I Seminário de História: Caminhos da Historiografia Brasileira Contemporânea
Universidade Federal de Ouro Preto
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Os conceitos de originalidade e autoria na produção e fruição artística
A obra de Manoel da Costa Athaide no final do século XVIII e início do XIX
Juam Carlos Thimótheo
Parte significativa da produção artística encontrada em Minas Colonial, provavelmente, foi fruto de forte influência de materiais impressos que circularam na época, além da
enorme fiscalização exercida pelos encomendantes das obras de arte, notadamente o clero
atuante nas igrejas matrizes e capelas, naquele período. Isso suscita indagações sobre como
entender algo que é fruto de fontes delineadoras e restritivas.
Assim, proponho estudar a arte no domínio conceitual, no campo das questões de
originalidade e autoria na produção e na fruição artística. A discussão partirá da análise
esquematizada do estatuto do artista plástico em Minas Gerais, contrapondo-se com algumas expressivas obras de arte da região central do ouro (principalmente Ouro Preto e Mariana) atribuídas ao pintor Manoel da Costa Athaide.
A relevância do tema aqui proposto está na oportunidade que terei de discutir assuntos que estão em pauta, atualmente, quanto ao estatuto do artista plástico e quanto aos estabelecimentos de conceitos tais como autoria e originalidade no fazer artístico e que, provavelmente, já eram percebidos no período colonial. Ao mesmo tempo, parece ser de grande
relevância estudar também outros conceitos relacionados, como o de censura, por exemplo.
Ao fazer esta proposição, de estudar os conceitos de originalidade e autoria, me insiro em um campo praticamente inédito dos estudos realizados até agora nesta área. Mesmo
em outras áreas artísticas, como a literatura e a música, por exemplo, estas questões não
estão ainda resolvidas.
Além de não se ter, praticamente, estudos de natureza conceitual sobre originalidade
e autoria para as artes plásticas mineiras no período colonial, pode se notificar também a
importância do estudo desses conceitos, que são tão usados, porém raramente interpretados,
inseridos na conjuntura temporal da concepção da obra artística. Isso torna esse estudo de
estrema relevância, pois pode resultar em novas perspectivas de como se entenderá a obra
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de arte. Ao que parece, praticamente não há também estudos significativos nas demais áreas como a literatura e música1, como já apontado, por exemplo.
A escolha da obra de Manoel da Costa Athaide2 para exemplificar este estudo foi,
justamente, por ser um artista de grande importância na região central de Minas (Ouro Preto e Mariana, principalmente) e por ter introduzido as formas rococó na pintura ilusionista
em templos religiosos naquela área. Porém, como a relevância maior do que proponho estudar são as questões conceituais e não o levantamento biográfico e artístico deste pintor,
percebe-se que a escolha do artista enfocado no projeto é arbitrária e delimitadora temporal,
pois são inúmeros os artistas do mesmo período que poderiam ancorar meus questionamentos, mesmo até em artistas contemporâneos.
Outro aspecto a ser considerado como definidor da relevância deste estudo é a possibilidade de verticalizar o entendimento da obra de arte barroca, abrindo, assim, novas
possibilidades interpretativas e de atribuições às peças daquele período, devolvendo a elas a
envergadura de obras de arte.
Para desenvolver os conceitos de originalidade e autoria, assim como os demais que
se mostraram pertinentes ao tema proposto, pretendo me atentar aos dicionários da época,
como o dicionário Bluteau e o Morais & Silva. Além dos dicionários, suponho ser possível
desvendar os conceitos propostos nos documentos que envolviam as obras de arte, como,
por exemplo, os registros de receita e despesa das inúmeras irmandades, ordens terceiras e
das igrejas matrizes.
Imagino ser necessário comparar as interpretações dos conceitos propostos no período colonial com as indagações atuais desses mesmos conceitos, pois assim evito anacronismos e suponho obter um quadro de análise conceitual mais amplo, como já dito em um
dos parágrafos anteriores. Meus questionamentos, assim, poderiam ser analisados através
até de artistas contemporâneos. Isto é, os conceitos de originalidade e autoria podem ser
inflexíveis, o que parece mudar não são esses conceitos, mas sim as demais atribuições que
1. Para alguns pormenores ver: SANTIAGO, Silviano. Vale quanto pesa; ensaios sobre questões políticoculturais. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. (Coleção Literatura e Teoria literária; v. 44) 200p. e HOLANDA,
Sérgio Buarque de. Panorama da literatura colonial. In: Capítulos de literatura colonial. São Paulo: Brasiliense, 1991. p. 409-29.
2. Para Informações Biográficas de Manoel da Costa Athaide consulte: MENEZES, Ivo Porto de. Manoel
da Costa Athaide. Minas Gerais: Edições Arquitetura, 1965. (Biografias de artistas mineiros, 1)
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envolvem a obra plástica, para não dizer todas as expressões artísticas, ao longo do tempo,
como o direito autoral que envolve patente, por exemplo.
Para o levantamento biográfico de Manoel da Costa Athaide, devo consultar o material bibliográfico publicado sobre o artista e inventariar o maior número possível de documentos que se refiram ao artista e à sua obra, para assim, preencher as possíveis lacunas e
corrigir eventuais lapsos. Devo fazer esta pesquisa documental principalmente nos arquivo
eclesiásticos das Arquidioceses de Ouro Preto e Mariana. Lá devo buscar os documentos
relativos aos termos de contratos e receitas das irmandades na região central do Ouro para
comprovar a autoria de determinadas obras que, atualmente são questionadas a quem se
pode atribuir determinadas obras. Assim também serão consultados os registros de batizado, crisma, casamento e óbito do artista em questão me auxiliarão na recomposição biográfica de Manoel da Costa Athaide, assim como os testamentos e inventários, que supostamente terei acesso.
Em arquivos das câmaras municipais, devo também encontrar registros de contratos
ou receitas e despesas que podem estar relacionados com o pintor. Além de, possivelmente,
auxiliar também na análise dos conceitos, pois, geralmente, nesse tipo de documentação são
bastante elucidativas as descrições do modo que se devem proceder à encomenda, no nosso
caso, dos forros e de outras manifestações pictóricas dos templos religiosos, por exemplo.
Nos arquivos cartoriais da região central do Ouro, devo encontrar documentos que
sustentarão minhas indagações, como, por exemplo, os registros crime, ou os testamentos e
inventários.
O levantamento biográfico de Manoel da Costa Athaide é importante, pois, através
da análise dos documentos de contratos com as irmandades, os inventários e testamentos,
provavelmente, se elucidarão os tramites que envolviam as atividades artísticas de pinturas
e de outros afazeres no período colonial brasileiro, no sentido em que, talvez, o pintor nada
mais fazia do que o que era-lhe imposto no contrato, sem grandes possibilidades de movimentação criativa.
Das fontes impressas, recorrerei aos missais, novenários, pontificais e outras tantas
obras dessa natureza que, através de uma análise estruturada nas teorias de Erwin Pa-
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nofsky3, que rege pela analise iconográfica4 e iconológica5 da peça artística, deve analisálas esquematicamente para compará-las com a obra de Manoel da Costa Athaide, que, evidentemente, também passará pelos mesmos tipos de analises.
Além de Panofsky, posso citar uma série de estudiosos da arte que, sem sombra de
dúvida, vão me auxiliar na execução desse projeto, são eles: Bauer6, Argam7,
Hadjincolaou8, Hauser9, Bazin10, Bayer11, entre outros. Não devo esquecer de mencionar
com certo destaque, Vitor Serrão, pois é dele a obra intitulada: O Maneirismo e o estatuto
social dos pintores portugueses de Lisboa12. Como afirmado anteriormente, são dos
modelos europeus que surge as obras do período colonial, parece ser de grande importância
saber como eram os estatutos que chegavam aos colonos.
Com a análise do estatuto do artista plástico em Minas Colonial, o desenvolvimento
dos conceitos de autoria e originalidade e outros conceitos envolvidos e o levantamento e
revisão biográfica de Manoel da Costa Athaide, devo analisar os três principais itens simultaneamente para tentar perceber se indagações a respeito da obra de arte barroca no Brasil é
aceitável considerá-la original.
3. Para pormenores destas posturas teóricas, confira: PANOFSKY, Erwin. Significado das artes visuais. São
Paulo: Perspectiva, 1979.
4. Iconografia, segundo Panofsky, é, basicamente, a análise que deve identificar os elementos da obra e os
significados factuais, apreendidos pela significação de suas relações. A análise iconográfica descreve e classifica as imagens, é o estudo limitado que se propõe a coletar e classificar a evidência, entretanto, não se considera obrigada a investigar a gênese e a significação dessa evidência, deixando essa função à iconologia.
5. Iconologia, segundo Panofsky, é, basicamente, a análise dos significados intrínsecos à obra de arte. Tal
significado nos permite interpretar a obra, nos revela a atitude básica de uma nação, período, classe social e
crença religiosa ou filosófica, qualificados por uma personalidade e condensados na obra. Na iconologia se
descobre os valores simbólicos em determinado objeto artístico, mesmo que o artista não os tenha feito conscientemente. Na iconologia se investiga a gênese e a significação, e trabalha como campos históricos, psicológicos ou críticos.
6. BAUER, HErmann. Historiografia del Arte: introducion critica ao estúdio de la historia del arte. Vers.
Rafael Lupiani. Taurus: Madrid, 1984. (ensaystas, 194).
7. ARGAN, Giulio Carlo. Arte e critica de arte. Tradução Helena Gubernatis. Lisboa: Estampa, 1988. (Imprensa Universitária, 66).
8. HADJINICOLAOU, Nicos. História da arte e movimentos sociais. Tradução Antônio José Massano.
Lisboa: Edições 70, s/d. (Arte e Comunicação, 7).
9. HAUSER, Arnold. Teorias da arte. 2ª Edição. Tradução F. E. G. Quintanilha. Lisboa: Presença, 1988.
10. BAZIN, Germain. História da arte: da pré-história aos nossos dias. Tradução Fernando Pernes. Lisboa:
Martins Fontes, 1976.
11. BAYER, Raymond. História da estética. Tradução José Saramago. Lisboa: Estampa, 1978. (Imprensa
Universitária, 12).
12. SERRÃO, Vitor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses. Lisboa: Imprensa Nacional; Casa da Moeda, 1983. (Arte e Artistas) 480 p.
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BIBLIOGRAFIA
ARGAN, Giulio Carlo. Arte e critica de arte. Tradução Helena Gubernatis. Lisboa: Estampa, 1988. (Imprensa Universitária, 66).
BAUER, HErmann. Historiografia del Arte: introducion critica ao estúdio de la historia
del arte. Vers. Rafael Lupiani. Taurus: Madrid, 1984. (ensaystas, 194).
BAYER, Raymond. História da estética. Tradução José Saramago. Lisboa: Estampa,
1978. (Imprensa Universitária, 12).
BAZIN, Germain. História da arte: da pré-história aos nossos dias. Tradução Fernando
Pernes. Lisboa: Martins Fontes, 1976.
HADJINICOLAOU, Nicos. História da arte e movimentos sociais. Tradução Antônio
José Massano. Lisboa: Edições 70, s/d. (Arte e Comunicação, 7).
HAUSER, Arnold. Teorias da arte. 2ª Edição. Tradução F. E. G. Quintanilha. Lisboa: Presença, 1988.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Capítulos de literatura colonial. São Paulo: Brasiliense,
1991.
MENEZES, Ivo Porto de. Manoel da Costa Athaide. Minas Gerais: Edições Arquitetura,
1965. (Biografias de artistas mineiros, 1).
PANOFSKY, Erwin. Significado das artes visuais. São Paulo: Perspectiva, 1979.
SANTIAGO, Silviano. Vale quanto pesa; ensaios sobre questões político-culturais. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1982. (Coleção Literatura e Teoria literária; v. 44).
SERRÃO, Vitor. O Maneirismo e o estatuto social dos pintores portugueses. Lisboa:
Imprensa Nacional; Casa da Moeda, 1983. (Arte e Artistas).
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1 – APRESENTAÇÃO - Seminário Brasileiro de História da