Uma assembléia nada geral
Reformar ou reformular estatutos é coisa para quem entende da coisa, porém, nem sempre
quem participa da reforma é perito no assunto. Mesmo que a boa vontade seja grande, os resultados e
as conseqüências são bastante óbvios.
A FEPEVI era regida por um estatuto elaborado ainda na década 70, em conseqüência de sua
transformação em fundação. Antes ela era uma autarquia. Aquele estatuto vigorou até os inícios da
década de 80, quando, literalmente, sofreu uma reforma. Começava internamente a crescer a
preocupação com as finalidades filantrópicas da instituição e era preciso mexer em seu documento de
origem.
Bem, reformas estatutárias são sempre necessárias e devem ocorrer, mesmo, de tempos em
tempos. O que aconteceu com o estatuto da então FEPEVI, porém, foi algo, juridicamente, bastante
inusitado.
O fato de ser a FEPEVI uma fundação pública, criada pelo poder público municipal dava à
instituição, naquelas primeiras décadas de vida, uma fachada bastante parecida à cara do partido
político que estivesse no poder. De acordo com esta minha impressão, a FEPEVI já teve muitas caras:
cara de pps, cara de mdb, de pmdb, de pfl, etc. Como diria uma amiga minha, “ninguém merece...”.
Numa dessas voltas do baile de máscaras, o time que estava no poder resolveu mudar a ordem
das coisas.
O estatuto foi modificado, criando-se, para a então FEPEVI, uma estrutura nos moldes do que
ditava o Código Civil. Lá se previa, dentre outras coisas, a implantação de uma assembléia geral,
dessas que são soberanas em suas decisões e tudo o mais. Além disso, incluiu-se naquele estatuto a
figura dos sócios. Aí o caldo começou a entornar. Sócios? Sim, a FEPEVI passou a ter sócios.
Imaginem como seria isso, sócios fundadores, beneméritos, contribuintes e por aí afora. A aventura
jurídica não teve maiores conseqüências (graças a Deus não deu tempo), pois ninguém se habilitou a
ingressar no quadro social recém inaugurado.
Bem, a criação de uma assembléia geral no interior de uma instituição, parece não ter nada de
mais. Havia outros órgãos colegiados na estrutura da fundação. O inusitado, porém, ficou por conta do
modo como foi montada a tal assembléia.
Sua composição era bastante simples, dela participavam a diretoria da fundação e os seus
sócios fundadores. A diretoria era composta por uma única autoridade, o presidente da FEPEVI. Os
sócios fundadores, quem eram? Bem, na hora de decidir quem eram os tais fundadores, descobriu-se
que a fundação havia sido criada pelo município de Itajaí e que, portanto, havia um único sócio
fundador: o prefeito municipal. Os dados estavam lançados.
A assembléia geral estava formada. Os membros eram o presidente da FEPEVI e o prefeito de
Itajaí. Sim, duas pessoas somente...
Para registrar as brigas ocorridas durante as sessões daquela incrível assembléia geral, fui
nomeado secretário ad hoc, naquele triste e tragicômico momento. Eu vi tudo aquilo bem de perto,
quase sempre de boca aberta, muitas vezes sem acreditar em meus ouvidos ou em meus olhos.
A assembléia era presidida pelo prefeito, que abria a sessão, determinava a leitura da ata da
reunião anterior, lia a ordem do dia e, de imediato, fazia as propostas sobre os itens postos em pauta.
Do outro lado da mesa, diria eu, na platéia, o presidente da FEPEVI. Às vezes arriscava algum palpite.
O presidente da assembléia dava o assunto por encerrado, colocava em votação e, pasmem,
invariavelmente eu contava dois votos, um contra e outro a favor. Por determinação do estatuto, o
presidente da assembléia tinha ainda o voto de minerva e, numa tacada só, cortava o nó górdio da
votação. Tudo acabava, quase sempre, em dois a um.
São coisas da nossa história, coisas com poucas testemunhas, mas que fazem parte desse longo
caminho trilhado, a duras penas, por uma instituição valente e decidida a vencer e a se tornar um
grande marco na história da educação de nosso país, apesar das pessoas e dos estratagemas utilizados
para dominá-la e usá-la em benefício próprio.
Prof. Jonas Tadeu Nunes (ex-colaborador da Univali)
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