Relação peso-comprimento e fator de condição de
Oligosarcus hepsetus (Cuvier, 1829) no Parque Estadual
da Serra do Mar - Núcleo Santa Virgínia, Mata Atlântica,
estado de São Paulo, Brasil
Gomiero, L.M. et al.
Biota Neotrop. 2010, 10(1): 101-105.
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Received/ Recebido em 30/05/09 Revised/ Versão reformulada recebida em 08/12/09 - Accepted/ Publicado em 12/02/10
ISSN 1676-0603 (on-line)
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Biota Neotrop., vol. 10, no. 1
Relação peso-comprimento e fator de condição de Oligosarcus hepsetus
(Cuvier, 1829) no Parque Estadual da Serra do Mar Núcleo Santa Virgínia, Mata Atlântica, estado de São Paulo, Brasil
Leandro Muller Gomiero1,2, Gilberto Aparecido Villares Junior1 & Francisco Manoel de Souza Braga1
1
Departamento de Zoologia, Instituto de Biociências, Universidade Estadual Paulista – UNESP,
Av. 24-A, n. 1515, CP. 199, CEP 13506-900, Rio Claro, SP, Brasil
2
Autor para correspondência: Leandro Muller Gomiero, e-mail: [email protected]
GOMIERO, L.M., VILLARES JUNIOR, G.A. BRAGA, F.M.S. Length-weight relationship and condition
factor for Oligosarcus hepsetus (Cuvier, 1829) in Serra do Mar State Park - Santa Virgínia Unit,
Atlantic Forest, São Paulo, Brazil. Biota Neotrop. 10(1): http://www.biotaneotropica.org.br/v10n1/en/
abstract?article+bn01610012010.
Abstract: In this work the length-weight relationship and the condition factor of Oligosarcus hepsetus were
analyzed in the Grande river within the Santa Virgínia Unit of the Serra do Mar State Park, State of São Paulo.
The length-weight relationship was esteemed for immature, females and male, through the expression W = aLb.
The parameters a and b were dear after logarithmic transformation of the data of weight and length and subsequent
adjustment of a straight line to the points for the method of the minimum square. For females and males were
obtained the equations of the length-weight relationships by period of the year (autumn, winter, spring and
summer), using the total weight and the weight without the gonads. The factor of condition of the immature was
higher than for males and females, possibly, due to the energy expense with the development of the oocytes and
in smaller degree of the spermatozoids. This species presented larger values of condition factor in the autumn
due to the fat accumulation and in the other stations these values decreased due to the long reproductive period.
The environment conditions of the Atlantic forest seem to be primordial for the development of the reproductive
strategies presented by Oligosarcus hepsetus.
Keywords: length-weight relationship, condition factor, Oligosarcus hepsetus, Atlantic Forest.
GOMIERO, L.M., VILLARES JUNIOR, G.A. BRAGA, F.M.S. Relação peso-comprimento e fator de condição
de Oligosarcus hepsetus (Cuvier, 1829) no Parque Estadual da Serra do Mar - Núcleo Santa Virgínia, Mata
Atlântica, estado de São Paulo, Brasil. Biota Neotrop. 10(1): http://www.biotaneotropica.org.br/v10n1/pt/
abstract?article+bn01610012010.
Resumo: Foram analisados a relação peso-comprimento e o fator de condição de Oligosarcus hepsetus no Rio
Grande do Parque Estadual da Serra do Mar - Núcleo Santa Virgínia, São Paulo. A relação peso-comprimento
foi estimada para imaturos, fêmeas e machos, através da expressão P = aCb. Os parâmetros a e b foram estimados
após transformação logarítmica dos dados de peso e comprimento e subsequente ajuste de uma linha reta aos
pontos pelo método dos mínimos quadrados. Para fêmeas e machos foram obtidas as equações da relação pesocomprimento por período do ano (outono, inverno, primavera e verão), utilizando o peso total e o peso sem as
gônadas. O fator de condição dos imaturos foi mais alto do que para machos e fêmeas, possivelmente, devido
ao gasto energético com o desenvolvimento dos ovócitos e em menor grau dos espermatozóides. Esta espécie
apresentou maiores valores de fator de condição no outono devido ao acúmulo de gordura e nas demais estações
estes valores diminuíram devido ao longo período reprodutivo. As condições ambientais da Mata Atlântica parecem
ser primordiais para o desenvolvimento das estratégias reprodutivas apresentadas por Oligosarcus hepsetus.
Palavras-chave: relação peso-comprimento, fator de condição, Oligosarcus hepsetus, Mata Atlântica.
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Biota Neotrop., vol. 10, no. 1
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Gomiero, L.M. et al.
Introdução
Material e Métodos
A Mata Atlântica vem sofrendo continuamente a ação antrópica
sob a forma de devastação florestal, exploração dos recursos naturais,
poluição, ocupação humana desordenada, fragmentação, etc. O seu
status de conservação é definido como crítico (Araújo-Lima et al.
2004), devido aos riscos para toda fauna e flora desse importante
bioma do Brasil.
A ictiofauna é igualmente afetada das mais variadas maneiras,
como, por exemplo, pela degradação da qualidade da água ou do hábitat ou pela combinação dos dois fatores, tendo como consequências
elevadas cargas de material em suspensão e o resultante assoreamento
(Araújo 1998), ocorrendo tanto em córregos de montanhas como em
Rios de planície.
O Rio Paraíba do Sul, apesar de sua enorme importância como
principal bacia hidrográfica entre São Paulo e o Rio de Janeiro, tem
recebido pouca atenção do ponto de vista de estudos dos ecossistemas. Sua bacia hidrográfica apresenta área de cerca de 57.000 km2,
localizando-se em fundo de vale, entre as serras do Mar e da
­Mantiqueira (Araújo 1998). Em áreas mais elevadas, naturalmente
protegidas pela altitude, as regiões de cabeceiras abrigam diversidade
baixa e alto endemismo de espécies de peixes. Devido a isto, estas
regiões são biologicamente importantes e estudos nessas áreas devem
ser prioritários (Castro & Menezes 2001, Menezes 2003, BeneditoCecilio et al. 2004).
Os peixes com hábitos alimentares carnívoros aumentam a estabilidade do ecossistema aquático, visto que atuam no ajuste da abundância de espécies de presas (Nikolskii 1963, Popova 1978) e suas
presenças denotam uma relativa estabilidade do ambiente. O peixe
denominado cachorro-magro, Oligosarcus hepsetus (Cuvier 1829),
é um carnívoro de pequeno a médio porte que habita principalmente
lugares rasos com vegetação densa em tributários ou em grandes
rios (Araújo et al. 2005). Esta espécie está distribuída em lagoas,
reservatórios e rios na região costeira do Sudeste-Sul do Brasil entre
Santa Catarina e o Rio de Janeiro (Menezes 1987).
A relação peso-comprimento é uma maneira fácil e rápida de
descrever o crescimento, sem levar em conta a idade do peixe. Tem
sido usada para converter comprimento em peso, conhecendo-se o
comprimento, ou vice e versa (Nomura 1962), como sendo uma das
etapas para o estudo do fator de condição (Braga 1986, 1993, 1997),
usada como um parâmetro no estudo da biomassa para estimativas de
populações naturais ou em cativeiro (Ricker 1975, Santos 1978), ou na
estimativa do stand crop em estudos bio-ecológicos (Lotrich 1973).
Vazzoler (1996) comenta que o fator de condição é um importante
indicador do grau de higidez de um indivíduo e seu valor reflete as
condições nutricionais recentes e/ou gastos das reservas em atividades cíclicas, sendo possível relacioná-lo às condições ambientais
e aos aspectos comportamentais das espécies. Este parâmetro é
uma ferramenta importante e eficiente para evidenciar mudanças
na condição dos peixes ao longo do ano, podendo ser usado para
indicar o período reprodutivo, períodos de alterações alimentares e
de acúmulo de gordura (Gomiero & Braga 2003, 2005, 2006), assim
como mudanças sazonais nas condições do ambiente (Braga et al.
1985). Porém, na floresta ombrófila densa, típica da área de estudo
as condições climáticas são pouco variáveis e praticamente não há
estação seca (Tonhasca Jr. 2005), tornando o ambiente estável quanto
a esses aspectos.
O objetivo do presente trabalho é caracterizar a relação pesocomprimento e o fator de condição de Oligosarcus hepsetus, peixe
carnívoro típico dos rios da Mata Atlântica do estado de São Paulo,
relacionando-os com a sazonalidade na reprodução e na alimentação
ao longo do ano, tanto quanto ao sexo como também em relação aos
indivíduos jovens e adultos.
O local de coleta foi o Rio Grande (bacia do Rio Paraíba do Sul)
no Núcleo Santa Virgínia-Parque Estadual da Serra do Mar. Esta área
protegida cobre 16.000 ha e se insere nos municípios de São Luiz do
Paraitinga, Natividade da Serra, Cunha e Ubatuba, localizada entre
as coordenadas 23° 24’-23° 17’ S e 45° 03’ O.
Foram efetuadas 12 amostragens mensais de janeiro a dezembro
de 2004. Em cada local foram utilizadas redes com malhas de 1,5;
2,0; 2,5; 3,0; 3,5 e 4 cm, medidas entre nós adjacentes. Cada conjunto
de malhagem específica possuía 10 m de comprimento e 1,5 m de
altura, totalizando 60 m. Além destas redes, foram utilizados covos
e peneiras para a captura dos menores exemplares. O esforço de
pesca foi padronizado mantendo-se constante o tempo e o número
dos apetrechos de pesca utilizados no local de amostragem em cada
período de coleta.
Para cada exemplar foram tomados o peso total (g), o comprimento total (cm) e o sexo. Os imaturos foram determinados macroscopicamente pela visualização das gônadas, considerando coloração,
transparência e vascularização superficial. Para a determinação de
machos e de fêmeas procedeu-se à visualização das gônadas quanto a
coloração, forma e presença do líquido espermático ou dos ovócitos,
respectivamente.
As frequências numéricas nas classes de comprimento total de
machos e de fêmeas foram analisadas com o teste KolmogorovSmirnov (Vanzolini 1993), α = 0,05, e as proporções mensais e
sazonais entre machos e fêmeas de Oligosarcus hepsetus foram
analisadas com Tabelas de contingência do tipo i x 2 (sendo i > 2)
(Vanzolini 1993), α = 0,05.
O fator de condição foi estimado utilizando inicialmente a relação
peso-comprimento (P = aCb), após transformação logarítmica dos
dados, obtendo-se lny = lnA + Blnx, que pelo método dos mínimos
quadrados obtêm-se A e B de onde obtêm-se a = eA, b = B (Santos
1978, Braga 1986). O fator de condição (K = P/Cb) foi estimado
para fêmeas, machos e imaturos (Le-Cren 1951, Weatherley 1972),
fazendo-se para cada grupo a relação peso-comprimento e assim
utilizando-se a constante b estimada, respectivamente. O fator de
condição obtido dessa maneira foi relacionado com os comprimentos
individuais respectivos de cada grupo. Para verificar a correspondência do fator de condição para os grupos de fêmeas, machos e imaturos,
foi aplicada a prova não-paramétrica de Kruskal-Wallis seguido de
um teste “a posteriori” de Tukey (Zar 1996).
O fator de condição também foi analisado sazonalmente, para
fêmeas e para machos, considerando para o seu cálculo o peso total
do peixe (K1) e o peso total menos o peso da gônada (K2) (Braga &
Gennari Filho 1990), para cada valor de K sazonal foi estimado o
intervalo de confiança (α = 0,05).
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Resultados
Nas doze coletas de 2004 foram capturados e analisados
117 exemplares de Oligosarcus hepsetus, sendo 21 exemplares
imaturos, 44 fêmeas e 52 machos. Os exemplares de Oligosarcus
hepsetus alcançaram comprimentos totais de 4,2 a 22 cm. O peso
total capturado foi de 3.416,98 g, sendo que as fêmeas contribuíram
com 1.830,22 g. As fêmeas também apresentaram o maior peso
médio (41,59 ± 21,18 g) em relação aos machos (27,78 ± 13,2 g),
assim como, tendo o maior comprimento médio (16,5 ± 2,8 cm) do
que os machos (14,44 ± 2,1 cm). Os imaturos tiveram peso médio de
6,75 ± 6,25 g e comprimento médio de 8,34 ± 3 cm (Tabela 1).
Quando todo período das coletas foi analisado, houve diferença
(χ2 = 17,06; p < 0,05) entre as distribuições de comprimentos de
machos e de fêmeas de Oligosarcus hepsetus capturados no Rio
Grande. Porém, nas proporções mensais de machos e de fêmeas não
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Relação peso-comprimento e fator de condição de Oligosarcus hepsetus.
Tabela 1. Dados biológicos referentes ao peso total capturado (PT), peso médio (PM) e comprimento médio (CM) para Oligosarcus hepsetus de machos,
fêmeas, imaturos e total.
Table 1. Biological data regarding the captured total weight (WT), mean weigh (WM) and mean length (LM) of males, females, immature and total for
­Oligosarcus hepsetus.
PT (g)
PM ± DP (g)
CM ± DP (cm)
N
Total
3.416,98
29,2 ± 20,2
14,12 ± 3,8
117
Machos
1.444,91
27,78 ± 13,2
14,44 ± 2,1
52
Fêmeas
1.830,22
41,59 ± 21,8
16,5 ± 2,8
44
Imaturos
141,85
6,75 ± 6,25
8,34 ± 3
21
Tabela 2. Representação algébrica das retas e curvas de função potência da relação peso-comprimento para os grupos de Oligosarcus hepsetus. N = número
de indivíduos analisados, r = coeficiente de correlação linear de Pearson com sua significância.
Table 2. Algebric representation of the straight line and curves of function potency of the length-weight relationship for the groups of Oligosarcus hepsetus.
N = number of analyzed individuals, r = Pearson’s correlation coefficient with significance.
Grupo
Total
Fêmeas
Machos
Imaturos
N
117
44
52
21
Reta
lny = 1,0084 + 3,0042 lnx
lny = 1,0080 + 3,0197 lnx
lny = 1,0079 + 3,0308 lnx
lny = 1,0090 + 2,9702 lnx
houve diferenças (χ2 = 8,42; gl = 11; p > 0,05), como também nas
sazonais (χ2 = 0,76; gl = 3; p > 0,05).
A Tabela 2 mostra as expressões das linhas retas estimadas após
transformação logarítmicas dos dados de peso e comprimento e das
curvas de função potência obtidas a partir delas.
A Figura 1 mostra a correlação entre o fator de condição (K1) com
o comprimento total de Oligosarcus hepsetus para indivíduos fêmeas,
machos e imaturos, onde pode ser visto que o fator de condição não
varia com o comprimento do peixe. Nota-se também que o fator de
condição médio (linha horizontal na Figura 1) corresponde aos valores
de a na expressão y = axb, que também é o fator de condição.
Todavia, foi constatada a variação significativa do fator de
condição entre os grupos de fêmeas, machos e imaturos pela prova
de Kruskal-Wallis (H = 29,03; p < 0,001). Pelo teste “a posteriori”
os imaturos apresentaram um valor médio do fator de condição
(K = 0,0089) superior (p < 0,001) ao de fêmeas (K = 0,0079) e de
machos (K = 0,0078), que foram semelhantes (p > 0,05).
A Figura 2 mostra a variação sazonal do fator de condição para
fêmeas e machos, considerando o fator de condição calculado com o
peso das gônadas (K1) e sem o peso da gônada (K2) e os respectivos
intervalos de confiança. Observa-se que no outono, tanto as fêmeas
como os machos apresentaram valores mais elevados, indicando
uma boa condição neste período. Para as fêmeas, no inverno e na
primavera, há uma maior diferença entre os fatores de condição K1
e K2 em decorrência do maior desenvolvimento dos ovários, sendo
que esta diferença torna-se menor no período em que os ovários estão
em repouso, no outono. Para os machos, a diferença entre K1 e K2 é
menos conspícua nas estações do ano, pela menor contribuição do
peso dos testículos no peso total do peixe. No outono, tanto para as
fêmeas como para os machos, o fator de condição encontra-se elevado pelo fato de estarem em repouso, fora do período mais intenso
de reprodução.
Discussão
O fator de condição é um índice que indica o estado de bem
estar do peixe e que não deve variar com o comprimento do peixe,
sendo correlacionado com a constante da relação peso-comprimento,
expressa por P = aCb (Braga 1986). Os valores individuais do fator
de condição alométrico não variaram com o comprimento de peixes
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Curva
y = 0,0084 x3,0042
y = 0,0079 x3,0197
y = 0,0078 x3,0308
y = 0,0089 x2,9702
r
0,996 (p < 0,01)
0,998 (p < 0,01)
0,978 (p < 0,01)
0,998 (p < 0,01)
a
b
c
Figura 1. Relação do fator de condição com o comprimento total de fêmeas
(a), machos (b) e imaturos (c) e a linha de tendência.
Figure 1. Relationship of the condition factor with the total length of females
(a), males (b) and immature (c) and the tendency line.
adultos (fêmeas e machos) e nem com o comprimento de peixes
imaturos. Porém, o fator de condição médio foi similar à constante a
da relação peso-comprimento de fêmeas e machos (0,0079 e 0,0078,
respectivamente) e foi superior para os imaturos (0,0089).
O fator de condição superior para os imaturos, sugere que neste
caso a condição dos peixes, que ainda não entraram no ciclo reprodutivo e que estão em fase de crescimento rápido, direcionando os produhttp://www.biotaneotropica.org.br
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104
Gomiero, L.M. et al.
a
b
Figura 2. Variações das médias de K1 e K2 com seus respectivos intervalos
de confiança para fêmeas e machos de Oligosarcus hepsetus em cada estação
do ano.
Figure 2. Variations of the means of K1 and K2 with their respective confidence intervals for females and males of Oligosarcus hepsetus in each
season.
tos do alimento ingerido para a construção do corpo, apresentam um
valor superior para o fator de condição. Em classes de comprimentos
menores, antes de atingir a primeira maturação gonadal, o peixe cresce
mais linearmente do que em volume, após atingir a primeira maturação gonadal o ganho em peso torna-se proporcionalmente maior,
enquanto que o crescimento linear diminui e isso é representado por
uma curva de função potência (Weatherley & Gill 1987).
Os indivíduos jovens que ainda não alcançaram o comprimento
de primeira maturação gonadal frequentemente apresentam altos
valores de fator de condição (Barbieri et al. 1985, Agostinho et al.
1990, Lizama & Ambrósio 2002, Villares Jr. et al. 2007). O fator de
condição para Brycon opalinus (Cuvier 1819), no mesmo ambiente
de Oligosarcus hepsetus, foi menor para as fêmeas que apresentaram
o comprimento de primeira maturação gonadal (L50) e foi maior para
os indivíduos imaturos (Gomiero & Braga 2006). O fator de condição
pode ser influenciado pelo estádio de maturação das gônadas e pelo
grau de repleção dos estômagos ao longo do tempo Barbieri et al.
(1982, 1985).
Nos ecossistemas aquáticos a sazonalidade influencia os períodos reprodutivos e a frequência alimentar das espécies de peixes
(­Vazzoler 1996). Em ambientes com pouca variação sazonal como
a Mata Atlântica, estes eventos podem se estender por mais tempo,
sendo que apenas parte da população de uma espécie reproduz ao
mesmo tempo e a alimentação e acúmulo de gordura podem acontecer
na maior parte do ano. Sobre isto, Gomiero et al. (2008) verificaram
que as distribuições das frequências dos estádios de maturidade
gonadal foram sazonalmente diferentes para machos e fêmeas de
Oligosarcus hepsetus com longo período reprodutivo de 8 meses.
Os valores de comprimento médio de primeira maturação gonadal
(L50) para machos e fêmeas foi de 11,2 e 11,6 cm, respectivamente,
e o comprimento em que todos os indivíduos já são adultos (L100)
foi de 16 cm para ambos os sexos. Já os imaturos foram frequentes
em todas as estações do ano, com maior número de indivíduos no
fim do outono e no inverno. Apresentando assim, longo período
reprodutivo, comprimento de primeira maturação gonadal precoce e
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desova parcelada, sendo considerado típico estrategista oportunista,
segundo Winemiller (1989).
As variações sazonais da diferença entre K1 e K2 são influenciadas pela reprodução das espécies (Vazzoler 1996, Gomiero &
Braga 2006). Como para Brycon opalinus (Gomiero & Braga 2006)
e Rhamdia quelen (Quoy & Gaimard 1824) (Gomiero et al. 2007) no
mesmo ambiente, O. hepsetus apresentou longo período reprodutivo
evidenciado pelas diferenças do K1 e K2 no inverno, na primavera
e no verão.
Os maiores valores do fator de condição de O. hepsetus no outono
possivelmente ocorreu devido a maior intensidade alimentar no final
do inverno e na primavera, com subsequente acúmulo de gordura no
final do verão e principalmente no outono (Botelho et al. 2007). Por
outro lado, os valores inferiores do fator de condição no inverno, na
primavera e no verão, coincidem com o período reprodutivo e respectivo aumento do gasto energético para a produção dos gametas.
A plasticidade fisiológica e comportamental dos peixes ajusta-se
às inúmeras diferenças ambientais encontradas nas áreas de ocorrência dessas espécies. A sobrevivência das populações em áreas
diferentes depende desta adaptabilidade ambiental influenciando os
eventos reprodutivos e alimentares ao longo do ciclo de vida.
As espécies de peixes analisadas nos rios do Parque Estadual da
Serra do Mar - Núcleo Santa Virgínia convergem para estratégias
muito próximas quanto ao longo período reprodutivo, desova parcelada, baixa fecundidade, comprimento de primeira maturação gonadal
precoce e longo período alimentar. A baixa variação ambiental ao
longo dos períodos, a disponibilidade constante de recursos e as condições encontradas na Mata Atlântica parecem ser primordiais para o
desenvolvimento das estratégias apresentadas pela ictiofauna.
Conclusão
As fêmeas e os machos tiveram fator de condição mais alto no
outono (época em que ocorreu o maior acúmulo de gordura). O
fator de condição dos imaturos foi mais alto do que para machos e
fêmeas, possivelmente devido ao gasto energético com o desenvolvimento dos ovócitos e em menor grau dos espermatozóides. A área
de estudo encontra-se na Mata Atlântica onde existe pouca variação
sazonal nas condições ambientais e disponibilidade constante de
recursos ao longo do ano, fazendo com que Oligosarcus hepsetus
apresentasse longo período reprodutivo evidenciado pelo fator de
condição K1 e K2 de fêmeas e machos no inverno, na primavera e
no verão. As estratégias apresentadas pela ictiofauna relacionam-se
com as condições ambientais prevalecentes ao longo de todo o ano
para a alimentação e reprodução, condições essas necessárias para a
manutenção e abundância das espécies.
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Recebido em 30/05/09
Versão reformulada recebida em 08/12/09
Publicado em 12/02/10
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