BIBLIOTECA LAS CASAS – Fundación Index http://www.index-f.com/lascasas/lascasas.php Cómo citar este documento Caldas, CP; Veras, RP. Promovendo a saúde do idoso na comunidade. Biblioteca Lascasas, 2007; 3(4). Disponible en http://www.indexf.com/lascasas/documentos/lc0274.php PROMOVENDO A SAÚDE DO IDOSO NA COMUNIDADE Introdução Uma das maiores conquistas da humanidade foi a ampliação do tempo de vida. A espécie humana necessitou de milhões de anos para atingir um bilhão de pessoas, o que teria ocorrido em 1830. Em 1927 este número dobrou. Em 1960 chegou aos três bilhões de habitantes no planeta. De lá para cá, a aceleração cresceu. Em 14 anos a marca dos quatro bilhões foi atingida, o quinto bilhão veio em 1987 e, 12 anos após, em 1999, alcançamos o sexto bilhão. Segundo o IBGE (2002), o crescimento da população de idosos, em números absolutos e relativos, é um fenômeno mundial e está ocorrendo a um nível sem precedentes. Em 1950, eram cerca de 204 milhões de idosos no mundo e, já em 1998, quase cinco décadas depois, este contingente alcançava 579 milhões de pessoas, um crescimento de quase 8 milhões de pessoas idosas por ano. As projeções indicam que, em 2050, a população idosa será de 1.900 milhões de pessoas, montante equivalente à população infantil de 0 a 14 anos de idade (Andrews, 2000). Outros aspectos importantes para explicar este fenômeno, na visão de Andrews, são os seguintes: • desde 1950, a esperança de vida ao nascer em todo o mundo aumentou 19 anos; • hoje em dia, uma em cada dez pessoas tem 60 anos de idade ou mais; para 2050, estima-se que a relação será de um para cinco para o mundo em seu conjunto, e de um para três para o mundo desenvolvido; • segundo as projeções, o número de centenários – de 100 anos de idade ou mais – aumentará 15 vezes, de aproximadamente 145.000 pessoas em 1999 para 2,2 milhões em 2050. Do ponto de vista demográfico envelhecer significa aumentar o número de anos vividos. Paralelamente à evolução cronológica, coexistem fenômenos de natureza biopsíquica e social, importantes para a percepção da idade e do envelhecimento. Mais do que qualquer época, o século XX se caracterizou por profundas e radicais transformações, destacando-se o aumento do tempo de vida da população como o fato mais significativo no âmbito da Saúde Pública mundial. A esperança de vida experimentou um incremento de cerca de 30 anos ao longo do século XX, numa profunda revolução da demografia e da Saúde Pública. Tal revolução formula para os especialistas, homens públicos e coletividades um dos maiores desafios sociais da história humana e uma intensa demanda por estudos e análises para uma melhor definição de políticas públicas de prevenção de saúde no envelhecimento. Trata-se de um fenômeno simultaneamente global e local, com evolução preocupante a curto e médio prazo, à medida que a rápida diminuição das taxas de natalidade observadas nos últimos anos na maioria dos países sinaliza um incremento ainda maior do processo global de envelhecimento da população. A equação demográfica é simples: quanto menor o número de jovens e maior o número de adultos atingindo a terceira idade, mais rápido é o envelhecimento da população como um todo (Camarano, 1999). Em termos biológicos, o envelhecimento compreende os processos de transformação do organismo que ocorrem após a maturação sexual e que implicam a diminuição gradual da probabilidade de sobrevivência. No entanto, o envelhecimento e o desenvolvimento são processos que coexistem ao longo do ciclo vital. A idade cronológica é uma informação que não diz muito sobre o real envelhecimento humano, embora seja um parâmetro importante para o planejamento de políticas de atenção ao idoso ou para a gestão de serviços. A única característica importante a ser destacada em relação ao processo de envelhecimento humano é a heterogeneidade. Ou seja, cada indivíduo envelhece de maneira própria, pois se trata de um processo multifatorial. A Capacidade funcional é o principal indicador da capacidade adaptativa do ser humano. Sua determinação nos informa sobre a idade ou o envelhecimento funcional do indivíduo e isso não depende da idade cronológica. Ou seja, existem pessoas jovens cronologicamente e bastante envelhecidas funcionalmente e vice-versa. Já a Idade social é determinada pela atualidade da participação na sociedade. O envelhecimento social ocorre quando existe um desengajamento do indivíduo, que deixa de interagir socialmente. Ou seja, quando a sociedade oferece oportunidade para o engajamento e os indivíduos mantém a capacidade de se adequarem ao desempenho de papéis sociais, o envelhecimento social pode até não ocorrer. A aposentadoria e a chamada “síndrome do ninho vazio”, que é quando a mulher que se dedicou à família se vê só com a partida dos filhos, são situações que podem precipitar o envelhecimento social. Por isso, é muito importante que o indivíduo atualize seus projetos de vida. Idade psicológica e envelhecimento psicológico referem-se à relação entre a idade cronológica e as capacidades: percepção, aprendizagem e memória (potencial de funcionamento futuro) e inclui um senso subjetivo de idade (comparando-se com outros). Embora haja uma alteração das funções cognitivas, perceptíveis em testes de desempenho mental com o avançar da idade, não foi detectado uma marcante alteração na personalidade. Destacam-se como características psicosociais do envelhecimento, a vivência de perdas, o declínio físico, uma intensificação de reflexões sobre a vida e a diminuição de perspectiva de futuro. São características de um processo natural de desenvolvimento em fases avançadas da vida, ou seja, de um Envelhecimento Normativo. O envelhecimento normativo pode ser sistematizado em dois níveis: o primário, que está presente em todas as pessoas, por ser geneticamente determinado e; o Secundário, que varia entre indivíduos e é decorrente de fatores cronológicos, geográficos e culturais. O conceito de Envelhecimento Bem Sucedido (Rowe e Kahn, 1987), envolve baixo risco de doenças e de incapacidades; funcionamento físico e mental excelentes e; envolvimento ativo com a vida. Depende da capacidade de adaptação às mudanças físicas, emocionais e sociais. Esta capacidade é o resultado da estrutura psicológica e condições sociais, construídas ao longo da vida. Para um envelhecimento bem sucedido, é necessário que haja uma substituição simbólica das inexoráveis perdas, por ganhos em outras dimensões; o atendimento às necessidades sociais (boas condições de vida e oportunidades sócio-culturais) e; a renovação dos projetos de vida. Já o Envelhecimento Mal Sucedido se dá quando ocorrem perdas dos projetos de vida; falta de reconhecimento; dificuldade de satisfazer suas próprias necessidades; sentimentos de fragilidade, incapacidade, baixa estima, dependência, desamparo, solidão, desesperança; ocorrência de ansiedade, depressão, hipocondria e fobias. As doenças que coloquem a vida em risco; a morte de pessoa próxima; a saída dos filhos de casa; as mudanças de residência; a perda da autonomia e; as perdas materiais são importantes riscos para que se estabeleça um processo de Envelhecimento Mal Sucedido. Qualidade de vida pode ser definida como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e do sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”(WHOQOL Group). Na velhice, os principais indicadores de qualidade de vida são a própria longevidade, a saúde biológica, a saúde mental, a satisfação com a vida, um bom desempenho cognitivo, competência social, produtividade e atividade. A fragilidade é outro conceito importante para se avaliar a saúde do idoso. Esta é definida como uma vulnerabilidade que o indivíduo apresenta aos desafios do próprio ambiente. Esta condição é observada em pessoas muito idosas ou naqueles mais jovens, que apresentam uma combinação de doenças ou limitações funcionais que reduzam sua capacidade de adaptar-se ao estresse causado por doenças agudas, hospitalização ou outras situações de risco. A fragilidade representa risco de dependência. A dependência se traduz por uma ajuda indispensável para a realização dos atos elementares da vida. Não é apenas a incapacidade que cria a dependência, mas sim o somatório da incapacidade com a necessidade. Por outro lado, a dependência não é um estado permanente. É um processo dinâmico cuja evolução pode se modificar e até ser prevenida ou reduzida se houver um ambiente e assistência adequados. Faz-se necessário classificar a incapacidade em graus de dependência: leve, parcial ou total. É exatamente o grau de dependência que determina os tipos de cuidados que serão necessários. Para se avaliar o grau de dependência utiliza-se o método de avaliação funcional. Função é a capacidade de um indivíduo adaptar-se aos problemas cotidianos, ou seja, aquelas atividades que lhe são requeridas por seu entorno imediato incluindo a sua participação social, ainda que apresente limitações física, mental ou social. Martins Sá (2002) destaca que o profissional que atua no campo da saúde do idoso precisa estar apto a apreender, histórica e criticamente, o processo do envelhecimento em seu conjunto; compreender o significado social da ação gerontológica; situar o desenvolvimento da gerontologia no contexto sócio-histórico; atuar nas expressões da questão da velhice e do envelhecimento, formulando e implementando propostas para o enfrentamento; realizar pesquisas que subsidiem a formulação de ações gerontológicas; compreender a natureza interdisciplinar da gerontologia buscando ações compatíveis no ensino, pesquisa e assistência; zelar por uma postura ética e solidária no desempenho de suas funções e; orientar a população idosa na identificação de recursos para o atendimento às necessidades básicas e de defesa de seus direitos. Pode-se considerar que a promoção da saúde do idoso na comunidade deve garantir um aprofundamento de práticas preventivas, balizado pelo afã de detectar precocemente os agravos de saúde. Cabe observar, no entanto, que a proposta não se esgota aí, mas avança em direção a uma nova fronteira: a Saúde Coletiva. Considera-se aqui como referência o conceito de “Saúde Coletiva” formulado por Paim & Almeida Filho (2000): “Podemos entender Saúde Coletiva como campo científico, onde se produzem saberes e conhecimentos acerca do objeto ‘saúde’ e onde operam distintas disciplinas que o contemplam sob vários ângulos; e como âmbito de práticas, onde se realizam ações em diferentes organizações e instituições por diversos agentes (especializados ou não) dentro e fora do espaço convencionalmente reconhecido como ‘setor saúde’” (p. 59). Saúde Coletiva e envelhecimento No final da década de 1980, quando se intensifica o movimento de valorização do idoso em decorrência das análises demográficas acerca do envelhecimento populacional, muitos profissionais nas áreas da saúde e das ciências humanas e sociais tomaram como ponto de partida a marcante obra de Simone de Beauvoir (1970), A Velhice, e, no âmbito nacional, os eloqüentes trabalhos de Eneida Haddad, A Ideologia da velhice (1986), e de Ecléa Bosi, Lembranças de Velhos (1987). Estas autoras discutem a perda do valor social do idoso em função do avanço do capitalismo, que torna o idoso elemento descartável de um sistema que singulariza a capacidade produtiva em detrimento de outras dimensões do humano. Desde então, profissionais que focalizam o envelhecimento como campo de eleição de sua prática profissional e construção de saberes vêm travando um embate na tentativa de resgatar o valor social de idoso. Tal resgate passa, inevitavelmente, por assegurar sua cidadania plena. Segundo Boff (2000), o desenvolvimento do capitalismo moldou o modo ocidental de ser e estar no mundo, e deu forma à nova ordem global. No início da década de 1970, inicia-se uma escalada de crises regionais, seguida da desestruturação econômica e aprofundamento das desigualdades na distribuição de renda. No curso das décadas de 80 e 90, as forças sociais dominantes passaram ao largo do enfrentamento das crises e se concentram na unificação do capitalismo em nível global, sob a égide do pensamento neoliberal. A ciência impulsiona o processo do capitalismo global, enquanto produto e sustentáculo do desenvolvimento da sociedade moderna. Se, por um lado, muitos benefícios foram alcançados por intermédio do conhecimento científico, por outro, a ciência silenciou outras formas de saber. Neste contexto, a tradição e a sabedoria dos anciãos perderam valor frente à palavra da ciência. O desenvolvimento moderno determinou profundas transformações no campo da saúde. Paim & Almeida Filho (2000) sublinham que a "nova ordem mundial", que se instaura na década de 80, inspirada no neoliberalismo, fragiliza os esforços para o enfrentamento coletivo dos problemas de saúde. Particularmente nos países de economia capitalista dependente, a opção pelo "Estado mínimo" e o corte nos gastos públicos, em resposta à assim denominada “crise fiscal do Estado”, comprometem a esfera institucional conhecida como Saúde Pública. Emerge então uma "crise da Saúde Pública", percebida de modo diferente pelos distintos sujeitos atuantes neste campo social. Visando superar esta situação adversa, vários aportes têm sido propostos, reclamando novas abordagens. Fala-se de um paradigma pós-moderno, que reconheceria as diferenças sociais e culturais, sem que haja uma ruptura com o conhecimento moderno, científico, e sim a sua superação, pelo reconhecimento das diferenças – o que exclui a idéia de hierarquia entre os desiguais, uma vez que é o respeito às diferenças o que nos faz iguais. Trata-se de um novo modelo, que tem como imperativos éticos a participação e a solidariedade, articulados à ciência e ao mundo da vida. De acordo com Serrano (2002), este novo paradigma compreenderia um modelo de desenvolvimento que leva em conta: a) a saúde como eixo das políticas públicas; b) uma atitude de cuidado na relação com a natureza; c) o compromisso com a participação social de todos, compreendendo o empowerment e a construção dos sujeitos-cidadãos; d) o resgate do lazer; e) o resgate do espiritual; f) a inserção da perspectiva da promoção da saúde como prioritária; e g) a integração das diferentes práticas culturais. Para construir este novo referencial é necessário garantir a cidadania para todos, inclusive para aqueles que a tiveram e perderam. É a partir da inclusão social que se pode contar com pessoas solidárias, cordiais e conectadas com tudo e todos. É neste marco que se pode resgatar o ser idoso como valor para a sociedade. O contexto atual, no entanto, não parece favorecer esta atuação: a baixa prioridade conferida aos idosos pelas políticas públicas (assistenciais, previdenciárias e de ciência & tecnologia) evidencia uma percepção inadequada das suas necessidades específicas. Torna-se necessário, portanto, um esforço político orientado no sentido de colocar na agenda da sociedade as necessidades deste segmento populacional. O envelhecimento é uma questão que, ainda que incorporada ao campo da Saúde Coletiva desde os seus primórdios, não vem merecendo a devida atenção dos formuladores e gestores de políticas públicas. Ao apresentar "a promoção da saúde" como um movimento no campo da Saúde Coletiva, Paim & Almeida Filho (2000) relatam que, em 1974, no Canadá, o documento conhecido como “Relatório Lalonde” definiu as bases de um movimento pela promoção da saúde, trazendo como consigna básica “adicionar não só anos à vida, mas vida aos anos”. Ferreira & Buss (2002), Adriano et al. (2000) e Paim & Almeida Filho (2000) concordam que a Carta de Ottawa (apud Brasil.Ministério da Saúde, 2002) constitui um marco deste movimento, uma vez que é nesta Conferência que a promoção da saúde é definida como "o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo". A Carta de Ottawa define cinco campos vitais à promoção da saúde: 1) elaboração e implementação de políticas públicas saudáveis; 2) criação de ambientes favoráveis à saúde; 3) reforço da ação comunitária; 4) desenvolvimento de habilidades pessoais; e 5) reorientação do sistema e dos serviços de saúde. Observe-se a ligação estabelecida entre saúde e qualidade de vida e a ênfase na criação de ambientes favoráveis à saúde e desenvolvimento de habilidades pessoais. Aí se inserem as ações de promoção da saúde do idoso que ampliam o âmbito das intervenções, como a experiência bem-sucedida relatada a seguir. A Carta de Ottawa (1986) destaca que as condições e os requisitos para a saúde são a paz, a educação, a moradia, a alimentação, a renda, um ecossistema estável, a justiça social e a eqüidade. A saúde, nesta concepção ampliada, é, mais do que ausência de doença, um estado adequado de bemestar físico, mental e social que permite aos indivíduos identificar e realizar suas aspirações e satisfazer suas necessidades (Ottawa, 1986). A partir desta definição de saúde, muitos autores na área da Saúde Coletiva, entre os quais Ferreira & Buss (2002), Adriano et al. (2000) e Paim & Almeida Filho (2000), sublinham o aspecto da promoção da saúde, incorporado à idéia de assistência e de cura. Ao considerar que “qualidade de vida” se reveste de múltiplos sentidos, Minayo, Hartz & Buss (2000) afirmam aproximar-se esta noção à satisfação buscada na vida familiar, amorosa, social e ambiental e na própria estética existencial. Pressupõe a qualidade de vida a capacidade de efetuar uma síntese cultural de todos os elementos que determinada sociedade toma como seus padrões de conforto e bem-estar. O termo abrange muitos significados, que refletem conhecimentos, experiências e valores de indivíduos e coletividades que a ele se reportam em variadas culturas, espaços e momentos históricos, sendo, portanto, uma construção social com a marca da relatividade cultural. Assis (1998) observa que os inúmeros problemas que afetam a qualidade de vida dos idosos em um país subdesenvolvido demandam respostas urgentes em diversas áreas. Às políticas públicas cabe garantir os direitos fundamentais (habitação, renda, alimentação), e desenvolver ações voltadas às necessidades específicas da população idosa, como centros de convivência, assistência especializada à saúde, centros-dia, serviços de apoio domiciliar ao idoso, programa de medicamentos, universidades da terceira idade etc. Em abril de 2002, na Segunda Assembléia Mundial sobre o Envelhecimento, realizada em Madri, foi aprovado o PIAE – Plano Internacional de Ação sobre o Envelhecimento. O documento foi referendado por todos os países membros das Nações Unidas e representa, portanto, um compromisso internacional em resposta ao rápido envelhecimento da população mundial. As recomendações do PIAE definem três áreas prioritárias: a) como inserir o envelhecimento populacional na agenda do desenvolvimento, b) a importância singular e global da saúde; e c) como desenvolver políticas de meio-ambiente (tanto físico quanto social) que atendam às necessidades de indivíduos e sociedades que envelhecem. À OMS, enquanto agência especializada da ONU (Organização das Nações Unidas), coube um papel particularmente importante na formulação de recomendações específicas do PIAE. Na Assembléia de Madri, a entidade lançou o documento Envelhecimento ativo: um marco para elaboração de políticas, que complementa e amplia o PIAE. Neste documento, a OMS recomenda que políticas de saúde na área de envelhecimento levem em consideração os determinantes de saúde ao longo de todo o curso de vida (sociais, econômicos, comportamentais, pessoais, culturais, além do ambiente físico e acesso a serviços), com particular ênfase sobre as questões de gênero e as desigualdades sociais (Carta de Ouro Preto-NESPE, 2003). Para atender a estas agendas, faz-se necessário desenvolver modelos de atenção à saúde do idoso que superem as práticas tradicionais, pois o atendimento que lhes é oferecido habitualmente restringe-se, na melhor das hipóteses, ao tratamento clínico de doenças específicas. O sentido de prevenção que assumimos aqui é o que está expresso no Relatório Lalonde (1974) – “Adicionar vida aos anos”. Sabe-se que os modelos de prevenção para esse segmento etário têm especificidades distintas dos grupos mais jovens. Segundo Caldas (1999), para adquirir uma mentalidade preventiva e promover adequadamente a saúde do idoso, é fundamental a evolução e disseminação do conhecimento sobre o envelhecimento. É importante que, em qualquer faixa etária, todos saibam reconhecer situações que ponham em risco a qualidade de vida no presente e no futuro, e como preveni-las. A proposta para os que já são idosos é a de promover a saúde por meio da manutenção ou recuperação da autonomia e independência. Com isso, naturalmente, procurar-se-á postergar, ao máximo, o início das doenças, pois estas, em sua imensa maioria, são crônicas, e depois de instaladas são de difícil resolução e evolução lenta. Embora tenha com a Gerontologia uma afinidade de saberes e práticas, a abordagem do idoso em saúde coletiva é diferente. Groisman (2002) observa que a Gerontologia veicula um discurso no qual utiliza a noção de prevenção num sentido diferente daquele preconizado e praticado no campo da Saúde Coletiva: A prevenção parece ser a saída encontrada pela Gerontologia para escapar do binômio saúde–doença. Com o discurso da “prevenção”, todos os sujeitos são passíveis de intervenção, independentemente de seu estado de saúde ou de sua inserção na “normalidade”. Pela urgência da prevenção, não importa também quando começa a velhice, pois a prevenção deve começar muito antes. Lutando por um envelhecimento bem-sucedido, a Geriatria/Gerontologia parece delinear o seu mais ambicioso projeto, que é disciplinar a vida humana em toda a sua extensão (Groisman, 2002). Teixeira (2001) enfatiza que a socialização de conhecimentos sobre estratégias e práticas de promoção da saúde e qualidade de vida deverá subsidiar a formação de novos sujeitos das práticas de saúde, para além do Estado. Ao mesmo tempo, a revolução das comunicações favorece a conexão de grupos que compartilhem ideais, pratiquem modos de vida comuns e busquem soluções para problemas singulares. As pessoas idosas desejam e podem permanecer ativas e independentes por tanto tempo quanto for possível, se o devido apoio lhes for proporcionado. Os idosos estão potencialmente sob risco não apenas porque envelheceram, mas em virtude do processo de envelhecimento torná-los mais vulneráveis à incapacidade, em grande medida, decorrente de condições adversas do meio físico, social, ou de questões afetivas. Portanto, o apoio adequado é necessário tanto para os idosos quanto para os que deles cuidam. Teixeira (2001) demonstra que as ações de promoção da saúde implicam o desenvolvimento de tecnologias "radicalmente novas". A autora acrescenta que estas tecnologias exigem o desenvolvimento de métodos, técnicas e instrumentos de comunicação social e marketing sanitário, visando à promoção de mudanças no âmbito das políticas públicas, bem como de mudanças das condições e dos modos de vida de grupos populacionais expostos a riscos diferenciados, o que pressupõe alterações nas relações de poder. A autora afirma que essas mudanças nas relações políticas e sociais vêm sendo anunciadas nos textos sobre promoção da saúde enquanto processo de empowerment de grupos populacionais específicos, o que significa não apenas a mobilização em torno de direitos gerais de cidadania, mas também a organização de ações político-sociais específicas que conectem indivíduos e grupos com problemáticas e preocupações comuns. A socialização de conhecimentos acerca de estratégias e práticas de promoção da saúde e da qualidade de vida deverá subsidiar a formação de novos sujeitos das práticas de saúde. Assim, como aponta Teixeira (2001), poderá ocorrer a revalorização do território mais imediato no qual se constitui o espaço público de convivência, seja este espaço a rua, o bairro, a cidade, ou a universidade. Afinal, ainda segundo a mesma autora: O futuro poderá ser o cenário em que se desenvolverão processos distintos: de um lado, a ”mercantilização“ da prevenção, com a penetração da lógica da produção, distribuição e consumo de mercadorias no campo específico da prevenção de riscos e agravos à saúde de indivíduos e grupos; de outro, o esforço coletivo pela ”socialização“ da promoção, com a formação de novos sujeitos políticos coletivos, que se mobilizem pela transformação das condições e dos modos de vida dos diversos grupos populacionais. A indeterminação, espaço de múltiplos possíveis, permanece, entretanto, como a marca da contemporaneidade, a exigir o conhecimento e a intervenção no tempo presente, tempo de exploração e construção de futuros. Segundo envelhecimento Caldas da & Silva população (2004), brasileira os desafios trazidos pelo têm diversas dimensões e repercussões na sociedade, mas nada é mais justo do que garantir ao idoso a sua integração na comunidade. As políticas de atenção à terceira idade impõem a atuação intersetorial na gestão pública, pois muitas vezes, as ações dirigidas aos idosos são executadas sem a mínima articulação com órgãos envolvidos nas diversas demandas que os idosos apresentam: saúde, educação, cultura, habitação, assistência social, etc. As necessidades dos idosos são muitas e variadas. Tradicionalmente, pensava-se somente nas questões físicas e econômicas dos idosos, na assistência à saúde e nas pensões; atualmente eles reivindicam os seus direitos sociais, que no passado recente não eram considerados importantes. Para que esses direitos sejam postos em prática no cotidiano é preciso que haja cada vez mais a mobilização permanente da sociedade para a inclusão da velhice na agenda de prioridades dos governos locais. Referências Bibliográficas Adriano JR, Werneck GAF, Santos MA & Souza RC. 2000. A construção de cidades saudáveis: uma estratégia viável para a melhora da qualidade de vida? Ciência & Saúde Coletiva 5(1):53-62. Andrews, G. A. Los desafíos del proceso de envejecimiento en las sociedades de hoy y del futuro. In: ENCUENTRO LATINOAMERICANO Y CARIBE—O SOBRE LAS PERSONAS DE EDAD, 1999, Santiago. Anais. Santiago: CELADE, 2000. p. 247- 256. (Seminarios y Conferencias - CEPAL, 2). Assis M. 1998. Aspectos sociais do envelhecimento. In: Caldas CP (org.) A Saúde do Idoso: A arte de cuidar. Rio de Janeiro: Eduerj. Beauvoir S. 1990. A Velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira Boff, L.; Arruda, M. Globalização: desafios socioeconômicos, éticos e educativos. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000. Bosi E. 1987. 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