DOUTRINA - A INCIDÊNCIA DOS JUROS MORATÓRIOS
NA RESPONSABILIDADADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
POR ATO ILÍCITO
Rénan Kfuri Lopes
“Da efetividade do prejuízo nasce o dever de
indenizar”.
É ainda titubeante a posição dos julgadores quanto
à incidência dos juros moratórios nas demandas versando sobre
responsabilidade civil extracontratual por ato ilícito, notadamente
nos casos de acidente de trânsito, dano material e dano moral.
A linha tradicional adota a rígida interpretação do
art. 960 do Código Civil cumulada com o regramento do art. 219,
caput, do CPC, que entende cabível a aplicação dos juros
moratórios somente a partir da válida citação do demandado.
Noutra vertente, os mais modernos optam ao vero
sentido do art. 962 do Código Civil, apregoando a superveniência
dos juros moratórios a partir da data do fato ilícito (delituoso).
O pomo da discórdia entre as duas facções reside na
expressão “provenientes de delito” contida no art. 962 do Código
Civil. Os primeiros sustentam que o “delito” descrito no
dispositivo limita a sua aplicação aos fatos previstos na lei penal,
enquanto os segundos entendem que alcança todas as obrigações
derivadas dos atos ilícitos em geral.
Com o fito de por termo a controvérsia doutrinária
e jurisprudencial o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula
54, cuja ementa por si só e esclarecedora, verbis:
“Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso,
em caso de responsabilidade extracontratual.”
O STJ sintetizou através da Súmula 54 que a
expressão “delito” do art. 962 do Código Civil, abrange todo ato
ilícito de culpa extracontratual, devendo contar-se os juros de
mora desde a data do evento.
Mister destacar que a Súmula 54 não atinge as
hipóteses de responsabilidade civil contratual, mesmo naquelas
ocasiões abrangidas pela amplitude do artigo 159 do Código Civil.
Preleciona com segurança ARNALDO RIZZARDO:
“Deduz que as normas do art. 962 e 1.544 se
completam e são reguladoras do momento a partir do qual se
contam os juros no caso de ato ilícito, seja culposo, seja doloso,
pois as palavras “delito” e “crime” inscritas, respectivamente, nos
mencionados arts. 962 e1.544 têm sentido lato, abrangente de um
ilícito e doutro(...). O princípio vem dos romanos, tanto que
COELHO DA ROCHA em suas Instituições (8º edição, I, 1917),
ensinava baseado na doutrina jurídica de Roma o seguinte: O
ladrão é reputado em mora desde o furto”.
Arremata o jurista:
“Na verdade, assim é de ser entendido, porque,
devendo o causador do ato ilícito reparar de modo completo as
perdas e danos que decorrem do seu comportamento injurídico, a
reparação deixa de ser integral se os juros não forem contados
a partir do fato que constituiu a fonte da obrigação de
indenizar, pois o desfalque do patrimônio daquele que sofreu o
ato ilícito não é apenas da quantia representativa do prejuízo, mas,
também, de tudo quanto ela deixou de render para o credor,
inclusive o lucro cessante”. (A Reparação dos Acidentes de
Trânsito, 1ª ed., p. 188).
A Súmula 54 guarda perfeita sintonia com a Súmula
43 do mesmo STJ no intuito de buscar-se a mais ampla
indenização pelos atos ilícitos em geral:
Eis o texto da Súmula 43:
“Incide correção monetária sobre dívida por ato
ilícito a partir da data do efetivo prejuízo.”
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Destarte, o direito pátrio mira-se no princípio de
que a reparação de danos decorrentes da prática de atos ilícitos
deve ser completa, recaindo os juros moratórios a partir do
evento danoso.
Sub censura.
Rénan Kfuri Lopes, adv.
FEVEREIRO DE 1996
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