BULLYING AO POVO BRASILEIRO:
AS AMARRAS QUE ESCRAVIZAM AS FAMÍLIAS
Antônio de Pádua Galvão∗
A Praça Sete é agora minha inspiradora. Chego às 9h, tomo um cafezinho, delicio
um pão de queijo no Café Nice, saúdo meus amigos, cumprimento a Sandra da
banca de jornal e vou sentido o movimento do centro. É neste observatório que
começo a pensar nas diversas e nefastas agressões sofridas de modo sistemático
pelo povo brasileiro.
Numa frenética manhã, estando no centro de BH, me deparei com os jogadores de
xadrez no quarteirão fechado da rua Rio de Janeiro com Avenida Afonso Pena.
Eles (os jogadores) demonstram astúcia e inteligência em cada jogada. Observo o
tabuleiro de xadrez, os banquinhos e o silêncio do jogo. Tudo ali no meio da rua, na
calçada, em frente ao extinto Banco do Estado de Minas Gerais (BEMGE). Banco
que fez história em Belo Horizonte e Minas Gerais, emprestou ao povo e saciou o
voraz apetite dos políticos.
De pé, em frente ao banco, observo os jogadores de xadrez e sou tomado de
pensamento. Percebo a força da dinâmica da cidade. Uns indo para o trabalho,
outros para a escola, compras e os afazeres do dia a dia. Meus sentidos se voltam
para força do sistema financeiro. Lembro-me do antigo Banco Lavourinha, Credireal,
Banco Nacional, Banco Mineiro, Banco do Progresso, Mutual, Banco Hércules, etc.
E vejo a força dos bancos atuais: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco
Itaú, Banco Mercantil, Santander e tantos outros. Senti uma breve dor no peito.
Sintoma de saudade dos meus amigos e colegas dos tempos de bancário. Labutei
muito no Banco Mineiro, Unibanco e Banco do Progresso. Foram 15 anos neste
ofício de pressão. Bancário bebia muito para aliviar o estresse. Parece que o hábito
permanece. Afinal, BH é capital dos botecos.
∗
Antônio de Pádua Galvão é economista, psicanalista e conselheiro do CORECON-MG.
Mas agora, é xadrez que retoma minha atenção. Jogo de natureza complexa que me
remete às tramas do poder. A movimentação árdua dos peões que avançam à
frente das guerras, que lutam para proteger as elites (rei, rainha, bispo, cavalo e
torres) e suas famílias. Os peões são como nossos trabalhadores que avançam
destemidos na saga de vencer a grande batalha de sustentar seus entes, não para
acumular riquezas. Como economista, sempre me pergunto por que as famílias
brasileiras não são portadoras de uma robusta poupança. Fazem parte dos sonhos
dessas famílias alimentação, casa própria, assistência médica e educação. Essa
última sempre fica em último plano.
Os escravocratas nos legaram algumas chagas: a indiferença ao povo, a lógica
perversa da dependência cultural e a indigência, a precisão de tudo, a pobreza e
miséria. Existe uma herança genética de maldade, que passa de geração a geração
pelas elites. Elas buscam quebrar, vergar e fragilizar o chefe de família, tornando-o
dependente de um emprego com salário mínimo, uma educação pública lastimável,
com professores com salários vergonhosos.
É a instalação de uma política pública geracional. O binômio “povo sem cultura e
endividado”, com carência afetiva, mas consumo desenfreado.
Há algo que custa caro. Perceber a publicidade consumista, crédito abundante e
consignado. Tudo como a armadilha para capturar a alma e dominar simbólica e
financeiramente muitas famílias. Existe uma legião de endividados. São dívidas
fabricadas por meio de contratos abusivos que tiram dinheiro, o sono e a
possibilidade de buscar conhecimento. É uma espécie de cativeiro moderno. O
açoite é dado na dignidade, alimentando a lógica da dependência.
A moeda é como o sangue que circula em nossos corpos. Se uma parte do corpo
não recebe este líquido essencial, esta área murcha, adoece, gangrena e morre. E o
saber é como a liturgia para alma. Sem conhecimento, o espírito fica errante, sem o
destino e o sentido das coisas. É assim que se sentem as famílias sem renda. A
energia vai sucumbindo. Falta o básico: gás, pão, leite, almoço, janta, caderno e
lápis. Falta conhecimento, faltam livros, falta saber. E falta ainda o essencial: a
esperança da emancipação das famílias do povo brasileiro.
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