Operações do Walt Disney World1
Alexandre Reis Graeml
Segue um relato das impressões que tive da visita que fiz à Disney e das informações
que obtive de alguns colaboradores da empresa durante o POMS (encontro da
Production and Operations Management Society) em Orlando, em março de 2001.
Destaquei principalmente 3 aspectos importantes da estratégia da empresa com
relação à sua operação: previsão, gerenciamento da capacidade e treinamento do
pessoal.
A operação de um parque de diversões pode parecer, à primeira vista, mais simples do
que outros negócios mais “sérios”, mas a Disney só consegue ser bem sucedida no
mercado porque presta atenção aos detalhes e é muito séria, quando trata de
entretenimento.
Para se ter uma idéia da complexidade envolvida na operação dos parques da Disney,
mesmo consideradas isoladamente, algumas das suas sub-operações já poderiam ser
consideradas negócios bastante vultosos. O Walt Disney World seria a 35a maior cadeia
de hotéis dos EUA, a 38a rede de restaurantes e a 63a rede de varejo. Não estará
sendo discutida em profundidade aqui a forma como a logística envolvida nesses
negócios é gerenciada, mas basta dizer que muito da distribuição precisa ser feito por
túneis que cruzam o subterrâneo dos parques, de modo a não quebrar o encanto do
que ocorre na superfície. Isto dá uma idéia dos desafios envolvidos.
A operação da Disney envolve gerenciar o estoque de 75000 itens, alguns dos quais
não podem jamais faltar. Se as capinhas de chuva do Mickey, por exemplo - o item
individual mais vendido nos parques em Orlando - não estiverem disponíveis em um dia
chuvoso, a empresa renuncia a uma enorme fonte de receita.
No total, são 8000 fornecedores para itens bastante diversos, desde fogos de artifício
vindos da Ásia até animais exóticos provenientes de todos os cantos do mundo,
passando por produtos mais usuais, como camisetas e bonecos dos personagens.
Felizmente, na opinião dos responsáveis por compras e gerenciamento de estoques na
Disney, existe um enorme potencial de substituição de compra para a maior parte dos
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Muitas das informações contidas neste texto foram fornecidas por membros do staff da Disney durante
o
o 12 Encontro Anual da Sociedade de Gestão da Produção e Operações (Production & Operations
Management Society), em março de 2001 na cidade de Orlando, na Flórida. Particularmente
relevantes foram as seguintes palestras, coordenadas por Lee Cockerell, Vice-presidente Executivo de
Operações da empresa:
♦ “Forecasting in the Service Sector” proferida por Mark Haskell, Gerente de Pesquisa do Walt Disney
World;
♦ “Service Standards and Measurement for Quality” proferida por Brad Rex, Vice-presidente de
Estratégias e Métricas de Operação;
♦ “The Walt Disney Company Supply Chain Activities” proferida por Ken Mercer, Vice-presidente de
Serviços de Compras;
♦ “Supply Chain Management at Walt Disney World” proferida por Karl Holz, Vice-presidente do Epcot
e Operações.
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itens, ou seja, o cliente está disposto a gastar uma determinada quantia com souvenirs,
independentemente do que sejam esses souvenirs (com exceção das capas de chuva).
“Ninguém vai a um parque da Disney para comprar uma camisa branca com a estampa
do Mickey. As pessoas compram lembranças”. Assim, a empresa pode escolher itens
que forneçam melhor lucratividade, descartando os que oferecem menor margem. As
lojas de souvenirs são temáticas e procuram ajudar na caracterização das atrações
próximas das quais se encontram. “A liquidação é de lembranças de momentos
agradáveis, por isso, não precisamos vender barato”.
Competências centrais (critérios ganhadores de pedidos)
A Disney percebe alguns fatores como sendo a chave do seu sucesso e procura
garantir que eles mereçam sempre a atenção necessária para manter os elevados
padrões que têm dado à empresa a liderança no setor de entretenimento.
Um destes fatores é a excelência do seu pessoal. Independentemente de se alguém
trabalha como um personagem ou é atendente em uma loja, todos os funcionários têm
que demonstrar paixão pela empresa e pelos seus objetivos. O treinamento dos
funcionários busca fazer que todos ajam de modo a garantir a segurança dos clientes,
fornecendo um atendimento cortês, dentro do espírito do show e com eficiência, nesta
ordem de prioridade. Mas, como a Disney vive dos “momentos mágicos” que
proporciona aos seus visitantes, todos devem separar pelo menos 5 minutos do seu dia
de trabalho para fornecer a algum visitante um tratamento realmente especial. Um
exemplo citado foi o de um repositor de estoques que, ao perceber uma menina
entrando no Magic Kingdom fantasiada de Cinderela, passou uma mensagem por rádio
e localizou Cinderela e a Fada Madrinha para que viessem pessoalmente receber a
“convidada especial”.
Mas a excelência do pessoal não poderia sequer ser avaliada se não houvesse alguma
forma de medir a satisfação dos clientes. A Disney vê nesta atividade uma outra
habilidade fundamental que conseguiu desenvolver ao longo dos anos. A empresa
fornece aos seus visitantes inúmeras formas para expressar os seus sentimentos sobre
a visita aos parques e utiliza o feedback proporcionado para melhorar a operação. A
forma mais visível da medição da satisfação dos clientes é a legião de jovens
entrevistadores que fica tomando depoimentos das pessoas à saída dos parques, que
os responsáveis pelo planejamento da operação afirmam utilizar como subsídio para
suas ações já na manhã seguinte, em muitos casos.
Alguns dos principais segredos do sucesso da Disney têm sido transmitidos à empresa
pelos seus visitantes, ano após ano, nas entrevistas de feedback e cartas enviadas.
Tudo o que eles querem é: (1) sentir-se especiais; (2) ser tratados como indivíduos; (3)
ter seus filhos respeitados; (4) obter informações úteis dos funcionários. Sabendo disto,
a empresa procura desenvolver em todos os seus funcionários atitudes que venham ao
encontro destas solicitações.
Dentre as competências que a Disney considera mais importantes para o seu sucesso,
talvez a mais inusitada seja a sua capacidade de gerenciamento de filas.
Considerando-se que milhares de pessoas passam pelos parques da empresa todos os
dias, é inevitável que existam filas nas principais atrações. Aliás, do ponto de vista
econômico, é importante que existam filas, desde que toleráveis pelos visitantes,
porque isto significa menos investimentos em atrações subtilizadas. A Disney se utiliza
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de diversos artifícios para tornar o tempo de fila mais agradável, seja quebrando este
tempo em frações menores, ao intercalar eventos preparatórios para a atração principal
com o tempo de espera, seja permitindo que as pessoas planejem antecipadamente o
horário em que desejam visitar uma atração. O planejamento prévio é possível com o
uso do “fast pass” (passe rápido), através do qual a Disney consegue tornar a demanda
por determinadas atrações “mais bem comportada” ao longo do tempo, ajustando-a, na
medida do possível à capacidade de processamento de visitantes dos brinquedos.
Uma operação que processa os próprios consumidores, como é o caso da Disney,
precisa saber, com a máxima precisão, qual será a sua demanda, dia após dia. Existem
inúmeros fatores que contribuem para que o número de visitantes seja bastante variável
ao longo do tempo, mas a maior parte desses fatores possui comportamento cíclico ou
sazonal, que pode ser modelado. A empresa investe muitos recursos em previsão e
planejamento por acreditar que respostas para perguntas do tipo: “quantas pessoas
virão?”, “quanto tempo vão ficar?” e “o que pretendem fazer enquanto estiverem aqui?”
são vitais para o seu negócio. Previsões são feitas para os próximos 5 anos, dia a dia.
Neste plano de 5 anos, são levadas em conta projeções econômicas, questões
demográficas, feriados, calendários escolares (de mais de 3000 escolas dos EUA) e
histórico dos anos anteriores. Esta previsão é utilizada principalmente para definir
grandes incrementos de capacidade nos parques, como a implantação de novos
brinquedos principais. Uma previsão mais detalhada é feita com um ano de
antecedência, também com discriminação diária. Para esta previsão, a tolerância é de
5%. Ou seja, se houver discrepância superior a 5% entre o público que foi previsto há
um ano para um determinado dia e o que realmente visitou o parque, as pessoas
envolvidas na previsão precisarão rever o seu modelo e, possivelmente, terão que se
explicar para o chefe. Por fim, há previsões de curto prazo e a verificação do que está
ocorrendo na prática. Todos os dias, às 11 horas da manhã é feita uma reunião da
equipe de planejamento, já com os dados referentes ao número de pessoas que estão
nos parques, para fazer os últimos ajustes de capacidade para o dia.
Mas prever com antecipação a quantidade de pessoas que vai visitar os parques em
um determinado dia de nada adiantaria se a operação não dispusesse de flexibilidade
para se ajustar às flutuações da demanda, que pode variar em até 4 vezes entre um dia
de grande movimento nas férias de verão e um dia calmo no meio do ano escolar.
Em suas medições da satisfação dos clientes, a empresa percebeu que os visitantes
ficam satisfeitos depois de terem experimentado, em média, 10 atrações em um dia.
Como a capacidade instalada é rígida, no curto prazo, isto é, não é possível construir e
colocar novas atrações em funcionamento da noite para o dia, é importante fazer boas
previsões de demanda (forecasting) para o longo prazo. No curto prazo, é importante
decidir quais brinquedos serão paralisados para manutenção preventiva, e em que dias
e horários. Com base nas previsões de demanda e na apuração do número de pessoas
que passaram pelas catracas de entrada dos parques, a gerência pode optar ainda por
expandir o número de horas durante as quais os parques permanecerão abertos em
dias de movimento particularmente elevado, para permitir que as pessoas visitem mais
atrações (ao menos as 10 que as deixarão satisfeitas) e saiam do parque com a
sensação de que a experiência valeu a pena e justificou o dinheiro gasto com o
ingresso.
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