sustentabilidade
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Capital Aberto Novembro 2010
sustentabilidade
Um por todos
Ganha força a proposta de um relatório
anual que integre — e não apenas reúna — as
informações financeiras, sociais e ambientais
Por Marília Ávila
S
e você trabalha na área de relações com investidores (RI) ou de comunicação de uma
companhia aberta, é muito provável que já tenha ouvido falar dos relatórios anuais
integrados — aqueles que unem informações financeiras, ambientais e sociais. Mas é
também possível que não tenha conseguido adotá-lo porque, antes de tudo, não sabe exatamente
o que é um relatório integrado e nem como fazê-lo. Bastaria juntar as informações sobre esses
três aspectos em uma única encadernação? Certamente não. O desafio aqui é um tanto mais
complexo, mas não se intimide. A verdade é que ainda não existem diretrizes claras sobre como
integrar os relatórios.
As poucas companhias que se propõem a isso seguem critérios próprios ou, muitas
vezes, vão pelo caminho mais fácil e equivocado que acabamos de citar: unem seus relatórios anual e de sustentabilidade em uma mesma publicação e se dão por satisfeitas.
Mas há uma boa notícia para quem estiver disposto a levar essa história a sério: as discussões sobre como obter a tão propalada integração estão a mil por hora no mundo todo.
Em agosto, foi formado o Comitê Internacional do Relatório Integrado (IIRC, na sigla
em inglês), com representantes de empresas de auditoria, como KPMG, PwC e Deloitte;
do mundo acadêmico, como Harvard; da sociedade civil, como WWF e Global Reporting
Initiative (GRI); e de reguladores, como a International Organization of Securities Commissions (Iosco), órgão que congrega comissões de valores mobiliários de diversos países.
Na ocasião, a presidente do comitê executivo da Iosco afirmou que, no futuro, a criação do
IIRC será vista como um divisor de águas no desenvolvimento dos relatórios corporativos.
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das companhias. Com isso, o núO comitê tem como meta estamero de informações requeridas
belecer diretrizes até 2020 para a
aumentou, incluindo dados sobre
integração dos dados. Nelmara Arbex,
direito dos trabalhadores, igualdade
vice-presidente da organização não
no ambiente de trabalho, políticas
governamental GRI, referência no
de investimento na comunidade e
desenvolvimento de diretrizes para a
cuidados com o meio ambiente.
elaboração de relatórios socioambienO mundo todo
Para o consultor de empresas
tais, e integrante do grupo formado
está se voltando
Lélio
Lauretti, estamos diante de
para sugerir ideias ao IIRC, afirma
ao relatório
mudanças no modo de enxergar a
que, até agora, foi discutida a necesintegrado, porque
atuação das companhias. “O capisidade de se estabelecerem princípios
o planeta vive uma
talismo de hoje não é mais o do propara preparar os relatórios e para a
crise financeira e
prietário ou do administrador. É o
definição das informações que farão
climática
capitalismo que discute qual o papel
parte desses documentos. A próxima
da empresa na sociedade”, ressalta.
reunião do IIRC será em janeiro.
Para Nelmara, da GRI, está cada
A ideia de integrar dados finanvez mais claro que um investidor que quer saber se
ceiros e de sustentabilidade ganhou força especiala empresa tem futuro não pode se basear apenas
mente após a crise financeira de 2008, que aumentou
em dados financeiros, pois ter bons resultados hoje
a preocupação com a forma de divulgação de dados
não é suficiente para afirmar que isso vai continudas companhias. “Com a crise, pôde-se perceber
ar. “É preciso saber como ela está administrando
que não se enxergava muitas informações”, coriscos financeiros, sociais e ambientais”, alerta.
menta Roberto Gonzalez, diretor da MediaGroup
De acordo com Mervyn King, presidente da
e conselheiro do fundo Ethical. Também cresceu o
GRI, o mundo todo está se voltando ao relatório
público a quem os dados divulgados se destinam.
integrado porque o planeta vive uma crise fi“Após a crise de 2008, em que grandes instituições
nanceira e climática, decorrente da degradação
sumiram da noite para o dia, ficou patente a nedo ecossistema e da perda de biodiversidade.
cessidade de divulgar informações não só para os
“Nós usamos os recursos naturais mais rapidamente
acionistas, mas para a sociedade como um todo”,
do que a natureza pode gerá-los.” Ele acredita que
admite Ricardo Zibas, gerente de sustentabilidade
as empresas precisam aprender a traçar estratégias
da auditoria KPMG.
para conduzir seus negócios de forma diferente
Essa lista de destinatários é extensa. James
e produzir mais com menos. “Só poderemos saHeffernan, coordenador de programas educacionais
ber se elas estão fazendo isso quando tivermos
da Associação Brasileira de Comunicação Empreuma forma integrada de divulgação”, defende.
sarial (Aberje), uma treinadora certificada da GRI,
afirma que, no ambiente dos negócios de hoje,
clientes, fornecedores, comunidades, funcionários,
na prática — Há algumas sugestões para quem preassim como reguladores e governos, demandam
tende começar essa jornada para integrar os relatóinformações sobre as atividades e a performance
rios financeiro e de sustentabilidade. Lauretti, autor
Por que fazer um relatório integrado
Os benefícios de adotá-lo vão muito além da área de comunicação
1. Maior clareza sobre a relação entre indicadores-chave financeiros e não-financeiros. Isso ajudará os administradores
a entender e solucionar conflitos de interesse para equilibrar demandas financeiras e societárias.
2. Melhores decisões de gestão. Conforme apontado pelos professores Robert S. Kaplan and David P. Norton,
criadores do Balanced Scorecard, há provas de que mais mensuração e, portanto, melhores informações, levam a um
processo mais eficiente de tomada de decisão.
3. Estimular os acionistas a focar em ações que favoreçam o retorno no longo prazo e os stakeholders a reconhecer a
necessidade do lucro para a criação de valor no futuro.
4. Risco reputacional mais baixo. Uma comunicação clara e consistente sobre a performance financeira e
não-financeira de uma companhia é a base de um diálogo construtivo.
Fonte: livro One Report: Better Strategy through Integrated Reporting
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do livro Relatório Anual, recomenda
primeiros passos — Citada como um
partir da demonstração contábil e inmodelo internacional, a Natura produz
cluir nela dados essenciais referentes
seu relatório anual de forma integrada
a sustentabilidade, que mostrem o
desde 2002. O diretor de assuntos corimpacto da companhia na sociedade
porativos, Rodolfo Guttilla, conta que
e no meio ambiente, sem entrar em
o documento é produzido de maneira
detalhes de interesse mais restrito,
empírica, coletando dados com todas
como quanto se está economizando
as áreas responsáveis por cada tema
Forme uma
em luz e papel, por exemplo.
do relatório. “Ainda estamos buscando
equipe responsável
Gonzalez sugere que, ao falar do
maneiras eficazes de dar significados
por conciliar
ativo intangível contabilizado, a comcorrelativos entre os resultados econôas informações
panhia trate também dos seus reflexos
micos, sociais e ambientais.”
contábeis com as
ambientais e sociais. Ao inserir, por
Hoje, no Brasil, as informações
socioambientais
exemplo, uma nota explicativa em
sobre impactos ambientais das comuma demonstração contábil sobre
panhias são requeridas no item 7.5 do
risco trabalhista, processos e demisrelatório de referência. Antes de instisões, a empresa pode aproveitar e explicar a razão
tuir o documento, a Comissão de Valores Mobiliários
desses processos, descrever a política em relação a
(CVM) estudou regras aplicadas em outros países e rebenefícios, discorrer sobre o nível de satisfação dos
comendações de entidades especializadas. Questionaseus funcionários. Ao mesmo tempo, em um relatório
da pela CAPITAL ABERTO sobre a possibilidade de mais
de sustentabilidade, pode-se mencionar os impactos
normas, a autarquia afirmou que considera o padrão
financeiros dos problemas e ações socioambientais.
e o nível de informações socioambientais exigidos pela
Para cada item do relatório, portanto, a proposta é
Instrução 480 apropriados para o momento.
dar informações que serão úteis tanto aos acionistas
Nessa questão do formulário, as empresas incomo aos demais stakeholders, esclarece Carlos Eduformam desde atividades mais simples, como coleta
ardo Lessa Brandão, conselheiro da GRI pelo Brasil
seletiva, a projetos desenvolvidos e prêmios recebidos.
e membro do conselho de administração do InstiA Gafisa, por exemplo, relata que, em média, 3% do valor
tuto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).
de obra de seus empreendimentos é destinado à prote“Ao fazer isso, é possível que a companhia se dê conta
ção do meio ambiente. O Itaú Unibanco cita o descarte
de algo e decida mudar um procedimento.” Uma dica
sustentável de lixo eletrônico e uso de energia renovável
é formar uma equipe responsável por integrar as inpara abastecer prédios administrativos. Já a Petrobras
formações contábeis societárias com as socioambienrelata que investiu em 2009 cerca de US$ 1,013 bilhão
tais, normalmente apresentadas conforme o método
em projetos ambientais, especialmente na redução de
do GRI. Gonzalez sugere, inclusive, que as empresas
emissões e resíduos resultantes de processos industriais.
criem comitês com representantes das áreas contábil
A Suécia é um dos países mais exigentes em
e socioambiental, não esquecendo a jurídica. A ideia
relação a informações sobre sustentabilidade.
é promover a conexão entre os dados.
Em 2007, suas estatais passaram a ser obrigadas
Mas para chegar ao relatório integrado que vem
a produzir relatórios sobre impactos ambientais.
sendo discutido mundo afora ainda será necessário
O estudo Increasing responsability through transpercorrer alguns passos. De acordo com Josefa Garparency?, da universidade Uppsala, divulgado em
zillo, diretora executiva de consultoria com foco em
setembro, mostrou como a exigência estimulou
sustentabilidade da Ernst & Young Terco, é necessário
atividades das companhias nesse campo na Suécia.
haver primeiro um processo de alinhamento interno e
“O relatório é também uma ferramenta para mudar
mapeamento do estágio atual da companhia. “Trata-se
atitudes. Ele não precisa ser como a linha de chegade saber onde estou e aonde quero chegar”, explica.
da, e sim, como uma arma para começar a pôr em
O interesse em publicar um relatório integrado
prática um processo de sustentabilidade”, concluem
está cada vez mais presente nas companhias braos autores do estudo. Na Dinamarca, outro país
sileiras, observa Paulo Henrique Praes, consultor
exigente com o tema, as grandes empresas devem
sênior da Global RI. “Vemos clientes perguntando
produzir, desde 2008, relatórios com princípios de
sobre isso.” Ernesto Cavasin, gerente sênior da PwC,
responsabilidade social corporativa em um moenxerga que a tendência é forte. Em sua opinião,
delo “comply or explain” (pratique ou explique).
os investidores e as empresas têm aprendido que o
custo de remediar um passivo ambiental ou social
PARA ASSINANTES
é muito maior que o de evitá-lo. Por isso, essa inConfira o estudo da Uppsala University sobre o impacto da exigência
de relatórios de sustentabilidade em www.capitalaberto.com.br
formação torna-se tão fundamental.
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