelas de somas,
multiplicações, tabelas de potências de um número, quadrados perfeitos, resolução de
equações de primeiro e segundo grau, problemas compostos aplicando método da falsa
posição e por fim, tendo neste trabalho uma importância muito relevante, problemas
envolvendo o conhecimento do Teorema de Pitágoras e tabelas dos primeiros ternos
pitagóricos.
A placa de Larsa (Figura 1.4) é um exemplo da sabedoria já adquirida na época.
Para podermos ter alguma ideia do que se trata o conteúdo desta placa, faremos uma
breve introdução ao sistema de contagem utilizado naquele período.
Por volta do séc. XXI a.C. o sistema usado era um sistema posicional sexagésimal, o
qual pode ser de certa forma considerado até mais rico do que o que utilizamos na
actualidade (decimal).
5
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Segundo este sistema posicional sexagésimal, para representar um número,
utilizava-se um sistema repetitivo de um mesmo símbolo. Para representar o número um
utilizava-se o símbolo
, os números do 2 até ao 9 obtinham-se da repetição deste do
seguinte modo:
.
O número dez era representado pelo símbolo
, e os múltiplos de 10 até 50
obtinham-se utilizando múltiplos deste símbolo, como no processo de construção dos
números 2 até 9:
.
Os números até ao 59 eram obtidos através da combinação dos anteriores, do
mesmo modo que fazemos no sistema decimal, ou seja, escrevendo-os da esquerda para
a direita. Assim sendo, por exemplo, o número 11 era escrito como
70 representava-se por
, enquanto que
.
Podemos assim construir todos os 59 símbolos utilizando apenas conjugações dos
símbolos
e
(Figura 1.3).
Figura 1.3 – Numerais na Antiga Babilónia
(Extraído de www-history.mcs.st-andrews.ac.uk/HistTopics/Babilonyan_numerals.html)
Se houvesse no número alguma posição que não possuísse valor, poderia ser
deixado um espaço em branco para o representar (até 300 a.C.). Mais tarde, por volta de
300 d.C. passou-se a utilizar o símbolo
para representar os espaços em vazio, ou
6
_____________________________________________________________Mesopotâmia
seja, para representar o zero; de qualquer modo, tal só sucedia para preencher espaços
em vazio entre símbolos e nunca utilizado no fim do número, pelo que o valor absoluto
do número continuava a ser de ponto flutuante. A introdução deste símbolo causou
algumas confusões a nível da interpretação da placa Plimpton 322, como veremos
posteriormente.
O modo convencional dos historiadores representarem números no sistema
sexagésimal de vírgula flutuante é utilizando virgulas como separadores, ou seja 1,33 é
60 + 33 = 93 na notação decimal e 1, 2,3 é 1× 602 + 2 × 60 + 3 = 3600 + 120 + 3 = 3723 .
Havia ainda um pequeno problema com a interpretação dos números escritos neste
sistema. Uma vez que o número 2 é representado por 2 caracteres, onde cada um
representa a unidade e o número 61 também é representado por dois caracteres: um
primeiro para representar a unidade e um segundo, idêntico ao anterior, para representar
a potência de expoente um de 60; ou seja o 2 e o 1,1 tinham praticamente a mesma
representação na escrita cuneiforme. Contudo tal dificuldade era facilmente
ultrapassada, uma vez que o espaço deixado entre os caracteres deixava perceber que
número se estava a mencionar. Na realidade, no símbolo para o 2 os caracteres,
representando a unidade, tocam-se formando um único símbolo, enquanto que em 61 tal
não sucede.
O sistema utilizado pelos babilónicos, sendo posicional mas de ponto flutuante,
permite ainda uma grande flexibilidade nos cálculos. Como não existem as vírgulas para
nos indicar qual o expoente da potência, cada placa contém muita mais informação do
que à partida possa aparentar, pois cada numeral aí representado, não representa apenas
um número, mas todas as suas potências base 60, uma vez que trabalhando com
potências, fracções, números de dimensões muito grandes ou muito pequenas, o
numeral que os representa continua a ser o mesmo.
7
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Visualizemos, então, a Placa de Larsa:
Figura 1.4 – Fotografia da Placa de Larsa
(Extraído de http:// ancientneareast.tripod.com)
Analisando as inscrições nesta tábua, consegue-se identificar e reconstruir o que
nela se encontra escrito.
Figura 1.5 - Placa de Larsa
(Extraído de Fauvel, 1987)
A placa parece consistir em quatro colunas, das quais a segunda e a quarta não
sofrem qualquer alteração ao longo das respectivas linhas, aparecendo um grupo de
caracteres que podemos pensar não se tratar de representações numéricas mas literais. A
terceira coluna altera-se de uma forma tão regular, que se torna fácil inferir que se trata
de uma coluna de números sucessivos. Pelo que analisamos da numeração e simbologia
utilizada na época, entende-se que o primeiro número representado é o 49, seguindo-se
8
_____________________________________________________________Mesopotâmia
o 50, 51, ...59 terminando com o 1, que como não podemos esquecer estarmos no
sistema sexagésimal de ponto flutuante, pode representar o número 60! Quanto à
primeira coluna, não se altera de uma forma tão regular, contudo se analisarmos de
forma mais pormenorizada podemos observar que:
representa o número 2500 que por sua vez é o quadrado de 50, o
número representado na terceira coluna da mesma linha
. Se repetirmos o
processo para as restantes sequências observamos que na primeira coluna se encontra
sempre o quadrado do número representado na terceira coluna.
Podemos, portanto, inferir que se trata de uma placa de quadrados perfeitos e de
raízes quadradas, uma vez que a podemos utilizar nos dois sentidos (da direita para a
esquerda e vice-versa).
As placas foram diferenciadas em três grandes períodos em termos cronológicos, e
não propriamente respeitando as diversas invasões ocorridas na Babilónia, como já
tínhamos referido no primeiro sub-capítulo. Neugebauer, um historiador de Matemática,
definiu os seguintes períodos:
•
Período antigo (1990-1600 a.C.), também denominado período da Antiga
Babilónia;
•
Neo-assírio (700 a.C.);
•
Neo-babilónico e selêucida (600 a.C. até à era cristã).
As placas astronómicas pertencem todas a este último período e revelam
conhecimentos semelhantes aos contidos no livro Almagesto de Cláudio Ptolomeu
(século II a.C.). A partir do conteúdo das placas, podemos supor que em 2500 a.C., já
existiam escolas de escribas. Na realidade existem placas que indicam claramente ter
sido escritas por discípulos, não só pela falta de precisão na escrita (os caracteres
aparecem marcados com imperfeições), como também pela existência de problemas
cuja resolução contém erros. Para além deste facto, placas como a Plimpton 322, de que
falaremos de seguida, ilustram a preocupação de se fazerem tabelas que permitissem aos
professores colocarem problemas aos alunos, de forma a terem a certeza que a resolução
era possível e que os cálculos davam “valores simpáticos”, isto é, resultados cuja escrita
na base sexagésimal seria finita.
9
_____________________________________________________________Mesopotâmia
Existem ainda várias placas que apresentam tabelas de números inversos ou de
conversão de números fraccionários nos seus equivalentes sexagésimais (dependendo da
interpretação dada por cada historiador). Números regulares, designados assim por
Neugebauer, números cuja decomposição em factores primos se compõem apenas da
combinação de expoentes de bases 2, 3 e 5, ou seja números que admitem inversos com
representação finita quando escritos na base sexagésimal.
É de salientar que muitas vezes na análise das placas, se toda uma conjectura só
falha pela falta de um símbolo, muitas vezes esse símbolo é introduzido pelos
historiadores, pelo que, as fontes não são consideradas mais verosímeis pela sua
antiguidade. É claro que este tipo de alterações nos conteúdos das placas iniciais só
podem ser executadas tendo-se em conta a estrutura matemática da época. Se uma placa
se encontrar demasiado danificada, só pode ser reconstruída com base nas percepções
que se têm desse período, podendo vir a alterar-se a sua interpretação aquando de novas
descobertas. Daí a extrema importância, do pensamento do conhecimento geral e em
particular do conhecimento matemático da época em que as placas foram datadas.
Surgem também, por vezes, opiniões divergentes em relação a uma mesma placa, como
estudaremos no caso da Plimpton 322.
1.2.3. A Plimpton 322 – Descrição
Na descrição da placa de Larsa pretendeu-se destacar o nível, espírito e flexibilidade
de cálculo na Matemática da Babilónia no tempo a que nos estamos a referir.
Vamos agora estudar o conteúdo de uma placa cujo processo de construção parece
ser de grande interesse e sustenta, inclusive, opiniões divergentes. A Plimpton 322, foi
descrita por Neugebauer como “ um dos documentos históricos mais notáveis da antiga
Matemática Babilónica”. A placa tem o nome da pessoa que a comprou, por volta de
1923, a um outro senhor de nome Banks que vivia na Florida. Desconhece-se a forma
como o Sr. Banks a adquiriu, pensa-se apenas que deverá ter sido descoberta em alguma
escavação feita em Larsa na Mesopotâmia.
O lado esquerdo da tábua encontra-se partido e desaparecido pelo menos até ao
momento! Contudo, podem-se visualizar vestígios de cola actual, sugerindo que a
10
_____________________________________________________________Mesopotâmia
quebra da placa se deu aquando, ou imediatamente após, a sua descoberta nas
escavações.
Vejamos uma fotografia desta placa:
Figura 1.6 – Fotografia da Plimpton
(Extraído de www-history.mcs.st-andrews.ac.uk/HistTopics/Babilonyan_Pythagoras.html)
Observando a placa (Figura 1.6) podemos distinguir quatro colunas de números com
cabeçalhos de palavras no topo de cada uma das colunas.
Quanto aos números, depois de termos estudado o tipo de sistema numérico usado
na época e os símbolos utilizados para representar cada um, não é difícil de apresentar o
conteúdo no sistema sexagésimal e passá-lo para o sistema decimal com o qual estamos
habituados a trabalhar na actualidade.
Relativamente aos cabeçalhos das colunas, o que consta na primeira não foi ainda
traduzido devido ao seu grau de danificação, na segunda coluna aparece a palavra
“comprimento” que segundo Neugebauer seria o comprimento do lado de um quadrado,
na terceira coluna inclui a palavra “diagonal” que estaria relacionada com a diagonal do
quadrado e na quarta coluna encontra-se escrito “onde se lê” que novamente segundo a
interpretação deste matemático seria uma enumeração das respectivas linhas.
No seguimento, passamos a apresentar um conjunto de tabelas reproduzindo a
reconstrução realizada por Neugebauer. Os números obtidos por interpolações serão
representados a verde e as correcções executadas aparecem a vermelho. Ou seja, o
conteúdo da próxima tabela não é uma leitura do que se encontra na placa, mas sim uma
restauração dos seus conteúdos, quer a nível das imprecisões originadas pelos danos que
11
_____________________________________________________________Mesopotâmia
a placa apresenta dada a sua antiguidade, quer como da correcção de alguns números
que não faziam sentido de ai se encontrarem. De qualquer modo, ainda voltaremos a
falar do porquê e do sentido destas correcções e interpolações.
1.3. Teorema de Pitágoras
1.3.1. O Teorema de Pitágoras e a Plimpton 322 – Várias Interpretações
No sub capítulo anterior fizemos uma observação rápida do conteúdo da Plimpton,
sem no entanto tentarmos entender o seu significado e com que interligação a podemos
visualizar.
Antes de mais, devemos lembrar que esta placa, aquando da sua descoberta, e até ser
estudada por Neugebauer, parecia tratar-se de uma placa, como tantas outras, com
conteúdos comerciais, em que os números não têm interligação aparente, para além de
simples registos numéricos.
O que é certo é que várias foram as interpretações feitas do seu conteúdo, consoante
cada historiador. O facto de algumas das entradas da tabela se encontrarem danificadas
o suficiente para se tornarem ilegíveis, permitiu obter um maior leque de hipóteses a
serem seguidas pelos matemáticos que sobre ela se debruçaram. Sendo assim, e
acrescendo o facto de no tempo em que a placa foi escrita o cálculo numérico não estar
desenvolvido como actualmente, proporcionou erros de arredondamento e erros de
realização, que puderam ser interpretados de formas divergentes pelos respectivos
historiadores.
1.3.1.1.
Interpretação de Neugebauer
Um dos primeiros historiadores a tentar perceber uma eventual interligação do
conteúdo das várias colunas da Plimpton foi Neugebauer. Até então, esta placa estava
catalogada como uma tabela de conteúdos comerciais.
Comecemos por traduzir a Plimpton ao jeito de Neugebauer.
A Plimpton encontra-se partida no extremo superior direito, pelo que o título da
quinta coluna está ilegível. Contudo, conjectura-se que aí estivesse o que se poderia
12
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traduzir pela palavra número. As entradas escritas a verde foram interpolações
realizadas para completar alguns símbolos da tábua que se deterioraram ao ponto de se
tornarem ilegíveis.
Temos então, na quinta coluna a sequência dos números naturais até ao 15 inclusive.
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
Figura 1.7 - 5ª Coluna da Plimpton
15
Note-se que, depois do que foi visto no estudo do sistema numérico babilónico,
basta-nos agora escrever o conteúdo das placas no sistema sexagésimal, passando
posteriormente para o sistema decimal.
Neste momento apresentamos a parte da fotografia da placa (Figura 1.7)
correspondente à coluna a que nos estivemos a referir, seguindo-se a sua escrita em base
sexagésimal (utilizando a notação actual) e a sua equivalência na base decimal nas
respectivas colunas do lado direito.
É óbvio que na primeira coluna não diferenciamos as bases sexagésimal e decimal,
uma vez que estas coincidem até ao número 59!
Os “Erros”, assim denominados por Neugebauer, serão escritos a vermelho com a
correcção por ele introduzida. Todos os zeros serão também interpolações realizadas,
uma vez que, como já vimos, no tempo a que se remete a Plimpton, os babilónicos não
possuíam um símbolo para o designar.
13
_____________________________________________________________Mesopotâmia
O título da segunda coluna inclui a palavra comprimento,
1,59
Figura 1.8 - 2ª Coluna
119
56,7
3367
1,16,41
4601
3,31,49
12709
1,5
65
5,19
319
38,11
2291
13,19
799
9,1 [8,1]
541 [481]
1,22,41
4961
45
45
27,59
1679
7,12,1[2,41]
25921[161]
29,31
1771
56
56
Na da terceira coluna a palavra diagonal,
Figura 1.9 - 3ª Coluna
2,49
169
3,12,1 [1,20,25]
11521 [4825]
1,50,49
6649
5,9,1
18541
1,37
97
8,1
481
59,1
3541
20,49
1249
12,49
769
2,16,1
8161
1,15
75
48,49
2929
4,49
289
53,49
3229
53 [1,46]
53 [106]
Como já mencionamos o lado esquerdo da placa encontra-se partido com vestígios
de cola, o que sugere que a placa já estava partida ou se partiu aquando das escavações,
e que alguém tentou remediar o facto sem sucesso. A placa encontra-se, assim, sem a
sua parte esquerda, o que nos sugere a eventualidade de inicialmente possuir outras
colunas com informação, que foram perdidas juntamente com a parte que se tentou colar
e da qual mais ninguém soube o paradeiro.
14
_____________________________________________________________Mesopotâmia
Na primeira coluna o título não se consegue discernir,
Figura 1.10 - 1ª Coluna
1,59,0,15
1,9834…
1,56,56,58,14,50,6,15
1,94916…
1,55,7,41,15,33,45
1,9188…
1,53,10,29,32,52,16
1,88625…
1,48,54,1,40
1,81501…
1,47,6,41,40
1,78519…
1,43,11,56,28,26,40
1,71998…
1,41,33,59,3,45
1,6928…
1,38,33,36,36
1,64267…
1,35,10,2,28,27,24,26
1,58612…
1,33,45
1,5625…
1,29,21,54,2,15
1,48942…
1,27,0,3,45
1,45002…
1,25,48,51,35,6,40
1,43024…
1,23,13,46,40
1,38716
Portanto, reescrevendo os dados da tabela, já com as traduções implementadas,
obtemos:
???
Comprimento
Diagonal
Número?
1,59,0,15
2,49
1,59
1
1,56,56,58,14,50,6,15
3,12,1 [1,20,25]
56,7
2
1,55,7,41,15,33,45
1,50,49
1,16,41
3
1,53,10,29,32,52,16
5,9,1
3,31,49
4
1,48,54,1,40
1,37
1,5
5
1,47,6,41,40
8,1
5,19
6
1,43,11,56,28,26,40
59,1
38,11
7
1,41,33,59,3,45
20,49
13,19
8
1,38,33,36,36
12,49
9,1 [8,1]
9
1,35,10,2,28,27,24,26
2,16,1
1,22,41
10
1,33,45
1,15
45
11
1,29,21,54,2,15
48,49
27,59
12
1,27,0,3,45
4,49
7,12,1 [2,41]
13
1,25,48,51,35,6,40
53,49
29,31
14
1,23,13,46,40
53 [1,46]
56
15
15
_____________________________________________________________Mesopotâmia
Ou analogamente, na base decimal, com a qual passaremos agora a trabalhar:
???
1,9834…
Comprimento
Diagonal
169
Número?
119
1
1,94916…
11521 [4825]
3367
2
1,9188…
6649
4601
3
1,88625…
18541
12709
4
1,81501…
97
65
5
1,78519…
481
319
6
1,71998…
3541
2291
7
1,6928…
1249
799
8
1,64267…
769
541 [481]
9
1,58612…
8161
4961
10
1,5625…
75
45
11
1,48942…
2929
1679
12
1,45002…
289
25921 [161]
13
1,43024…
3229
1771
14
1,38716
53 [106]
56
15
A partir deste momento consideremos as interpolações e correcções realizadas por
Neugebauer como lícitas, para conseguirmos entender como, segundo ele, terá sido
construída a tabela.
Observando agora a tabela:
y
d
 
 y
120
1,9834…
3456
4800
2
x
d
#
119
169
1
1,94916…
3367
4825
2
1,9188…
4601
6649
3
13500
1,88625…
12709
18541
4
72
1,81501…
65
97
5
360
1,78519…
319
481
6
2700
1,71998…
2291
3541
7
960
1,6928…
799
1249
8
600
1,64267…
481
769
9
6480
1,58612…
4961
8161
10
60
1,5625…
45
75
11
2400
1,48942…
1679
2929
12
240
1,45002…
161
289
13
2700
1,43024…
1771
3229
14
90
1,38716
56
106
15
16
_____________________________________________________________Mesopotâmia
Em cada caso aparece uma raiz quadrada perfeita, indicada na coluna y , sendo que
2
d
a outra coluna representa o quociente   . Este quociente, por outro lado, deu uma
 y
pista de como teria sido construída a tabela.
Por definição um terno pitagórico é
( x, y , d ) ,
x2 + y2 = d 2
igualdade:
onde x, y , d ∈ , que verifica a
, e para resolvermos esta equação
podemos começar por dividir todos os ternos por y 2 , obtendo-se:
x2 y 2 d 2
+
=
y2 y2 y2
x2
d2
⇔ 2 +1 = 2
y
y
Façamos agora umas pequenas mudanças de variável para
facilitar os cálculos.
Seja u =
d
y
x
Figura 1.11 - Triângulo
Rectângulo
x
d
e v = , então a nossa equação passa a ter o seguinte aspecto:
y
y
u 2 + 1 = v 2 , esta equação é por sua vez equivalente a
⇔ u 2 − v2 = 1
⇔ ( u + v )( u − v ) = 1
Então, dado o valor de u + v , podíamos encontrar o valor de u − v numa tabela de
inversos, uma vez que os números que constam da tabela são todos números regulares,
ou seja, números que o inverso tem uma expressão finita na base sexagésimal (segundo
Neugebauer).
Por exemplo, se
1

u + v = 2 :15  = 2  o seu inverso é
4

 4
u − v = 0 : 26, 40  =  .
 9
17
_____________________________________________________________Mesopotâmia
Resolvendo em ordem a u e v obtínhamos os valores
 65 
u = 0 : 54,10  = 
 72 
e
 25 
v = 1: 20, 50  = 1 
 72 
, os quais
multiplicados por y = 1: 72 ( = 72 ) , resultam nos números que constam na tabela na
linha 5.
Assumiu-se, assim, que os babilónicos estavam interessados em encontrar triângulos
rectângulos de formatos diferentes, cujos lados tivessem um comprimento com
representação finita na base em que utilizavam, ou seja a sexagésimal.
Na verdade esta tabela contem todos os triângulos rectângulos onde 31º ≤ α ≤ 45º
aproximadamente. Começa na primeira linha com um ângulo de amplitude 45º,
diminuindo gradualmente 1º por linha, correspondendo os valores da última linha da
tabela, a um triângulo rectângulo, com um ângulo de 31º. Sendo assim estão listados
nesta tabela todos os casos de triângulos rectângulos onde os comprimentos dos lados
são números regulares na base sexagésimal e um dos ângulos internos tem amplitude
31º ≤ α ≤ 45º .
1ª Linha
15ª Linha
Figura 1.12 - Triângulos rectângulos correspondentes aos dados da tabela
Esta interpretação feita por Neugebauer levou a algumas falsas suposições
realizadas por outros historiadores, que passaram a interpretar o conteúdo da Plimpton
como se tratasse de uma tábua de trigonometria. O que, como relataremos
posteriormente, não tem qualquer sentido, uma vez que segundo Eleonor Robson, o
conceito de ângulo não existia na época a que se remete a tábua.
18
_____________________________________________________________Mesopotâmia
Isto sucede porque
2
α
d
2
  = sec α
 y
d
e  
 y
d
y
2
está na segunda coluna da tabela, nas
x
condições acima referidas de números regulares.
Figura 1.13 - Triângulo
Rectângulo
Na realidade a única palavra que consta na tábua que introduz uma possível relação
geométrica é a palavra “diagonal”, que figura numa das entradas do cabeçalho.
Após verificação tanto da leitura do conteúdo da tábua, como da metodologia
aparentemente usada na sua construção, aceitou-se como razoável a explicação dada por
Neugebauer para os quatro erros, que foram aqui substituídos desde o início pelos
valores respectivos a essa mesma conjectura.
Assim sendo:
Na linha nove, onde aparece [9:1], deveria estar então [8:1], e neste caso
Neugebauer justifica o erro como um equívoco de transcrição.
Na linha treze, o valor [7:12,1] é o quadrado de [2:41] que seria o valor correcto,
e como tal, uma incongruência simples de justificar, uma vez que nesta tábua também
aparecem os quadrados dos respectivos números (segundo esta conjectura).
Na linha quinze [53], deveria ser [1:46] que é precisamente o seu dobro.
Finalmente na linha dois, onde figura [3:12,1] deveria encontrar-se [1:20,25]!
No que diz respeito a este último erro surgiram várias sugestões de como teria sido
cometido, mas nenhuma suficientemente convincente para aqui ser referida.
Ao longo de toda a sua pesquisa, Neugebauer começou a admitir que os babilónicos,
não só já teriam o conhecimento de como construir ternos pitagóricos da forma:
(p
2
+ q 2 , p 2 − q 2 , 2 pq )
como
também
escolheriam
os
valores de p e q de forma a obterem números regulares, o que como já vimos é
preponderante nesta “construção” da tabela, especialmente na coluna número dois, onde
são apresentados os valores de
d2
.
y2
19
_____________________________________________________________Mesopotâmia
De facto temos que:
p2 + q2 )
(
d2
d2
=
=
=
y 2 d 2 − x 2 ( p 2 + q 2 )2 − ( p 2 − q 2 )2
=
(p
=
2
+ q2 )
( 2 pq )
2
2
(p
2
+ q2 )
2
p 4 + 2 p 2q 2 + q 4 − p 4 + 2 p 2q 2 − q 4
2
(p
=
2
+ q2 )
4 p2q2
2
=
2
2
 1  p2 + q2   1  p q   1 
1
1 
= 
 =   +  =   p × + q ×  ,
q
p 
 2  pq    2  q p    2 
o que se obtém com facilidade através das tabelas de inversos.
A hipótese dos babilónicos já conhecerem este método de construção de ternos
pitagóricos fica ainda justificada pelo facto de, em algumas das linhas onde foram
cometidos “erros” nos valores de x e d , não existir “erro” onde figura o valor
correspondente a
d2
, sugerindo portanto que, este último valor teria sido calculado
d 2 − x2
com base noutras tabelas, e obtidos directamente a partir dos valores de p e q .
1.3.1.2.
Interpretação de Jöran Friberg
Outra interpretação bastante sugestiva foi a apresentada pelo historiador Jöran
Friberg, que defende que a tábua seria uma tabela de “ajuda ao professor”, ou seja, uma
relação que permitia ao professor saber antecipadamente os resultados de um certo
enunciado, propondo deste modo, aos seus discentes, apenas problemas que
envolvessem triângulos que possuíssem um ângulo recto.
Assim, se um professor pretendesse colocar um
problema do tipo: “Uma escada de comprimento
c , encontra-se encostada a uma parede, com uma
distância ao nível da base b da mesma, determine
até que altura da parede se consegue subir pela
escada?”, escolhendo os números b e c na tábua
de Plimpton, o professor estaria seguro que a
resposta à questão seria possível e “simpática”, isto
Figura 1.14 - Triângulo Rectângulo
20
_____________________________________________________________Mesopotâmia
é, um número com representação sexagésimal finita, que segundo a definição de
Neugebauer se designa, como já mencionamos, por um número regular.
Temos de ter em conta que esta interpretação se suporta na concepção de que as
tábuas teriam sido produzidas em função de dois tipos de contexto:
Placas de texto;
Placas de problemas.
Existiriam, portanto, tábuas de números quadrados, cubos, inversos e composição
das anteriores. Ou seja, as placas funcionariam para os Babilónicos como a actual
máquina de calcular.
Sendo assim, estas tábuas seriam utilizadas essencialmente nas Escolas de Escribas,
onde se ensinava o essencial para uma sociedade, onde era indispensável saber escrever,
contar, fazer alguns cálculos, entre outras competências. Na realidade, existem
inclusivamente tábuas de problemas resolúveis através de equações de segundo grau; é
claro que não podemos pensar que um escriba desta época tivesse um conhecimento de
Teoria Elementar de Números, equivalente aos dias de hoje (ou do mesmo nível do
utilizado por Neugebauer para explicar a sua teoria de como, eventualmente, foi
construída a placa de Plimpton), mas tinham de facto uma capacidade razoável de
resolução de problemas.
Outro factor preponderante para a boa percepção de como eram inseridos e
interpretados certos conteúdos, é a cultura em que estiveram embutidos e a função para
que eram preconizados no seu tempo. Ao examinarmos as instruções dadas nas placas
escritas pelos babilónicos, torna-se notável que o essencial era a sistematização da
resolução de cada “tipo” de problema e não propriamente o resultado final obtido.
Temos como exemplo deste facto, algumas placas nas quais por vezes um número é
multiplicado pela unidade, o que nos poderia parecer insólito e desnecessário, visto que
esse é o elemento neutro da multiplicação; contudo, essa multiplicação pela unidade
serve para relembrar ao estudante que estivesse a utilizar a tábua, que na resolução
daquele “tipo” de problema, o processo passava por uma multiplicação, eventualmente
por um número diferente da unidade consoante os dados do respectivo enunciado.
O facto de algumas das tábuas referentes a esta época serem descrições
pormenorizadas dos passos a seguir para resolver certos e determinados problemas
(usuais na sociedade decorrente deste período) sustenta de algum modo a teoria
proposta por Jöran Friberg.
21
_____________________________________________________________Mesopotâmia
1.3.1.3.
Interpretação de Leonor Robson
À medida que os anos foram passando, e não aparecendo nenhuma proposta mais
convincente do que a dada por Neugebauer, a Plimpton passou a ser interpretada
segundo a teoria deste historiador como sendo a original. De tal forma que, na maioria
dos livros de História de Matemática, a Plimpton não é apresentada como se encontra na
origem, mas sim com as correcções e interpolações sugeridas por Neugebauer como
sendo as originais, não sendo tão pouco chamada à atenção para o facto de não serem
aqueles os números que figuram na tabela original. As justificações deste matemático
foram aceites como verdades indubitáveis, e a sua teoria, por algum tempo, passou a ser
considerada como realidade, como um dado adquirido, onde não havia lugar para
dúvidas ou outras conjecturas.
Assim, permaneceu durante alguns anos até que Eleonor Robson em 1997 contrapôs
(Old Babylonian Mathematics, Seminário do SNHM, Coimbra), afirmando que a teoria
baseada na interpretação geométrica tinha de ser colocada de lado uma vez que, do
estudo que fizera de alguns textos desse tempo se inferia que os matemáticos desta
época não tinham noção de ângulo.
Vejamos como Eleonor Robson chegou a esta conclusão.
Em “Neither Sherlock Holmes nor Babylon: A Reassessment of Plimpton 322”,
Eleanor Robson começa por chamar à atenção para a importância da interligação entre
os artefactos encontrados e o contexto histórico que os envolve. Segundo a historiadora,
tal como num estudo policial, também na matemática os mistérios podem e devem ser
resolvidos por análise de nada mais se não o seu conteúdo.
Muitas vezes o mundo real, histórico e linguístico, não é tido em conta e acabam por
surgir várias interpretações de um mesmo trabalho. A fiabilidade da interpretação da
Plimpton, bem como de qualquer outro artefacto, deve depender inteiramente do
contexto em que este se encontra inserido. Ao contrário do que muitas vezes sucede,
tem de se ter o cuidado especial de não interpretar os factos encontrados com base na
actualidade, para não se correr o risco de procurar tesouros de sabedoria fora da
realidade vigente. Foi exactamente isto que sucedeu, na concepção de Eleonor Robson,
com todo o desenvolvimento feito em torno da Plimpton. Os historiadores viram o que
pretendiam e não, na realidade, o que se lá encontrava exposto. A aceitação tornou-se
tão óbvia que, como já dissemos anteriormente, a modernização e domesticação da
placa, fez com que esta passasse a ser apresentada, não com o seu conteúdo original,
22
_____________________________________________________________Mesopotâmia
mas apenas com todas as correcções realizadas por um historiador que as achou válidas.
Assim sendo, qualquer leitor passa pela dificuldade de interpretar como lícito o que o
autor pressupôs ser verdade, passando assim a tomar como realidade o que aí está
exposto, sem qualquer acesso à informação original, nem tão pouco ao facto de que o
que aí se lê ser uma interpretação de uma outra pessoa e não o objecto original.
Actualmente pode construir-se uma ideia da cultura milenar da época em estudo,
pois tanto quanto mais soubermos sobre uma sociedade, maior a credibilidade da análise
dos seus “produtos”, pelo que, não se justifica a incongruência de vermos o que
queremos, e não o que na realidade foi executado.
Uma das primeiras críticas que Eleonor Robson realizou, foi o facto da placa ter
sido simplesmente traduzida através da comparação com outras tábuas, muitas delas,
que apesar de terem sido encontradas na mesma época, não possuíam qualquer conteúdo
matemático.
Evidencia ainda o facto de na altura da descoberta das tábuas, haver o pressuposto
que se estas se encontrassem danificadas (partidas, ou com falta de alguns conteúdos
legíveis) a sua venda seria mais proveitosa uma vez que os preços atingidos eram
deveras mais elevados. Como a Plimpton é um destes casos, torna-se impossível
determinar o que lá se encontrava senão por pura especulação.
Segundo a mesma, os títulos das colunas, estando escritos num misto de quatro
línguas de diferentes povos, nomeadamente Sumério, Acádios, Assírios e Persas,
privilegiando a língua Suméria a e Acádia, fazem com que a tabela possa ser lida nos
dois sentidos. Contudo, é mais simples utilizar a leitura da direita para a esquerda.
Tal como Neugebauer, Eleonor refere também conteúdo dos lados e das diagonais
dos triângulos, no entanto questiona o porquê das colunas possuírem como cabeçalhos
as palavras quadrado, diagonal e comprimento, quando na realidade as restantes
entradas da tabela só contêm comprimentos de linhas. Segundo ela, a resposta reside no
facto de em Acádio a palavra “mithartun” derivar do verbo “mohärun”, que define “ser
igual e em simultâneo ser oposto”, o que significa literalmente “ coisa que é igual e
oposta a si própria em simultâneo”.
Em Acádio e em outras línguas, a palavra “quadrado”, também se pode referir ao
seu lado, ou seja, à sua raiz quadrada.
Por tudo isto “mithartun” não deve ser traduzido por “quadrado”, mas sim por
“lado do quadrado” ou analogamente “raiz quadrada”. Segundo a Matemática, esta
dualidade de significado da palavra não seria tão obscura quanto à partida poderia
23
_____________________________________________________________Mesopotâmia
parecer. Na realidade, na época existia uma lógia métrica, ou seja, medidas distintas
para dimensões distintas, como era o caso de comprimentos e de áreas, o que tornava
impossível para um escriba, qualquer tipo de ambiguidade quanto ao conteúdo do que
estivesse a trabalhar.
Quanto aos erros, Eleonor menciona que provavelmente três deles não são erros,
argumentando que apenas foram assim considerados devido à interpretação dada pelo
matemático que apresentou a respectiva teoria (Neugebauer). Acrescenta ainda que,
uma vez que a tábua se encontra escrita no sistema sexagésimal de vírgula flutuante, os
números serão por ela tomados como sendo números inteiros.
Eleonor Robson para refutar a teoria proposta pelos historiadores, onde se supõe que
a tábua teria sido realizada com base no conhecimento prévio dos p e q , indica que tal
não é propriamente viável, uma vez que, na tábua existem 44 números diferentes, o que
dá uma possibilidade de escolhas de 44 ×
43
= 946 pares por onde escolher. Se
2
supusermos que os babilónicos tinham familiaridade com a concepção de números pares
e números ímpares, poder-se-iam eliminar 12 ×
11
= 66 possibilidades de pares por onde
2
escolher, deixando assim 880 pontos de partida! Mesmo que levássemos mais longe e
considerássemos que os escribas tinham conhecimento sobre números primos entre si,
ficariam ainda 159 pares admissíveis. Como teria descoberto o escriba, quais destes 159
deveria escolher? Aleatoriamente?! Não faz muito sentido.
Para além desta falha, existe ainda uma outra que torna mais evidente que a tábua
não foi construída através desse processo. Admitindo a ordem das colunas, e
2
considerando que na coluna I se encontra ( p 2 + q 2 ) / 2 pq  , torna-se estranho o
método de cálculo proposto. Uma vez que, aparecendo à esquerda da coluna II e coluna
III, p 2 − q 2 e p 2 + q 2 respectivamente, seria de esperar, segundo o modo de escrita da
Babilónia antiga que contivesse os cálculos intermédios para os resultados da coluna II
e III, ou mesmo de ambas. Por exemplo, seria de esperar que aparecesse p 2 e q 2 , mas
em vez disto, temos os resultados derivados da coluna III; nem tão pouco podemos
interligar o cabeçalho da coluna I de forma a encaixar-se na interpretação dos p e q .
Em terceiro lugar temos ainda a análise dos “erros” da tábua. Não contando com os
erros provavelmente ocorridos na transferência de dados da tábua de cálculo para a
cópia da Plimpton, ou seja, erros de cálculo, está ainda por fundamentar os restantes três
24
_____________________________________________________________Mesopotâmia
erros, cuja explicação tem sido realizada através da coluna III, que não possui relação
simples com o valor correcto de p 2 + q 2 na teoria dos p e q !
A adicionar a tudo isto, Eleonor refuta ainda a ideia de que de algum modo a tábua
pudesse ser de conteúdo trigonométrico, dizendo que esta interpretação só surgiu por
alguns historiadores terem interpretado mal o comentário realizado por Neugebauer.
Para enfatizar um pouco mais a falta de sentido desta interpretação, Eleonor mostra,
como já referimos, que na realidade a noção de ângulo não existia ainda na antiga
Babilónia.
A Geometria /Área na antiga Babilónia era baseada na definição de componentes. A
área de uma figura era definida e calculada através da curva externa que a circunscrevia,
podendo ser segmentos de recta ou curvas. Em muitos casos, o nome que define a
componente e a figura propriamente dita (que se considera a área da figura) são
idênticos. Por exemplo, “círculo” e “circunferência” na antiga Babilónia eram ambos
designados por “kippatum” do verbo “kapâpum” – curvar. Tanto “quadrado” como o
seu lado eram designados por “mithartum” (como vimos previamente). “Rectângulo” e
a sua diagonal também tinham a mesma designação, apesar de neste caso a diagonal de
um rectângulo não ser suficiente para definir unicamente o seu rectângulo circundante,
somente a configuração mais simples, ou seja a do quadrado.
O conceito de “círculo” e “circunferência” é revelada não só na sua terminologia
mas também no modo como os círculos eram tratados em geometria.
Dois exemplos dados por Eleonor Robson são os dois círculos que se encontram
numas tábuas, provavelmente encontradas em Larsa, pertencentes agora à Universidade
de Yale. As tábuas têm, elas próprias, formato circular, com cerca de 8 cm de diâmetro,
(“quase como pequenos biscoitos”, Robson 2001), o que sugere que tenham sido
realizadas por estudantes nos seus trabalhos.
Na notação moderna elas aparecem com a seguinte figura.
Figura 1.15 - Placas YBC 7302 e YBC 11120
(Extraído de Robson, 2001)
25
_____________________________________________________________Mesopotâmia
Os números do primeiro círculo são fáceis de ler e como são inferiores a 60,
podemos tratá-los como números representados na base decimal, assim, rapidamente se
observa que 32 = 9 e que 45 = 5 × 9 . Como 45 se encontra no meio do círculo, podemos
“deduzir” que designa a sua área, a qual podemos designar por A . Também podemos
sugerir que o 3 e o 9, na parte interior do círculo estão relacionados com a
circunferência, que designaremos por C .
Sabemos que A = π r 2 , mas não temos nenhum raio marcado no círculo.
Também sabemos que C = 2π r , e como tal, através de alguma manipulação
2
2
 C  C
algébrica moderna podemos ver que A = π r = π 
.
 =
4π
 2π 
2
Assim, parece que 3 é o comprimento da circunferência, 9 é o seu quadrado, ou seja
C 2 . Substituindo valores temos então:
A=
C2
9
9
=
= 9 × 0;05 = 0; 45
4π 4π 4 × 3
esta fórmula com a do segundo círculo, tomando C = 1;30 , obtemos:
A=
ou seja
1;302 2;15
= 2;15 × 0;05 = 0;1115
4π
4× 3
11 15
3
+
=
em fracções actuais.
60 3600 16
Em outras palavras, a circunferência que é metade do comprimento da primeira
circunferência, é uma quarta parte da área da primeira.
Aparte da diferença aritmética de trabalhar em base decimal ou sexagésimal, estes
dois exemplos ilustram elegantemente a distinção fundamental entre o conceito
geométrico de círculo actual e o círculo na época a que nos referimos.
Enquanto que actualmente conceptualizamos o círculo como sendo a figura gerada
pela rotação do raio em torno do centro da circunferência, no período da Antiga
Babilónia, ele era visto como a figura circunscrita à circunferência. Mesmo quando era
conhecido o diâmetro do círculo, a sua área era calculada por este processo descrito.
Isto não significa que o raio numa circunferência não fosse considerado, pois ele
aparece em problemas sobre semicírculos.
Este tipo de raciocínio “apenas” nos dá a clara noção de que, naquele tempo, apesar
de o círculo poder ser desenhado com compasso, a definição não era realizada em
função do raio.
26
_____________________________________________________________Mesopotâmia
Sem uma definição de centro e de raio da circunferência, não podia existir uma
concepção ou mecanismos para medir ângulos.
Portanto, qualquer hipótese sobre a criação da Plimpton 322, tem de recair
inicialmente na primeira coluna e respectivos valores, não como objectivo, mas sim
como ponto de partida.
A comunidade matemática teve de se render às evidências e abrir as suas mentes a
uma nova interpretação para a Plimpton.
Na concepção de Eleonor Robson são utilizadas apenas noções de geometria de
áreas. Sendo assim, Eleonor sugeriu a seguinte conjectura para a criação da Plimpton.
Através das tábuas de inversos era fácil encontrar um rectângulo cuja área fosse um,
bastava que para tal se considerasse um lado cuja medida fosse n e o outro lado tivesse
de comprimento
1
.
n
Obter-se-ia algo como:
n
1
n
Figura 1.16 – Rectângulo de lados com comprimento n e
1
n
Seguidamente e utilizando geometria das áreas, podemos dividir o rectângulo em
três partes como se analisa na figura que se segue.
1
n
1

n − :2
n

1

n− :2
n

1
n
Figura 1.17 – Utilização de geometria das áreas no rectângulo considerado
Teríamos assim um quadrado de lado
1
1
, e dois rectângulos de altura
e
n
n
1

comprimento  n −  : 2 , cada um.
n

Reagrupando estes rectângulos num gnómon, podemos redesenhar a figura com o
seguinte formato:
27
_____________________________________________________________Mesopotâmia
1
n
1

n− :2
n

1
n
1

n− :2
n

Figura 1.18 – Gnomo correspondente ao rectângulo considerado
Podemos ainda considerar um quadrado com os lados com comprimento igual ao da
figura anterior, ou seja,
1
1
n + 
2
n
1
1
n+ 
2
n
Figura 1.19 – Quadrado de lado
1
1
n + 
2
n
Onde
1 1
1 1 n 1
+ n−  = + −
=
n 2
n  n 2 2n
n 1
= +
=
2 2n
1
1
= n+ 
2
n
28
_____________________________________________________________Mesopotâmia
Sendo assim o nosso rectângulo inicial teria a mesma área que a obtida pela
diferença de dois quadrados, nomeadamente
2
2
1 
1   1 
1 
 2  n + n   −  2  n − n   , o que facilmente se verifica por
  

 
manipulação algébrica:
2
2
1 
1   1 
1 
 2  n + n  −  2  n − n  =
  

 
1
1  1
1 
=  n 2 + 2 + 2  −  n2 − 2 + 2  =
4
n  4
n 
1
1
1
1
1 1
= n 2 + + 2 − n2 + − 2 =
4
2 4n 4
2 4n
1
=1 = n×
n
Que é a área do rectângulo inicial.
A igualdade que acabamos de obter é definida
por Friberg como sendo um rectângulo
normalizado, ou seja
1
1
 n + d
2
n
1
um rectângulo em que “o flanco” é um, a
hipotenusa é
1
1
 n +  e o cateto menor é
2
n
1
1
n −  .
2
n
x
1
1
n − 
2
n
Figura 1.20 – Triângulo rectângulo
considerado
Através de uma tabela de recíprocos obtém-se uma listagem dos triângulos
rectângulos de lados racionais, que mais uma vez vem coincidir com a proposta de
Friberg de a Plimpton poder ser uma tábua de ajuda aos professores, para colocarem
apenas problemas resolúveis aos seus alunos!
29
__________________________________________________________________Egipto
2. Egipto
2.1.
Introdução Histórico Temporal
2.1.1. Localização Geográfica
Quando falamos do Egipto, temos de ser um pouco específicos quanto à altura a que
nos referimos. Na realidade a Civilização Antiga Egípcia é frequentemente dividida em
três períodos distintos de modo a facilitar a localização/identificação da época a que nos
referimos:
Antigo Reinado – entre sensivelmente 2700 a.C. e 2200 a.C.;
Egipto Médio – entre sensivelmente 2100 a.C. e 1700 a.C.;
Novo Egipto – de 1600 a.C. a 1000 a.C.
O Egipto atingiu muito cedo um nível de civilização bastante alto. Podemos
questionar por que terá sucedido tal facto! A explicação não é difícil de encontrar por
qualquer um que se debruce sobre o assunto. A terra era generosa para com o seu
povo; o solo era muito fértil devido à presença do Nilo, o qual todos os anos, sofria
cheias transbordando as suas margens e alagando os
campos que o circunscreviam. Para além deste
pormenor, o clima era aprazível facilitando o
desenvolvimento da agricultura com boas colheitas.
Sendo um país rico, o único problema residia na
possibilidade de ocorrência de guerras com outros
países que poderiam atentar contra tanta sus tansa.
Contudo o Egipto possuía fronteiras de ordem
natural, uma vez que se encontrava rodeado de
desertos, providenciando assim uma barreira às
forças invasoras tal como podemos confirmar num
mapa da época (Figura2.1).
Figura2.1 - Mapa Antigo Egipto
(Extraído de http://www.ancientegupt.org/topography/giza/index.html)
30
__________________________________________________________________Egipto
Figura 2.2 - Mapa Actual Egipto
(Extraído de http://go.hrw.com/atlas/span_htm/egypt.htm)
2.1.2. O Povo
Por volta de 3000 a.C. as duas nações mais antigas desta região tinham-se unificado
e formado uma nação única, o Egipto, no qual as regras eram iguais em todo o seu
território.
A agricultura tinha sido desenvolvida de forma a tirar proveito dos períodos
regulares, secos e húmidos, ao longo do ano.
Como o Nilo se comportava de forma disciplinada, transbordando durante as
estações de chuva e providenciando uma terra fértil, tornou-se possível fomentar o
crescimento de óptimas colheitas implementando-se um complexo sistema de irrigação
que permitia que as terras se tornassem mais ricas, mesmo nos períodos de seca.
É de notar que para este desenvolvimento era fundamental saber em que época se
iniciariam as chuvas que fariam transbordar o Nilo, o que acabou por fundamentar o
desenvolvimento da Astronomia, no intuito de desenvolver um calendário informativo
fidedigno (sobre qual nos debruçaremos mais tarde).
A larga área que a nação Egípcia cobria, requeria uma administração complexa,
incluindo inclusive sistemas de impostos de forma a poderem ser mantidos os exércitos
que orientavam, entre outras, a boa cidadania. É de notar que uma das bases de
tributação era a área de terra de cultivo.
31
__________________________________________________________________Egipto
À medida que a sociedade se tornava mais complexa, tornava-se necessário a
existência de escrita e de numerais, de forma a ser possível registarem-se os ganhos e as
transacções que se efectuavam diariamente.
Em 3000 a.C., os Egípcios já tinham desenvolvido a sua escrita hieroglífica, e foi
este facto que demarcou o início do período do Antigo Reinado, que ficou imortalizado
pela construção das Pirâmides, por exemplo a Pirâmide de Giza, que foi construída por
volta de 2650 a.C., denotando um vasto, conhecimento Arquitectónico e de Engenharia.
Este artefacto demonstra já claramente o elevado nível de conhecimentos que esta
sociedade possuía no tempo a que nos referimos.
2.1.3. O Calendário Egípcio
Como observamos anteriormente, era vital para o povo Egípcio ter noção de quando
as enchentes do Nilo começariam a ocorrer, uma vez que disso dependia o sucesso da
agricultura, bem como a subsistência dos habitantes. A existência de um calendário, o
mais fidedigno possível, era portanto fundamental.
Na realidade este povo, era também a nível da astronomia muito avançado, e se aqui
fazemos uma incursão sobre algo que aparentemente nada tem a ver com o conteúdo do
nosso trabalho, é de facto pela magnificência do mesmo.
O início do ano era marcado pela subida heliacal da estrela Sirius (a primeira vez
que esta aparecia no céu após um período da sua ausência). Sirius trata-se da estrela
mais brilhante do céu, também conhecida por estrela do Norte. No calendário actual,
isto ocorre em Julho, o Nilo transbordava pouco depois desta data, pelo que fazia
sentido o início do ano coincidir com o início de toda uma época de trabalho. A subida
heliacal de Sirius chamaria, assim, a atenção da população para o início das cheias.
O ano era constituído por 365 dias e isto era certamente sabido por volta de 2776
a.C. pois este valor foi utilizado num calendário civil de registo de datas importantes.
Mais tarde surgiu um valor mais aproximado, 365 dias e
1
de dia, que era a duração
4
exacta de um ano. No entanto, este valor nunca foi utilizado para actualizar o calendário
Egípcio, pelo que não existiram anos bissextos como na actualidade.
Para além deste calendário, era tido em conta um outro calendário em paralelo, o
calendário lunar, o qual sabemos ser um dos modos de prever as alterações a nível
32
__________________________________________________________________Egipto
meteorológico. O calendário civil era dividido em 12 meses, todos eles compostos por
30 dias, tendo no final do ano um período de 5 dias para festejos, formando assim os
365 dias.
Para além da magnitude de um conhecimento desta envergadura ser um dado
adquirido naquele tempo (e como tal, merecer este lugar de destaque), é ainda de notar
que, apesar do calendário Egípcio ter sofrido várias alterações ao longo dos tempos,
acabou por constituir a base para os Calendários Gregoriano e Romano. Introduzido por
Júlio César, em Roma, por volta do ano 46 a.C. é também deste calendário que provém
o calendário actual!!!
Tudo isto demonstra o nível de conhecimento já atingido pela civilização Egípcia há
mais de quase 5000 anos!
2.2.
A Matemática no Egipto
2.2.1. Os vários tipos de escrita e numeração
Há que considerar três tipos diferentes de escrita da Antiguidade Egípcia.
O primeiro tipo de escrita foi através dos hieróglifos, ou seja, a escrita hieroglífica
realizada à base de figuras, às quais correspondiam significados. É fácil de perceber
como seria denotado por exemplo a palavra “pássaro”, contudo este tipo de escrita não
consegue representar muitas palavras. Os Egípcios ultrapassaram esta dificuldade
utilizando não apenas o que cada figura demonstrava, mas associando sons a cada uma
delas, podendo estas ser conjugadas de forma a obter outros significados. Isto tinha a
desvantagem da escrita depender essencialmente do contexto em que se encontrava
inserida, suscitando assim algumas dúvidas ou falsas interpretações.
Este tipo de escrita esteve presente desde 3000 a.C., resistindo até aos primeiros
séculos da era cristã, apesar de a partir de uma certa altura ser utilizada apenas em
inscrições formais ou registos em pedra.
Após a descoberta do papiro, tendeu-se a simplificar a escrita hieroglífica, a qual era
morosa, uma vez que por vezes para representar um certo conceito era necessário
“desenhar” várias figuras. Tentando então tornar mais rápida a escrituração, que deixava
33
__________________________________________________________________Egipto
agora de ser realizada apenas em pedra, irrompeu assim a escrita hierática, a qual
começou a ser utilizada por volta de 2000 a.C. É geralmente neste tipo de escrita que se
encontram registados a maioria dos papiros que possuem conteúdos históricos,
nomeadamente os de índole matemática.
Mais tarde surgiu ainda a escrita demótica, que como a própria palavra denota, se
destinava à população em geral. Tratava-se de uma simplificação da escrita hierática,
destinada a ser utilizada pelo povo nos seus apontamentos diários como registos ligados
ao trabalho, transacções comerciais, entre outros.
O sistema numérico Egípcio também sofreu as suas alterações. Possuíam um
sistema numeral hieroglífico decimal, mas com esta afirmação, pretendemos apenas
dizer que possuíam dez símbolos separados, um para representar a unidade, um para as
dezenas, e assim sucessivamente até a 106 . Na tabela seguinte podemos observar este
primeiro sistema:
Figura 2.3 - Primeiro sistema numérico
(Extraído de http://go.hrw.com/atlas/span_htm/egypt.htm)
A escrita dos números tornava-se simples uma vez que bastava repeti-los as vezes
necessárias consoante o número que se pretendesse representar.
Para uma melhor percepção apresentamos dois exemplos desta escrita, gravados
num artefacto arqueológico de nome Pedra de Karnac, a qual data de 1500 a.C.,
(encontra-se actualmente no museu do Louvre em Paris) apresentando a representação
dos números 276 e 4622, respectivamente.
34
__________________________________________________________________Egipto
Figura 2.4 - Representação do nº276
Figura 2.5 - Representação do nº 4622
(Extraído de http://go.hrw.com/atlas/span_htm/egypt.htm)
Note-se que a escrita hieroglífica era realizada da direita para a esquerda,
começando-se pelos símbolos que representavam um valor mais elevado e diminuindo
sucessivamente até aos de menor importância.
Por incrível que possa parecer, os Egípcios já trabalhavam com fracções, quase
exclusivamente unitárias (há excepção da fracção
fracção
2
utilizada frequentemente e da
3
3
utilizada menos vezes) tendo, inclusive, representação hieroglífica para as
4
mesmas. A necessidade de decompor uma fracção como soma de fracções unitárias
encontra-se vinculada aos algoritmos, por eles desenvolvidos, para realizarem as quatro
operações básicas, como observaremos posteriormente.
Assim sendo, para diferenciarem as fracções dos números inteiros, quando
pretendiam representá-las, colocavam um símbolo por cima do número que constaria do
actual denominador, representativo de uma “boca” que designava “parte”.
Ter-se-ia por exemplo:
Figura 2.6 - Representação de 1/3
Figura 2.7 - Representação de 1/5
(Extraído de http://go.hrw.com/atlas/span_htm/egypt.htm)
35
__________________________________________________________________Egipto
para representar as respectivas fracções. Quando o número continha muitos símbolos, o
símbolo que designava “parte” (a “boca”), era colocado por cima do primeiro hieróglifo
representativo do número.
Não esquecendo que a escrita era realizada da direita para a esquerda, por exemplo:
Figura 2.8 - Representação do nº 1/249
(Extraído de http://go.hrw.com/atlas/span_htm/egypt.htm)
À semelhança do que sucedeu com a escrita hieroglífica, também o sistema de
numeração foi sendo alterado. Aquando da introdução da escrita hierática (devido à
invenção do papiro), introduziu-se também uma escrita numérica hierática.
Esta representação numérica permitia aos
escribas escreverem os números de forma
muito mais compacta, não necessitando de
desenhar tantos símbolos para representar um
mesmo número.
Contudo passou a existir um outro senão,
é que passaram a ter de conhecer e
memorizar mais símbolos. O próximo quadro
apresenta esse tipo de escrita.
Passou-se assim de 10 símbolos que
representavam todos os números, por a
necessidade de se utilizarem 36 símbolos,
para se poderem representar os mesmos que
anteriormente.
Figura 2.9 - Outro sistema numérico
(Extraído de
http://go.hrw.com/atlas/span_htm/egypt.htm)
Porém, com este sistema era possível escrever os mesmos números utilizando-se
muito menos símbolos, economizando-se tempo e espaço. Por exemplo, o número 9999
passava agora a ser representado apenas por quatro símbolos, enquanto que com a
escrita anterior seriam necessários trinta e seis.
36
__________________________________________________________________Egipto
Uma das grandes diferenças entre a escrita hierática e o nosso sistema numérico é
que a escrita hierática não era posicional, pelo que os numerais podiam ser escritos
segundo qualquer ordem; por exemplo, o número 2765 pode ser representado como:
ou
Figura 2.10 - Uma Representação de 2765
Figura 2.11 - Outra Representação de 2765
(Extraído de http://go.hrw.com/atlas/span_htm/egypt.htm)
Ou ainda, qualquer outro tipo de combinação entre estes quatro símbolos.
Da mesma forma que a escrita hierática sofreu alterações ao longo dos tempos, o
mesmo sucedeu com a numeração hierática, só que nesta sucedeu com maior
frequência; podemos dividir estas alterações em seis períodos distintos, enquanto que a
escrita só sofreu três mudanças. Sendo assim, é natural que se encontre noutros livros
outros sistemas de numeração da época hierática Egípcia; o que aqui tem vindo a ser
apresentado data de cerca de 1800 a.C.
É de notar ainda que, tal como com a escrita hieroglífica, também com a numeração
sucedeu algo de semelhante, os dois sistemas (hieroglífico e hierático) foram utilizados
em simultâneo ao longo de 2000 anos, sendo que, mais uma vez, os hieroglíficos eram
utilizados para gravar na rocha, enquanto que a escrita hierática era usada para a escrita
em papiro.
2.2.2. Exemplares de Artefactos Arqueológicos
Os numerais hieroglíficos podem ser encontrados em diversos lugares desde
templos, monumentos em pedra e até em vasos. Nestes exemplares encontra-se pouco
conhecimento sobre como os cálculos matemáticos eram desenvolvidos com o seu
sistema numérico.
Enquanto os hieroglíficos foram cravados em pedra, não foi necessário desenvolver
símbolos que pudessem ser escritos de forma mais rápida. Contudo, e como já foi
referido no sub capítulo sobre a escrita e a numeração hieroglífica e hierática, a partir do
momento em que os Egípcios começaram a utilizar folhas de papiro seco e a escrita
37
__________________________________________________________________Egipto
passou a ser realizada com um tipo de “caneta”, predispôs o desenvolvimento da escrita
hierática de letras e numerais.
Devem ter existido um grande número de papiros, muitos deles ilustrando de
diversos modos a Matemática aí utilizada, mas infelizmente, dada a fragilidade do
material, quase todos pereceram, devido às circunstâncias climáticas do Egipto,
nomeadamente o seu alto nível de humidade, sendo até notável a sobrevivência de
alguns.
Destes escassos documentos, destacam-se dois com maior conteúdo Matemático, o
Papiro de Rhind e o Papiro de Moscovo. É através destes dois documentos que a
maioria do conhecimento da matemática Egípcia chegou até aos nossos dias.
2.2.3. Papiro de Rhind e Papiro de Moscovo
O papiro de Rhind ficou assim denominado, depois do egiptólogo A. Henry Rhind o
ter comprado em 1858, em Luxor. Este papiro é um “rolo” de aproximadamente 5, 5m
de comprimento por 33cm de largura. Escrito por volta de 1650 a.C. por um escriba de
nome Ahmes, trata-se de uma cópia de um documento com 200 anos, de acordo com o
que Ahmes afirma no mesmo. O manuscrito original em que se baseia o papiro de
Rhind data portanto de 1850 a.C. Este é também denominado por papiro de Ahmes,
uma vez que esse é o nome de quem o copiou. O artefacto encontra-se actualmente no
British Museum em Londres.
Um outro papiro mesma época, conhecido pelos seus conteúdos matemáticos é o
papiro de Moscovo. O seu nome provém do facto de se encontrar actualmente no
Museum of Fine Arts em Moscovo. Não se conhece o nome do escriba que o executou,
pelo que só tem mais uma designação, ou seja, papiro de Golenischev, o nome de quem
o adquiriu.
O papiro de Moscovo contém apenas 25 problemas, enquanto que o papiro de Rhind
possui mais de 80 questões. Os problemas propostos nestes documentos são sobretudo
de índole prática, existindo no entanto alguns que demonstram a manipulação do
sistema numérico propriamente dito. Por exemplo, os primeiros seis problemas do
papiro de Rhind é pedido para dividir n pães entre 10 homens, onde no Problema1
n = 1 , no Problema2 n = 2 , no Problema3 n = 6 , no Problema4 n = 7 no Problema5
38
__________________________________________________________________Egipto
n = 8 , no Problema6 n = 9 ; claramente são aqui envolvidas fracções. É de notar que
entre os 87 problemas propostos neste papiro, 81 deles envolvem operações com
fracções.
É ainda de salientar que o papiro de Rhind se inicia por uma tabela que fornece a
duplicação de todas as fracções unitárias de denominador n ímpar, onde n varia entre 5
e 101. Ahmes não necessitou de fornecer na tabela as duplicações de
uma vez que ter-se-ia apenas
1
com n par,
n
1
onde m = 2n .
m
Veremos de seguida o porquê da importância desta tabela ser merecedora do lugar
de destaque por iniciar o papiro de Rhind.
A tábua começa por:
Fracção Unitária
Duplicação da Fracção Unitária
1
5
1 1
+
3 15
1
7
1 1
+
4 28
1
9
1 1
+
6 18
1
11
1
13
1
15
1 1
+
10 30
1
17
1 1 1
+ +
12 51 68
A tabela original não contém erros. De facto, o papiro de Rhind apresenta poucos
erros, mas os que aparecem como erros, parecem ser erros de cálculo e não de cópia,
uma vez que os erros são levados ao longo de todo o exercício, em vez de surgirem
posteriormente corrigidos (o que aconteceria caso fossem erros de duplicata).
O sistema numérico Egípcio não era muito ajustado a cálculos aritméticos. O
mesmo sucede com a numeração Romana; existindo actualmente uma certa
39
__________________________________________________________________Egipto
familiarização com esta, torna-se perceptível que a adição de numerais romanos é
satisfatória, embora a multiplicação e a divisão sejam praticamente impossíveis.
O sistema Egípcio possuía desvantagens semelhantes às do sistema Romano.
Contudo, isso foi contornado através da introdução de algoritmos. A descoberta destes
algoritmos deveu-se provavelmente à componente prática dos Egípcios no trato e
aplicação da Matemática. Nestes algoritmos são apenas envolvidas adições, como
ilustraremos seguidamente.
A realização de tais algoritmos exigia o manuseamento de fracções, problema que
também foi ultrapassado com sucesso.
Para ultrapassarem as deficiências do seu sistema numérico, os Egípcios
desenvolveram métodos perspicazes e inteligentes de forma a poderem resolver
multiplicações sendo aqui que enfatizando-se a importância da tabela anteriormente
referida.
Vejamos, então, como eram executadas as operações básicas, e como estão
exemplificadas nos papiros que chegaram até nós.
Ahmes, no papiro de Rhind, ilustra o método egípcio para a multiplicação do
seguinte modo: assuma-se que se pretendemos multiplicar 41 por 59.
Consideremos o número 59 e adicionemo-lo a si próprio, posteriormente,
adicionemos o resultado a si próprio e continuemos o processo:
41
59
1
59
2
118
4
236
8
472
16
944
32
1888
Uma vez que 64> 41, não necessitamos de prolongar o processo, pelo que paramos
na entrada do número 32.
40
__________________________________________________________________Egipto
Seguimos agora para uma sequência de subtracções:
41 − 32 = 9
9 −8 =1
1−1 = 0
Assim, conseguimos escrever
41 = 32 + 8 + 1
De seguida, identificamos os números da coluna direita da tabela que correspondem
a 32, 8 e 1, marcamo-los, por exemplo com um visto ou uma seta, e de seguida
procedemos à sua adição, ou seja,
59 + 472 + 1888 = 2419
Note-se que a multiplicação é obtida utilizando apenas a adição.
Invertendo a ordem de entrada na tabela e repetindo o processo temos:
59
41
1
41
2
82
4
164
8
328
16
656
32
1312
2419
Obtínhamos assim que a multiplicação de 41 por 59 tem como resultado 2419!
Note-se que este método pressupõe o conhecimento de que cada número pode ser
escrito como potências de base 2. Os antigos Egípcios não tinham prova disto, nem tão
pouco teriam sentido necessidade da sua existência; sabiam por experiência prática que
tal era sempre possível, pelo que utilizavam esse conhecimento.
Notemos que este método pode ser comparado com o recente uso da aritmética
binária. Basicamente podemos pensar neste método como escrever um número em
potências de base 2, pelo que, nos exemplos anteriores teríamos:
41 = 1 ⋅ 20 + 0 ⋅ 21 + 0 ⋅ 22 + 1 ⋅ 23 + 0 ⋅ 24 + 1 ⋅ 25
52 = 1 ⋅ 20 + 1 ⋅ 21 + 0 ⋅ 22 + 1 ⋅ 23 + 1 ⋅ 24 + 1 ⋅ 25
.
41
__________________________________________________________________Egipto
A divisão também era obtida através do sistema de duplicação.
Por exemplo, para dividirmos 1495 por 65, procederíamos do seguinte modo:
1
65
2
130
4
260
8
520
16
1040
Mais uma vez parávamos neste momento as iterações, pois de outra forma, na
seguinte já obteríamos um número superior a 1495.
Agora, e de modo análogo ao que foi realizado para a multiplicação, procuramos e
assinalamos os números da segunda coluna, que uma vez adicionados permitissem obter
umdão o resultado pretendido, ou seja:
1495 = 65 + 130 + 260 + 1040
Adicionando agora os números que se encontram na coluna da esquerda obtemos:
23 = 16 + 4 + 2 + 1
pelo que 1495 dividido por 65 teria como resultado 23!
O que sucederia se a divisão não fosse exacta? Para os Egípcios tal problema não se
colocava! Os Egípcios continuariam o método utilizando fracções como demonstra o
exemplo que se segue.
Para se dividir 1500 por 65 procederíamos do mesmo modo.
1
65
2
130
4
260
8
520
16
1040
E novamente pararíamos aqui, uma vez que a próxima iteração levar-nos-ia a um
número superior a 1500.
42
__________________________________________________________________Egipto
Agora procurávamos os números da coluna da direita, que uma vez adicionados
permitissem obter um número n , tal que 1500 − 65 < n ≤ 1500 , (mais uma vez os
Egípcios tinham o conhecimento de que isto era sempre exequível),
1495 = 65 + 130 + 260 + 1040
E faltam apenas 5 unidades para obtermos a soma pretendida (1500). Novamente,
marcar-se-iam as entradas das linhas usadas e somávamos os respectivos números da
coluna esquerda.
23 = 16 + 4 + 2 + 1
e assim, dividir 1500 por 65 teria por resultado 23 e
unitárias, como era realizado na época, 23 e
5
, ou utilizando fracções
65
1
. Se eventualmente a solução não
13
envolvesse uma fracção unitária, os Egípcios tratariam de o fazer, dando a resposta
como uma soma de fracções unitárias.
Falta-nos apenas visualizar como eram realizadas as operações que envolviam
fracções, logo no enunciado. Constatemos novamente a perícia destes antepassados.
1 1
Vejamos agora como multiplicar, usando os métodos Egípcios: 1 + +
por
3 5
1
30 + .
3
Comecemos então por considerar:
1
2
4
8
16
2
3
1
3
1 1
1+ +
3 5
2 1 1
1
2+ + + = 3+
3 3 15
1
1 1
6+ +
10 30
1 1
12 + +
5 15
1 1 1 1
24 + + + +
3 15 10 30
2 1 1 1 1
+ + + +
3 6 18 10 30
1 1 1
1
1
+ + + +
3 12 36 20 60
43
__________________________________________________________________Egipto
1
Paramos aqui para procurar os números da coluna da esquerda que somam 30 + ,
3
marcando essas linhas. Se adicionarmos os números correspondentes na coluna da
direita obtemos:
1 1 1 1 1
1
46 + + + + + + .
5 10 12 15 30 36
1 1
Obtemos assim resposta ao problema inicial de quanto seria o produto de 1 + +
3 5
1
por 30 + .
3
Terminamos a “viagem” pelo Papiro de Rhind, visualizando a resolução dada para o
Problema50.
Problema50: Um campo circular tem de diâmetro 9Khet. Determine a sua área.
Ahmes a esta pergunta, responde com a seguinte solução:
Tire-se
1
do diâmetro (que consideramos como unidade) sobrando assim 8
9
pequenas partes. Multipliquemos 8 por 8, obtendo 64. Sendo assim contém 64 partes de
terra.
Ou seja,
1
9
1
9
1
1
8
2
16
4
32
8
64
isto retirado ficamos com 8
Logo a área é 64.
44
__________________________________________________________________Egipto
Este exemplo foi mencionado, na medida que a ele corresponde à utilização de
8
2
π = 4   = 3,1605 o que é uma notável aproximação se tivermos em conta o ano a
9
que se remota. De facto, e resolvendo em notação actual, obteríamos:
2
2
9
2
64 = π r ⇔ 64 = π   ⇔ π = 64   ⇔
 2
9
2
2
2
2
2
 22 × 2 
2
2
8
π = 2 ×   = 22 × 24 ×   = 4 
 = 4  .
9
9
9
 9 
6
Contudo, a matemática egípcia era ainda mais rica do que até agora foi descrito.
Vejamos alguns exemplos de problemas que eram resolvidos na época. A diversidade e
amplitude de áreas contempladas eram grandes, e aparecem problemas onde se pede a
solução de uma equação, como é o caso do que se segue:
Problema26: Uma quantidade adicionada a um quarto dessa quantidade é igual a 15.
Qual é essa quantidade?
Outros que envolvem séries geométricas, como por exemplo:
Problema64: Divida dez pães por dez homens, para que, cada homem tenha
1
de pão a
8
mais do que o homem precedente.
Outros são geométricos:
Problema50: Um terreno circular tem de diâmetro 9 khet (unidade de comprimento
utilizada na época). Qual a sua área?
O papiro de Moscovo contém teores semelhantes.
Contudo, contém uma resolução que faz todo o sentido referir neste trabalho, não só
por ser considerada por muitos historiadores como o mais impressionante conhecimento
da matemática Egípcia, mas também por estar intimamente ligada às pirâmides, das
quais vamos falar de seguida.
45
__________________________________________________________________Egipto
Figura 2.12 – Papiro de Moscovo
(Extraído de http://www-history.mcs.st-andrews.ac.uk/HistTopics/Egyptian_papyri.html)
Problema16: Calcular o volume da pirâmide cuja base é um quadrado de lado 4 cubits,
o topo da pirâmide é um quadrado de lado 2 cubits e a altura é de 6 cubits.
Note-se que o autor escreve “calcular o volume da pirâmide” embora se refira ao
cálculo do volume da pirâmide truncada! Notemos ainda o quão apropriado é este
cálculo nesta civilização, que é ainda hoje universalmente conhecida pela notável
construção das pirâmides.
O cálculo segue os seguintes passos:
- Inicia-se pela determinação da área da base: 4 × 4 = 16 .
- Segue-se o cálculo da área do topo, ou seja: 2 × 2 = 4 .
- De seguida o produto do lado da base pelo lado do topo: 4 × 2 = 8 .
- Estes três resultados são de seguida adicionados: 16 + 4 + 8 = 28 .
- Agora
1
da altura é 2.
3
- Finalmente, o produto de
1
da altura pela soma anterior dá o resultado 56,
3
considerado como resposta final.
46
__________________________________________________________________Egipto
Este exemplo significa que os Egípcios conheciam a fórmula do volume (embora
não de um modo algébrico como aqui exporemos). Sendo o lado da base quadrada a , o
lado do topo b e a altura h , então:
V = h ( a 2 + ab + b 2 ) / 3 .
Analisando o conteúdo destes papiros chega-se à conclusão que os Egípcios tinham
uma visão muito prática da matemática, ao contrário do que veremos posteriormente na
sociedade Grega, onde a matemática passa a ter uma forte componente abstracta.
A maioria dos historiadores acredita que os Egípcios não pensavam nos números
como quantidades abstractas, mas sempre através de colecções de objectos, ou seja,
quando consideravam o número 3, eles concretizavam um conjunto com 3 objectos. Do
facto de não existirem registos de justificações dos seus métodos, resultavam apenas
exemplos de como os resolver. O importante era solucionar os problemas e não perceber
o porquê de tal solução ser fidedigna.
2.3. Teorema de Pitágoras
2.3.1. A Pirâmide de Guiza
O Egipto ficou conhecido durante muitos anos, como sendo um país detentor de
uma das sete maravilhas do Mundo – as Pirâmides do Egipto. Muitos assim as
consideram pela sua magnitude visual, pelo sua excelência em termos arquitectónicos,
principalmente quando se considera o tempo a que se remota a sua construção.
Contudo, e se observamos todas as coincidências, ou não, inerentes à sua
arquitectura, perceberemos porque é que as Pirâmides de Guiza ocupam o primeiro
lugar da lista das maravilhas do mundo antigo.
As Pirâmides de Guiza são um conjunto de três pirâmides (Figura 2.13), sendo que
cada uma corresponde a um membro da dinastia dos Reis Kufu ou Quéops. A primeira e
mais majestosa foi mandada construir por Quéops, o segundo Rei da 4ª Dinastia, que
posteriormente mandou construir a pirâmide Quéfren para ser o túmulo de seu filho e
ainda a pirâmide de Miquerinos para futuro túmulo de seu neto.
47
__________________________________________________________________Egipto
Figura 2.13 - Da esquerda para a direita: Pirâmides de Quéops, Quéfren e Miquerinos.
(Extraído de http://pt.wikipedia.org/wiki/Pir%A2mides_de_Giz%C3%A9)
A maior delas, também designada como a
Grande
Pirâmide,
tinha
146,6m
de
altura,
(actualmente 137,16 m devido à erosão e desgaste
ao longo dos tempos). Após 4500 anos da sua
construção, ainda se consegue ver do seu topo
desde a cidade Saladin a Este de Cairo, e para Sul
até tão longe quanto Dashur. É simplesmente a
maior das 80 pirâmides existentes no Egipto. Foi
mandada construir cerca de 2550 a.C. no auge do
Figura 2.14 - Mapa Pirâmides de Guiza
(Extraído de http://www.ancientegypt.org/guiza/index.html)
antigo reinado, por e para, pertencer a Quéops.
Esta pirâmide orienta os quatro pontos cardeais. A sua orientação permite que os
raios luminosos da estrela Sirius, ao passarem por esse meridiano, atravessem a câmara
do núcleo da pirâmide através de um canal. Era assim que naquela época, aquando a
subida heliacal da estrela Sirius, se demarcava o início do ano e o começo das cheias do
Nilo, como que se anunciar ao seu Rei, mesmo depois deste morto.
A Grande Pirâmide manteve-se como sendo a mais alta estrutura construída pelo
homem até 1889 momento em que foi ultrapassada, em altura, pela Torre Eiffel, cerca
de 4500 anos após a sua construção!
A título de curiosidade podemos mencionar o facto de que se os seus blocos de
pedra da Grande Pirâmide fossem alinhados sobre o equador, conseguirem perfazer 2/3
do mesmo. Os seus blocos foram justapostos, como se de legos se tratasse, não sendo
utilizado qualquer tipo de cola ou cimento. Os lados da pirâmide, ao contrário do que
parece à vista desarmada, são ligeiramente côncavos, apenas o suficiente para aumentar
o reflexo da luz solar. Talvez por coincidência, o raio dessa inclinação é igual ao raio da
Terra!
48
__________________________________________________________________Egipto
Para essa reflexão solar ser possível foi necessário colocar uma cobertura de pedra
calcária compacta de cor branca semelhante ao mármore, mas preterida a este, de forma
a surtir esse efeito.
Terminamos esta análise acrescentando que as pirâmides mandadas construir para o
filho e o neto, Reis descendentes de Quéops, foram construídas em locais “especiais”.
Assim, e de acordo com o que
podemos
visualizar
na
planta,
o
alinhamento das três pirâmides e os seus
templos
mortuários
particularidades;
os
têm
lados
algumas
Oeste
das
pirâmides de Quéops e de Quéfren
encontram-se
quase
perfeitamente
alinhados com as faces Estes de Quéfren e
de Miquerinos respectivamente. O lado sul
da pirâmide de Quéfren forma uma linha
recta com o lado sul do Templo do Vale de
Khafre.
Figura 2.15 - Planta Pirâmides de Guiza (Extraído
de http://www.mariomarcia.com)
Legenda da Figura 2.15:
1 - Grande Pirâmide de Cheops (Khufu);
10 - Templo da Esfinge;
2 - Pirâmide da Filha de Cheops;
11 - Templo do Vale de Khafre
3 - Túmulo de Hetepheres;
12 - Pirâmide de Miquerinos (Menkaure);
4 - Buracos de Barcos (boat pits);
13 - Templo Mortuário de Miquerinos;
5 - Boat Museum;
14 - Passagem de Miquerinos;
6 - Pirâmide de Khafre;
15 - Templo do Vale de Miquerinos;
7 - Templo Mortuário de Khafre
16 - Pirâmides das Rainhas;
8 - Passagem do Templo do Vale;
17 - Túmulo de Khentkaus.
9 - Grande Esfinge;
Mas o mais interessante de todos estes factos é que os vértices a Sudoeste de cada
uma das pirâmides reais, formam uma linha recta, uma diagonal de Noroeste para
Sudeste. Como a pirâmide de Miquerinos é menor, isto explica o facto do seu centro
não se encontrar alinhado com os centros das outras duas pirâmides. Só se pode
especular sobre este alinhamento, porque também se verifica noutras pirâmides. Alguns
49
__________________________________________________________________Egipto
historiadores pensam que a diagonal Noroeste tinha eventualmente subjacente a
intenção de apontar para o santuário em Heliópolis, casa do culto ao sol.
Muitos historiadores defendem que o primeiro contacto que Pitágoras de Samos teve
com o que seria posteriormente o Teorema de Pitágoras, se deu aquando da sua visita ao
Egipto. Nesta visita, Pitágoras terá estado em contacto com a matemática Egípcia, bem
como com a aplicação diária da mesma. Como é sabido, o Nilo transbordava todos os
anos, e como já foi referido, até o calendário egípcio tinha este factor por base. Assim,
todos os anos eram necessário remarcar as áreas de cultivo, utilizando a corda dos 12
nós, ou seja, o terno pitagórico (3,4,5).
2.3.2. O Teorema de Pitágoras e as Pirâmides
A pirâmide que observaremos também de modo mais detalhado no que respeita aos
conteúdos matemáticos, é a Grande Pirâmide, devido às suas consideráveis medidas
terem dado lugar a várias especulações por parte dos historiadores matemáticos, que
terão realizado diversas conexões de teores matemáticos diversos, entre eles alguns
relacionados com a Matemática Pitagórica.
Joseph e muitos outros autores analisaram as medidas da pirâmide de Guiza,
levando-os a acreditar que esta foi construída, tendo como base certas constantes
matemáticas não propriamente “inocentes”.
Assim sendo, vejamos algumas supostas, ou não, coincidências! O ângulo entre a
base da pirâmide e uma das faces é 51º50’35’’, a secante deste ângulo é 1.61806… que
é notavelmente aproximado de
1+ 5
, o famoso número de ouro utilizado na divina
2
proporção na pintura, na escultura e na arquitectura ao longo dos tempos (por se tornar
agradável à vista humana). Não queremos com isto dizer que os Egípcios tivessem a
noção e o conhecimento de secante de um ângulo, mas não deixa de ser curioso verificar
que esta coincide com o quociente entre a unidade e o seno do ângulo formado pelos
lados da pirâmide.
Por outro lado, a medida da co-tangente do ângulo entre a base e a face lateral da
pirâmide é muito próximo de
π
4
. Mais uma vez não querendo dizer que os Egípcios
50
__________________________________________________________________Egipto
tivessem conhecimento desta razão trigonométrica, mas sim apenas que a razão dos
lados da pirâmide parece ter sido realizada de forma a se obter este número.
Desta forma, podemos unicamente admitir que terá existido algum tipo de relação
entre a razão do número de ouro e π . De facto existe uma coincidência numérica, entre
o facto da raiz quadrada da razão de ouro multiplicada por π ser aproximadamente 4, e
de na realidade esse produto ser igual a
1+ 5
× π 3,996168 ….
2
Robins, um outro historiador, contesta tanto a teoria da razão de ouro como de π ,
estarem deliberadamente envolvidos na construção da pirâmide. Ele afirma que a razão
entre a altura vertical e a distância horizontal foi escolhida para ser 5
que
1
de 7, e o facto é
2
11
× 4 = 3,1428 , o que não é uma má aproximação de π . Ainda assim, isto não
14
passaria de uma simples coincidência. Do mesmo modo, sustenta que a razão de ouro se
obtém também de uma simples coincidência. Robins afirma que certas construções eram
realizadas para que o triângulo que se formava com a base e a altura fosse de
comprimentos correspondentes ao terno pitagórico (3,4,5). Certamente seria mais
verosímil que os engenheiros utilizassem o conhecimento matemático para construírem
ângulos rectos, em vez de utilizarem razões entre a razão de ouro e o valor de π .
Mais uma vez nos deparamos com a grande dificuldade dos historiadores da
Historia da Matemática, que é a de saber até que ponto estão lá os resultados à vista, ou
se somos nós que os queremos descortinar?!
Quanto ao Teorema de Pitágoras no Antigo Egipto, chegamos no epílogo à conclusão de
que não existe um artefacto que comprove directamente o seu conhecimento. Apenas
podemos ter a certeza que utilizavam no seu quotidiano o terno (3,4,5) para obterem
ângulos rectos (como é exemplo a construção e as proporções da Grande Pirâmide).
A verdade é que possuíam conhecimentos a nível
da
Matemática,
Arquitectura,
Engenharia
e
Astronomia, entre outros, bastantes mais complexos
do que o Teorema de Pitágoras (como temos vindo a
exemplificar com os Papiros de Rhind e de Moscovo,
ao longo de todo este capítulo).
Figura 2.16 - Terno Pitagórico
(Desenhado pela autora utilizando
Sketchpad)
51
__________________________________________________________________Grécia
3. Grécia
3.1.
Introdução Histórico Temporal
3.1.1. Contextualização Geográfica
A história da civilização grega pode parecer um pouco complexa, uma vez que é
subdividida em seis períodos. Passamos a enumerá-los, ressalvando que as épocas que
estão subjacentes ao nosso estudo são principalmente relativas aos dois últimos, como
se verificará com facilidade pelas datas. Os períodos são os seguintes:
•
Pré-Homérico (1900-1100 a.C.) – período anterior à chegada dos Fenícios e dos
Cretenses;
•
Homérico (1100-700 a.C.) – Aquando a chegada de Homero, que seria
imortalizado pelas suas obras, Odisseia e Ilíada.
•
Arcaico (800-500 a.C.) – Início do progresso económico e da organização da
Grécia através de cidades estado;
•
Clássico (500-338 a.C.) – Discutível, mas considerado por muitos como o
período do esplendor da civilização grega. Esparta e Atenas eram as cidades
consideradas mais importantes nesta época e rivalizavam entre si.
•
Helenístico (338-146 a.C.) – Após a morte de Alexandre o Grande, altura em
que a pólis (cidade) grega entra em crise, e à qual se seguem as invasões
macedónicas.
Contudo, e como foi escrito, o início do progresso económico teria ocorrido por
volta de 800 a.C. Nesta altura os Gregos mudaram o seu sistema de escrita, de
hieroglífica para o alfabeto fenício, o que lhes permitiu registar com mais facilidade os
seus conhecimentos. Na ausência de papel, nessa época os gregos escreviam os seus
textos em papiro. Infelizmente, a maioria dos textos matemáticos não sobreviveu até aos
nossos dias na sua versão original. Alguns não resistiram de todo, outros chegaram até
nós por intermédio de comentários e menções escritas em livros posteriores, ou de
traduções para o árabe e do árabe para o latim. O papiro era um material que se
deteriorava com alguma facilidade, principalmente quando sujeito a ambientes húmidos,
e como naquele tempo o único modo de ter outros exemplares de um livro pressupunha
52
__________________________________________________________________Grécia
a sua reprodução e cópia manual de um outro original, tornava-se dispendioso e moroso
fazê-lo. Assim sendo que, só os trabalhos mais relevantes eram copiados.
Na Figura 3.1 podemos observar um mapa da Grécia Antiga, no auge da sua
expansão, altura em que Alexandre o Grande concretizava o objectivo do seu falecido
pai Filipe II, assassinado por um nobre macedónio em Julho de 336 a.C., após vencer as
batalhas de Granico, Isso e Gaugamela, marchando ainda até à Índia.
O império que assim construiu, foi o maior de todos os tempos, incluindo os
impérios romanos posteriores. Ia desde a Ásia Menor ao Afeganistão, passando pelo
Egipto.
Figura 3.1 – Mapa Antiga Grécia (Extraído de Encyclopaedia Britannica, 1994)
Alexandre faleceu de forma prematura (possivelmente de malária) em 323 a.C.
quando retomava das suas vitórias sem ter, contudo, conquistado a Índia.
53
__________________________________________________________________Grécia
Após a sua morte, os seus generais lutaram pela posse do império, que viria a ser
dividido em três reinos distribuídos pelos políticos gregos da época, nomeadamente:
•
Antígono, que fundou um Reino a que pertenciam a Ásia Menor, a Macedónia e
a Grécia;
•
Seleuco, cujo reino compreendia o Afeganistão e a Macedónia;
•
Ptolomeu, que foi coroado Rei do Egipto.
A civilização da Grécia Antiga viria a ser considerada como base da cultura da
civilização ocidental, uma vez que influenciou a filosofia, o sistema educacional, o
sistema político (a Grécia foi a primeira democracia existente, de lá advém também o
conceito de cidadania), influiu ainda a nível educativo, tecnológico e científico, bem
como na arte e arquitectura moderna. A sua influência está bem patente no período
renascentista na Europa Ocidental, e os períodos neoclássicos dos séculos XVIII e XIX,
na Europa e na América.
O mapa da Grécia na actualidade encontra-se na Figura 3.2.
Figura 3.2 – Mapa Actual Grécia
(Extraído de http://go.hrw.com/atlas/span_htm/greece.htm)
54
__________________________________________________________________Grécia
3.1.2. O Povo
O Povo Grego surgiu da união de vários povos que migraram para a Península
Balcânica em diversas ondas, desde o início do terceiro milénio a.C. Apesar de tal
sugerir que seria uma grande desordem de línguas e de modos de vida, isso não
correspondia à realidade; apesar dos conflitos e das diferenças sociais existentes, os
gregos possuíam muitos elementos culturais em comum: falavam a mesma língua,
mesmo quando possuíam dialectos e sotaques diferentes, tinham a mesma religião e
adoravam os mesmos Deuses.
Prova da sua actividade cultural comum são os tão conhecidos Jogos Olímpicos que
se começaram a realizar a partir de 776 a.C., de quatro em quatro anos. Para assistirem a
estes jogos, os gregos viajavam das suas casa até à cidade de Olímpia, local onde se
realizava o festival de competições. Os jogos eram tão importantes para este povo, que
chegaram a interromper guerras entre cidades, para não prejudicar o bom desenrolar dos
mesmos!
Como o território Grego era muito extenso, houve necessidade de alterar/renovar o
regime político inicial, de forma a ser possível organizar e governar, ordenadamente,
um império tão vasto, tanto em termos de território como das civilizações que o
constituíam. Formaram-se assim na Grécia Antiga diversas cidades independentes, em
que cada uma tinha o seu próprio sistema de governo, respectivas leis, calendário e
moeda de troca. A cada uma destas cidades deu-se o nome de pólis ou cidades-estado.
Esta forma de organização social visava uma completa autonomia política relativamente
às outras poleis gregas, embora existisse muito comércio e divisão de trabalho ente as
cidades.
Atenas era a cidade maior e mais rica da Grécia Antiga nos séculos V e IV a.C. Para
além de ser a cidade-estado, era também a cidade “Mãe”, uma vez que dela saíam os
tramites gerais que as restantes cidades estado deveriam seguir, de forma a existir uma
unificação e coesão indispensável para a boa gerência de tão vasto império.
Como referimos anteriormente, o grande desenvolvimento da cultura grega surgiu
por volta do séc. VI a.C., numa colónia situada na Ásia Menor, mais exactamente na
cidade de Mileto. Os filósofos de Mileto tentavam explicar os fenómenos naturais sem
recorrer ao misticismo.
55
__________________________________________________________________Grécia
Naquele tempo os contactos comerciais com o Egipto e a Mesopotâmia, entre outros
países, favoreciam a troca e aquisição de novos conhecimentos. Nesses países já eram
utilizados vários resultados de índole matemática, embora apenas como aplicações
práticas na resolução de problemas concretos do quotidiano.
Quando estes resultados foram “importados” para a cultura grega, os filósofos de
então não se contentaram em apenas saber utilizá-los. Na escola jónica, Tales introduziu
a Geometria, tentando enunciar e fundamentar os resultados já utilizados pelas outras
civilizações. Acima de tudo pretendia-se entender o porquê de tais procedimentos
funcionarem correctamente e justificá-los, abstraindo do caso particular para uma visão
mais abrangente e geral.
No final do séc. VI a.C., o centro de conhecimento mudou-se de Mileto (e outras
cidades da Ásia Menor) para a Magna Grécia onde viveu Pitágoras (569 a.C. 475 a.C.).
Pensa-se que terá sido nesta escola que se descobriu a incomensurabilidade. Esta
descoberta foi mantida em segredo por se considerar um contra-exemplo na abordagem
de que o mundo podia ser explicado através dos números. Para os matemáticos da época
só existiam números inteiros e números fraccionários. Os irracionais que hoje sabemos
serem, de algum modo, o motivo da existência dos incomensuráveis, não eram vistos
como números. A descoberta da incomensurabilidade invalidava também a teoria das
proporções criada e usada por essa escola, tendo a sua descoberta originado a
abordagem dos problemas através da geometria das áreas. A crise provocada nas
proporções só viria a ser resolvida por Eudoxo, num estudo minucioso relatado
posteriormente nos Elementos de Euclides. Na Escola Pitagórica estudavam-se também
os sólidos regulares.
Por volta do séc. V a.C., o centro voltou a mudar-se, desta vez para Atenas, onde a
Matemática e a Filosofia se desenvolveram principalmente na Academia de Platão (429348 a.C.). Na Academia seguiam-se as mesmas crenças relativamente aos números que
na escola Pitagórica. A Aritmética e a Geometria eram a chave de todo o Universo.
Houve no entanto importantes progressos no desenvolvimento da lógica e dos métodos
geométricos e começavam-se a tentar definir noções como ponto, linha, plano. A
Academia ficou conhecida como criadora de matemáticos uma vez que dessa escola
saíram personalidades de destaque tais como Eudoxo de Cnidus, o autor de quase todas
as proposições do livro V dos Elementos e das primeiras cinco proposições do livro XII.
56
__________________________________________________________________Grécia
O período helénico (300-200 a.C.) foi, no entanto, a época mais fértil do
desenvolvimento da matemática grega. Cerca de 300 a.C. o centro da matemática
mudou-se de Atenas para Alexandria, cidade construída por Alexandre o Grande (358323 a.C.), que fundara a Biblioteca e o Museu, local onde trabalhavam matemáticos
como Euclides.
Após a mudança para a Alexandria, o centro do conhecimento permaneceu aí cerca
de 1 milénio. A matemática aqui desenvolvida é considerada de origem grega
principalmente por ser feita por matemáticos gregos que a relatavam utilizando essa
mesma língua.
3.2. A Matemática na Grécia Pré-Helénica
3.2.1. Tales de Mileto - A Escola Jónica
Tales de Mileto nasceu a 624/625 a.C. em Mileto
(actual Turquia), vindo a falecer na mesma cidade em
556/558 a.C. (Figura 3.3). Tales é apontado como um dos
sete sábios da Grécia Antiga, considerado também o
primeiro filósofo da “physis” (natureza), intitulado por
Aristóteles, como o fundador da filosofia. Foi um dos
percursores da ciência, pois foi dos primeiros a tentar
substituir as explicações míticas sobre o Universo por
explicações físicas e de ordem natural.
Figura 3.3 - Tales de Mileto
(Extraído http://www.google.pt)
Tales buscava um início para todas as realidades, uma explicação para a Vida, a
Terra e o Universo, procurava o “arché”, isto é, o princípio de todas as coisas, presente
em todos os momentos de existência de tudo, desde o início até à morte de qualquer
ente.
57
__________________________________________________________________Grécia
Segundo a sua teoria, o arché era a água. Ele acreditava que todas as coisas têm um
princípio físico original, que para ele seria a água. Defendia três princípios
fundamentais:
“…a água é o princípio de todas as coisas…”
“…todas as coisas estão cheias de deuses…”
“…a pedra magnética possui um poder porque move o ferro…”
É de ressalvar que, quando Tales afirmava que todas as coisas estavam cheias de
deuses, ele não se referia à presença dos Deuses da Mitologia, mas sim a uma força
intrínseca a cada objecto, força essa que, por exemplo, era bem observável nas pedras
magnéticas, uma vez que atraiam o ferro.
Tales fundou uma escola, a Escola Jónica, construída na colónia grega da costa
ocidental da Ásia Menor. Esta foi a primeira escola filosófica do período naturalista.
Tales e os demais filósofos que aí estudavam e debatiam as suas teorias dedicavam-se à
procura de uma substância única que fosse a causa e o princípio do mundo natural.
Tales também se destacou na área da Astronomia. Defendia que os astros tinham
natureza terrestre, sendo contudo incandescentes como o Sol. Considerava que a Lua era
iluminada pela luz solar, tendo sido Tales o primeiro a fazer esta afirmação. Esta
percepção permitiu-lhe uma explicação para os eclipses lunares, e conseguiu prever com
exactidão o eclipse solar de 28 de Maio de 585 a.C. Esta previsão parece ter sido
utilizada para atemorizar os exércitos que se encontravam em guerra, fazendo-os
suspender uma batalha que travavam nesse momento, culminando esta com um firmar
de acordo de paz.
Contudo, e como a grande maioria dos seus contemporâneos, Tales para além de
filósofo, astrónomo e como veremos matemático, era também comerciante de sal, azeite
e azeitonas. Conta a lenda que Tales enriqueceu devido à previsão de uma óptima safra
58
__________________________________________________________________Grécia
de azeitonas, conhecimento este que o levou a comprar todas as prensas de azeitonas
daquela região, tendo posteriormente todos os agricultores de lhe pagar uma certa
quantia pela sua utilização.
A sua profissão de comerciante colocava-o em contacto com pessoas de outros
países e proporcionava-lhe viajar e visitar esses mesmos países.
Um desses países foi o Egipto, onde teve a oportunidade de estudar Astronomia e
Geometria, a qual, ao que parece, começou rapidamente a pôr em prática, uma vez que
determinou a altura da pirâmide de Quéops, utilizando o conhecimento da proporção
entre a sua sombra e a sombra da pirâmide, na altura do dia em que a sombra de Tales
coincidia com a sua altura (podendo-se traduzir o problema por um triângulo rectângulo
e isósceles).
Alguns
historiadores
contestam,
contudo,
que
Tales já
possuísse
estes
conhecimentos, uma vez que estes só viriam a ser demonstrados nos Elementos de
Euclides que datam de 300 a.C., ou seja, com uma diferença de quase 300 anos de
estudos e conhecimentos.
O historiador matemático Sir Thomas L. Heath argumenta que no que concerne à
altura da pirâmide, e sabendo-se que Tales tinha a noção de triângulo isósceles,
provavelmente se tenha tratado de “uma indução, após medições efectivas num número
considerável de casos” (Heath, 1981, 1, pp.129, 130). Ou seja, não teria sido realizada
qualquer proporção, apenas a observação constante, de que existe um momento no dia
em que o sol provoca uma sombra igual ao real comprimento do objecto.
É-lhe também atribuída a utilização da mesma semelhança de triângulos para
determinar a que distâncias se encontravam os barcos inimigos da costa grega tendo
contribuído para a defesa da própria pátria. Assim, o resultado que estabelece as
relações existentes entre triângulos semelhantes viria a ser atribuído a Tales por Proclo
59
__________________________________________________________________Grécia
de Lícia que diz: “…Eudemo, nas suas Histórias Geométricas, atribui o presente
teorema a Tales; pois, declara ele, é necessário usar este teorema para saber a distância
dos barcos no mar da maneira que foi mostrada por Tales.”
Mas também para esta façanha Sir Thomas Heath possui uma conjectura alternativa
que tenta explicar o sucedido, sem a utilização das proporções entre triângulos
semelhantes. Segundo ele, desde que existisse uma torre, poder-se-ia utilizar um
instrumento consistindo numa vara à qual estaria articulado um ponteiro que marcasse
qualquer ângulo desejado. Apontada na direcção do navio e marcado, assim, um
determinado ângulo, bastaria rodar o diapositivo até que este apontasse para um local
acessível na costa, local que estava à mesma distância da torre que o navio e ao qual era
possível de medir a distância. (Heath, 1908, 1, p.305)
Segundo Proclo, Tales passara os conhecimentos de Geometria adquiridos na sua
viajem ao Egipto aos seus contemporâneos e discípulos, o que leva a crer que, ou Tales
criou uma outra escola jónica onde se estudava matemática, ou na escola jónica de que
falamos à pouco se debatiam para além dos temas filosóficos, temas geométricos e de
carácter matemático.
Ainda na Matemática, são atribuídas a Tales várias Proposições, entre as quais
destacamos algumas. Em cada uma delas está indicado o local onde podemos encontrar
a demonstração desse resultado, realizadas ou transcritas por um outro Matemático ( de
que falaremos mais tarde), Euclides, já pertencente ao período Helénico.
Proposição: Os ângulos internos de um triângulo somam dois rectos. – Note-se que
nesta época ainda não existia o método de medição de ângulos actual. (Euclides I, 32)
60
__________________________________________________________________Grécia
Proposição: Um ângulo é recto se e só se pode ser inscrito numa semicircunferência.
(Euclides III.31)
Note-se que o conhecimento desta proposição, permite deduzir com alguma
facilidade que é possível inscrever um rectângulo numa circunferência, verificando-se
posteriormente que as diagonais do rectângulo são diâmetros da circunferência e que o
rectângulo inscrito pode tomar qualquer posição dentro da mesma.
Proposição: Se duas linhas rectas se cortam, elas fazem os ângulos verticalmente
opostos iguais entre si. (Euclides I, 15)
Proposição: Em triângulos isósceles os ângulos da base são iguais entre si. (Euclides I,
5)
Proposição: Se dois triângulos têm dois ângulos de um, iguais a dois ângulos
respectivamente do outro, e um lado igual a outro lado do outro (lado este adjacente ou
oposto a ângulos iguais), terão também iguais os outros lados que se correspondem num
e no outro triângulo, bem como o terceiro ângulo. (Euclides I, 26) – Actualmente
conhecido entre os estudantes, como o critério (ala) de congruência (igualdade) de
triângulos.
Proposição: Os triângulos semelhantes têm os seus lados proporcionais. – Viria mais
tarde a designar-se Teorema de Tales. (Euclides VI, 4)
Proposição: Se dois triângulos têm os lados correspondentes directamente
proporcionais então são triângulos semelhantes. (Euclides VI, 5)
61
__________________________________________________________________Grécia
Actualmente, a junção das duas proposições anteriores, é conhecida entre os
estudantes, como o critério (aaa) de semelhança de triângulos, ou uma generalização
do Teorema de Tales.
“Não se sabe se os três casos de congruência de triângulos seriam ou reconhecidos
pelos geómetras jónicos. O caso ângulo-lado-ângulo não é menos complicado do que os
outros dois. Portanto, se Tales (ou algum seu contemporâneo) tiver observado que um
lado e os dois ângulos adjacentes bastam para determinar um triângulo então poderá não
lhe ter escapado que um triângulo também fica determinado por dois lados e o ângulo
por eles formado, quer pelos três lados.” (Carlos Sá, 2000, 5, p. 229)
Por tudo o que foi referido anteriormente, todos estes resultados podem ou não, ter
sido vislumbrados por Tales, argumentados de forma quase demonstrativa, mas mais
uma vez a falta de fontes deixa-nos apenas com a possibilidade de acreditar ou
conjecturar. É no entanto usual atribuir a Tales a transição da resolução de questões
matemáticas particulares para a formulação de resultados gerais.
62
__________________________________________________________________Grécia
3.2.2. Pitágoras de Samos – A Escola Pitagórica
Pitágoras de Samos (Figura 3.4) nasceu a cerca de 569
a.C. em Samos perto de Mileto, vindo a falecer por volta
de 475 a.C. em Metaponto, Luciana.
Mais uma vez, tudo o que se afirma sobre relatos desta
época pode ter sido objecto de lendas, as narrações são
tardias e tudo o mais, para o que já alertámos nos
capítulos anteriores.
Enquanto que Tales é muitas vezes considerado como
o primeiro Filósofo, Pitágoras é usualmente considerado o Figura 3.4 – Pitágoras de Samos
(Extraído http://www.google.pt)
primeiro Matemático.
Pitágoras pertencia a uma família modesta, o seu pai era um mercador, e enquanto
criança, Pitágoras acompanhava o pai em várias das suas viagens de negócios. Existe
evidência de que Pitágoras teria estado em Tire com o seu pai, lugar onde foi ensinado
por Caldeus (babilónicos) e os Mestres da Síria. Parece que, ainda em criança, e na
companhia de seu pai, visitou a Itália.
Pitágoras teve uma boa educação enquanto jovem, educação que tentou desenvolver
após atingir a maior idade. Entre os 18 e os 20 anos, Pitágoras procurou Tales, de quem
foi discípulo. Existiram três filósofos que o influenciaram bastante: Pericles, descrito
muitas vezes como sendo o professor de Pitágoras ao longo da sua infância, Tales que o
influenciou no que respeita à Matemática e Astronomia, e Anaximandro, discípulo de
Tales, que dada a idade avançada do seu mestre, terá sido quem orientou Pitágoras nos
seus estudos posteriores.
63
__________________________________________________________________Grécia
A conselho de Tales, Pitágoras viajou para o Egipto por volta de 535 a.C. Supõe-se
que Pitágoras era amigo de Policrates (político que nessa época tinha o controle da
cidade de Samos) e que ao que parece, escreveu uma carta de recomendação para que
Pitágoras a apresentasse aquando da sua chegada ao Egipto, sendo portanto tratado com
uma primazia diferenciada do público em geral.
Pitágoras foi admitido num templo, que funcionava também, como era usual na
época, funcionava como uma academia/escola, em Dospolis, onde se acostumou a
cumprir certas regras que mais tarde viria a implementar na escola que viria a fundar.
Como é exemplo pode referir-se a proibição de comer carne - Pitágoras era o que hoje
designamos por lacto-vegetariano, tendo algumas características de Vega, pois por
exemplo não vestia roupa que contivesse pele de animais.
Em 525 a.C. o Rei da Pérsia invadiu o Egipto e Pitágoras foi feito prisioneiro, sendo
remetido para a Babilónia, lugar onde aprendeu e aperfeiçoou os seus conhecimentos de
Aritmética, Música e outras ciências conhecidas pelos Babilónicos.
Em 520 a.C. Pitágoras voltou a Samos e criou uma primeira escola de nome
Semicírculo, a qual teve de posteriormente abandonar devido à situação política da
cidade, que estava sob o domínio do Rei Persa que o mandara prender. Pitágoras
retomou a Itália, fixando-se na cidade de Crotona onde fundou a famosa Escola
Pitagórica.
A Escola Pitagórica baseava os seus ensinamentos em Filosofia, Matemática,
Música e Astronomia. Os seus alunos estudavam os alunos as disciplinas de Aritmética,
Astronomia Geometria e Música. A Escola tinha exigências muito fortes em termos de
sigilo e possuía uma série de regras obrigatórias para os seus membros, assemelhandose a uma seita mística e misteriosa, quase como uma religião.
64
__________________________________________________________________Grécia
A Escola era constituída por matemáticos, alunos internos aos quais não era
permitido possuir bens próprios, partilhando os seguintes princípios:
• A natureza é matemática, até ao seu mais profundo nível;
• A filosofia pode ser usada para purificação espiritual;
• A alma pode partilhar uma união com o divino;
• Alguns símbolos têm significado místico;
• Todos os seguidores da ordem devem manter lealdade e segredo.
Este último impedia que qualquer aluno falasse ou comentasse o que se passava na
escola, bem como os resultados e as descobertas realizadas. Tudo o que lá se fazia era
sempre, por uma questão de respeito, atribuído ao mestre Pitágoras, daí as dificuldades
em saber até que ponto, na realidade os resultados a ele associados, foram de facto por
ele descobertos, ou por alunos que pertenciam à escola.
Um facto curioso, é que para além dos alunos internos - os matemáticos; existiam
também alunos externos - os acromáticos, que podiam possuir bens próprios, dormir nas
suas próprias casas e frequentar também a Escola, ouvindo as lições através de uma
cortina, através da qual apenas lhes era permitido passar ao fim de cinco anos. Para
além disso, e esta era uma grande novidade, eram admitidas mulheres como membros
desta Sociedade. Muitas delas viriam a tornar-se filósofas importantes.
Em relação aos símbolos com significado místico, o
melhor exemplo talvez seja o símbolo escolhido para a
Escola Pitagórica – o Pentagrama. O Pentagrama, ou
estrela de cinco pontas, era um modo de representar o
número 5, que simbolizava a união, o casamento!
Figura 3.5 – Pentagrama
(Desenhado pela autora utilizando
Sketchpad)
65
__________________________________________________________________Grécia
O número 1 era considerado o gerador de todos os outros números, o número 2 era o
primeiro número par (considerados femininos) e o 3 o primeiro número ímpar
(considerados masculinos), logo 5 era a junção do primeiro feminino, com o primeiro
masculino, pelo que simbolizava toda a criação.
Falaremos de seguida de alguns resultados atribuídos a esta Escola.
3.2.3. A Aritmética Pitagórica – Os números figurados
Como dissemos no sub capítulo anterior, para os Pitagóricos todo o Universo e
respectiva Harmonia se podia reduzir em números; é portanto natural que os estudassem
ao pormenor.
Utilizavam muitas vezes representação figurada dos números, dispondo pequenas
pedras de formas diferentes, geralmente em figuras geométricas. Isto permitiu-lhes
várias descobertas sobre certas propriedades dos números, conseguindo outros, a partir
dos anteriores, aplicando a regra que tinha a sequência com que estavam a trabalhar.
Surgiram assim:
•
Números Triangulares – porque se conseguiam dispor sob a forma de um
triângulo;
1
3
6
10
15
…
Figura 3.6 – Sequência dos primeiros números triangulares.
(Desenhado pela autora)
66
__________________________________________________________________Grécia
Números Quadrados – porque se conseguiam dispor sob a forma de um
•
quadrado;
1
4
9
16
25
…
Figura 3.7 – Sequência dos primeiros números quadrados.
(Desenhado pela autora)
Números Pentagonais – porque se conseguiam dispor sob a forma de um
•
pentágono;
1
5
12
22
…
Figura 3.8 – Sequência dos primeiros números pentagonais.
(Desenhado pela autora)
•
Números Rectangulares – porque se conseguiam dispor sob a forma de um
rectângulo e davam oportunidade de desenvolver a noção de divisores de um número.
2
6
12
20
30
…
Figura 3.9 – Sequência de uns primeiros números rectangulares.
(Desenhado pela autora)
67
__________________________________________________________________Grécia
Podemos traduzir estes resultados sob a actual notação, ou mesmo verbalizá-los.
•
Número Triangulares – que podemos traduzir por recorrência:
 ∀n ∈ : t1 = 1
,

tn +1 = tn + (n + 1)
Ou seja, um número triangular pode ser sempre obtido do número triangular
anterior, acrescentando-lhe o número actual! Podemos simplificar a relação de
recorrência anterior:
∀n ∈ : tn =
•
n ( n + 1)
2
.
Números Quadrados - que podemos escrever simplesmente:
∀n ∈ : qn = n 2
Ou em função dos números triangulares, como podemos observar na figura:
Figura 3.10 – Sequência dos números quadrados divididos em números triangulares consecutivos.
(Desenhado pela autora)
De forma aritmética:
∀n ∈ / {1} : qn = tn −1 + tn .
•
Número Pentagonal de ordem n é dado por:
∀n ∈ : Pn =
n (1 + ( 3n + 2 ) )
2
=
n ( 3n − 1)
2
Analogamente se obtinham os números hexagonais, heptagonais, octogonais, etc.
Mostra-se que o número m-gonal de ordem n, quer dizer, o número correspondente a
um polígono de m Ângulos, de ordem n, é
68
__________________________________________________________________Grécia
∀n, m ∈ : Pn( m) =
1
n  2 + 2 ( n − 1)( m − 2 )  .
2 
Por exemplo, o 6º número pentagonal, i.e., o 6º número 5-gonal
n = 6, m = 5, P6(5) =
1
6 [ 2 + 5,3] = 51
2
número que coincide com o obtido, fazendo n=6 em Pn =
n ( 3n − 1)
.
2
Foi através de observações como esta que deduziram que para se passar de um
número quadrado, para o número quadrado seguinte, é sempre necessário adicionar-lhe
um número ímpar.
Figura 3.11 – Sequência de dois números quadrados consecutivos por junção de um número ímpar.
(Desenhado pela autora)
Este número ímpar, com estas características, que consiste exactamente em
adicionar a qn o valor de 2n + 1 , designa-se por um gnomon, quando visto desta forma
geométrica.
Logo,
∀n ∈ : qn +1 = qn + ( 2n + 1)
Na realidade este foi o caminho segundo o qual viriam a descortinar um método
para obter ternos pitagóricos. Que podemos reescrever como:
( n + 1)
2
= n 2 + ( 2n + 1) , n ∈ Para que a expressão anterior seja um terno pitagórico, basta que 2n + 1, n ∈ , seja
um número quadrado!
69
__________________________________________________________________Grécia
Ou seja,
p2 −1
, pelo que,
2n + 1 = p ⇔ n =
2
2
2
2
 p2 −1   p2 −1 
 p2 −1 
+
1
=
+
2
+ 1

 


 2
  2 
 2

2
2
 p2 −1 + 2   p2 −1 
2
⇔
 =
 + ( p − 1 + 1)
2
2

 

2
2
 p2 + 1   p2 −1 
2
⇔
 =
 +p
 2   2 
que é um terno pitagórico.
Muitas outras propriedades foram descobertas pelos Pitagóricos, mas ficamo-nos
por aqui uma vez que já conseguimos descobrir como tão facilmente obtinham ternos
pitagóricos.
3.2.4. Descoberta dos Incomensuráveis – Geometria das Áreas
A descoberta da incomensurabilidade na Escola Pitagórica pode estar associada ao
Teorema de Pitágoras, pois é provável que tenha surgido ao comparar os lados e a
diagonal de um quadrado.
Aquando da descoberta dos incomensuráveis, a Escola sofreu uma crise de índole
filosófica. Como se podia admitir no Universo (que era tão perfeito e se podia explicar
através dos “sagrados” números) a existência de um número como o
2 , e outros
semelhantes (números irracionais) que começavam a aparecer?!
Esta descoberta foi mantida em segredo, para que os valores, regras e ensinamentos
da Escola não caíssem em descrédito. Os resultados que os pitagóricos tinham
demonstrado, utilizando a Teoria das Proporções baseada na comensurabilidade,
70
__________________________________________________________________Grécia
deixavam assim de estar provada, pelo que tiveram de se tentar outras estratégias para
os manter. Ao tentarem provar o pretendido, sem recorrer à comensurabilidade, surgiu
um novo método de prova, designado por Geometria das Áreas.
3.2.5. Teorema de Pitágoras – Demonstração
Existe mais que uma demonstração do Teorema de Pitágoras utilizando o seu novo
método de prova, mas dada a época a que se refere, não nos é possível determinar qual
destas provas foi a realizada por Pitágoras, ou mesmo, se ele próprio teria descoberto
mais de que uma demonstração. Assim sendo, dentro da variedade existente, vamos
apresentar a prova considerada pelos historiadores de matemática, como sendo a
original.
Consideremos um triângulo ABC, rectângulo em A. Digamos que a hipotenusa mede
c e que os restantes catetos medem respectivamente a e b.
Figura 3.12 - Triângulo ABC, rectângulo no vértice A.
71
__________________________________________________________________Grécia
Observe-se que, ambas as figuras são quadrados de lados a+b.
Figura 3.13 - Demonstração do Teorema de Pitágoras
(Extraído de Euclid, 1952)
A primeira figura foi subdividida em quatro triângulos geometricamente iguais ao
da Figura 3.12, e num quadrado de lado c.
A segunda figura também possui quatro triângulos iguais ao da Figura 3.12.
Podemos concluir que se dois quadrados são iguais e ambos contêm quatro
triângulos iguais, então o que resta num quadrado tem de ser igual ao que resta no outro.
Ou seja, acabamos de demonstrar que c 2 = a 2 + b 2 , ou seja, o que se pretendia
provar.
3.3.
A Matemática na Grécia Helénica
3.3.1. Elementos de Euclides
Como a maioria dos textos escritos nesse período, a versão original dos Elementos
de Euclides não sobreviveu até aos nossos dias, mas foi preservada através de cópias e
comentários de matemáticos posteriores.
Por ser tão abrangente e conter todos os resultados logicamente encadeados e
justificados, os Elementos mantiveram-se ao longo dos tempos, devido à sua
escrupulosa organização, clareza e rigor, chegaram ainda a ser utilizados nas escolas
europeias inclusivamente no séc. XX.
72
__________________________________________________________________Grécia
Os Elementos de Euclides são constituídos por 13 livros, cada um direccionado para
tema específico de Matemáticos, abrangendo os resultados desde o Período Jónico até à
época, das quais referimos as descobertas de Teetêneo e Eudoxo de Cnido. São livros
extremamente bem arquitectados, utilizando o método axiomático, isto é, um método
hipotético-dedutivo, onde a inferência de novas verdades são deduzidas a partir de
axiomas, postulados ou proposições previamente demonstradas.
Eudoxo de Cnido proporcionou um salto no desenvolvimento da Matemática, na
medida em que, foi ele quem apresentou uma nova teoria das proporções, capaz de
resolver os problemas causados pela descoberta dos incomensuráveis. O seu sistema de
proporções era válido em ambas as situações, quer as grandezas a comparar fossem
comensuráveis ou incomensuráveis, pelo que “libertava” a Geometria, que desta forma
ficara bastante espartilhada aquando da descobertas dos incomensuráveis, mesmo apesar
do esforço dos Pitagóricos para contornar o problema através da utilização da
Geometria das Áreas. Foi graças à nova teoria das proporções, que se pôde avançar com
o estudo de figuras semelhantes, como é o caso das semelhanças de triângulos, no livro
VI continuando-se o desenvolvimento da Matemática, agora já com um método onde
não havia restrições, nem particularidades.
Analisemos a seguinte tabela, onde se esquematiza, resume e sintetiza os diversos
conteúdos que constam nesta compilação de livros:
73
__________________________________________________________________Grécia
Elementos de Euclides
Livro
Conteúdo
I
Triângulos, rectas paralelas, congruência de
triângulos e Teorema de Pitágoras.
II
“Álgebra” Geométrica. Geometria das Áreas.
Origem provável
Período Jónico
(especialmente a Escola
III
Geometria
Círculo e circunferência – propriedades.
Pitagórica)
Plana
IV
Polígonos regulares inscritos e circunscritos.
V
Proporções (de grandezas).
VI
Figuras Semelhantes.
VII
VIII
IX
X
Divisibilidade. Números primos.
Números primos entre si.
Proporções (de números).
Números em proporção contínua.
Teoria dos
Números quadrados e cúbicos; números
Números
(planos e sólidos) semelhantes.
Infinidade dos primos.
Soma de uma progressão geométrica.
Números perfeitos.
Comensurabilidade e incomensurabilidade.
Subtracção recíproca.
Teoria (unificada) das proporções.
XI
XII
XIII
Construções no espaço. Paralelepípedos.
Geometria
“Método da exaustão”.
Tridimensional Prismas, cones e esferas.
Poliedros Regulares – Sólidos Platónicos.
Eudoxo
?
Escola Pitagórica
Teetêto
Período Jónico
Eudoxo
Teetêto
(Extraído de Sá, 1996)
No primeiro livro dos Elementos, Euclides começa por apresentar 23 definições,
pois não pretendia usar termos desconhecidos. Dando apenas alguns exemplos:
Definição 1: Um ponto é o que não tem partes.
74
__________________________________________________________________Grécia
Definição 2: Uma linha é comprimento sem largura.
Definição 20: Das figuras triláteras, um triângulo equilátero é o que tem os três lados
iguais, um triângulo isósceles o que tem apenas dois dos seus lados iguais, e um
triângulo escaleno o que tem os seus três lados desiguais.
Definição 23: Duas rectas paralelas são linhas rectas que, estando no mesmo plano e
sendo prolongadas indefinidamente em ambos os sentidos, não se encontram em
nenhum dos sentidos.
Procede com uma lista de 5 Postulados (em lógica matemática moderna designamse Axiomas):
Postulado 1: Traçar uma linha recta de qualquer ponto a qualquer ponto.
Postulado 2: Prolongar continuamente uma linha recta numa linha recta.
Postulado 3: Traçar um círculo com quaisquer, centro e distância.
Postulado 4: Todos os ângulos rectos são iguais entre si.
Postulado 5: Se uma linha recta incidir em duas linhas rectas e fizer os ângulos
internos do mesmo lado menores do que dois ângulos rectos, então as duas linhas rectas,
se prolongadas indefinidamente, encontram-se do lado em que estão os ângulos
menores do que dois ângulos rectos.
E culmina o início do livro com as seguintes 5 noções comuns (também designadas
actualmente por regras de inferência):
Noção comum 1: Coisas que são iguais à mesma coisa são iguais entre si.
Noção comum 2: Se iguais forem adicionados a iguais então os todos são iguais
entre si.
Noção comum 3: Se iguais forem subtraídos a iguais então os restantes são iguais
entre si.
Noção comum 4: Coisas que coincidem com outra são iguais entre si.
Noção comum 5: O todo é maior que a parte.
Só após esta introdução, é que Euclides começa a expor as suas proposições e as
demonstrações das mesmas, com a precisão, rigor e encadeamento que já mencionamos,
75
__________________________________________________________________Grécia
culminando com a apresentação da Proposição
47,
correspondente ao Teorema de
Pitágoras, e a Proposição 48, relativa ao recíproco do mesmo.
3.3.2. Elementos de Euclides, livro I – Proposição 47
O resultado sobre o qual nos temos debruçado, sobretudo, ao longo deste trabalho,
atribuído por muitos à Escola Pitagórica, conhecido como Teorema de Pitágoras e,
como vimos anteriormente, provavelmente já demonstrado através da Geometria das
Áreas na Escola Pitagórica, é apresentado no Livro I dos Elementos com o seguinte
enunciado:
Elementos I, 47: Em triângulos rectângulos, o quadrado sobre o lado subtendendo o
ângulo recto é igual aos quadrados sobre os lados contendo o ângulo recto.
Uma conjectura é que as primeiras provas assentavam na Teoria das Proporções
Pitagórica, anterior à descoberta da incomensurabilidade e por ela inviabilizada. Apesar
da nova Teoria das Proporções, descoberta por Eudoxo de Cnido, permitir a utilização
desta abordagem na demonstração do resultado, não é essa a opção dos Elementos e de
igual modo, não utilizada a Geometria das Áreas.
Euclides poderia também ter efectuado uma demonstração mais simples para esta
proposição se tivesse aplicado o Axioma5 (o Axioma das paralelas), mas é perceptível
ao longo dos Elementos de Euclides que ele tenta, sempre que possível, não utilizar o
axioma, procedendo por vezes a demonstrações muito mais elaboradas. Uma explicação
possível é que, como os conceitos envolvidos neste axioma não eram bem aceites pela
comunidade matemática da época, o que era agravado pela complexidade da formulação
76
__________________________________________________________________Grécia
do axioma, Euclides optasse por não o aplicar de modo a que as provas dos resultados
não fossem postas em causa.
A prova apresentada em Elementos I é a seguinte:
Demonstração:
Seja ABC um triângulo rectângulo em A e seja H o pé da altura relativa a A.
Construam-se os quadrados sobres os lados do triângulo dado e prolongue-se a altura
AH como na Figura 3.5.
Figura 3.14 - O Teorema de Pitágoras
(Extraído de Euclid, 1952)
Os triângulos FBC e ABD são congruentes, uma vez que FB = AB, e BC =BD e
tanto o ângulo FBC como o ângulo ABD são iguais à soma de um ângulo recto com
ABC. Logo, as suas áreas são iguais, bem como são iguais os respectivos dobros ou seja,
as áreas do quadrado ABFG e do rectângulo BDLH.
Analogamente, os triângulos KCB e ACE são congruentes e, portanto, a área do
quadrado ACKH é igual à do rectângulo CELH.
Logo, a soma das áreas dos dois quadrados é igual à soma das áreas dos dois
rectângulos, ou seja, a área do quadrado BDEC.
77
__________________________________________________________________Grécia
Esta demonstração encontra-se no culminar do primeiro dos treze livros que
constituem os Elementos de Euclides, tendo sido necessário considerar várias das
quarenta e seis proposições, anteriores a esta, para que o Teorema de Pitágoras pudesse
ser demonstrado na sua plenitude, sem qualquer tipo de lacuna, ou restrição. O Livro I
dos elementos de Euclides termina com o recíproco desta proposição:
Elementos I, 48: Se num triângulo, o quadrado sobre um dos lados for igual aos
quadrados sobre os restantes dois lados do triângulo, o ângulo contido pelos restantes
dois lados do triângulo é recto.
A prova apresentada em Elementos I é a seguinte:
Demonstração:
Considere-se que o triângulo ABC tem o quadrado sobre o lado BC igual aos
quadrados sobre os lados BA e AC; eu digo que o ângulo BAC é recto.
Figura 3.15 - O Recíproco do Teorema de Pitágoras
(Extraído de Euclid, 1952)
Trace-se pelo ponto A uma linha recta AD perpendicular à linha recta AC, tal que
AD é igual a BA, e deixe-se DC ser unida.
Como DA é igual a AB, o quadrado em DA é também igual ao quadrado em AB.
78
__________________________________________________________________Grécia
Adicionemos o quadrado de lado AC a ambos; sendo assim, os quadrados em DA,
AC são iguais aos quadrados em BA, AC.
Mas o quadrado em DC é igual ao quadrado em DA, AC, porque o ângulo DAC é
recto [ I , 47 ] ; e o quadrado em BC é igual aos quadrados em BA, AC, pois esta é a
hipótese; sendo assim, o quadrado em DC é igual ao quadrado em BC, logo DC=BC.
Uma vez que DA=AB, e AC é comum a ambos os lados DA, AC que são iguais aos
dois lados BA, AC; e a base DC é igual à base BC; então o ângulo DAC é igual ao
ângulo BAC [ I ,8] .
Mas o ângulo DAC é recto; logo o ângulo BAC também é recto.
Logo o triângulo é recto.
Com alguma frequência, encontra-se a assunção de que o Teorema de Pitágoras
consiste numa equivalência, ou seja, como se o Teorema de Pitágoras e o seu recíproco
se tratasse de um só.
Ou seja:
“Teorema de Pitágoras”: Um triângulo é rectângulo se e só se, se verifica que
c 2 = a 2 + b 2 , onde a, b, c são os comprimentos dos lados do triângulo, sendo c o maior.
Uma possível explicação para esta imprecisão, é alguns autores, principalmente de
livros didácticos, pressuporem erroneamente que tal junção facilitará a apreensão e
compreensão deste conteúdo por parte dos discentes.
Actualmente existe uma vasta gama de demonstrações do Teorema de Pitágoras,
utilizando diversas ferramentas matemáticas, desde as geométricas às algébricas entre
outros domínios. Foi escrito inclusivamente um livro composto somente por
demonstrações distintas do Teorema de Pitágoras, abrangendo diversas áreas; o qual
pode ser consultado com vista à percepção da variedade existente.
79
__________________________________________________________________Grécia
Uma das curiosidades inerentes a este teorema prende-se ao facto, de não só no
passado ter surgido em diversas culturas, como também na actualidade continua a
aparecer em civilizações desconectadas da nossa realidade. Um exemplo disso, são as
tribos Africanas, que apesar de “virgens” no contacto com outras culturas, exibem a
demonstração do teorema, de modo geométrico, na ornamentação dos seus cestos
artesanais. Esta ocorrência leva-nos a pensar até que ponto é que o Homem descobriu
uma vez o Teorema de Pitágoras, ou que todas as Civilizações ao longo do seu percurso
de desenvolvimento o vai descobrindo.
Do mesmo modo que a Humanidade sentiu a necessidade de comunicar com os seus
iguais, numerar os objectos que o rodeia, criar uma linguagem, uma escrita e um
sistema de numeração, não passará também pela descoberta do Teorema!
Claramente esta ideia não passa de uma conjectura, cuja explicação ou aprovação
exacerba os domínios desta tese. Contentamo-nos em deixar a pergunta em aberto e a
curiosidade desperta.
80
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