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Um relógio que conta o seu tempo
– e não só o dele
por Miguel Esteves Cardoso
relógio que só conta as horas. Avança, pachorrento, sem se impor-
tempo têm sempre os melhores relógios.
tar com o resto. A minha mãe, que é um bocadinho snob, diz que
Conhecem o valor de um minuto, de uma
a pressa é uma coisa para o povo, gente aflita que tem de marcar
hora e de um dia e um bom relógio acaba
ponto, que corre de um lado para o outro, penalizada se chega um
por ser uma maneira barata de celebrar
minuto atrasada.
esses valores.
Quando comprei um Mercedes descapotável novinho em folha há
As pessoas que se queixam do preço dos reló-
coisa de dois anos e a convidei para ir almoçar ela logo me disse,
gios deveriam pensar mais um bocadinho. E fazer as
quando cedi à irresistível tentação de lhe mostrar a rapidez da
contas. Quanto é que acaba por custar nos termos para que foi con-
máquina: «Oh Miguel, com um carro destes deves andar devagari-
cebido – ou seja, por hora?
nho, para saberem que não tens de estar em lugar nenhum a qual-
Um ano tem quase 8800 horas. Para facilitar os cálculos, digamos
quer hora certa… só os desgraçados é que andam sempre de prego
que com 220 contos já se consegue comprar um relógio bastante
a fundo, ansiosos para não perder um minuto, com medo que lhes
decente. Verifica-se assim que, por cada mil escudos, recebem-se
ralhem à chegada…».
40 horas inteiras de bom serviço. Uma hora sai assim a 25 escudos
Há a mania de que os ingleses são muito pontuais mas a verdade é
por hora – uma quantia mais módica ainda se atendermos aos mi-
que os mais ingleses de todos – os que não têm de trabalhar para
nutos e segundos. Mas não atenderemos, para não complicar as
viver – combinam tudo vagamente. Nunca dizem «one o’clock»;
contas.
dizem «one-ish». Como quem diz: «coisa que o valha». Nunca
Repare-se ainda que um bom relógio dura pelo menos 25 anos. E
dizem «five o’clock»; dizem «after five» ou, mais snob ainda, «any
assim se chega facilmente à conclusão de que estamos a pagar um
time after five». Teoricamente poderia ser às seis ou às sete. Quan-
escudo por cada hora. É o preço que levava uma empregada domés-
do querem ser muito rigorosos dizem «I’ll expect you around
tica em, sei lá, 1658. De qualquer forma, é muito pouco.
eight»; mas não é menos indefinido por isso.
Um escudo por hora é quanto custa um relógio que custa hoje 220
Concordo que é um pouco ordinário gostar de um relógio com pon-
contos. Se estiver disposto a pagar dois escudos por hora já poderá
teiro de segundos e muitos númerozinhos e que o cúmulo do
investir num relógio de 440 contos. Se quatro escudos por hora lhe
chique é um relógio caríssimo e giríssimo que apenas dá uma ideia
parecer justo por tanto prazer e tanta utilidade – é um escudo por
aproximada das horas que são. Já reparei no prazer com que certas
quarto-de-hora – então não pense duas vezes em adquirir um belo
pessoas confessam que os relógios estão «running late». Mas man-
conta-horas de 880 contos. Nem quero computar o valor de troca de
tenho que nada disso é importante. Devemos escolher um relógio
um bom relógio – se assim fizesse, um bom relógio sairia quase de
de que gostamos. Eu também chego atrasado ou adiantado e rara-
graça. E, caso se fizesse a escolha acertada, seria muito capaz de dar
mente sei a quantas ando – mas gosto de saber a severidade dos
lucro ao fim de 25 anos, caso o quisesse vender a um coleccionador.
meus atrasos com o máximo rigor.
Mas os bons relógios não são para vender – oferecem-se ou dei-
Cada um sabe da relação que tem com o tempo. E essa relação deve
xam-se em herança. E assim como o relógio do meu pai no meu
reflectir-se no relógio que escolhe. É, por exemplo, evidente que um
pulso me traz constantemente memórias dele e dos bons tempos
relógio que nos diz não só o dia do mês mas o dia da semana só se
que passámos juntos, essas coisas não têm preço.
justifica se uma pessoa não tem outra maneira de saber. Se temos
Os relógios não são como isqueiros ou automóveis, que só são leva-
de trabalhar como abelhas sabemos que é quarta-feira ou que fal-
dos a funcionar de vez em quando. Um relógio está sempre lá, sem-
tam dois dias para o fim-de-semana. Mas se a vida é de lazer abso-
pre a bater; como um coração. Cada segundo é assinalado; cada ho-
luto e não há maneira de distinguir um sábado de uma terça-feira,
ra corresponde a uma viagem; a uma jornada.
então pode dar jeito ficar com uma ideia do dia que está, digamos,
Não sou um coleccionador de relógios – considero-me apenas um
em vigor...
apreciador. Mas sei que cada relógio corresponde, na maneira como
Ao preço que estão os relógios, vale certamente a pena ter um reló-
apresenta a informação e no pormenor com que conta o tempo, a
gio para cada uma das disposições temporais que possamos ter.
uma concepção diferente do tempo. Em férias gosto de usar um
Nem que seja para ajudar a passar o tempo...
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Um relógio que conta o seu tempo –e não só o