A ESCOLHA PROFISSIONAL NA ADOLESCÊNCIA: MOTIVAÇÕES E
APONTAMENTOS PARA A ATUAÇÃO EM PSICOPEDAGOGIA
OLIVEIRA, Wanderlei Abadio de.– UNIUBE/MG
[email protected]
SILVA, Jorge Luiz da.– UNIUBE/MG
[email protected]
SILVA NETO, Walter Mariano de Faria. – UNIUBE/MG
[email protected]
Área Temática: Psicopedagogia
Agência Financiadora: Não contou com financiamento.
Resumo
A presente exposição pretende caracterizar a escolha profissional de adolescentes do
município de Uberaba-MG. O objetivo geral foi identificar as motivações das escolhas
profissionais de um grupo de adolescentes e neste processo, as intervenções do meio familiar,
escolar e do grupo de pares. Para tanto, quatro adolescentes, com idade média de 17 anos,
concluintes do ensino médio foram entrevistados a partir de um roteiro específico, sendo
posteriormente realizada a análise dos dados. Os quatro participantes já haviam realizados
suas escolhas profissionais, quais sejam: dois pretendiam realizar cursos na área de Exatas e
os outros dois, respectivamente, cursar Administração de Empresas e Direito. Para realizarem
estas escolhas, os adolescentes buscaram informações sobre a área pretendida e ainda
possuíam dúvidas quanto ao futuro profissional. Sobre os motivos que os levaram a realizar
estas escolhas, dois adolescentes mencionaram estar bem informados sobre a área de atuação
desejada e outro participante apontou para a possibilidade de ganho financeiro e para o
retorno do mercado de trabalho como sendo as suas maiores motivações. Constatou-se que no
processo de escolha dois adolescentes buscaram contatos com as áreas afins, conversando
com pessoas inseridas no curso de graduação e com profissionais da área; outro participante
baseou sua escolha na experiência que possui com a área; e o outro adolescente trabalhava na
área escolhida o que despertou o desejo por qualificar-se mais através do curso de graduação.
As motivações que levaram o grupo de adolescentes a pensar sobre seu futuro profissional e
as dúvidas e incertezas sobre o futuro profissional evidenciam a necessidade do
estabelecimento de programas e projetos de intervenção que visem orientar não apenas
psicopedagogicamente, mas que propõem ações multidisciplinares para o esclarecimento de
dúvidas, não apenas de adolescentes, mas também de adultos que demandem uma recolocação
profissional ou mesmo auxílio em novos cargos e atividades.
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Palavras-chaves: Adolescência. Orientação profissional. Desenvolvimento humano.
Introdução
O presente trabalho se insere no campo da investigação qualitativa sobre a escolha
profissional de adolescentes, à luz da psicologia e à área social.
Neste sentido, parte-se do ensejo de identificar motivações que levam os
adolescentes a realizarem suas escolhas de carreiras profissionais. Vale ressaltar que escolhas,
não apenas àquelas que se referem à profissão, são processos que demandam elaboração de
perdas, reflexões e a tomada de decisão em si (BOCK, FURTADO, TEIXEIRA, 2002;
TORRES, 2001; LEVENFUS, 1997). Entende-se, pois, que decidir e fazer escolhas são
realidades constantes e, segundo Camargo (2006) viver é escolher, pois se toma decisões no
âmbito pessoal, escolar, profissional e, até mesmo, sobre aspectos corriqueiros do cotidiano.
Entende-se que as motivações no processo de escolha profissional estão, em geral,
vinculadas às experiências e vivências que sujeito realiza dentro do próprio processo de
desenvolvimento. É dentro da perspectiva do desenvolvimento que se pode compreender que
a pessoa vai construindo uma definição de ser e do que fazer na vida em termos profissionais.
Logo, a síntese destas experiências, atreladas às características sociais e culturais do
desenvolvimento, bem como aquelas características pertencentes ao mundo do trabalho,
favorecem o conjunto de motivações que precedem o momento da escolha profissional.
(PRIMI; MUNHOZ; BIGHETTI; NUCCI; PELLEGRINI; MOGGI; FRANCISSO, 2000).
Assim sendo, é importante identificar quais são as motivações, que tipo de reflexões,
compreensões e informações os participantes do estudo realizaram para escolherem suas
profissões, já que escolher uma carreira é um processo envolto em aspectos sociais,
econômicos, culturais e emocionais.
Destarte, este trabalho apresenta pesquisa realizada com adolescentes do município
de Uberaba-MG. Após a apresentação dos resultados obtidos através da utilização de
instrumentos qualitativos pretende-se deixar um aporte teórico-metodológico para iniciativas
que instruam e orientem adolescentes e adultos jovens, respeitando suas características
pessoais, seus desejos e tendências. Assim, poderão ser repensados e propostos programas de
orientação profissional de cunho local e regional, pois, a comunidade deve ser inserida no
pensamento científico, para desfrutar das aquisições e apontamentos pertinentes à sua
realidade.
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O objetivo geral do estudo foi identificar as motivações de um grupo de adolescentes
sobre suas escolhas profissionais e como objetivos específicos: caracterizar as intervenções do
meio familiar, escolar e do grupo de pares na escolha profissional do adolescente e identificar
possíveis influências das profissões dos pais na escolha dos jovens, assim como a importância
atribuída às possibilidades de ganhos financeiros a partir da escolha realizada.
Metodologicamente, este trabalho está dividido em três momentos. Um primeiro de
revisão de literatura sobre os temas pesquisados. O segundo momento foi configurado,
especificamente, pela coleta de dados em campo. Assim, foram entrevistados quatro
adolescentes, sendo um de 16 anos, dois de 17 e um de 18 anos. Todos concluintes do ensino
médio e oriundos de escolas públicas (50%) e privadas (50%). Por fim, já no terceiro
momento da pesquisa, aconteceu a análise dos dados a partir do referencial teórico levantado
e dos dados coletados.
A escolha profissional como processo na adolescência
Quando se vislumbra a adolescência e suas peculiaridades é possível identificar
muitas situações e escolhas que permeiam este processo e apontam para o futuro do indivíduo.
Dentro do conjunto de decisões que o jovem tem que tomar está a escolha de uma profissão
que lhe garanta, pelo menos do ponto de vista do ideal, uma inserção no mundo adulto, na
sociedade e, ainda, sustentabilidade financeira e felicidade.
De acordo com Bock, Furtado e Teixeira (2002), no que se refere à escolha
profissional, principalmente quando associada à escolha de um curso superior, pode-se
perceber que na sociedade atual ela é concebida como imposição da idade e, mesmo, do
desenvolvimento humano, variando entre as classes sociais e acenando para a atividade que o
indivíduo, potencialmente, assumirá pelo resto da vida. Assim, para o adolescente/jovem esta
escolha é importante e, principalmente, na sociedade capitalista que responsabiliza estes
sujeitos pelo sucesso ou não de suas escolhas, revestindo o momento de conflitos já que se
fala de uma opção que se realizará por longo tempo no existir de quem escolhe.
Nota-se que a escolha é um exercício que permeia a vida humana, praticado
constantemente e que, muitas vezes, resume a condição humana, posto que o homem é, grosso
modo, resultados de escolhas que realiza. Disto decorre a importância do tema, pois ao
escolher sua futura profissão o adolescente tem que ser levado a uma reflexão sistemática e
9300
esclarecedora, capaz de fazê-lo vislumbrar as possibilidades que o campo poderá lhe
proporcionar, pois escolher uma profissão não é um hábito, algo trivial, mas é um processo
complexo, que envolve um conjunto de circunstâncias favoráveis, quais sejam: sociais,
econômicas, ambientais e até emocionais. (CAMARGO, 2006).
Primi et al. (2000) consideram que a escolha é resultado da integração entre as
diversas experiências que o sujeito forjou ao longo do desenvolvimento e nesta escolha
existem dois fatores que podem ter implicações no processo de formação de uma identidade
ocupacional. Segundo os autores:
O primeiro grupo aborda dois microssistemas desenvolvimentais importantes na
vida do indivíduo, o contexto educacional e o familiar. A qualidade das relações
estabelecidas nesses contextos influencia diretamente o desenvolvimento da
maturidade vocacional, podendo prejudicá-la quando são pouco estimuladores à
curiosidade e à autonomia, por exemplo. O segundo grupo aborda os aspectos
afetivos, intelectuais e sociais do indivíduo. Como exemplo desses aspectos pode-se
citar: a) dependência emocional, b) falta de motivação, c) problemas relacionados ao
autoconceito, d) rigidez de pensamento e raciocínio infantil, e) pouca informação
prática a respeito da profissão, com percepções mais subjetivas de carreira, e f)
dificuldades de adaptação a diferentes situações, adotando atitudes rígidas. (PRIMI
et al., 2000, p.452).
É importante destacar que a influencia destes fatores no processo de escolha está
atrelada a outras experiências que o sujeito viveu ou vive e, ainda, àquelas que são históricas e
materiais da sociedade e do sistema de produção que ditam as normas vigentes do mercado de
trabalho.
Sobre a realidade externa ao sujeito, a partir de debates no campo teórico, percebe-se
que, historicamente, escolher uma ocupação profissional é algo recente. Segundo Bock
(2006), por muito tempo, viveu-se experiências voltadas ora para o ócio, ora para a
subsistência ou mesmo momentos em que a força de trabalho era destinada a uma única
camada da população, principalmente em certos períodos históricos.
A própria concepção de trabalho foi construída ao longo da história da civilização e
acompanha os desdobramentos que esta história adquiriu nos últimos tempos, atravessada
pelo desenvolvimento do modo de produção capitalista. Segundo Trechera (2009) com o
advento da idade dita moderna, inaugurada pela Revolução Industrial o trabalho deixa de ser
uma atividade dividida entre aquelas consideradas dignas e as indignas para se converter em
um dever que se estendeu a todos os membros da sociedade. É com este movimento que a
9301
concepção de trabalho como responsabilidade assume os moldes morais e vinculados ao
processo de desenvolvimento humano.
Nesta mesma perspectiva, considera-se que a própria escolha profissional tem
contornos históricos, pois mesmo pertencendo ao escopo subjetivo ela tem que garantir ao
sujeito aspectos de significação e aceitação social. As mudanças nas relações e na vida
material do homem, forjadas no bojo do sistema capitalista, trazem implicações para a escolha
já que estabelecem valores, normas e conceitos que são assumidos como regras para uma vida
melhor e dentro da lógica de liberdade proposta pelo capitalismo. (ANDRIANI, 2003).
Não é difícil entender que a estrutura econômica e histórica das relações humanas
mudam o pensar sobre o homem e convergem para uma autonomia que coloca no indivíduo a
capacidade de decidir quais serão os rumos de seu futuro “profissional” e aqui as mudanças
citadas no mundo do trabalho ganham ares de maior subjetividade. O que antes era ditado
pelos céus, pela estirpe familiar e pela condição econômica de origem, passa a ser regido pela
vontade do sujeito, que pode agora, em tese, se movimentar, pelos diversos ofícios existentes.
Muitos destes pensamentos têm fundamento na visão liberal de homem, uma
perspectiva positiva e mecanicista do desenvolvimento humano e, consequentemente, está
alicerçada em prerrogativas de organização e determinação ditadas pela lei de “causa e
efeito”. Dentro da visão sócio-histórica adotada por este trabalho, essa concepção é
ultrapassada, pois se compreende o homem como ser histórico-dialético, constituído
subjetivamente também pela objetividade que o cerca. Assim, as escolhas internas estão em
relação com o mundo material, em movimentos de oposição capazes de transformar a
realidade material e o próprio sujeito. (BOCK; GONÇALVES; FURTADO, 2001).
É possível, desta forma, compreender que muito do que se vivenciou ao longo da
história como vocação ganha, dentro deste debate, novos contornos e há uma tendência para o
rompimento com os paradigmas que falam de vocação inata e universalizante do homem,
trazendo a tona a lógica da escolha e da orientação profissional. Ou seja, a liberdade de
escolha profissional constitui-se em dada base material, leia-se capitalismo, que recoloca a
temática do trabalho para além da mera sobrevivência pessoal. A rigor, só se pode falar em
opção num caso em que a pessoa não mais pode sobreviver de forma autônoma e por isso
precisa vender sua força de trabalho. A idéia de que a pessoa escolhe seu caminho a partir das
condições em que vive e em função de suas vontades e aptidões só ocorre nesse momento de
mudança de paradigmas. (BOCK, 2006).
9302
Percebe-se que a escolha profissional é um fenômeno determinado, que ocorre a
partir de dado momento na história da humanidade. Não há como concebê-la como elemento
natural de cada indivíduo, a partir de uma vocação fechada em si. Escolher um caminho
profissional requer, sob um ponto de vista, mobilização, concentração e vontade de lutar para
vencer as dificuldades que possam surgir durante a jornada escolhida. (CAMARGO, 2006).
Neste sentido, é importante que o jovem perceba sua história, onde ele está e quais
são suas intenções diante do futuro profissional. Muitos, ainda, atribuem aos chamados
aspectos inatos do indivíduo que escolhe, mas há que se atentar para a dinâmica da escolha e
para as reflexões acerca do modelo econômico contemporâneo. O Capitalismo vigora e exige
cada vez mais das pessoas posturas que apontam para uma referida liberdade, que em seu bojo
traz as necessidades e carências do “mercado”.
Feitas estas considerações sobre a escolha profissional, cabe atrelá-la à adolescência
e para tanto são necessárias considerações sobre o entendimento e a definição desta que
também pode ser entendida como uma construção histórica, especificamente como construção
de uma fase do desenvolvimento humano e que está intimamente ligada ao processo de
escolha profissional. Sendo que, esta última simboliza, muitas vezes, o ingresso na vida
adulta.
Para a psicologia sócio-histórica a adolescência existe, “mas não é uma fase natural
do desenvolvimento humano. É criada historicamente pelo homem, nas relações sociais,
enquanto um fato, e passa a fazer parte da cultura enquanto significado” (AGUIAR; BOCK;
OZELLA, 2009, p.168). Essa compreensão permite identificar que pensar na escolha
profissional como exigência da idade é naturalizar o fenômeno e não considerar como
implicados neste processo os aspectos históricos e materiais da vida. Em resumo, a
adolescência se mostra como uma manifestação cultural, construindo-se nos âmbitos
socioeconômico e cultural das sociedades.
Nessa perspectiva, o homem, abordado como um ser histórico e social tem o seu
processo de constituição subjetiva atrelado ao meio onde vive e às suas condições de vida nos
planos material, social e cultural. Sendo o seu mundo psíquico construído a partir das suas
interações com este meio, ou seja, sua subjetividade tem uma origem social. Com tal
argumentação, o autor sugere que a adolescência é construída historicamente e tem o seu
processo de constituição e duração atrelado e determinado pela forma de organização e
estruturação de cada sociedade em particular.
9303
Portanto, o período da vida compreendido como adolescência foi “construído
socialmente a partir de necessidades sociais e econômicas”. (OZELLA, 2002, p.23) de cada
sociedade e cultura em especifico, de tal forma que a sua duração é determinada pelas
condições, principalmente econômicas, existentes no meio em que o adolescente esteja
situado. Podendo ela ser estendida ou mesmo abreviada dependendo da condição econômica d
a família, o que influirá diretamente no tempo de preparação do jovem para o mercado de
trabalho, pois cada profissão exige um tempo diferente de preparação para o seu exercício.
Tomada por este prisma, não pode ser universalizada ou naturalizada, nem mesmo dentro de
uma mesma cultura, considerando as desigualdades socais que ela abarca.
Destarte, destaca-se que, uma das atividades da adolescência, na sociedade atual, é a
constituição de um período de preparação do sujeito para o mercado de trabalho,
concomitante às várias modificações em sua estrutura biológica e psíquica.
Torna-se, portanto, evidente que a concepção adotada considera que a adolescência
revela não apenas como um período de instrução para a formação da carreira profissional do
jovem, mas como um período de constantes transformações e aprendizagens, que o auxilia na
moldagem de sua inteligência, de seu caráter e da sua personalidade e, consequentemente,
essas características conduzem o sujeito à escolha de uma profissão. Neste sentido, a seguir
são realizadas análises sobre motivações e aspectos que compõem a escolha profissional de
adolescentes de Uberaba/MG.
A escolha profissional de adolescentes em Uberaba/MG: resultados e discussão
Quando se pensa na escolha profissional e, concomitantemente nos sujeitos nela
envolvidos e que dela lançam mão, não deve ser desconsiderada que se tratam de sujeitos que
buscam se encontrar e se realizar em dadas profissões ou ocupações. Logo, é fundamental que
esta escolha ocorra dentro de parâmetros e motivações pessoais, que consigam conciliar a
realização pessoal e profissional com as expectativas do mercado. Assim, objetivando
apreender quais são as motivações e influências atuais na escolha de uma carreira para jovens
da cidade de Uberaba-MG, realizaram-se entrevistas com 4 adolescentes da referida cidade.
Vale ressaltar que, na escolha profissional estão implicados vários fatores como as
características da profissão, o mercado de trabalho, a remuneração, o status social, os custos
da formação entre outros. Neste sentido, Bock, Furtado e Teixeira (2002, p.310) asseveram
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que “os fatores que influem na escolha profissional são muitos, com peso e composição
diferentes na história individual dos jovens”. Segundo os autores estes fatores estão em
permanente interação e é a combinação entre eles que caracteriza o processo de escolha
profissional.
Todos afirmaram que já realizaram a escolha de uma futura profissão. Dois jovens
pretendem realizar cursos na área de Exatas (Engenharia de Produção e Sistema de Produção)
e os outros dois pretendem, respectivamente, cursar Administração de Empresas e Direito
com ênfase no Direito Internacional ou Ciências Políticas, este último referindo-se ao local
onde quer realizar seu curso (Universidade de Brasília).
Assim, analisando as entrevistas coletadas, pode-se perceber que muito embora os
participantes desta pesquisa já tenham realizado suas escolhas, três deles mencionaram que
ainda possuem dúvidas quanto ao futuro profissional. Dúvidas como: gostarão ou não do
curso escolhido; pensam em mudar de opção; ou se a escolha está acertada com a vontade
própria. Ou seja, são dúvidas que revelam a interação entre os aspectos pessoais e os sociais
no processo de escolha e, ainda, revelam a onipotência do adolescente, que pretende saber
tudo o que quer e faz e tem dificuldades em deixar outros projetos para aderir a uma escolha.
As dúvidas no processo de escolha profissional são muitas e, segundo Bock et al.
(2002), são favorecidas pela complexidade e pelas dificuldades que a sociedade atual
apresenta como características do mundo do trabalho. É um momento importante, tanto do
ponto de vista psicológico quanto pessoal, mas que sofre influências externas com vistas a
permitirem uma síntese que culmina na escolha em si.
Ainda sobre as dúvidas apresentadas, Levenfus (1997) disserta sobre a possibilidade
de escolhas maduras e ajustadas, entendidas como a capacidade para lidar com conflitos como
os apresentados, permitindo ao adolescente conciliar seus gostos e capacidades com as
oportunidades exteriores. Grosso modo, o adolescente deve conseguir fazer um balanço ou
uma síntese entre responsabilidade individual (consigo mesmo) e responsabilidade social, ou
seja, deve buscar conciliar seus interesses e aptidões com o que a sua realidade e a realidade
da carreira lhe oferece. Porém, a autora destaca que mesmo esta escolha “madura” não exime
o jovem de elaborar abandonos de outros projetos ou perspectivas e de revisar suas escolhas.
Também, pode-se afirmar que:
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Sentir dúvida é uma condição adquirida, um sinal de maturidade. Pressupõe
capacidade de suportar a ambivalência frente ao objeto. Levisky (1995) refere que,
nas fases iniciais do desenvolvimento, a capacidade de discriminação é tênue ou
inexistente. Evoluindo para certo estado de percepção afetiva, de natureza
confusional, atinge-se a capacidade de discriminação. Nesta evolução o ego passa
por um estado de ambigüidade, até alcançar um estado de ambivalência. Surge,
então, a capacidade de se ter dúvida e a possibilidade de elaborar o pensamento.
(LEVENFUS, 1997, p.189).
Ora, o adolescente caminha e busca a maturidade, mas antes que esta se realize
definitivamente, ele tende a ver o mundo, as pessoas e suas escolhas dentro de lógicas do
“tudo ou nada”, “do preto no branco”. Esta característica também é fundamental quando se
analisa as implicações e as justificativas para a dúvida que possuem sobre o futuro
profissional. Aparentemente, se eles não escolhem a profissão ideal, que os farão as pessoas
mais felizes do mundo, eles falharam em suas missões e ficaram perdidos para sempre.
(LEVENFUS, 1997).
Quando indagados sobre os motivos que os levaram a realizar as escolhas
apresentadas, dois dos jovens explicitaram que já possuem conhecimento prévio sobre a
futura área de atuação como demonstrado no trecho a seguir, transcrito de uma das entrevistas
coletadas:
Trabalho atualmente nesta área e isto me ajudou a decidir. Desde o primeiro
momento tive facilidade para aprender. Tenho afinidade e gosto de trabalhar com
informática. Quando pensei em escolher este curso pensei em fazer alguma coisa
que gostasse de fazer, depois arrumei serviço na área de informática e pretendo
investir nisso. (transcrito das entrevistas coletadas).
Diferentemente, outro jovem apontou a possibilidade de ganho financeiro e o retorno
do mercado de trabalho como as suas maiores motivações. Em outra perspectiva, um terceiro
jovem se referiu aos seus interesses pessoais como motivadores da escolha, sendo esta a mais
vaga das respostas, pois conotações pessoais são atribuídas em ambas justificativas já que,
pensar nas experiências particulares, no mercado ou no futuro financeiro é pensar, igualmente,
em interesses pessoais.
Perguntados sobre o processo de escolha e como este se deu, dois afirmaram que
buscaram contatos com a área afim, conversando com pessoas já inseridas no curso de
graduação e com profissionais da área. Outro participante afirmou que sua escolha foi baseada
na experiência que possui com a área, mas não soube precisar a que tipo de experiência se
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referia. Sendo que outro trabalha com a área escolhida e isto despertou o desejo por
especializar-se no curso de graduação na área em questão.
Do exposto, recorre-se a Lassance ([S.d] apud LEVENFUS, 1997) para refletir sobre
possibilidades de escolhas que muitas vezes se configuram como equivocadas. Para este autor
alguns jovens associam, por exemplo, que desenhar bem é uma habilidade específica para o
exercício da Arquitetura e, tendo tal habilidade, decide-se por essa profissão, sem considerar
outros fatores envolvidos na escolha profissional. Outros decidem por profissões relacionadas
a matérias nas quais obteve êxito no período escolar, sem conhecimento do exercício dessas
profissões.
Muitos ainda, tendo pouco contato com diferentes áreas ocupacionais, decidem por
uma das quais esteve diretamente relacionado seja em tratamentos médicos, viagens escolares
e outras situações. Há os que buscam o status social da profissão, decidindo por profissões
socialmente reconhecidas e valorizadas, ou os que buscam profissões que consideram estar
bem-situadas em termos de mercado de trabalho, sem se preocupar com prática profissional
ou a satisfação no exercício.
Nota-se que os entrevistados buscaram informações sobre as áreas e tendem a
conciliar suas aptidões e desejos pessoais com a prática profissional. Isto é fundamental para
que a escolha seja considerada madura, pois o adolescente deve colher informações e formar
conhecimentos concretos sobre o futuro para o qual se prepara. Somente um dos participantes
demonstra, nesta questão, desconhecer e buscar informações práticas sobre as profissões ora
escolhidas, baseando-se em experiências que não sabe relatar quais são, tal postura é
reconsiderada quando, na questão seguinte, referente às influências na tomada de decisão:
Recebi a influência de amigos e de universitários, pois estes me aconselharam sobre
a escolha de profissões. (transcrito das entrevistas coletadas).
Assim como ele, no que se refere às influências recebidas ao escolher a profissão,
outros dois adolescentes confirmaram o que haviam exposto anteriormente. Suas escolhas são
baseadas em contatos prévios com as áreas, em sua maioria, como nos trechos a seguir:
Meus pais pouco me influenciaram, mas eles me apóiam seja qual for a minha
escolha.
9307
Recebi indiretamente, meu pai meio que trabalha em uma área que se relaciona
com a área que escolhi.
Acho que recebi influência dos amigos. Além de ter amigos cursando
administração, tenho um outro que trabalha em um escritório como auxiliar de
administração e isso me ajudou a decidir. (transcrito das entrevistas coletadas).
Nestes trechos evidencia-se que os jovens buscaram contato direto com as atividades
relacionadas às suas escolhas e que não está explicita a influência dos pais na escolha. Não há,
também, qualquer referência a escolhas baseadas apenas em habilidades específicas, contatos
breves com a área, continuidade de estudos do segundo grau ou com o mercado. Ressalta-se
que um dos participantes afirma que não recebeu qualquer tipo de influência e, que decidiu
pela área por que começou a trabalhar na mesma.
Perguntados sobre a profissão dos pais e as influências destas na escolha que os
jovens realizaram, apenas um participante indicou que a profissão do pai como influenciadora
em sua escolha.
Diferentemente desta constatação, estudos como o Almeida e Pinho (2008) revelam
que a família é apontada como fonte de apoio no momento da decisão e, muitas vezes, como
elemento que deposita sonhos, perspectivas e objetivos que não foram ou já são tradicionais
no grupo familiar. Destaca-se ainda que, estes estudos apontam a atuação da família na
escolha profissional de adolescentes é notória tanto no discurso dos pais quanto dos filhos e
que a maneira de influenciar é múltipla, pois pode acontecer de forma aberta ou velada, sutil
ou manipuladora.
Sobre o lugar ocupado pela família na escolha profissional, Andriani (2003) assevera
que ela ocupa espaço de destaque seja por significar o lugar afetivo ou o de aceitação de uma
condição social ou racial. Para Bock, Furtado e Teixeira (2002), a família também representa
as expectativas de superação ou perpetuação de uma condição social e, muitas depositam no
mundo do trabalho perspectivas de melhores condições de vida ou ressignificação da própria
condição de grupo familiar.
Por fim, indagados sobre as perspectivas e pretensões de ganho com a profissão
escolhida, todos afirmam que conciliam a realização dos desejos pessoais com as
possibilidades do mercado, os ganhos do prazer com a finalidade a que estão se propondo.
Isto fica claro no discurso de um dos participantes transcrito a seguir:
9308
Pretendo poder trabalhar em algo que realmente goste. Principalmente porque eu
gosto de computadores, acho que sempre vou estar contente com o que farei. E
também, por ser uma área promissora que cresce e pode ser rentável. (transcrito
das entrevistas coletadas).
Há um harmonizar de aspectos pessoais e de expectativas referentes ao mercado, ao
futuro profissional e ao prazer. Em todas as decisões percebe-se que não há a problemática da
desinformação, de falta de conhecimentos sobre as áreas pretendidas e sobre os gostos
pessoais.
Cumpre ainda realizar alguns considerações, pois é notório que não há distinção
entre os discursos oriundos de escolas públicas e privadas, tendo em vista que a pesquisa se
deu em ambos espaços (dois adolescentes de cada). Porém, percebe-se que os jovens da rede
pública têm um contato maior com o exercício profissional, já atuam ou estão envolvidos em
grupos que propiciam este envolvimento. Na outra ponta, os alunos da rede privada
conseguem vislumbrar o mercado com outras perspectivas. Inclusive definindo metas quanto
a instituição em que se quer cursar a graduação (Universidade de Brasília citada por um dos
participantes).
Considerações finais
A partir dos dados do estudo é possível identificar as motivações que levam muitos
adolescentes, especificamente a amostra selecionada, a optar por seu futuro profissional. Estes
dados explicitam a necessidade do estabelecimento de programas e projetos de intervenção
que visem orientar e esclarecer dúvidas, não apenas de adolescentes, mas também de adultos
que precisam de uma recolocação profissional ou mesmo de auxílio de descobertas por novas
aptidões.
Destaca-se que os sujeitos desta pesquisa estão bem informados, mas as dúvidas
quanto ao futuro permanecem. Neste sentido, dinâmicas de grupo, grupos de orientação
profissional e acompanhamento psicoterápico são ações que contribuem para o sucesso e o
amadurecimento destas escolhas. Com vistas a direcionar as ações de orientação profissional
para ambientes escolares, quiçá familiares, que permitam ao jovem obter conhecimentos
pertinentes ao definir seu futuro profissional.
Sendo, assim, fundamental uma forma de compreensão e atuação com o orientando,
que englobe toda a sua personalidade, incluindo sua história de vida, sua escolaridade, sua
9309
família e seu meio socioeconômico e cultural, bem como as circunstâncias do momento da
escolha, sejam subjetivas, sejam objetivas ou externas ao indivíduo. É importante saber quem
é e como está escolhendo o jovem que procura a orientação profissional, que interesses,
pressões, dificuldades, entre outros aspectos, o fazem sentir necessidade de ajuda, para que
seja possível efetivamente ajudá-lo neste momento de decisão. (CARVALHO, 1995).
Em perspectiva prática sobre a atuação em contextos que permitam atividades de
orientação profissional, deve ser considerado como relevante o trabalho em grupo. Este tipo
de trabalho coloca o adolescente em contato com seus pares, grupos e turmas, auxiliando na
construção da identidade. Há ainda a possibilidade de compartilhamento de sentimentos de
dúvida, confusão e insegurança com relação à escolha profissional e ao seu futuro e cada
participante do grupo torna-se um facilitador, pois a sua possibilidade de entender o outro e
poder expressar como o percebe, auxiliam no conhecimento que cada membro busca de si
mesmo. (LUCCHIARI, 1993).
Destarte, ao se considerar a escolha profissional como oriunda de um processo que
implica o contexto social, econômico e cultural, considera-se, igualmente, a importância que
espaços como a família e a escola exercem neste processo. Assim sendo, ações no ambiente
escolar que visem o estabelecimento de espaços de debate e escuta favorecem a escolha e dão
ao adolescente condições para pensar a própria história, a história de sua família e assim
realizar a chamada “escolha madura”.
Pensa-se ainda que a comunidade deve ser inserida no pensamento científico e na
formulação deste, para desfrutar das aquisições e apontamentos pertinentes à sua realidade.
Neste sentido, iniciativas que instruam e orientem os adolescentes, respeitando suas
características pessoais, seus desejos e tendências são urgências da escola e da comunidade,
por isso, é fundamental o envolvimento de profissionais de múltiplas áreas, capazes de
articularem ações e projetos que auxiliem na consolidação de programas de orientação
profissional.
Estas ações, mediadas pela psicopedagogia e pela psicologia, na escola ou na
comunidade, tendem a transformar o meio em que são desenvolvidas e podem assim
ressignificar projetos de vida e processos, muitas vezes, de exclusão e vulnerabilidade. No
trabalho multidisciplinar é possível, ainda, recriar sentidos e refazer projetos de vida, já que as
ações articulam saberes e transformam a própria possibilidade de intervenção no mundo
cotidiano.
9310
Especificamente sobre o campo de atuação em psicopedagogia, propõe-se uma
perspectiva de trabalho na qual o processo de orientação profissional é concebido como uma
atuação que envolve a aprendizagem de elementos ligados ao comportamento de escolha e
que, portanto, pode ser trabalhado no campo psicopedagógico, já que em muitos casos, os
alunos têm dificuldade para realizar escolhas, já que não são formados para lidar com estas
como objetos. Assim, como processo, a escolha profissional pode ser trabalhada nos
contextos escolares e educacionais de forma preventiva, dentro de propostas que envolvem a
aquisição de novas aprendizagens e a reconstrução de sentidos.
REFERÊNCIAS
ADRIANI, Ana Gabriela P. O significado construído por jovens negros pertencentes a
camadas populares sobre a escolha e o futuro profissional. In. OZELLA, Sérgio.
Adolescências construídas: a visão da psicologia sócio-histórica. São Paulo: Cortez, 2003.
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ALMEIDA, Maria Elisa Grijó Guahyba de; PINHO, Luís Ventura de. Adolescência, família e
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v.20,
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Disponível
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A ESCOLHA PROFISSIONAL NA ADOLESCÊNCIA