PARECER N° 13.170
BENS PÚBLICOS. USO ESPECIAL POR
PESSOA
JURÍDICA
DE
DIREITO
PRIVADO . FORMALIZAÇÃO DE LIAME
JURÍDICO A SER CONSUMADO ENTRE
ESTADO E CONCESSIONÁRIA DE
SERVIÇO
PÚBLICO
DE
TELECOMUNICAÇÕES.
LICITAÇÃO,
PRAZO E REMUNERAÇÃO .
REGULARIZAÇÃO DE RELAÇÕES DE
NATUREZA FÁTICA JÁCONSTITUÍDAS.
RECOMENDAÇÕES.
1. Os Senhores Secretários de Estado da Administração e dos Recursos
Humanos e da Justiça e da Segurança encaminham a esta Procuradoria-Geral, solicitando
exame e pronunciamento, expedientes administrativos versando sobre a utilização de
bens públicos para a instalação de equipamentos de telefonia celular .
A consulta é articulada através de quesitos, assim deduzidos:
"I - o instituto jurídico a ser adotado para o uso do espaço público por
parte das concessionárias de telefonia móvel (estão em foco os institutos da
servidão, os' da autorização e da cessão de uso, sem prejuízo de outros a serem
apontados pela PGE) ;
“II - O prazo pelo qual poderão ser firmados os termos (com a
observação de que, segundo Maria Sylvia di Pietro, na servidão a cláusula de
prazo é inócua se persistir a utilidade pública, que parece-nos configurada por
tratarmos de concessionária de serviço público - havendo, inclusive, previsão
no Código de Águas relativamente a servidão para as concessionárias de
energia elétrica; e a de que o prazo manifestado como sendo o ideal, para que
o investimento privado seja compensado, foi o de cinco anos);
“III- o preço que será cobrado das empresas de telefonia (reportamonos ao estudo anexado, onde há detalhamento dos estudos empreendidos pelo
Departamento de Patrimônio);
"IV- necessidade ou não de competitório público para a destinação de
espaços, bem como a possibilidade de uso simultâneo dos próprios estaduais
por mais de uma concessionária ;
" V - a regularização das áreas do Estado já ocupadas por empresas de
telefonia móvel ( a .forma como deverá dar-se, prazo, requisitos que deverão
ser exigidos para a regularização ou prazo para desocupação, etc.) ".
Acompanham o processo administrativo principal cinco outros, tendo
estes por objeto o ressarcimento de valores devidos pela instalação já existente de antenas
de telefonia móvel em próprios do Estado.
Inicialmente distribuído em caráter ordinário, foi agora solicitada
urgência no tratamento do caso, regime com que passa a ser enfrentado.
É o relatório.
2. A temática proposta foi segmentada em tópicos e como tal será
apreciada.
" I - O instituto jurídico a ser adotado para o uso do espaço público por
parte das. concessionárias de telefonia móvel (estão em foco os institutos da
servidão, os da autorização e da cessão de uso, sem prejuízo de outros a
serem apontados pela PGE)"
A definição do correto instituto jurídico a revestir 8 a relação que se
estabelece entre o Estado do Rio Grande do Sul e as concessionárias de serviço de
telefonia móvel passa pelo conhecimento da categoria de bem público que se pretende
utilizar .
Consoante se depreende dos autos administrativos em exame, os
imóveis do Estado em que já existem antenas de telefonia celular são todos de uma só
espécie, qual seja, edifícios aplicados a serviço da Administração.
Esses bens, destinados à consecução dos objetivos do Estado, tais como
os em que se encontram instaladas suas repartições públicas ou onde se desempenham
algumas de suas atividades precípuas ( escolas, hospitais, fortificações, canhões e outras
armas, exemplifica Pontes de Miranda (1), constituem seu patrimônio indisponível e, na
classificação quase centenária da Lei Civil Brasileira, recebem a denominação de bens de
uso especial.
Essa noção se faz importante porquanto os bens de uso especial, por
submeterem-se a regime de direito público (assim como os bens de uso comum do
povo), não se podem reger por institutos de direito privado.
1 – Tratado de Direito Privado, T. II. Borsoi, R.J., p. 155, 1954
Disso se infere que o uso de bens do domínio público de uso especial
dar-se-á mediante a autorização, a permissão ou concessão de uso, títulos jurídicos
públicos, e não privados, como o são a locação, o arrendamento e a enfiteuse, por
exemplo.
Com a exclusão dos institutos de direito privado, há condições de se
adentrar no estudo da servidão e da cessão de uso, hipóteses jurídicas cogitadas pelo
consulente, além da autorização, permissão e concessão já citadas.
No que concerne à primeira delas, a servidão, existe um imperativo
lógico a vedar sua aplicação na espécie: é modo de limitação da propriedade que recai
sobre bem privado .
Com efeito, ao conceituar a servidão, com propriedade anota Rafael
Bielsa:
"Um direito público real constituído por uma entidade pública sobre um
bem privado, com o objeto de que é servir ao uso público, com uma extensão
ou dependência do domínio privado." (2) (Grifou-se).
Referindo também à natureza do bem sobre o qual incide a servidão,
leciona Eros Roberto Grau:
" A servidão administrativa ou pública e consubstancia um direito
limitativo do Estado, definindo-se como uma restrição imposta ao particular
quanto ao exercício de seu direito de propriedade sobre determinado bem. Daí
dizermos que a servidão administrativa ou pública incide sobre a propriedade
privada” (3)
Servidão, portanto, não se harmoniza à relação jurídica em tela, haja
vista serem públicos os bens de que se ora questiona.
A cessão de uso, de outra banda, encerra diverso óbice a embargar sua
aplicação.
É o que se extrai da conceituação mesma do instituto, formulada por
Hely Lopes Meirelles, como se vê:
2
. Apud Marcelo Figueiredo, in “Utilização de Subsolo para Passagem de Equipamentos Públicos
– Aspectos Gerais e Desafios do Uso Compartilhado – Resenha Doutrinária e Jurisprudencial”,
Revista Trimestral de Direito Público, nº 26, Malheiros, S.P., p. 188, 1999.
3“
Concessionária de Serviço Público – Bens Públicos – Direito de Uso”, Revista de Direito
Administrativo, nº 218, R. J., p. 348, 1999.
3“
Concessionária de Serviço Público – Bens Públicos – Direito de Uso”, Revista de Direito
Administrativo, nº 218, R. J., p. 348, 1999.
"Cessão de uso é a transferência gratuita da posse de um bem público de
uma entidade ou órgão para outro, a fim de que o cessionário o utilize nas
condições estabelecidas no respectivo termo, por tempo certo ou
indeterminado. É ato de colaboração entre repartições públicas, em que
aquela que tem bens desnecessários aos seus serviços cede o uso a outra que
deles está precisando.
E prossegue:
"Também não se confunde com qualquer das modalidades pelas
quais se outorga ao particular o uso especial de bem público (...)” (4).
(Grifou-se).
Assim sendo, não se prestando a servidão e a cessão de uso aos fins
colimados pelas partes, remanescem a autorização, a permissão e a concessão de uso, ao
início referidas, como alternativas a serem estudadas.
A autorização de uso, pela transitoriedade acentuada que a carateriza,
bem assim por contemplar interesse privado do particular, mostra-se desde logo inservível
àqueles misteres.
Nessa direção, observa com acuidade Celso Antônio Bandeira de Mello:
" Autorização de uso é o ato administrativo unilateral e discricionário,
pelo qual a Administração consente,
a título precário, que o particular se utilize de bem público com
exclusividade.
"( ...) A utilização não é conferida com vistas a atividade pública, mas
no interesse privado do utente. Aliás, essa é uma das características que
distingue a autorização da permissão e da concessão." (5)(Grifou-se).
Certo, a exploração de serviços de telecomunicações por concessionária
da União não guarnece interesses .predominantemente privados. Por isso mesmo, extreme
de dúvidas, autorização de uso aqui não se terá.
Restam, destarte, a permissão de uso e a concessão de uso.
Diferentemente da autorização, a permissão de uso volta-se à finalidade
pública da utilização do bem.
4 – Direito Administrativo Brasileiro, 26ª ed. Malheiros, S. P. p. 487, 2001
5 – Curso de Direito Administrativo, 8ª ed. Atlas, S. OS., P. 446, 1997.
É o que ensina Maria Sylvia Zanella di Pietro, verbis:
"Permissão de uso é o ato administrativo unilateral, discricionário e
precário, gratuito ou oneroso, pelo qual a Administração Pública faculta a
utilização privativa de bem público, para fins de interesse público.
"( ...) Sendo ato precário, revela-se mais adequado nos chamados usos
anormais em que a utilização privativa, embora conferida com vistas a fim de
natureza pública, está em contraste com a afetação do bem ou com sua
destinação principal." (6) (Grifos originais).
De plano, emerge a permissão de uso como a alternativa que mais atine
aos propósitos ora almejados, uma vez que o serviço de telecomunicações concedido é de
interesse público e se concretiza através da tresdestinação do bem utilizado .
Sucede, todavia, que em virtude de sua inerente transitoriedade, a
permissão não se ajusta à prestação de serviço público de caráter permanente, como o é o
de telecomunicações.
Dela distingue-se substancialmente, todavia, a concessão de uso, que se
dá quando o uso do bem público tem por fito a execução de atividade também pública,
porém com outros contornos, como assenta a mesma autora:
" A concessão é o instituto empregado, preferentemente à permissão,
nos casos em que a utilização do bem público objetiva o exercício de atividades de
utilidade pública de maior vulto e, por isso mesmo, mais onerosas para o concessionário.
Este assume obrigações perante terceiros e encargos financeiros elevados, que somente se
justificam se ele for beneficiado com a fixação de prazos mais prolongados, que
assegurem um mínimo de estabilidade no exercício de suas atividades. Em conseqüência,
a forma mais adequada é a contratual, que e permite, mediante acordo de vontades entre
concedente e concessionário, estabelecer o equilíbrio econômico-financeiro do contrato e
fixar as condições em que o uso se exercerá, entre as quais a finalidade, o prazo, a
remuneração, a fiscalização, as sanções." (7) (Grifou-se).
Dúvida não há, exige a prestação de serviços públicos de
telecomunicações vultoso aporte de capital por parte da pessoa jurídica de direito privado
que vier a explorá-la. Daí porque não poderá ficar esta à mercê de um vínculo
excessivamente precário com o Estado, seja pela necessária amortização dos
investimentos pela mesma realizados, seja pelo comprometimento da própria atividade
fim que lhe compete desempenhar .Devendo obediência cogente ao princípio da
continuidade do serviço público, a formação de um vínculo dotado de maior estabilidade
é verdadeira condição de exequibilidade das obrigações contraídas pela concessionária de
serviço.
6- Direito Administrativo, 8ª ed. Atlas, p. 446/1997
7 – Id, ib, p. 449
Exsurge a concessão de uso, pois, notadamente a concessão acessória
de uso, assim denominada por se vincular a uma outra concessão, que é a de serviço,
como a solução mais consentânea à relação aqui retratada.
Talo que se depreende, ainda uma vez, do expendido pela aludida
autora:
"Pode-se falar, ainda, em concessão autônoma ou acessória, conforme
seja ou não conjugada com uma concessão de serviço público; na acessória, o
concessionário só pretende o bem como condição material da montagem de um
serviço público, como se verifica na concessão da via pública ou do espaço aéreo
para colocação de postes e lançamento de fios ou cabos, aéreos ou subterrâneos,
de instalações elétricas de interesse público, bem como na concessão de águas
públicas para aproveitamentos hidráulicos de interesse público." (8)(Grifou-se).
Este, em síntese, o modelo jurídico que mais se afeiçoa ao objeto
perseguido pelos interessados.
II - O prazo pelo qual poderão ser firmados os termos (com a
observação de que, segundo Maria Sylvia di Pietro, na servidão a cláusula de
prazo é inócua se persistir a utilidade pública, que parece-nos configurada por
tratarmos' de concessionária de serviço público -havendo, inclusive, previsão no
Código de Águas relativamente a servidão para as concessionárias de energia
elétrica; e a de que o prazo manifestado como sendo o ideal, para que o
investimento privado seja compensado, foi ode cinco anos).
Considerando-se, por evidente, prejudicado o questionamento no que
diz com a servidão, tem-se aqui indagação cuja resposta veio de ser tangenciada no
questionamento anterior.
A concessão de uso, como visto, é geralmente firmada por longo prazo
para resgatar o capital invertido na exploração da atividade pública.
Esse prazo encontra uma primeira exigência no Estatuto das Licitações
e Contratos, que textualmente dispõe:
" Art. 57 - A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à
vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:
"(...) § 3° -É vedado o contrato com prazo de vigência
indeterminado." (Grifou-se).
Não prevê a lei, entretanto, um prazo especial para os contratos de uso
de bens públicos. Na ratio da própria utilização, pois, poder-se-á defini-lo.
_____________________
8 – Id, ib, p. 450
Atente-se para o fato de que nos bens onde hoje se localizam e nos quais
se pretende instalar outros equipamentos de telefonia móvel o Estado desenvolve
atividade tipicamente pública ( o Presídio Madre Peletier, v.g., no qual já existe em
funcionamento uma antena da Companhia Telefônica Celular).
O uso intentado pela empresa, da mesma sorte, finalísticamente público
será.
Nessa ordem, a determinação do prazo deverá conjugar essa duplicidade
de interesses, convencionando as partes aquele que lhe mais se afigurar conveniente. Por
conseguinte, à falta de vedação legal, nada elide a que seja dito prazo fixado em cinco
anos, nos moldes propostos pelo consulente, se for este o lapso temporal tecnicamente
mais adequado à atividade desenvolvida.
A determinação desse prazo não será inócua, adite-se, como se dá na
servidão, até porque, precisamente em conseqüência dos interesses públicos visados,
poderá ser prorrogado.
"III - O preço que será cobrado das empresas de telefonia (reportamonos ao estudo anexado, onde há detalhamento dos estudos empreendidos pelo
Departamento de Patrimônio)"
O quantum a ser fixado pela utilização dos bens públicos em apreço
guarda, por igual, características sobremodo peculiares.
Isto porque não se trata, frise-se, de uma exploração comercial típica, na
qual o Poder Público viesse a auferir espécie de vantagem pecuniária em sentido estrito.
Não. Há, aqui, reprise- se, a utilização de bem público como meio para a prestação de
serviço também público. Nesse passo, não pode a cobrança efetuada pelo Estado visar
lucro, pena de repercutir na tarifa cobrada do usuário final dos serviços.
Por esta razão é que Lúcia Valle Figueiredo, analisando a matéria sob a
ótica da utilização de bens do Município, com acerto leciona:
"Os valores seriam definidos levando em conta que as tarifas, que serão
pagas pelos usuários, devem, em decorrência dos princípios constitucionais
(Emenda n° 19/98) e determinação legal (Lei n° 8.987/95, art. 6°, § 1º), ser
módicas. Portanto, os custos da passagem devem ser razoáveis.
______________________
9 – “Telecomunicações e Infra-Estruturas: Arts. 73 e 74 da Lei nº 9.472/97”, Boletim de Direito
Administrativo, nº 6, jun. NDJ, p. 425-428, 2001
“A cobrança será feita por preços públicos, e não por taxas. As taxas
serão devidas, conforme já acentuamos, somente em função do poder
fiscalizatório (licença de edificação e de instalação das infra-estruturas)."(9) (
Grifou-se ) .
Na mesma senda, observa Vanêsca Buzelato Prestes, consignando:
" A cobrança decorrente da utilização da via pública, das calçadas, do
mobiliário urbano ou de outro espaço público por terceiros é preço público,
sendo que este deve ser atribuído com razoabilidade e fundamentação, de
modo que não seja vil ou extorsivo." (Grifou-se).
O preço público exigível da concessionária de serviço público, pois, não
encerrando teleologia tributária, representará retribuição com supedâneo no art. 68 do
Diploma Civil Brasileiro. Sua determinação deverá ser feita através de legislação estadual
(lei e decreto regulamentador), na qual serão definidas a utilização dos bens do Estado, os
instrumentos, os prazos e outras condições afetas ao uso remunerado, podendo-se adotar
como parâmetro para tal a Lei n° 8.712/01, editada no Município de Porto Alegre (v. doc.
em anexo).
Essa regra, saliente-se, vale não apenas para a fixação dos valores a
serem cobrados nas concessões a serem ora firmadas, mas, do mesmo modo, deve nortear
a definição das importâncias devidas pela já utilização de bens públicos. Tal é o que será
abordado em "V" infra.
" IV -necessidade ou não de competitório público para a destinação de
espaços, bem como a possibilidade de uso simultâneo dos próprios estaduais
por mais de uma concessionária"
A necessidade de realização de certame licitatório decorre da
viabilidade ou não de competição entre os potenciais interessados no uso dos bens em
foco.
No particular, a Lei n° 9.074, de 07.07.95, Lei Geral de
Telecomunicações, garante ao concessionário o uso de bens necessários à execução de
serviço ou de obra pública, prevendo até mesmo a possibilidade de desapropriação de
bens móveis e imóveis para esta finalidade, como se vê:
_____________________
10 – “As Redes e Infraestrutura Aéreas e Subterrâneas e a Relação com o Poder Local –
Obrigatoriedade de Licenciamento e Possibilidade de Cobrança pela Utilização do Bem
Público”, Interesse Público, nº 7, Nota Dez, p. 179, 2000.
" Art. 100 -Poderá ser decretada a utilidade pública, para fins de
desapropriação ou instituição de servidão, de bens imóveis ou móveis,
necessários à execução do serviço, cabendo à concessionária a implementação
da medida e o pagamento da indenização e das demais despesas envolvidas."
(11)
Assim sendo, inexiste a possibilidade de qualquer entidade pública
simplesmente impedir a instalação de equipamentos para o funcionamento daquele
serviço público federal concedido. Não podendo fazê-lo, tem-se que deverá receber a
todos quantos se apresentarem como e concessionários, a bem de se lhes facultar o uso de
bens necessários à prestação de tais serviços.
É dizer, em outras palavras, no tocante a telecomunicações, que a todo
concessionário de serviço é assegurado utilizar-se, na qualidade de concessionário de
uso, de bens públicos pertencentes ao Distrito Federal, aos Estados e aos Municípios. Não
se forja, em conseqüência, como regra, disputa entre os concessionários a justificar a
realização de procedimento licitatório para a entrega de bens a um só.
Estudando a matéria em comento, Rogério Favreto refere o
descabimento da licitação, apontando o caminho a ser adotado:
"Destaca-se, ainda, a incidência de inexigibilidade de licitação para a
concessão ou permissão de uso na utilização de espaços públicos,
concretamente porque o Município, enquanto poder permitente, não pode
estabelecer concorrência entre os interessados, já estes, na condição de
concessionários de serviços públicos possuem o direito de a passagem.
Entretanto, subordinam-se sempre, ao regramento .local que deve disciplinar
por onde e a forma de passagem das redes de infra-estrutura, sem contudo
inviabilizá-las, a fim de compatibilizá-las com o meio urbano. Logo,
inviabilizada a competição, mas recomendável que o poder público, mormente
quando esteja realizando ou qualificando determinada obra em via pública, faça
convocação por edital publicado na imprensa oficial, a fim de oportunizar
isonomicamente a todos os interessados e induzir a instalação consorciada
(...).” (12)(Grifou-se).
A inviabilidade de competição, em suma, com fulcro no caput do art.
25, combinado com o art. 26 da lei de regência, é a pedra de toque desta inexigibilidade
de licitação. Em havendo, ao revés, convergência de interesses sobre um mesmo bem -por
sua privilegiada e localização, v.g. -, bem este que não possa ser por ambos utilizado,
compulsória será a instauração do competitório.
___________________________
11 – Note-se que o mandamento alcança não apenas a bens públicos, como a bens
privados – o que autoriza tecnicamente a referência à servidão.
12 – Redes de Infra-estrutura e Gestão Municipal”, artigo produzido para Seminário
realizado em 13 e 14 do corrente em Porto Alegre.
Quanto ao uso simultâneo de bens estaduais por mais de uma
concessionária, tem-se configurada alternativa não somente viável, como até mesmo
estimulada reflexamente pela já citada Lei Geral das Comunicações. É o que se flagra no
precitado texto, ao disciplinar o compartilhamento de estruturas entre as prestadoras de
serviço público:
" Art. 147 -É obrigatória a interconexão às redes de telecomunicações a
que se refere o art. 145 desta Lei, solicitada por prestadora de serviço no regime
privado, nos termos da regulamentação. "
"(...) Art. 150- A implantação, o funcionamento e a interconexão das
redes obedecerão à regulamentação editada pela Agência, assegurando a
compatibilidade das redes das diferentes prestadoras, visando à sua
harmonização em âmbito nacional e internacional."
Nesse diapasão, aduza-se, a Agência Nacional de Telecomunicações
(ANATEL), a Agência Nacional de Energia Elétrica CANEEL) e a Agência Nacional do
Petróleo CANP), editaram a Resolução Conjunta n° 001, de 24.11.99, aprovando o
Regulamento Conjunto para Compartilhamento de Infra-estrutura entre aqueles setores,
que em seu Anexo assim estatui :
" Art. 4° - O agente que explora serviços públicos de energia elétrica,
serviços de telecomunicações de interesse coletivo ou serviços de transporte
dutoviário de petróleo, seus derivados e gás natural, tem direito de
compartilhar infra- estrutura de outro agente de qualquer destes setores,
de forma não discriminatória e a preços e condições justos e razoáveis, na
forma deste Regulamento."
"(...) Art. 7° -As infra-estruturas e os correspondentes itens passíveis de
compartilhamento ficam divididos em três classes, da seguintes forma:
“(...) II - Classe 2 dutos, condutos, postes e torres; (....)” (Grifou).
" V - a regularização das áreas do Estado já ocupadas por empresas de
telefonia móvel ( a forma como deverá dar-se, prazo, requisitos que deverão
ser exigidos para a regularização ou prazo para desocupação, etc.)"
Essa questão estende-se ao contido nos expedientes anexos ao principal,
ao início referidos.
A regularização das situações pretéritas, assim consideradas aquelas
em que as empresas de telefonia celular de longa data servem-se de bens do Estado (mais
precisamente os prédios em que funcionam a Secretaria da Justiça e da Segurança,
situados nas Avenidas Pátria, n° 1358, e Sete de Setembro, n° 666, pelo Presídio Madre
Peletier, na Av. Teresópolis, n° 2727, e pelo Instituto Geral de Perícias, nas Avenidas
Presidente Roosevelt, n° 88, e Farrapos, s/nº, terá como requisito o respectivo
pagamento por quem deles fez uso sem a correspondente contraprestação. Essa
contraprestação, esclareça-se, não terá por fundamento a concessão de uso -que então
formalmente inexistia -, mas se dará a título de indenização pela utilização já operada.
Para tanto, cumpre adequar-se os ternos de ressarcimento já lançados
nos expedientes sob exame (ressarcimento este que não se dará a título de "cessão de uso
remunerada", como neles consta, pela óbvia razão de que inocorreu tal outorga pela
Administração ), ternos que devem conter expressamente o período no qual houve a
utilização anterior do bem e o correspondente valor indenizatório .
Essa contraprestação, sublinhe-se, bem como a que será posteriormente
estipulada para a concessão de uso, radica na limitação da fruição plena do bem por seu
titular ou, como quer Celso Antônio Bandeira de Mello, na sobrecarga acarretada ao bem
público pela utilização concorrente do particular .
Nesse sentido, calha trazer à colação o magistério de Diogo do Amaral
Freitas, cujo excerto do trabalho " A utilização do domínio público pelos particulares"
vem por Adilson Abreu Dallari mencionado:
"O fundamento deste dever de pagar uma quantia em dinheiro como
retribuição do direito à utilização do domínio público é simples de entender e
não se afasta, no essencial, daquele que alicerça idêntica obrigação a propósito
dos usos comuns extraordinários. A sua justificação encontra- se
luminosamente condensada nas palavras de Jèze, sublinhando que o particular
no uso privativo não usa a coisa como todos os outros mas para seu proveito
pessoal, esclarece: seria injusto que de uma utilização privativa de certa coisa
pública, construí da e conservada com o dinheiro de todos os contribuintes,
uma pessoa só extraísse vantagens exclusivas".(13)
E, acresce, imediatamente a seguir , Adilson Abreu Dallari:
"Essa situação não se altera absolutamente quando o uso especial é
feito por uma empresa privada exploradora de serviço público. Nem
mesmo haveria de ser gratuito se o serviço fosse operado diretamente por
pessoa jurídica de direito público diferente daquela titular do domínio,
pois os patrimônios públicos são diferentes, afetando diferentemente diferentes
contribuintes."(14) (Grifou-se).
_____________________
13 – In Adilson Abreu Dallari, “Uso do Espaço urbano por Concessionárias de Serviços
de Telecomunicações, Revista de Direito Administrativo”, nº 223, jn/mar., Renovar, R.J.,
p. 50-51, 2001.
14 – Id, ib, p. 51
Por derradeiro, não se pode olvidar que a desocupação do bem pelo
concessionário (assim entendida a desocupação por inadimplemento reiterado da
contraprestação já devida) não parece ser solução conforme ao regime legal incidente na
relação discutida.
Havendo trânsito assegurado ao concessionário de serviços
relativamente à utilização de bens públicos, melhor se coaduna com a lógica do sistema
recorram as partes à via judicial, dado que o ponto nodal da contenda não seria o usoocupação do bem -garantido por lei com vista a assegurar a prestação do serviço de
telecomunicações -, e sim a satisfação do valor devido por quem dele se aproveita.
Em conclusão, entendendo-se elucidadas todas as questões formuladas,
tem-se que a concessão de uso é o instituto jurídico mais ajustado in casu, o qual deverá
ter prazo fixado a termo certo, mediante a contraprestação de preço público razoável e,
como regra, sem necessidade de prévio competitório.
No que respeita ao uso não formalizado de bens imóveis do Estado,
assume o ressarcimento caráter de indenização, quantificado nos mesmos parâmetros da
concessão a ser ulteriormente celebrada.
É o parecer .
Porto Alegre, 03 de outubro de 2001.
MARIA DENISE FEIX DE VARGAS,
Procuradora do Estado
Ref. Exp. Adm. nº 1678-24.00/01.5,
2017-12.00/00.7,
2018-12.00/01.0,
2019-12.00/01.2,
2020-12.00/01.0,
0138-12.00/00.9
Processo nº 000138-12.00/01.7
Acolho as conclusões do PARECER nº 13.170, da Procuradoria do
Domínio Público Estadual, de autoria da Procuradora do Estado Doutora MARIA
DENISE FEIX DE VARGAS.
Encaminhe-se o expediente ao Excelentíssimo Senhor Secretário de
Estado da Justiça e da Segurança.
Em 23 de novembro de 2001.
Paulo Peretti Torelly,
Procurador-Geral do Estado.
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parecer n° 13.170 bens públicos. uso especial por pessoa jurídica