___________________________________________________________________________ Considerações Sobre a Caquexia Cardíaca1
CONSIDERAÇÕES SOBRE A CAQUEXIA CARDÍACA
Vitor Oliveira Carvalho1
Vagner Oliveira Carvalho2:
RESUMO: A insuficiência cardíaca é a via final comum de toda cardiopatia. Além de apresentar
cansaço e baixa capacidade física, os pacientes comumente apresentam depleção de massa muscular
ou, mas comumente chamado de emagrecimento. Esta depleção, além de muscular, é também
manifestada nos tecidos adiposos e ósseos. A condição caquética confere ao paciente uma menor
sobrevida, comparada com os não caquéticos. Diversos fatores contribuem para esta condição, como
uma atividade neurohormonal ainda mais exacerbada, uma baixa ingesta calórica associada ao edema
e baixa perfusão esplâncnica. Por esta manifestação ser comum nos pacientes com insuficiência
cardíaca, tem-se pesquisado muito a respeito da fisiopatologia e do tratamento. Apesar disto, não
dispomos de diretrizes, e sim sugestões de tratamento. A intenção deste artigo é fazer uma breve
revisão da caquexia cardíaca.
Palavras-chave: Insuficiência cardíaca; caquexia; fisiopatologia; tratamento.
ABSTRACT: Heart failure is the common final way of all cardiopathy. Besides presenting fatigue
and low physical capacity, the patients frequently present depletion of muscular mass or wasting.
This depletion, beyond muscular, also is revealed in bone and fat tissue. The cachexia condition
confers to the patient a minor survival compared to patients without cachexia. Some factors
contribute for this condition, as a neurohormonal activity still more revealed, a low caloric intake
associated to edema and low intestinal perfusion. Considering this common status, so many research
is been published. Despite of this we don’t have guidelines, only suggestions for treatment. The aim
of this article is to make a soon review of cardiac cachexia.
Key-words: Heart failure; cachexia; pathology; treatment.
1 Introdução
A Insuficiência Cardíaca (IC) é a via final comum de toda cardiopatia, sendo o seu principal
sintoma a “falta de ar”. Esta síndrome é o reflexo de uma função cardíaca deteriorada, uma atividade
Fisioterapeuta. Doutorando em Cardiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP. E-mail:
[email protected]
2 Graduando do curso de Biologia da Faculdade de Tecnologia e Ciências – Salvador. E-mail: [email protected]
1
__________________________________________________________________________
Diálogos & Ciência –- Revista da Rede de Ensino FTC. Ano V, n. 10, maio. 2007. ISSN 1678-0493
http://www.ftc.br/dialogos
___________________________________________________________________________ Considerações Sobre a Caquexia Cardíaca2
neurohormonal exacerbada e uma disfunção vascular importante. Esses comprometimentos
culminam com a perda de massa muscular que, quando muito intensa, é freqüentemente chamada de
caquexia cardíaca (CC) ANKER et al. 1999, 2002; POEHLMAN et al. (1999). A primeira definição da
CC foi dada por Anker et al.1999 baseado na documentação da perda não intencional de peso maior
que 7,5% do peso normal pré-morbidade, ocorrendo em um período de tempo maior que seis meses.
A estatística, usando essa definição, mostra que 16% da população de pacientes com insuficiência
cardíaca são caquéticos (ANKER et al.1999).
2 Desenvolvimento
A presença da CC é preditor de mau prognóstico (ANKER et al. 1997, 1999, 2002; DAVOSv
et al. 2003), independente da classificação funcional, fração de ejeção ventricular esquerda e consumo
máximo de oxigênio (ANKER et al. 1997, 1999, 2002). Em estudo de sobrevida em pacientes com
perda muscular, foi mostrada uma mortalidade de 28% em três meses, 29% em seis meses, 39% em
12 meses e 50% nos primeiros 18 meses (ANKER et al. 1997). Estes autores concluíram também que
pacientes com pico de consumo de oxigênio inferior que 14 mL Kg-1 mim-1 tinham uma mortalidade
em 3,6,12 e 18 meses, respectivamente 19%, 30, 40% e 51%. Este dado faz entender que um baixo
consumo de oxigênio, combinado com a CC, identifica pacientes com um risco extremamente alto
de morte (ANKER et al. 1997). Analisando a composição corporal, os pacientes com caquexia
cardíaca contam com uma depleção das reservas energéticas (massa gorda), massa magra (músculos)
e tecido ósseo (osteoporose) (ANKER et al. 1999, 2002). Pacientes com CC são mais fadigáveis e
mais fracos pela perda quantitativa (ANKER et al.1999, 2002; POEHLMAN et al.1999) e qualitativa
(ANKER et al.1999) de musculatura esquelética.
As alterações fisiopatológicas dessa síndrome não estão bem estabelecidas (ANKER et
al.1999, 2002; POEHLMAN et al.1999), mas as evidências disponíveis sugerem que a CC seja uma
desordem multifatorial neuroendócrina, metabólica e imunológica que culmina com um prognóstico
muito ruim. Há um desequilíbrio complexo nos sistemas corpóreos de anabolismo e catabolismo,
levando à perda de massa corporal (ANKER et al.1999), e a um estado de hipermetabolismo
(POEHLMAN et al.1999). Pacientes com IC associada à CC, quando comparados com os portadores
não caquéticos e com indivíduos normais, apresentam níveis plasmáticos ainda mais elevados de
__________________________________________________________________________
Diálogos & Ciência –- Revista da Rede de Ensino FTC. Ano V, n. 10, maio. 2007. ISSN 1678-0493
http://www.ftc.br/dialogos
___________________________________________________________________________ Considerações Sobre a Caquexia Cardíaca3
epinefrina, norepinefrina e cortisol, além de níveis de renina e aldosterona elevados, associados ao
sódio plasmático, mas baixo (ANKER et al.1999). Um estudo mostrou que a CC está ligada a
elevados níveis plasmáticos de Fator de Necrose Tumoral (FNT) produzidos, provavelmente, em
resposta à diminuição do fluxo sanguíneo tecidual (ANKER et al.1998) e à perda de massa muscular
relacionada a anormalidades neurohumorais e imunológicas (ANKER et al.1999). A ativação
neurohumoral pode levar à fibrose e à morte celular (FILLIPPATOS et al., 2003).
Um estudo desenvolvido com pacientes portadores de IC, caquéticos e não caquéticos, não
mostrou diferença na presença da apoptose, possível causa da deterioração muscular esquelética
(FILLIPPATOS et al., 2003). Um outro estudo investigou relação do TNF alfa e o fluxo sangüíneo
na perna de pacientes com IC e mostraram uma relação inversa entre os mesmos (ANKER et al.
1998). Outro fator que contribui para esta perda muscular é a má nutrição que não significa a baixa
ingesta de alimentos, e sim a má absorção do intestino, por causa da baixa e da perfusão sangüínea
(VON HAEHLING et al. 2007).
Atualmente não existe um tratamento padronizado para a condição de emagrecimento destes
pacientes. O que se tem de concreto é que o tratamento usual da IC deve ser mantido com o uso de
beta-bloqueadores e inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA). Alguns tratamentos
alternativos foram propostos e são utilizados, como estimuladores de apetite, hormônios
anabolizantes (mais comumente Ghrelin e hormônio do crescimento, respectivamente) e
suplementações dietéticas (YANG et al. 1995; DRISCOLL et al. 1997; OSTERZIEL et al. 1998;
BOCCHI et al. 1999; SPRINGER et al. 2006). Do ponto de vista cirúrgico, o transplante cardíaco
vem tendo um destaque especial no prognóstico e na reversão parcial da CC (HABEDANK et al.
2005). Apesar de não existir estudo em relação exercício físico específico, recomenda-se o seu uso de
forma aeróbia e de força, a fim de quebrar o ciclo vicioso do cansaço-sedentarismo-cansaço
(CASTILLO-MARTINEZ et al. 2005; KASIKCIOGLU et al. 2006).
3 Conclusão
A síndrome da insuficiência cardíaca com seu agravante de caquexia continua sendo um
grande desafio para os profissionais que trabalham com cardiologia. Ainda permanecem muitos
tópicos a serem elucidados. Existe uma grande necessidade de uma padronização no tratamento
destes pacientes, por isso fazem-se necessários maiores estudos.
__________________________________________________________________________
Diálogos & Ciência –- Revista da Rede de Ensino FTC. Ano V, n. 10, maio. 2007. ISSN 1678-0493
http://www.ftc.br/dialogos
___________________________________________________________________________ Considerações Sobre a Caquexia Cardíaca4
Referências
ANKER SD, CHUA TP, PONIKOWSKI P, HARRINGTON D, SWAN JW, KOX WJ, POOLEWILSON PA, COATS AJS. Hormonal changes and catabolic/anabolic imbalance in chronic
heart failure and their importance in cardiac cachexia. CIRCULATION, 1997.
ANKER SD, Coats AJ. Cardiac cachexia: a syndrome with impaired survival and immune and
neuroendocrin activation. In: CHEST, 1999.
ANKER SD, PONIKOWSKI P, VARNEY S, CHUA TP, CLARK AL, WEBB-PEPLOE KM,
HARRINGTON D, KOX WJ, POOLE-WILSON PA, COATS AJ. Wasting as independent risk
factor for mortality in chronic heart failure. In: LANCET, 1997.
ANKER SD, Rauchhaus M. Insights into pathogenesis of chronic heart failure: immune
activation and cachexia. In: CURR OPIN CARDIOL, 1999.
ANKER SD, SHARMA R. The syndrome of cardiac cachexia. In: INT J CARDIOL, 2002.
ANKER SD, VOLTERRANI M, EGERER KR, FELTON CV, KOX WJ, POOLE-WILSON PA,
COTS AJ. Tumor necrosis factor alpha as a predictor of impaired peak leg blood flow in
pacients with chronic heart failure. In: QJM, 1998.
BOCCHI EA, MASSUDA Z, GUIMARÃES G, CARRARA D, BELLOTTI G, MOCELIN A,
SOBRINHO CRMR, RAMIRES JF. Hormônio do crescimento na otimização do tratamento da
insuficiência cardíaca refratária. In: ARQ. BRAS. CARDIOL,1999.
CASTILLO-MARTINEZ L. Anthropometric variables and physical activity as predictors of cardiac
cachexia. In: INTERNATIONAL JOURNAL OF CARDIOLOGY, 2005.
DAVOSV CH, DOEHNER W, RAUCHHAUS M, CICOIRA M, FRANCIS DP, COATS AJ,
CLARK AL, ANKER SD. Body mass and survival in pacients with chronic heart failure
without cachexia: the importance of obesity. In: J CARD FAIL, 2003.
DRISCOLL JGO, GREEN DJ, IRELAND M, KERR D, LARBALESTIER RI. Treatment of
end-stage cardiac failure with growth hormone. In: LANCET 1997.
FILLIPPATOS GS, KANATSELOS C, MANOLATOS DD, VOUGAS B, SIDERIS A,
KARDARA D, ANKER SD.; KARDARAS F, UHAL B. Studies on apoptosis and fibrosis in
skeletal musculature: a comparison of heart failure pacients with and without cardiac
cachexia. In: INT J CARDIOL, 2003.
HABEDANK D, HUMMEL M, HETZER R, ANKER S. Reversibility of cardiac cachexia after
heart transplantation. In: J HEART LUNG TRANSPLANT. 2005.
__________________________________________________________________________
Diálogos & Ciência –- Revista da Rede de Ensino FTC. Ano V, n. 10, maio. 2007. ISSN 1678-0493
http://www.ftc.br/dialogos
___________________________________________________________________________ Considerações Sobre a Caquexia Cardíaca5
KASIKCIOGLU E. The Achilles point of cardiac cachexia: To exercise or not to exercise. In:
INTERNATIONAL JOURNAL OF CARDIOLOGY, 2006.
OSTERZIEL KJ, STROHM O, SCHULER J, ET AL. Randomized, double blind, placebo
controlled trial of human recombinant growth hormone in pacients with cronic heart failure
due to dilated cardiomyopaty. In: LANCET, 1998.
POEHLMAN ET. Special considerations in design of trials with eldery subjects: unexplained
weight loss, body composition and energy expenditure. In: J NUTR, 1999.
SPRINGER J, FILIPPATOS G, AKASHI YJ, ANKER SD. Prognosis and therapy approaches of
cardiac cachexia. In: CURR OPIN CARDIOL. 2006.
VON HAEHLING S, DOEHNER W, ANKER SD. Nutrition, metabolism, and the complex
pathophysiology of cachexia in chronic heart failure. In: CARDIOVASC RES. 2007.
YANG R, BUNTING S, GILLETT N, CLARK R, JIN H. Growth hormone improves cardiac
performance in experimental heart failure. In: CIRCULATION, 1995.
__________________________________________________________________________
Diálogos & Ciência –- Revista da Rede de Ensino FTC. Ano V, n. 10, maio. 2007. ISSN 1678-0493
http://www.ftc.br/dialogos
Download

Vitor Oliveira Carvalho1