ANALISANDO OS PERSONAGENS E O CENÁRIO EM NARRATIVAS
PRODUZIDAS POR ALUNOS DA 7ª SÉRIE
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Jéssica Reinert dos Santos (FURB)
Este artigo faz parte do PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência),
subprojeto de Letras da Universidade Regional de Blumenau, e tem como objetivo analisar a
construção de personagens e cenários que são apresentados nas narrativas produzidas pelos
alunos da 7ª série de uma escola situada no município de Brusque, no estado de Santa
Catarina. Para que a coleta de dados fosse efetuada, os alunos receberam um comando com
cinco cenas sequenciais mudas e, a partir dessa proposta, deveriam criar uma narrativa, dando
sucessão aos fatos. Após a recolha dos dados, as narrativas foram analisadas e constatou-se
que os alunos não exploraram as várias possibilidades de criação de personagem. Na maioria
das narrativas, não havia descrição de características físicas ou psicológicas dos personagens
e, em alguns casos, não possuíam nome. Quanto à criação de cenários, muitas vezes esse
recurso não foi utilizado na narrativa, tornando difícil a compreensão do ambiente no qual a
narrativa se passava. Pode-se concluir que há uma lacuna no processo de aprendizagem dos
elementos essenciais que uma narrativa deve apresentar. Os alunos ainda não compreenderam
o papel desses elementos para que a narrativa possa ter sentido, sendo necessário detalhar
características dos personagens e cenários para que o leitor possa entender aquilo que se quer
narrar e descrever. Com base em tudo o que foi relatado, o projeto terá continuidade a partir
da introdução do gênero Diário, onde será trabalhado com conectores, anafóricos e entrevistas
que se transformarão em conto, que farão parte de um livro que será organizado e ilustrado
pela turma.
Palavras-chave: Personagem, Cenário, Análise, Narrativas.
INTRODUÇÃO
O do subprojeto de Letras do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência
(PIBID) tem por objetivo preparar o graduando para analisar e diagnosticar dificuldades que
são apresentadas pelos alunos na produção textual.
As escolas participantes foram escolhidas através das baixas notas do último IDEB
(Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), sendo, neste caso, a Escola de Ensino
Fundamental Municipal Lions Clube Companheiro Oscar Maluche, que obteve a nota 3,4. O
projeto está sendo desenvolvidos com as turmas de 6ª, 7ª e 8ª séries e 6º ano do Ensino
Fundamental, totalizando 173 alunos participantes.
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Acadêmica do curso de Letras da Furb. Endereço eletrônico: [email protected]
Para um melhor preparo dos graduandos participantes do projeto, foram realizados
encontros mensais com os coordenadores e professores envolvidos para discussão de leituras,
filmes e trabalhos relacionados à teoria de Stein e Glenn, sendo uma das mais utilizadas pelo
grupo.
A coleta dos dados foi realizada através de uma proposta de produção de narrativa,
onde fora entregue aos alunos uma sequência de cinco imagens, as quais os estudantes
poderiam criar suas narrativas. Após a recolha dos textos, estes foram digitados de maneira
fiel à escrita dos alunos, conservando erros de ortografia para possíveis análises.
Foram coletadas vinte e cinco narrativas desenvolvidas pelos alunos da 7ª série do
período matutino, porém, neste artigo, serão analisadas apenas cinco produções, levando em
consideração a construção das personagens e cenários.
1 – A PERSONAGEM
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A personagem “é um ser fictício que é responsável pelo desempenho do enredo; em
outras palavras, é quem faz a ação” (GANCHO, 1991, p. 14). Elas podem ser um animal,
pessoa, irreal e inanimado ou ainda um objeto. Esses seres são criados pelo narrador e
pertencem a uma realidade ficcional.Segundo Junior (1995) a personagem é um ser de papel,
construído através de palavras e recebe um sistema de predicação, podendo ocorrer de
maneira direta ou indireta, de acordo com seu modo de pensar e agir.
Dependendo do papel que desempenha na narrativa, a personagem pode ser
classificada como protagonista, antagonista e secundários. A personagem protagonista é
aquela cujas ações ocorrem em seu redor. Ela pode ser herói, tendo “características superiores
às de seu grupo” (GANCHO, 1991, p. 14) ou anti-herói, possuindo “características iguais ou
inferiores às de seu grupo, mas que por algum motivo está na posição de herói (...)"
(GANCHO, 1991, p. 14).
Quando a personagem é antagonista, “além de colocar obstáculos à concretização dos
desejos e objetivos da protagonista, esta personagem ainda disputa o mesmo objeto
pretendido pela personagem protagonista” (JUNIOR, 1995, p. 45). Se a antagonista possui
muitos atributos negativos, pode ser atribuído o nome de vilã da narrativa. Já a personagem
secundária desempenha um papel pouco importante na narrativa, “podem desempenhar papel
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É possível utilizar a palavra personagem precedida tanto do artigo “o” quanto “a”.
de ajudantes do protagonista ou do antagonista, de confidentes, enfim, de figurantes.”
(GANCHO, 1991, p. 16).
As personagens são classificadas dependendo da maneira como suas características e
traços vão sendo apresentadas durante a narrativa e se dividem em planas ou redondas.
Segundo Gancho (1991), as personagens planas são aquelas cujas características são
identificadas facilmente pelo leitor, contendo um número pequeno de características. Esse tipo
de personagem plana é dividido ainda em dois segmentos: as tipos, sendo aquelas que contêm
apenas “seus traços mais marcantes, tanto os físicos como os psicológicos. (...) Somente os
traços mais significativos interessam” (RAMAZINI, 1991, p. 98), contendo predicativos
típicos e invariáveis; e as caricaturas, sendo “o personagem reconhecido por características
fixas e ridículas. Geralmente é um personagem presente em histórias de humor.” (GANCHO,
1991, p. 17).
O narrador também pode ser um personagem da narrativa, o que irá determinar o foco
narrativo do texto, ou seja, “o ângulo de visão através do qual o autor vai contar a história”
(CAMPEDELLI, 2002. p. 357), podendo ser como personagem, protagonista, testemunha,
onisciente, intruso e ainda observador.
O narrador personagem narra à história em 1ª pessoa e “pode interagir com os outros
personagens, mas nada sabe sobre o que se passa com eles, a não ser aquilo que é capaz de
observar diretamente” (SARMENTO, 2010. p. 383). Já o narrador protagonista, é quando este
é o personagem principal. O narrador se torna testemunha quando “narra a história do
personagem principal em 1ª pessoa, também conforme aquilo que vê” (SARMENTO, 2010. p.
383).
Quando o narrador “omite opinião, pode até conversar com o leitor, mostrando que
sabe o que está acontecendo, o que vai acontecer e mesmo o que os personagens pensam”
(CAMPEDELLI, 2002. p. 358), ele se torna o narrador onisciente, pois tem uma visão mais
ampla do que está sendo narrado. Além do narrador onisciente, há o narrador intruso, que
“além de tudo narrar (e conhecer) em 3ª pessoa, fala (e tece comentários sobre personagens)
com o leitor.” (SARMENTO, 2010. p. 383).
Por último, mas não menos importante, existe o narrador observador, cujo texto é
narrado também em 3ª pessoa, porém ele apenas narra o que vê e descreve as ações feitas
pelos personagens, não sabendo o que se passa nos pensamentos dos outros envolvidos na
trama.
2 - O ESPAÇO E O AMBIENTE
O espaço é o local onde ocorrem os conflitos vividos pelos personagens, suas derrotas,
vitórias e medos, tendo como principais funções “situar as ações dos personagens e
estabelecer com eles uma interação, quer influenciando suas atitudes, pensamentos ou
emoções, quer sofrendo eventuais transformações provocadas pelos personagens.”
(GANCHO, 1991, p. 22).
Da mesma maneira que ocorre com os personagens, o espaço pode ser definido
diretamente na narrativa, ou suas características podem vir no decorrer do texto. Segundo
Gancho (1991), o espaço designa apenas o lugar físico onde ocorre a história.
O ambiente “pode refletir a atmosfera psicológica vivida pela personagem” (JUNIOR,
1995, p. 48). Segundo Gancho (1991) o ambiente tem como função: situar o personagem no
tempo, espaço e grupo social; projetar os conflitos enfrentados pela personagem; entrar em
conflito com o personagem e constituir pistas para o desfecho da história. A autora ainda cita
que para caracterizar o ambiente, alguns fatores precisam ser levados em consideração, como
a época em que se passa a narrativa, características físicas, aspectos socioeconômicos,
psicológicos, morais e religiosos.
3 – ANALISANDO AS NARRATIVAS3
Observando as narrativas produzidas pelos alunos, nota-se que na maioria das histórias
foi designado um nome para a personagem protagonista, como João, Pedrinho, José, Júnior ou
até mesmo menino. Em duas das cinco narrativas analisadas, o personagem é plano e tipo,
aparecendo suas características logo no início da narrativa e podem ser facilmente
identificadas, como nos segmentos a seguir:
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As narrativas encontram-se em sua maneira original, não sendo corrigidos possíveis erros de ortografia ou
demais.
• João era um garoto que gostava muito da natureza, sempre que passava por árvores e
paisagens bonitas ficava sempre admirando (...)
• Era uma vez um menino que se importava bastante com o meio ambiente, o nome dele
era Pedrinho.(...)
Nas demais narrativas, os alunos não deram características para as personagens, passando
diretamente para a situação-problema que a figura mostrava:
•
Junior sempre estava cansado logo após brincar, mas ele nunca tinha lugar para
descansar. Então um dia Junior resolveu plantar uma árvore em seu jardim.
•
Num belo dia, um menino chamado José plantou duas árvores, e ele foi regando
cuidando das duas árvores, e foram-se passando os anos e cada vez elas iam
crescendo mais.
•
Era uma vez um menino que queria ter uma rede para dormir mas ele não tinha
como montar dois ganchos e ai ele descidio plantar duas árvores
As narrativas foram escritas com o narrador em 3ª pessoa, apenas duas histórias
utilizaram personagens secundários e nenhuma apresentou uma personagem como vilã.
Nas histórias analisadas, não há descrição do espaço em que a narrativa acontece e não
aparecem relatos de ambientes.
• João e a Árvore
João era um garoto que gostava muito da natureza, sempre que passava por árvores e
paisagens bonitas ficava sempre admirando, então um dia ele chegou em casa e pediu para
seus pais que comprassem uma árvore para ele plantar, os pais disseram que ele só poderia
ter a arvore se ele cuidasse dela direito, regasse etc...
Então o garoto promoteu cuidar, e os pais deram, ele ficou feliz e foi plantar, todo dia ele
cuidava.
Passou alguns anos e a árvore, cresceu, então o garoto não sai de lá até dormir ele dormia
lá. (B. E. P. – 13 anos)
Narrador em 3ª pessoa: Então o garoto promoteu cuidar, e os pais deram, ele ficou feliz e foi
plantar, todo dia ele cuidava.
Personagem secundário: os pais
Vilã: Não existente
Espaço: árvores e paisagens bonitas / Não apresenta descrição do local onde foram plantadas
as árvores.
• Descanso natural
Junior sempre estava cansado logo após brincar, mas ele nunca tinha lugar para descansar.
Então um dia Junior resolveu plantar uma árvore em seu jardim. Outro dia, ele foi e plantou
mais uma árvore.
Com o passar do tempo, Junior sempre regava suas árvores, e então, um dia elas cresceram e
ficaram bem grandes e bonitas. Junior então, como não tinha um lugar legal para descansar,
amarrou uma rede entre as árvores, e é lá que ele sempre descansa, até hoje. (. L. P. – 13
anos)
Narrador em 3ª pessoa: Com o passar do tempo, Junior sempre regava suas árvores, e então,
um dia elas cresceram e ficaram bem grandes e bonitas.
Personagem secundário: Não existente
Vilã: Não existente
Espaço: jardim
• As árvores
Num belo dia, um menino chamado José plantou duas árvores, e ele foi regando cuidando
das duas árvores, e foram-se passando os anos e cada vez elas iam crescendo mais.
Quando elas estavam grandes ele descidiu colocar uma rede, ele colocou a rede e foi
descançar. (A. F. – 13 anos)
Narrador em 3ª pessoa: Num belo dia, um menino chamado José plantou duas árvores, e ele
foi regando cuidando das duas árvores, e foram-se passando os anos e cada vez elas iam
crescendo mais.
Personagem secundário: Não existente
Vilã: Não existente
Espaço: Não há relatos do local onde as árvores foram plantadas
• O dia mas feliz
Era uma vez um menino que se importava bastante com o meio ambiente, o nome dele
era Pedrinho. Um dia Pedrinho foi ao parque e levou duas mudas de uma árvore muito
bonita e plantou elas, cada dia que passava Pedrinho ia ver como ela estava, ele regava e
cuidava dessa arvore que nem um animal de estimação.
Os dias se passaram e a árvore crecia mais e mais, então ele decidio em levar a rede
que seu vô tinha para tirar uma soneca bem nas árvores que ele plantou.
Esse foi o dia mais feliz da vida de Pedinho.
Fim (A. C. S. – 13 anos)
Narrador em 3ª pessoa: Os dias se passaram e a árvore crecia mais e mais, então ele decidio
em levar a rede que seu vô tinha para tirar uma soneca bem nas árvores que ele plantou.
Personagem secundário: Não existente
Vilã: Não existente
Espaço: o parque
• O menino e sua árvore
Era uma vez um menino que queria ter uma rede para dormir mas ele não tinha como montar
dois ganchos e ai ele descidio plantar duas árvores e de re criou duas arvores que ele, regava
quase teodos os dias, e ele deixou um tempo de ir lá e quando ele foi as duas árvores ja
estavam Bem grandes e ai ele montou uma rede de dormir. (G. P. – 12 anos)
Narrador em 3ª pessoa: Era uma vez um menino que queria ter uma rede para dormir mas ele
não tinha como montar dois ganchos
Personagem secundário: Não existente
Vilã: Não existente
Espaço: Não há relatos do local onde as árvores foram plantadas
4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
No início deste artigo, foram apresentadas as classificações e o processo de criação de um
personagem, bem como do espaço pelo qual se passará a narrativa. Com base nos trechos e
narrativas expostas, o que se percebe é que os alunos não possuem, com clareza, o domínio de
produzir um texto, de forma que sejam criados personagens, os espaços e outros elementos
que são necessários para a escrita de uma narrativa. Estes mostram possuir uma base muito
superficial sobre personagens e cenários, não conseguindo explorar todas as possibilidades de
criação. Além disso, os alunos ainda não compreenderam a importância desses dois elementos
para um melhor entendimento daquilo que se quer dizer e contar através de uma narrativa.
Atualmente, um problema observado é que os alunos têm trocado o hábito da leitura e
escrita fora da sala de aula por outras mídias como a internet, televisão, jogos e entre outros.
Devido a isso, caberia à escola despertar novamente o interesse dos alunos por esse tipo de
atividade, desenvolvendo novas didáticas e materiais pedagógicos que despertem nos alunos a
mesma atenção e interesse que as demais atividades por eles apreciadas.
REFERÊNCIAS
CAMPEDELLI, Samira Yousseff. Português – Literatura, Produção de Textos e
Gramática. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
GANCHO, Cândida Vilares. Como analisar narrativas. São Paulo: Ática, 1991.
JUNIOR, Benjamin Abdala. Introdução à análise da narrativa. São Paulo: Scipione, 1995.
RAMANZINI, Haroldo. Literatura, gramática e criatividade: volume II. São Paulo:
Editora do Brasil, 1991.
SARMENTO, Leila Lauar. Português – Literatura, Gramática, Produção de Textos. 1. ed
– São Paulo: Moderna, 2010.
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40 - analisando os personagens e o cenário em