UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
Bárbara Ribeiro Santana
A CRIMINALIDADE NA PERSPECTIVA DA SOCIOLOGIA JURÍDICA
FUNDAMENTOS E FRONTEIRAS
CURITIBA
2010
A CRIMINALIDADE NA PERSPECTIVA DA SOCIOLOGIA JURÍDICA
FUNDAMENTOS E FRONTEIRAS
CURITIBA
2010
Bárbara Ribeiro Santana
A CRIMINALIDADE NA PERSPECTIVA DA SOCIOLOGIA JURÍDICA
FUNDAMENTOS E FRONTEIRAS
Monografia apresentada no Curso de Direito da
Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade
Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a
obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Profº. Dálio Zippin Filho.
CURITIBA
2010
TERMO DE APROVAÇÃO
Bárbara Ribeiro Santana
A CRIMINALIDADE NA PERSPECTIVA DA SOCIOLOGIA JURÍDICA
FUNDAMENTOS E FRONTEIRAS
Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Bacharel no Curso de Direito da
Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, 15 de março de 2.010.
_____________________________________
Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite
Coordenador do Núcleo de Monografia
Universidade Tuiuti do Paraná
Orientador:
Prof. Dálio Zippin Filho
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
Prof. Dr.
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
Prof. Dr.
Universidade Tuiuti do Paraná
Curso de Direito
Ao meu marido e filho, razão do meu viver, pela compreensão
e carinho a mim dedicados.
Pode-se dizer que tudo o que sabemos, quer dizer, tudo o que
podemos, acabou por se opor àquilo que somos.
Valéry
RESUMO
O objetivo do presente trabalho é demonstrar ou tentar elucidar, empiricamente, a
problemática crescente dos crimes que assombra a sociedade, para tanto se vale de
teorias e construções doutrinárias sob o ponto de vista da sociologia jurídica com o
apoio das diversas ciências. Deste modo, com amparo na sociologia a qual analisa o
homem e sua associação com os demais, objetivando a análise das regras e seus
efeitos no meio social, busca-se verificar, a influência das diversas culturas e a
culpabilidade do Estado e da sociedade, indo ao corrompido desenvolvimento social
que enfraquece a lei com anseios jamais findados.
Palavras-chaves: fato social; interações humanas; sociedade; criminalidade; normas
jurídicas; soberania; cultura;
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.........................................................................................................10
2 A SOCIOLOGIA.......................................................................................................12
2.1 A EVOLUÇÃO DA SOCIOLOGIA..........................................................................12
2.2 VISÕES DE SOCIEDADE.....................................................................................13
2.3 A HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA JURÍDICA............................................................15
2.4 SOCIOLOGIA JURÍDICA.......................................................................................16
2.4.1 Principais temas abordados pela Sociologia Jurídica.........................................17
2.4.2 Objeto da Sociologia Jurídica na concepção de Durkhéim................................18
2.5 MÉTODO DA SOCIOLOGIA JURÍDICA................................................................18
2.6 AUTONOMIA DA SOCIOLOGIA JURÍDICA..........................................................19
2.7 O HOMEM E A FILOSOFIA...................................................................................20
2.8 SOCIOLOGIA JURÍDICA E FILOSOFIA JURÍDICA..............................................22
2.9 SOCIOLOGIA JURÍDICA E SUA RELAÇÃOCOM O DIREITO E A FILOSOFIA
JURÍDICA: FATO, VALOR E NORMA........................................................................22
3 PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA..............................................................................23
3.1 FATO SOCIAL.......................................................................................................23
3.2 ANOMIA.................................................................................................................25
3.3 MEIOS DE CONTROLE SOCIAL..........................................................................26
3.4 COMPORTAMENTO COLETIVO..........................................................................27
3.5 OPINIÃO PÚBLICA...............................................................................................27
3.6 DEVIO SOCIAL.....................................................................................................28
4 A FUNÇÃO SOCIAL DO DIREITO..........................................................................29
5 A BANALIDADE DA VIOLÊNCIA............................................................................30
6 ABORDAGEM SOCIOLÓGICA NO ESTUDO DA CRIMINALIDADE.....................32
6.1 PATOLOGIA DO CRIME.......................................................................................33
6.2 PROBLEMAS CONTEMPORÂNEOS PARA A SOCIOLOGIA JURÍDICA............34
6.2.1 Corrupção..........................................................................................................34
6.2.2 Minorias marginalizadas....................................................................................35
6.2.3 Grupos urbanos geradores de violência............................................................36
6.2.4 Delinquência juvenil...........................................................................................36
6.2.5 Crime organizado...............................................................................................37
6.2.6 Temas emergentes em políticas públicas..........................................................37
6.2.7 Percepção social do sistema judicial.................................................................38
6.2.8 A criminalidade: relevância do estudo dos tóxicos e suas medidas preventivas
e repressivas..............................................................................................................39
7 O COMBATE AO CRIME........................................................................................40
7.1 CONTROLE SOCIAL............................................................................................41
7.2 LEI E JUSTIÇA.....................................................................................................42
7.3 A LUTA PELA NÃO VIOLÊNCIA...........................................................................43
7.4 UM DIAGNÓTICO DAS SITUAÇÕES E TENDÊNCIAS......................................44
8 FRONTEIRAS: UMA VISÃO BIOLÓGICA.............................................................46
8.1 A MODERNIDADE SOCIOPATA..........................................................................48
CONCLUSÃO............................................................................................................50
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................51
10
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa se desenrola no campo da Sociologia Jurídica, voltada
à tentativa de entender a criminalidade de frente, pois o momento para tais reflexões
é extremamente oportuno, visto, que diante de um ambiente canalizado no
desenvolvimento econômico, nota-se o favorecimento à progressão da violência,
que desencadeou ondas de síndromes, gerando instabilidade na vida do homem em
sociedade.
Tem-se como objeto de análise o fenômeno social jurídico, pormenorizando
a conduta social desviante em partes rumo a conquista de desvendar a essência em
sua totalidade.
A amplitude do tema, embora uma pequena parcela de tantos outros,
justifica-se na crise do século, não que a criminalidade não tenha forças pretéritas,
mas agora desnuda na, antes imaginada, escala de horror explícita em todas as
possíveis frações de espaço.
Buscou-se, em especial, alguns clássicos da teoria social, como Weber,
Durkhéim, Arendt, Marx, Engels, Rousseau que fundamentam e justificam merecidas
contemplações na realidade social. Ademais, visto a complexidade de apenas tal
ciência
abarcar
toda
esquematização
e
solução,
se
faz
necessária
a
interdisciplinariedade rumo a contribuição incisiva das diversas ciências para
proporcionar modestas mudanças. A caminhada é longa, devendo discutir-se em
médio e longo prazo.
Habita na grande problemática das influências, que a sociedade revela ao
Direito (norma) e o modo como esse mesmo Direito vai agir naquele meio, propor
soluções que não amarelem no papel.
11
Algumas hipóteses para a confirmação da “boca da lei” serão traçadas, mas
esta, claro fica, não pode servir ao soberano, mas, sim sustentar a fome da justiça,
pois, ficar acorrentado levará ao caos e ruptura dos laços sociais outrora
contratados.
12
2 A SOCIOLOGIA
2.1 A EVOLUÇÃO DA SOCIOLOGIA
Nos primórdios o homem foi concebido em um ambiente rudimentar,
prevalecendo fatores biológicos, mas diante de situações desvantajosas frente a
predadores, percebeu a necessidade de conviver em grupos, visando sua própria
sobrevivência. Quando dessa ocasião, firmou-se a solidariedade entre os
componentes do, agora, grupo social. Posteriormente, com a organização humana
em sociedades, adveio discórdias e condutas desviantes ao considerado normal,
deste modo o homem passou a elaborar regramentos para que a ordem fosse
mantida, assim, aquele que fosse de encontro a elas, seria punido.
Conseqüentemente o homem, que outrora ao natural, foi gradativamente
formando um ambiente cultural, passando a ser o resultado desse meio cultural. O
homem passa a ser “um herdeiro de um longo processo acumulativo, que reflete o
conhecimento e a experiência adquiridos pelas numerosas gerações que o
antecederam.” (DIAS, 2009, p. 3)
Adiante dessas pequenas considerações, nota-se que a sociologia, parte do
pressuposto de que o homem para poder prover sua subsistência, necessita
relacionar-se com os outros, e, necessariamente o faz por meio de regras. Deste
modo, as ciências sociais vão estudar este comportamento do homem e suas
interações com os demais num dado processo histórico, assim a Sociologia Jurídica,
vai se preocupar em estudar quais são as regras de conduta e de que forma essas
normas vão orientar uma sociedade, e o faz com o intuito não somente de estudar o
presente, mas também de vislumbrar as conseqüências desse presente para o
13
futuro. “O objeto de estudo da sociologia, é, portanto, conhecer as formações sociais
passadas, presentes e opinar sobre as futuras.” (ROCHA, 2009, p. 8).
Em outras palavras, a sociologia preocupa-se com as mudanças, destarte, vale
destacar que para tal ciência seu estudo se volta a fenômenos determinados,
significa dizer que as sociedades, desde seu nascimento, não são eternas, ou seja,
a Sociologia somente pode evidenciar-se num conjunto de transformações, onde
deste modo poderá sugerir tais transformações. As sociedades se mostram em
processo de significativas mutações, e constantemente está permeada de novos
elementos transformadores.
Vale destacar que o comportamento social é analisado em meio ao grupo que o
indivíduo está inserido, em toda a evolução social a fonte é o grupo e não o
indivíduo.
2.2 VISÕES DE SOCIEDADE
Para um entender mais sistemático desta disciplina, há um dever de
explicações e análises de alguns termos essenciais que embasam a Sociologia,
existindo algumas variações nos conceitos que levam ao mesmo posicionamento e
fim, assim é com a expressão “sociedade”. Por conseguinte, esta tem sua origem no
latim societas, significando associação amistosa com os demais, sendo que deriva
de socius, “companheiro”, explicitando sua real gênese.
Para alguns pensadores, como Aristóteles (384-322 a.C.), Sto.Tomás de
Aquino (1225-12740), Friederich Engels (1821-1895) e Karl Marx (1818-1883)
trazem a concepção de “sociedade natural”, esta visão não aceita uma sociedade
14
sem que exista regramentos, o homem nasce em meio a um grupo, e neste meio
todos convivem comandados por regras, pois estas precedem ao homem, que as
criam,
meramente
por
questões
de
sobrevivência.
Contrapondo os primeiros, outros pensadores aceitam a convivência em grupo sem
que haja regras amplamente aceitas, os humanos convivem em plena harmonia
(Locke e Rousseau), com direitos naturais e respeitados por todos, ou em constante
guerra na luta pela conquista de propriedade (Hobbes), é o chamado “estado de
natureza”, cujos adeptos assinam Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (16321704) e Jean Jacques Rousseau (1712-1778), esta visão destes chamados
“contratualistas” tem dispostos em suas convivências um “contrato social”, onde se
estabelece regras comuns e de concordância geral, onde todos possuem deveres e
obrigações sem qualquer formalização.
Já Émile Durkheim (1858-1917) traz o conceito de “horda”, nesta os
humanos utilizam-se de constantes agressões pela busca da individualidade, pois
não aceitam ou não conhecem a noção de grupo. Neste desempenhar, observa-se
um estado de caos, em
constante guerra pela sobrevivência. Daqui surge a
percepção da divisão do trabalho, sendo este a criar os regramentos sociais a partir
do caos da “horda”.
No pensamento de Max Weber (1864-1920) o que leva o indivíduo a seguir
os regras sociais não é a força de coerção que estas exercem, mas sim o pensar de
que os demais esperam de seu comportamento, importa é o que a coletividade vai
pensar sobre um eventual desvio de sua conduta.
Claro é, para os contratualistas analisados, que os homens não conseguem
viver harmoniosamente por muito tempo, passando logo do “estado natural” para a
15
“sociedade civil ou jurídica”. Nesta se estabelece, através de um “contrato social”,
normas de convivência pacífica que regulará deveres e direitos, ao passo que o
descumprimento do acordado ser-lhe-á imputado sanções pelo desvio cometido.
Todas as considerações mencionadas leva a conscientização de que o
humano enquanto ser, somente existe e racionaliza enquanto grupo social, existe, é
presente porque descende de uma sociedade, mesmo que pequena, e precisa desta
para se sociabilizar e conseqüentemente formar sua cultura social. Para que esse
processo se desenvolva com certa normalidade, o faz por meio de regras sugeridas
e traçadas pela classe dominante. Por este motivo o homem ao nascer já estará
implantado em uma organização social servida de vastos regramentos, não
podendo ser concebido sem contato com outros de sua espécie, caso em que não
sobreviveria ou regrediria a forma rudimentar.
2.3 HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA JURÍDICA
A Sociologia do direito tem seu surgimento no final do século XIX e começo do
século XX, se utilizando dos conhecimentos da sociologia geral para voltar-se a
aplicação do direito, cujo qual encontra-se, desde os tempos mais remotos,
enraizado as diferentes sociedades.
Há autores que entendem que os grandes precursores da Sociologia Jurídica seja
Durkheim, Duguit, Emmanuel Lévy, Maurice Hauriou, Max Weber e Eugene Ehrlich.
Vale também incluir Rudolf Von Jhering (1818-1892), haja vista que deu um grande
passo a fundamentação sociológica do Direito. Mas foram Émile Durkheim (18581917) na França e Max Weber(1864-1920) que integraram a sociologia Jurídica
16
como uma disciplina autônoma. No Brasil um dos pioneiros (1922) foi Eusébio de
Queiroz com sua obra Princípios de Sociologia Jurídica.
2.4 SOCIOLOGIA JURÍDICA
A Sociologia Jurídica se preocupa em estudar o direito enquanto fenômeno
social, visto que para o homem conviver harmonicamente com os demais, sentiu-se
a necessidade de criar regras, das quais, posteriormente passaram a se positivar
em uma estrutura sistemática, de modo a combater as condutas tidas como
desviantes da então considerada normalidade. Busca entender essa formação e
consolidação das normas a partir do convívio do homem em um determinado grupo
social, visando entender o direito enquanto “fato social”, assim, se volta a conduta
humana por esta mostrar-se ligada por uma norma jurídica.
No entendimento de Cláudio e Solange Souto a “Sociologia do Direito ou
Sociologia Jurídica é a ciência que investiga, através de métodos e técnicas de
pesquisa empírica, o fenômeno social jurídico em correlação com a realidade
social.” (1981, p.13)
Na concepção de Cavalieri Filho, a finalidade da Sociologia Jurídica “é
estabelecer uma relação funcional entre a realidade social e as diferentes
manifestações jurídicas, sob forma de regulamentação da vida social fornecendo
subsídios para suas transformações, no tempo e no espaço”.(2000, p. 46).
O foco central da Sociologia é pesquisar as causas sociais que fundaram o
direito e a forma como este implica no meio em que foi gerado. É nessa esfera que a
Sociologia vai atuar, como no pensamento de Durkheim, de forma a entender o
17
Direito como um fato social, ou seja, é a sociedade que cria o sistema jurídico e por
ele se deixa influenciar. Este mesmo autor explica que os costumes e o Direito
apresentam como objeto de estudo os fatos morais e jurídicos, acrescenta ainda,
que tal disciplina deve pesquisar por meio de dois requisitos básicos a saber: como
essas regras formaram-se historicamente, “quais são as causas que suscitaram e os
fins úteis que elas preenchem”( DURKHEIM, 1969, p.1) e, como serão aplicadas na
sociedade, notando-se que ambos requisitos devem ser solidários entre si.
2.4.1 Principais temas abordados pela Sociologia Jurídica
A Sociologia Jurídica aborda diversos temas em sua compreensão, mas o
principal, sem dúvida, é as relações sociais, dessa, irá partir da atitude e do
comportamento humano que na sua origem permeado de regras se encontra. As
interações humanas respiram direitos e obrigações, portanto, grande é a
importância do Direito na sociedade.
A estrutura social também presta grande importância à mencionada ciência,
pois, o conjunto de grupos hierárquicos que dividem a sociedade em grupos de
status, também têm fortes vínculos com o Direito. Outro tema abordado é a
burocracia que prevê a prestação do serviço, cabe também mencionar, como
posição de destaque, o controle social que o Direito, como também as outras
instituições de controle social, exercem sobre as camadas populacionais e que
operam limites no meio social.
Leon Mayhew faz uma outra abordagem encarada pela Sociologia Jurídica:
Há o estudo do funcionamento de órgãos jurídicos; em segundo lugar, o
estudo do desenvolvimento da ordem jurídica nos setores privados da
sociedade; em terceiro lugar, o estudo do impacto do Direito sobre a conduta;
18
e, finalmente, o estudo do Direito como sistema normativo, que estabelece a
coerência das principais instituições da sociedade e contribui para ela. (1970,
PÁG. 210).
Como visto, a Sociologia Jurídica e o Direito se interdependem, pois aquela
ciência avalia o modo como os fatores sociais vão influenciar no Direito e o reflexo
que este terá na sociedade.
2.4.3 Objeto da Sociologia Jurídica na concepção de Durkhéim (1973)
Nessa pequena extensão trabalhada, percebe-se em todos os contornos as
diversas manifestações e termos desenvolvido por Durkhéim, justo então enfocar o
tema em sua perspectiva. Por tratar de uma ciência social seu objeto revela amparo
nos “fatos sociais”, em linhas retas, pode ser um fenômeno religioso, político,
literário, artístico, etc, que vai repercutir no mundo jurídico, pois qualquer ato social
realizado está envolto em laços jurídicos.
Esses
“fatos
sociais”,
“apresentam
características
muito
especiais:
consistem em maneiras de agir, pensar e sentir exteriores ao indivíduo, e dotadas
de um poder coercitivo em virtude do qual se lhe impõe.” (1973, p. 391-392)
Simplificando, a Sociologia se ocupa das relações humanas, surge na vida
social se dispondo a observar o comportamento das regras outrora ditadas dentro
deste meio.
2.5 MÉTODO DA SOCIOLOGIA JURÍDICA
Para Lévy-Bruhl (1997) em sua obra Sociologia do Direito, o método utilizado
é a observação, a interpretação e a comparação. A primeira consiste em olhar os
19
fatos sociais importantes nas sociedades construídas ao longo do tempo, para,
posteriormente serem examinadas, classificadas e interpretadas, deste modo, podese contrastar as diferenças existentes entre, por exemplo, as sociedades primitivas
com as contemporâneas.
A interpretação, quase se confundindo com a primeira, vai examinar e
classificar os fatos sociais extraindo as primeiras conclusões, essas conclusões
podem ser dedutivas (parte do geral para o particular, o que vale para o geral vale
para o particular), e indutivas (caminho inverso do primeiro).
Quanto a comparação se faz um exame de duas ou mais situações,
determinando alguma relação, semelhança ou diferença, sendo que poderá ser
feita no plano vertical ou temporal (compara-se os resultados de uma mesma
sociedade mas em épocas diferentes) e no plano horizontal ou espacial (compara o
resultados de sociedades diferentes mas na mesma época/ano/período), levando a
conclusões mais abrangentes e definitivas.
Este método sociológico, indivisível, é indispensável para o surgimento do
exercício de novas realizações, proporcionando novas reformas na esfera jurídica.
2.6 AUTONOMIA DA SOCIOLOGIA
A autonomia desta ciência é muito discutida, e até hoje verifica grandes
controvérsias sobre o assunto, são diversos os posicionamentos, no entanto para
que não se tire o foco central do trabalho, vale dizer que a Sociologia jurídica
conquistou destaque e hoje é reconhecida como ciência autônoma, pois possui
objetos e métodos próprios, sendo inconveniente confundi-la com outras ciências.
20
Ademais, vale dizer que a Sociologia Jurídica para uns é um ramo da Sociologia
Geral e por vezes com ela se confunde, pois conforme já apontado, o homem existe
no ambiente normativo, não tendo contornos sem que hajam regramentos. Porém,
de mais valia, é evidente que a Sociologia Jurídica mantém relações com todas as
ciências sociais e com os diversos ramos do Direito.
2.7 O HOMEM E A FILOSOFIA
A história pode ser observada em etapas diferentes e é clara a importância
da ciência da Filosofia como fundamento para todas as demais ciências.
Primeiramente, na antiguidade, no início, somente existia o caos e com o
surgimento do cosmos adveio a ordem, separou-se a água da terra e todas as
demais coisas organizaram-se. Os gregos explicavam as coisas com base nas
manifestações divinas, por meio de uma explicação fantasiosa traçando as relações
calcadas nas divindades onde cada um tinha seu papel na sociedade, e este
homem respeitava essa organização que lhe foi dada sob pena de voltar ao
indesejado caos. Cada época é atribuída a um elemento, nesta seu elemento
explicativo é o Cosmos, este trouxe a organização se apoiando em uma ordem
politeísta, o conhecimento humano apenas se limitava a contemplação, o que
percebia existir uma insegurança, pois o limite era dado pela divindade, sendo que
esta era imperfeita ao ponto de voltar-se contra o homem.
Passando a Idade Média, começa a ser admitido e incutido na sociedade o
cristianismo como religião, mudando a crença, prevalecendo um único Deus, traz
como referência explicativa a religião. O mundo aqui foi criado por Deus e a grande
21
preocupação era descobrir o caminho que levava à Ele, tendo como pressuposto a
divisão bitemporal. Nota-se que a razão passa a ser considerada, ou seja, havia a
necessidade de acreditar para após compreender e nessa relação estava a fé.
Mas alguns posicionamentos surgem e invertem esse entendimento, no
sentido de primeiramente compreender para só então crer, nesse desenrolar anos
se vão para tentar explicar, o que não se explica, a fé, com isso uma crise paira no
final da idade média, começa a vigorar o ceticismo e a igreja começa a ser
questionada em suas verdades. Dessa passagem do ceticismo para o otimismo
revela-se a modernidade, esta apresenta a dúvida como questão para a nova era.
Descartes, com seu método dedutivo, traz a razão como certeza da
existência do homem, esse ser existente passa a ser a referência nesse momento, e
vai relacionar-se com Deus diretamente. O homem vai desvendar a sociedade a
partir de suas referências, e é esse método cartesiano que vai colocar o homem
como senhor e possuidor da natureza, ou seja, o homem deixa de ser criatura para
ser criador.
Cada fase foi marcada por um ser intocável, primeiramente o cosmos,
depois a fé em Deus, para então chegarmos à razão, na notória frase de Maquiável,
“penso, logo existo”, mal sabia o homem que era feliz antes de adquirir sabedoria. E
em cada fase o espírito social acompanhava e contemplava, à luz das ciências
sociais, a regrada evolução social.
22
2.8 SOCIOLOGIA JURÍDICA E FILOSOFIA JURÍDICA
Ambas ciências visualizam o Direito com um olhar externo, o que as
diferencia da ciência Jurídica Dogmática, que vê o Direito como ele o é
internamente, estudando o conjunto de normas jurídicas que formam determinada
legislação.
Mas ambas não se confundem, enquanto a Filosofia Jurídica estuda a idéia
de justiça e os valores que esta revela, a Sociologia jurídica preocupa-se em
pesquisar as causas sociais que formaram o Direito e a forma como este vai
repercutir perante essa mesma sociedade. A Sociologia é uma tentativa de
compreender o ser humano enquanto interage com os demais. Deste modo, se
sobressai ao Direito, demonstrando sua importância como um item essencial à
organização da sociedade, eis que a vida humana esta coberta de regramentos, no
dizer de Bobbio, “estamos envoltos em uma rede muito espessa de regras de
conduta que, desde o nascimento até a morte, dirigem nesta ou naquela direção as
nossas ações.” (2005, p. 24). Observando, assim que o objeto de estudo da
Sociologia é a própria “conduta humana” (KELSEN, 2005, p. 254), pois é esta que
vai traçar os fenômenos jurídicos, pois o indivíduo aceitou a ordem como sendo
válida, e, na concepção de Émile Durkheim (1858-1917), enquanto “fato social”, a
Sociologia vai buscar dados na “história social e econômica.” (EHRLICH, 1986, p.
364).
2.9 SOCIOLOGIA E SUA RELAÇÃO COM O DIREITO E A FILOSOFIA JURÍDICA:
FATO, VALOR E NORMA
23
Anteriormente foram destacadas pequenas diferenças entre Sociologia e
Filosofia Jurídica, cabe agora delinear breves explicações do vocábulo Direito.
Dante Alighieri (1960), na Idade Média, em “Da Monarquia”, formulou uma
definição conivente com o tema ora estudado, “Direito é a proporção real e pessoal
de homem para homem que, conservada, conserva a sociedade e que, destruída, a
destrói.”
Simplesmente, é o conjunto de normas que regulam os impulsos desviantes
de certos indivíduos dentro da sociedade.
Reale (2004), dispõe a estrutura tridimensional do direito, considerando o
direito como fato, norma e valor. Essa análise vai desencadear na problemática da
eficácia, vigência e fundamento. O “fato”, claramente vai ser estudado pela
Sociologia Jurídica, onde tem por obrigação aprofundar-se na “eficácia” da norma,
consistente em entender se tais normas, impostas num dado espaço e em um
determinado momento histórico, atendem as necessidades desta sociedade. Na
continuidade, a “norma” por excelência é matéria do Direito, devendo os juristas
ater-se a “vigência”, no controle de buscar saber se está em vigor para então poder
interpretá-la e aplicá-la ao caso concreto. Já à Filosofia do Direito lhe sobra a
importância do “fundamento”, existe enquanto tem embasamento no mundo
axiológico, sua preocupação está relacionada com o ideal, com os princípios e os
conteúdos éticos do Direito, resumidamente, com o “valor” do Direito.
3 PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA
3.1 FATO SOCIAL
24
Para que possamos entender com clareza a Sociologia, verifica-se a
necessidade de conceituar alguns termos, assim como em todas as ciências, para
que não seja utilizado de forma deturpada. Percebe-se que, pela maioria dos
sociólogos, embasa o Direito em Durkheim (1895), portanto diversos conceitos são
trazidos deste autor, e o mesmo ao considerar o comportamento humano, o dispôs
como “fato social” por entender que estes comportamentos somente tem razão de
ser se o fizer em convívio social, demonstra o interesse de conduzir, empiricamente,
a Sociologia à sua autonomia.
O comportamento de uma determinada pessoa somente pode ser analisado
enquanto estiver em meio social, visto que não se vislumbra um ser que não esteja
independente deste meio. Assim, para Durkheim, criador do conceito, “fato social é
todo fenômeno social coercitivo, exterior aos sujeitos e que apresenta certa
generalidade no grupo social”.( ROCHA, 2009, p. 67).
Ao analisarmos o presente conceito, percebe-se que este encontra-se
fundado em três características básicas, a primeira trata da coercitividade, ou seja,
todos são obrigados a seguir as regras que lhe são impostas sob pena de sofrer
uma determinada sanção. A segunda característica é a exterioridade, entendida
como algo (norma) que é imposto, de forma a ser preexistente e incorporada antes
mesmo de nosso nascimento. Por fim a generalidade, pois a Sociologia precisa de
uma quantidade significativa de comportamentos para que possa declinar sua
hermenêutica do todo social. É desta maneira que o Direito deve regular a
sociedade, devendo ênfase aos fenômenos sociais.
25
3.2 ANOMIA
A expressão tem origem grega significando ausência, falta ou privação de
normas de conduta ou lei, foi abordado primeiramente por Durkhéim em “Divisão do
Trabalho Social” e na obra “Suicídio”, importando na perda de regulação na
sociedade, ou seja, há uma falha nesta organização, normalmente essa falha
resulta de uma determinada transição social advinda de um conflito com uma
determinada regra, como por exemplo o divórcio.
Merton (1970) difunde o conflito existente entre estrutura social, que dita a
ordem social, e estrutura cultural, que mantém a cultura, por razões inúmeras,
quando estas entram em colisão, surge a anomia.
Quanto mais o andar paralelamente se apresenta mais se concebe a
anomia, este comportamento patológico informa que houve algum fracasso por
parte das instituições de Controle Social, se tal comportamento foge do esperado
pelo homem médio como meio de manter sua sobrevivência, algo restou fracassado
no processo de sociabilização, a solidariedade fracassou.
Durkhéim (1893), em seu discurso literário A Divisão do Trabalho Social,
revela os pontos básicos da anomia, citando fenômenos sociais no desenvolvimento
estabelecido pela sociedade moderna, em que para o atingimento de um fim, deve
organizar-se para sobreviver, essa organização simplifica-se na divisão do traballho,
essa divisão irá produzir uma especialização acarretando no isolamento dentro do
grupo, deixando de lado a solidariedade tão esperada, enfraquecendo-a,
dissolvendo totalmente até chegar ao desvio. O indivíduo se isola em suas tarefas,
não percebendo que existem outros colaboradores comuns, perdendo essa idéia de
26
visão em conjunto, enfraquecendo todo o sentimento de solidariedade grupal.
Porém nas sociedades subdesenvolvidas o maior índice de criminalidade
está presente entre os menos especializados, por esta razão tal entendimento foi
preterido por outros pensadores.
No entanto, verifica-se uma incompatibilidade com o quadro cultural que o
criou ou com as normas vigentes, algo normal e sempre presente, mais ainda
modernamente. Por outro lado, questões anômicas suscitam mudanças nas
condutas individuais e grandes mudanças sociais que vão beneficiar toda uma
coletividade.
3.3 MEIOS DE CONTROLE SOCIAL
Vê-se nas normas positivadas que sozinhas não conseguem frear as
corrupções humanas, como outrora mencionado, existindo outros meios de
sobrevivência que auxiliam os legisladores, como um auxílio a barrar os ímpetos da
alma pecaminosa, estes mostram-se presentes em um ambiente cultural ao qual o
indivíduo esteja inserido.
Ao nascer, é passado uma carga de valores que pouco a pouco vão sendo
inseridos nesse pequeno existir, individualmente, o que a coletividade já prega a
anos anteriores, o que por conseguinte determina a forma de sociabilização geral.
Esse processo de aprendizagem de uma cultura leva a esculpir a personalidade
social.
Em uma sociedade o papel de sociabilização é traçado pela família, pela
escola, pela igreja e pelo Estado, sendo importante frisar que nas sociedades
27
modernas o Estado assume o centro da sociabilização de forma indireta. O Estado
sobredetermina valores para a sociedade e a mesma o faz inversamente, mas com
menos intensidade, o que não descarta o poder de repressão, descentralizada, por
parte do grupo social, pois, por mais que existam anomias ou desuso de normas
positivadas, a sociedade continuará criando e recriando mecanismos de poder e de
repressão.
3.4 COMPORTAMENTO COLETIVO
O indivíduo ao nascer apresenta-se como um ser desprovido de cultura
social, e no decorrer dos anos recebe estímulos que irá formar sua consciência de
coletividade. É transparente a influência que o grupo exerce na vida das pessoas,
sendo que cada indivíduo vai dar uma resposta, consciente ou inconsciente, das
influências dos demais. Todo esse armazenamento de informações “se desenrola
todo o plano de vida e personalidade do indivíduo”. (PIERSON, 1971, p. 221). Outro
fenômeno deve ser considerado no processo de sociabilização, trata-se da reação
circular, onde o indivíduo que recebe estímulos também o faz com reciprocidade,
provocando uma cadeia crescente de estímulos.
3.5 OPINIÃO PÚBLICA
A opinião pública é um conjunto de pessoas que recebem os mesmos
estímulos, seja pela mídia, ou por qualquer outro meio difusor de idéias sociais, para
formar decisões ou pensamentos que irá conduzir uma massa de reações. A opinião
28
pública é um fenômeno social que leva em conta sua perspectiva no tempo e no
espaço, deste modo, possui caráter imprevisto e imutável.
Acrescenta-se que, um ou mais grupos transferem seu modo de pensar
formando um juízo de aceitação ou de repulsa, tendente a tornar-se um juízo
coletivo, essa assertiva leva à criação da opinião pública.
Quando se observa que esse determinado público se desloca da opinião
para a ação, então será denominado grupo de pressão, do qual podemos conceituar
“como grupos sociais que visam a manutenção ou à transformação de conduta
social, no interesse dos líderes.” (CASTRO, 2003, p.268).
Essa opinião pública está inserida no mundo social e por vezes define um
caminho a ser seguido, deste modo deve ser considerada como um objeto de
coerção.
3.6 DESVIO SOCIAL
O ser humano desde sua concepção é formado em âmbito social e para que
a ordem prevaleça, ao longo do tempo foi criado normas de conduta, escritas ou
não, para que a harmonia estivesse sempre presente. Este domínio de
comportamento serve de proteção à sociedade, trazendo a esta certa segurança,
pois acarreta em previsibilidade no convívio com os demais.
Modernamente traçou-se o entendimento de o que difere o homem dos
animais é a moralidade e as faculdades mentais, e desta união ensejou a
sociabilização, que existe por questões de sobrevivência da espécie humana. Neste
entendimento reflete Darwin:
29
Ser moral é aquele capaz de refletir sobre seus atos passados e seus
motivos, e de aprovar uns e desaprovar outros: o feito de ser homem é dele
ter estas condições, constituídas, de todas as diferenças, esta é a maior
verificada entre os animais inferiores existentes. [...] Trato de mostrar que o
sentido moral é uma seqüela, é no primeiro momento, oriundo da natureza
persistente e uma constante nos instintos sociais. [...] E de uma
extraordinária atividade de suas faculdades mentais e da extrema rapidez
com que se reproduzem os feitos passados: por estas últimas qualidades
ele difere dos animais inferiores. (1977, p. 780).
Quando
um
indivíduo
afronta
determinado
regramento
acaba
por
desestabilizar o pacto que lhe foi imposto, se foge do esperado pelo homem médio,
acaba por rasgar a previsibilidade, trazendo tormentos a segurança contratada.
Para Lumia, desvio social é um “comportamento de não observância que o
grupo desaprova e que vai desde o desrespeito a certas regras de boa educação e
de etiqueta até as ações criminosas que colocam em risco a própria sobrevivência
do grupo.” (2003, p. 26).
Por outro lado, algumas transgressões, pois a coercibilidade imposta não é
absoluta, podem servir para adaptar uma cultura a mudanças no conteúdo e
estrutura da norma infringida. Nota-se, que uma sociedade em constante processo
de transformação, precisa de algumas condutas desviantes para que possa,
continuamente, inovar em seu ordenamento pátrio, para que uma possível anomia
não venha infectar seu arcabouço jurídico.
4 - A FUNÇÃO SOCIAL DO DIREITO
O homem enquanto inserido na sociedade exerce determinadas atividades
no grupo, na lição de San Tiago Dantas (apud CAVALIERI, 1995, p.12-15)
atividades de cooperação e concorrência. Enquanto aquelas se dão pela conversão
de
interesses,
estas
se
concretizam
inversamente,
caracterizam-se
pela
30
inocorrência de interesse comum. Ambas atividades podem gerar conflitos de
interesse, e, desse conflito pode acarretar demandas que terão o condão de
desestabilizar a normalidade pactuada. É nesse ponto que prolifera a função social
do Direito – prevenção - consiste em evitar tanto quanto possível o conflito de
interesses. É assim que atua o Direito, preceituando normas de conduta que impõe,
subjetivamente e abstratamente, no reverencial de convivência tranqüila e pacífica
com os demais.
5 A BANALIDADE DA VIOLÊNCIA
O tema em questão é muito complexo, e há muitos apontamentos em
diversos caminhos, mas ao vislumbrar atos desviantes, enquanto fenômenos
sociais, percebe-se o papel fundamental das ciências sociais,
a qual tenta, na
realidade social, demonstrar as implicações que determinado fato social foge de sua
previsibilidade. Ora, para Hobbes, é da natureza do homem ser agressivo e invejoso
(2004, p. 11), pois o ser humano possui instintos como ao de um animal selvagem.
Nota-se que, ao longo da evolução histórica, esta esteve invadida por barbáries e
repleta de ações transgressoras da manutenção da ordem, e constantemente
percebe-se a preocupação em combater tais fatores negativos da vida social.
Tais comportamentos são assim considerados patológicos, como advindas
da exclusão social, no entendimento de Durkheim, ou causado pelo consumismo
das sociedades industriais modernas, no ver de Marx e Weber. Estas causas
servem como norte para embasar esta ciência que vê naquele um ser
desequilibrado e que tormenta a normalidade social, devido ao seu fracasso frente
31
ao grupo social, por falta de recursos econômicos, ou por excesso, sendo que este
o conduzirá ao individualismo. Sem contar a visão biológica, que atribui a violência
como sendo elemento de nascença.
Foge, no entanto, dessa percepção que condutas desviantes surgem
também de manifestações e condições sociais absolutamente normais, e de
pessoas até então consideradas boas na concepção do homem médio.
(SACADURA, 2008, p. 202). Neste sentido, há apontamentos que, em uma
atualidade em torno incessante da busca pelo sucesso, em um ambiente
extremamente competidor, deixando valores a acrescentar por último, se ainda o
couber, observa-se a extrema necessidade da inclusão, portanto, modernamente
esta se sobressai a exclusão, por motivos de sobrevivência, por prestígio ou
lealdade a determinado grupo ou classe social. É a luta pela inclusão que,
atualmente, avassala a ordem e delega a contemporaneidade anomalias sociais
anteriormente não imaginadas.
No ideário de Rousseau (1979), no mito do bom selvagem, considera que o
homem ao natural é bom e justo ao nascer, e quando inserido em sociedade se
corrompe com as enfermidades e mazelas deste ambiente social deturpado,
fazendo com que o homem se volte para o mal.
No imaginário de Marx, já era previsto a opressão de um país capitalista,
transformando a sociedade em classes, das quais os oprimidos, proletariados, eram
apenas contribuidores de forças de produção. É clara a contribuição da burguesia
dada aos instrumentos e as relações de produção, todavia, dessa evolução
industrial, passou-se a corrida pelo consumismo, e uma luta de classes imbuída
pela obscuridade dos dias atuais e que desvirtua os chefes de família.
32
6 ABORDAGEM SOCIOLÓGICA NO ESTUDO DA CRIMINALIDADE
Uma visão sociológica sobre o crime vai considerá-lo no quadro social,
situando seu estudo na interação humana, estando claro que apontar as causas e
as soluções para o crime é um trabalho complexo e pede um longo estudo da
situação concreta.
Durkheim (1938) considera em um de seus trabalhos a normalidade do
crime, pois, desde os gregos e romanos, até mesmo na bíblia, em seu velho
testamento, as civilizações estão marcadas por assassinatos guerras e inúmeras
violências, não há um passar histórico que não esteja acorrentado com agressões
humanas. Por isso o considerar “natural em uma sociedade, o que não é natural é a
complacência diante dele.” (RODRIGUES et al., 1980, p.179).
O despertar da consciência moral ressurge quando se manifesta a idéia de
combate ao crime ou de sua prevenção. Este despertar vai provocar a sensibilidade
da sociedade para a movimentação do aparato estatal na esperança de técnicas de
prevenção ou de repressão, sendo que aquela deve ocupar maior espaço.
A grande problemática de uma sociedade em crescente desenvolvimento é
que o crime acompanha essa modernização, aparecendo novas modalidades de
crime, aumentando as tradicionais, conseqüentemente alterando a escala e o perfil
do agente cometedor de um ato infracionário.
33
6.1 PATOLOGIA DO CRIME
A realidade se comparada com poucos anos atrás, claramente nota-se que
o homem moderno atingiu espaços nunca antes imaginados, traz como marca o
antropocentrismo, interage com milhões de pessoas simultaneamente num
verdadeiro frenesi social, evoluindo em conhecimentos que se renovam de forma
espantosa. Mais ainda, o crescente aumento populacional abarrota o planeta,
invade o meio ambiente e corrompe a natureza social, pois a busca pela
sobrevivência é uma luta travada dia a dia, qualificando o ciclo destrutivo que ao
final acarreta deformidades no convívio social.
Essa globalização, que por vias trouxe a tão esperada modernidade, trouxe
também a violência sem se quer manipular o antídoto para esse mau que assola
toda a humanidade.
Toda essa monstruosidade tecnológica, além de refletir no Direito, também
se espelha na estrutura familiar, política, nos transportes, nas crenças, enfim em
tudo.
Mas
um
item
é
preocupante,
essa
aceleração
norteadora
da
contemporaneidade que contribui em alguns pontos, em outros traz seu
retardamento. Amplas pesquisas sociais foram realizadas para atender as
demandas que solicitavam soluções urgentes, mas ao saírem do papel,
encontravam-se desatualizadas, mas essa é apenas a ponta do iceberg enfrentado
pelas mais diversas ciências. O Direito também exibe seu recrudescimento, pois
não consegue acompanhar as constantes transformações. Mas o ponto mais
importante está no desenvolvimento, o progresso tramitante na ordem econômica,
este gera o consumismo, a concorrência, a cumplicidade na desordem, a
34
submissão, a tolerância e a mais perversa de todas: a patologia. Esta transgride a
paz social e leva a insegurança e desestabilidade do alicerce social.
6.2 PROBLEMAS CONTEMPORÂNEOS PARA A SOCIOLOGIA JURÍDICA
Não há como elencar as diversas problemáticas que o Direito enfrenta nos
dias atuais, mas alguns crimes merecem relevância em sua análise, embora os
demais também careçam de aprofundamento, mas é um trabalho que se cumpre em
médio e longo prazo, infelizmente.
Passemos a discutir neste capítulo, com base no entender de Reinaldo Dias
(2009), as minorias marginalizadas, a subcultura da violência: os grupos radicais
urbanos, delinqüência juvenil, crime organizado, corrupção, temas emergentes em
políticas públicas e a percepção social do sistema judicial.
6.2.1 Corrupção
Freqüentemente, ao abrirmos o jornal, ao ligar a televisão ou o simples
manusear de revistas, fácil é notar a crescente violação de valores éticos de honra,
probidade e justiça, pois tais indivíduos para obter posições políticas ou sociais ou
para adquirir benefícios econômicos, violam as normas legais. A corrupção envolve
funcionários públicos que desviam suas funções em prol de interesse próprios,
degeneram a função, pois detém poder para garantir a impunidade, sujeitos que
adquirem poder político e econômico e, sob o manto da democracia, lesam toda
uma sociedade. A corrupção é um ato que atinge diretamente uma universalidade de
35
indivíduos contrariando o Direito e a moral onde um ou um grupo, podendo estar
ligados a uma cadeia, se deixam seduzir-se pelo dinheiro.
6.2.2 Minorias marginalizadas
Aqui trata-se de introduzir nas mentes que a diversidade existe como uma
característica inerente a humanidade, pode abranger raças, culturas,
status,
deficientes, homossexuais, idosos, entre outros. Essas minorias marginalizadas é
um assunto que deve ser contemplado não somente pelo Direito, mas também pela
coletividade. Essas diferenças são marcadas na subjetividade de geração para
geração, e transmitem, não tão acentuadas no Brasil, mas ainda comumente
conduzem ao preconceito e a agressões, onde tal grupo reprimido se isola com seus
iguais, afastando-se dos desiguais dominantes. A disparidade também suplica o
Direito, esta onda de desigualdades versus desenvolvimento sócio-econômico,
embora alguns entendam que com a modernidade essa exclusão ficou no passado,
quanto mais o país se desenvolve mais os iguais se afastam dos desiguais.
Um bom exemplo é o que ocorre nas empresas públicas e privadas, a
inclusão de deficientes no quadro de funcionários. Talvez passe despercebido pelas
pessoas, mas é nesse quadro de solidariedade que a sociedade busca manter um
certo equilíbrio e segurança que somente o Direito satisfaz e é esse ato juntamente
com outros diversos, intrinsecamente unidos, que levam ao combate das patologias,
portanto, tema merecedor de abordagem pelo Direito como também pela conjuntura
social.
36
6.2.3 Grupos Urbanos Geradores de Violência
Em geral, formado por jovens, inseridos na camada média ou alta da
sociedade, e que atacam prostitutas, mendigos, indígenas, homossexuais, etc.,
como por exemplo, no Brasil, mas precisamente no Rio de Janeiro, em 2007, o caso
da empregada doméstica que foi espancada no ponto de ônibus por indivíduos
moradores de um condomínio de luxo, que agrediram-na por achar que se tratava
de uma prostituta. Na prática não são devidamente punidos, então aqui fica claro a
“anomia”, as normas estão perdendo sua eficácia, não há compatibilidade entre os
objetivos esperados pela sociedade e as normas vigentes.
6.2.4 Delinquência juvenil
O tema em questão assumiu, não somente no Brasil, proporções
alarmantes, grande é a incidência de crianças e adolescentes no plano da
marginalidade, o pesar deste caminho fomenta a “tolerância” que conduz ao
enfraquecimento das normas.
O mais preocupante é que este tipo de desvio está relacionado com o
crescimento econômico e com o aumento da influência do crime organizado, este se
utiliza de jovens como rebanho da ordem desviante, classe manifesta da patologia,
conhecedora da não punição do menor na estrutura normativa, ostenta controle e
mando, conduzindo ao decesso e quebra do comando (normas) a que é
prerrogativa do Estado.
37
6.2.6 Crime organizado
Aqui, um determinado grupo de pessoas se organizam e formam uma
sociedade que repele a sociedade normal, ou seja, desloca o fundamento da
decência e moralidade para o da vantagem e ilicitude, essa conduta afronta e se
afasta da normalidade.
O desenvolvimento sócio-econômico, cultural, tecnológico, político, dentre
tantos outros, como alguns já citados, levou a sociedade a se separar em pequenos
e grandes blocos de agrupamentos de uma determinada classe, realizou-se em
meio social dicotomias, o grupo dos homossexuais, dos assalariados, dos
empresários, dos detentores de riquezas, dos atores, e inúmeros outros, estes por
terem as mesmas características se simpatizam e se unem, ou concorrem entre si,
aqui situa-se o grande problema de controle do Estado: as diferenças no gigantesco
contingente populacional.
E para grande pânico há também a formação de grupos transgressores das
normas, que cada vez mais adquire novos adeptos. Seguem o mesmo sistema
evolutivo da sociedade, mas aqui semeiam a prática delituosa. Para Reinaldo Dias
(2009), há uma enorme rede que se beneficia dessa ilegalidade, e, até mesmo
questiona o controle e legitimidade do Estado. O grande problema do crime
organizado está em adaptar as leis a esse tipo de enfrentamento.
6.2.6 Temas emergentes em políticas públicas
Os temas emergentes são questões novas que a sociedade se depara,
38
como as questões relacionadas á informática, à bioética, a questão ambiental, etc.
A sociedade atual está cada vez mais especializada, mais complexa, todo
esse desenvolvimento reflete também no Estado, por sua vez, este precisa correr na
execução de políticas públicas, e para tanto, se vale de parcerias com organizações
não governamentais para conseguir atingir sua função social, pois foi incompetente
no atendimento das novas demandas. Toda essa movimentação envolve diversos
segmentos e setores das sociedades e que “estão relacionados à revolução
científico-tecnológica que se está vivendo neste inicio do século.” ( DIAS 2009, p.
230).
6.2.7 Percepção social do sistema judicial
Outro
grande
problema
enfrentado
pela
Sociologia
está
no
desconhecimento das leis, um motivo que não está fundado na fonte inspiradora do
Direito, o caminho do Direito está na sua bíblia e esta deve ser difundida
genericamente de modo a se fazer entender.
Na Idade Média a igreja fazia papel de intermediadora, traduzindo a
“palavra” aos seus seguidores, pois as escrituras sagradas eram escritas em Latim.
Esse papel intermediador no Direito cabe aos juristas que o fazem com intenções
econômicas, se especializam para sobreviver. O conteúdo normativo está à
disposição de todos, mas não seu entendimento. O Direito possui vínculo com o
todo social, ubi societas, ibi jus, mas a sua complexidade existe e dificulta o acesso
aos excluídos de sabedoria jurídica.
39
6.2.8 A criminalidade: relevância do estudo dos tóxicos e suas medidas preventivas
e repressivas
A evolução da criminalidade encontra boa parte de seu distúrbio na situação
sócio-econômica, e tentar proceder uma modificação consiste, primeiramente, em
transformações no atual modelo econômico brasileiro. A criminalidade não é um
problema que se resolva a curto prazo, todavia metas preventivas e repressivas
devem nortear todo e qualquer aparato jurídico estatal. Não há quem ignore o
abismo existente entre o Direito e a criminalidade atuante da severa tecnologia tanto
esperada. Sofre a sociedade e pena o infrator as escuras com o abuso das
autoridades geradores de violência sobre violência, “entre as paredes do cárcere, o
drama de sofrimento de um culpado, por antecipação do inferno” ( DOTTI et
al.,1980, p.208) ou “reduzida, dentro e fora do palácio, à condição de coisa, de coisa
intra commercium, franqueada à publicidade e à curiosidade.” (ibid., p. 206).
Há medidas que servem como vacinas contra o crime, tais medidas de
segurança servem, na atual ruptura da ordem, como idealização preventiva do crime
com conseqüente redução da criminalidade. Todavia, como apontado, deve se valer
de ações sociais, e mais, de movimentação dos cofres públicos.
Como realçador, um dos crimes que mais fomenta, corrompe e conduz a
outras modalidades de ilícitos na contemporaneidade é o uso e o tráfico de drogas,
matéria que deve dar ênfase a pena e ao cárcere conjuntamente. Claro é que os
“diretores” dessas mazelas não sofrem o abalo das leis, esta cabe aos rastejadores
da escória social, muito menos, caberá o vento da prisão que toca, apenas, aos
mais espertos.
40
Com apreço pelas medidas preventivas e repressivas elencadas pelo árduo
trabalho dos criminólogos, em um breve comentário de algumas, Serrano Neves
(1980), as elenca em “educação e instrução com o auxílio de educandários, serviços
de assistência social, associações desportivas e, sob o mútua compreensão, por
intermédio de emissoras de rádio e de televisão, de revistas, jornais e outros meios
de comunicação pública”; uma efetiva fiscalização, “com relatórios periódicos, de
fronteiras, portos, aeroportos, estradas e atalhos, com freqüente rodízio de pessoal”;
apreensão de substâncias tóxicas com uma urgência na remessa do presente à
perícia, bem como, o controle efetivo de todo o indivíduo que a utiliza e que está a
controle da institucionais; uma freqüente vigilância aos locais suspeitos de
comercialização de psicotóxicos; “comunicação a cargo da autoridade desportiva
competente” dos casos de doping em que estejam outros envolvidos.
As medidas repressivas há anos mostraram suas falências e sua única
tentativa de ressurreição estaria vinculada à diretrizes reformatórias no todo cultural,
educacional, social e principalmente nas chagas do “Leviatã”.
7 O COMBATE AO CRIME
Quando
um
comportamento
se
desvia
de
sua
previsibilidade,
conseqüentemente surge um juízo de reprovação por meio da sociedade em que tal
indivíduo está inserido, essa reação social é considerada um juízo moral, quando
este senso passa a tolerar a conduta desviante, significa que houve uma aprovação
no comportamento anti-social, essa tolerância gera uma crise na estabilidade da
sociedade, sobrevindo uma deterioração do pensamento social, e se o Estado não
41
traçar meios para combatê-lo, seguirá rumo ao anarquismo.
Para que se possa delimitar condições para o implemento de políticas de
combate ao crime é indissociável que esteja atada às políticas sociais. A política
estatal juntamente com a política social devem mutuamente cooperar-se, de modo
sistematizado como forma de enfrentamento da criminalidade. Franz Von Liszt, no
final do século XIX estabeleceu o conceito de política criminal como “o conjunto
sistemático de princípios, de acordo com os quais deve organizar o Estado e a
sociedade a luta contra o crime.”
7.1 CONTROLE SOCIAL
A questão do controle social é considerado como a função social mais
importante do Direito, é algo que deve respaldar um Estado em seu alicerce, é uma
expressão do poder posto as mãos do soberano.
Um sistema de poder deve reproduzir-se em uma esfera hierárquica de
normas a fim de escalar os objetivos gerais da coletividade. Toda organização se
mantém por meio de prioridades e objetivos a serem alcançados, para tanto, deve
haver uma sistemática de comportamentos esperados para que não implique em
desvios às normas estabelecidas, essa manutenção da ordem é trazida pelo
controle social. Para que uma sociedade conviva com certa previsibilidade no seu
cotidiano, necessita deste controle imposto pelo poderio, deste modo, há como
determinar o comportamento social, proporcionando estabilidade e segurança a
sociedade.
42
7.2 LEI E JUSTIÇA
É a lei, oriunda do poder, que ditas as regras de Direito, emanada da
autoridade, dando à sua forma escrita o meio de conhecimento do Direito, devendo
curvar-se às necessidades sociais, sob pena destas não terem aplicação prática.
“Em suma, a lei é continente e o Direito conteúdo.” (CAVALIERI FILHO, 1995, p.64).
A lei nada mais é do que uma norma formal que regula às ações do homem,
assim deve ser difundido seu conteúdo como forma de orientação num contexto
territorial.
Algo que evoluiu de costumes ou de tragédias merece estar incluída como
fonte do Direito e suprema característica de um Estado, mas esta lei deve
representar os direitos da camada populacional, portanto, seu sucesso se dá pela
conjunção com a moralidade, pois o Direito, no mundo do dever ser, aqui se insere.
Para Bauman “A lei e o lucro deslocam e substituem a gratuidade e
ausência de sanções do impulso moral. A maneira da organização socializar a ação
inclui, como corolário indispensável, a privatização da moralidade.”(1998, p.102)
Nenhuma ciência social, ao desvendar o entronamento das normas, refuta o
caminho de sangue marcado pela sua formação no Direito positivado, tampouco
pode contestar a inaplicabilidade, na evolução histórica, da moralidade na máxima
de justiça.
O texto abaixo, datado de 1804, escrito por um Bispo chamado Watson, e
que pregava para a sociedade burguesa, demonstra:
As leis são boas, mas infelizmente, são burladas pelas classes mais baixas.
As classes mais altas, certamente, não as levam muito em consideração.
Mas esse fato não teria importância se as classes mais altas não servissem
de exemplo para as mais baixas. Peço-lhes que sigam essas leis que não
são feitas para vocês, pois assim ao menos haverá a possibilidade de
43
controle e vigilância das classes mais pobres. (apud FOCAULT, p. 94).
A lei é formada como declaração da justiça, e apesar de pronunciado nas
mãos do soberano e ao comando destes, é incorreta a afirmação de que uma
coletividade prescinde de Estado para manutenção da paz, como na visão de
Locke, em que uma sociedade sem Estado regrediria ao caos, na luta de todos
contra todos, pois uma sociedade libertária, apenas, persiste na ficção.
Atualmente é claro que lei não se confunde com justiça, a par de que esta é
empregada ao bel alvitre do homem, falho e imperfeito, que traça seu conceito
conforme seus valores, enquanto aquela deveria explicitar as expectativas da ordem
social.
7.3 A LUTA PELA NÃO VIOLÊNCIA
Este capítulo se dispõe a estudar embasado na teoria de Hannah Arendt
(2004), onde acredita ser possível existir o exercício do poder sem violência.
No caminhar da humanidade incontáveis pessoas foram vitimadas por
guerras e violências que deixará marcas perpetuamente, desnecessariamente o
monopólio estatal colocou inocentes como barreira do seu impetuoso senso de
domínio. Essa violência em massa surge também às obscuridades do Direito,
através de atos oficiosos de prepostos do Estado, e, juntamente com este, terroriza
toda uma estrutura social. Confronta direitos conquistados e tidos como
fundamentais com o poderio estatal, conferido a este democraticamente, sem que
tal poder se abale, essa desumana voz da incompetência dizima, abstratamente,
toda uma liberdade.
O Estado ao correr dos anos cometeu inúmeras atrocidades aos olhos
44
apáticos da população e a esta é que cabe a responsabilização pela não
resistência. O homem manifestamente cegou-se a corrente de violência, se depara
com mecanismos estatais cada vez mais inúteis, aceitando-os rotineiramente.
Vislumbra-se, nessa desenfreada vigilância e punição, uma manifestação
que vá de encontro a esse poder, buscando a “ética e a decência, com uma
participação”, ampla, “democrática e não violenta do espaço público.” (ROCHA,
2008, p.194).
7.4 UM DISGNÓSTICO DAS SITUAÇÕES E TENDÊNCIAS
Como anteriormente exibido, estamos em um estado de caos e tendências
nunca antes mensuradas, a sociedade se moderniza e com ela todos os
aniquiladores da paz também, numa busca extremada pelas infinitas necessidades,
o crime se sobressai, como um troféu pelo aproveitamento cruel da sensibilidade
social. Se o crime é algo normal e comum em toda estrutura, o seu combate é mais
que isso, é um exercício de justiça que deve controlar toda a mente social. Sob este
ângulo, na verdade nua e crua, a criminalidade também se modernizou e se elevou
a respeitosos espantos. Somos hoje escarnecidos pela marginalidade, em todos os
extremos o crime se fixa. Nosso país é um dos grandes mercados de distribuição de
tóxicos, sem contar a delinqüência juvenil que parecem resultar da perda de
autoridade, num afastamento das instituições basilares, como família, igreja,
escolas. Mais ainda, o crime econômico, passou para a escala de explicidade. “É
como se estivéssemos regredindo de um mundo de perfil durkheimiano, mundo de
coações institucionais e organizacionais, para uma sociedade rousseauniana,
45
desinstitucionalizada, permissiva e libertária.” (RODRIGUES et al., 1980, p. 181).
Houve um corte nas raízes contratuais, e o enfrentamento dos novos
problemas desencadeou despreparo por parte dos órgãos de justiça, impregnados
com um formalismo que os é comum, e que leva a elevados índices burocráticos. As
penas mostram-se incompatíveis com a mudança social, e os centros punitivos e
reformadores se tornaram escolas da criminalidade. E o que dizer da polícia, que às
vezes protege, outras se contagia, a polícia no consciente social, nada tem a ver
com a utopia de paz almejada. No entanto convém procurar os focos geradores, “o
crime aumenta, com ele a repressão, está gera a violência que produz mais crimes”.
(1980, p.183). No trabalho de juristas e cientistas sociais, no momento, não parece
eficaz aumentar as verbas, adquirir equipamentos sofisticados ou, tampouco
aumentar o contingente policial, ora, observa-se que isso vem se propondo e
aplicando nos últimos anos. Recomenda-se o investimento nacional nos
procedimentos de justiça criminal, e principalmente na criação de grupos de apoio
complementar formados por cidadãos, neste imaginário, deve-se prevenir, pois a
repressão demonstra o fracasso do poder dominante. Em todos os aspectos é
imprescindível a participação e colaboração da comunidade na prevenção do crime.
A união social se basta.
No relatório dos trabalhos dos juristas e cientistas sociais, é trazido com
sabedoria:
A onda crescente de violência é um desafio que o mundo moderno propõe
à Inteligência humana movida pelo senso moral. Não há uma ciência da
prevenção como não existe qualquer técnica capaz de prever suas
modalidades protéicas. Exige, isso sim, um agudo sentido do bem comum,
da responsabilidade cívica e é essa a grande prova que a sociedade
brasileira deve enfrentar[...] ( 1980, p. 230).
A sociedade está frente ao limite e encontra-se a espera do exorcismo
46
social, ela tropeça na crise e apaticamente se reduz a destruição. Como bem
esquematizado por Platão, está em um ciclo fatídico, onde necessariamente, toda
degradação chega ao cume, para após despontar a um novo renascer. Este ciclo
oportunamente e obrigatoriamente tem que se fechar, estando presente na história
da humanidade, pois da paz e harmonia haverá sempre o fator que corrompe a
estrutura social.
8 FRONTEIRAS: UMA VISÃO BIOLÓGICA
Atualmente há uma tendência de aceitação para o estudo sociobiológico, eis
que a própria psicologia por si só não consegue explicar totalmente o
comportamento humano. Rotineiramente nos deparamos com problemas e a
solução para estes vem do estrato social, observa-se ainda, que a maioria de
nossos mecanismos biológicos foram criados para solucionar as dificuldades vindas
do ambiente social. Mas também não há como explicar toda agressividade humana
amparado apenas nas ciências sociais.
Algo importante a saber é que boa parte da personalidade tem causas
genéticas, ou seja, 50%, sendo que 5% advém de influências da família, mas o que
dizer dos 45% que resta, ninguém sabe a origem destas consideráveis
porcentagens que influenciam a variação da personalidade do homem, acredita-se
que qualquer evento que foge ao controle do homem pode pesar nos 45%, tais
como posição do feto, doenças gestacionais e as que convalescem a criança nos
primeiros anos de vida, inclusive acidentes na infância, gestos de bondade e de
agressão no convívio familiar, bem como, o meio ao qual se está inserido também é
47
fator importante para acrescer na personalidade humana. Percebe-se que quase
metade da nossa personalidade nos diferencia dos demais, nos tornando seres
únicos e aqui não existe domínio. Fica claro que nestes 45%, do ponto de vista
biológico, situa-se a Sociologia, a grande problemática está em saber quanto a
interação humana contribuiu para formar o todo complexo comportamental de cada
indivíduo, mais ainda, de uma coletividade.
Os neurocientistas tentam explicar como agem os dispositivos genéticos do
homem sem levar em conta o ambiente sócio-cultural, mas ainda não conseguiram
descartá-lo completamente. Osborne Wilson sugere:
A fim de procurar uma nova moralidade baseada numa definição mais fiel
do homem, é necessário olhar para dentro, dissecar a maquinaria da mente
e traçar novamente sua história evolutiva. [...] Existem no cérebro censores
e motivadores inatos que afetam profunda e inconscientemente nossas
premissas éticas; dessas raízes, a moralidade evoluiu como instinto. Se
essa visão estiver correta, logo a Ciência poderá estar em posição de
investigar a própria origem e significado dos valores humanos, dos quais
decorrem todos os julgamentos éticos e muitas das práticas políticas.
(1981, p. 4-5).
Tal ciência analisa as emoções humanas sob a influência do hipotálamo,
como também do córtex pré frontal que exerce papel de destaque na região
cerebral, Outra questão importante a considerar é a o fator hormonal, considerando
que o homem é de 20 a 40 vezes mais agressivo que a mulher, preocupou-se em
avaliar o índice e as alterações que a testosterona provoca no homem, este
hormônio é responsável por grandes mudanças comportamentais no homem em
suas diversas fases da vida, mais facilmente percebida na adolescência onde os
níveis de hormônio triplicam.
A seara hormonal é de muita valia para cercar as violências causadas por
menores infratores que, consideravelmente, terroriza a sociedade.
No clamor de uma sociedade repleta de medos e indignações, muito se
48
discute a redução da maioridade penal, mas este tema está baseado apenas em
argumentos sócios culturais não se valendo das lentes da neurociência.
O período da adolescência é uma fase de grandes transformações e
maturação no indivíduo, em que se vê despreparado para a enxurrada de
hormônios que irá receber e causar mudanças drásticas no seu comportamento e é
nessa fase que alguns vão tecer abominações anti-sociais. Mas, infelizmente o
problema da agressão humana não está somente nos adolescentes, por isso,
evidencia-se que as ciências devem estar de mãos dadas para a resolvimento da
violência que hoje opera negativamente o decoro humano. Para Sun Tzu, uma
guerra se desvenda, atendo-se à: “A garantia de nos tornarmos invencíveis está em
nossas próprias mãos. Tornar o inimigo vulnerável, só depende dele próprio.” (2008,
p. 42).
8.1 A MODERNIDADE SOCIOPATA
Hoje é fácil constatar condutas anti-sociais que freqüentemente agravam o
quadro social devido à ação de psicopatas e de pessoas que adotam formas
psicopatas, porque o meio em que se vive favorece o problema.
A cultura atual é baseada na individualidade, sobressaindo o interesse
pessoal como busca desenfreada à realização material. O desenvolvimento
econômico reformou a forma de ver e sentir o mundo, prevaricando a crescente
ansiedade da realização pessoal, atingindo um contentamento de adquirir somente
para si, na cega visão de não parar nunca, desvinculando-se dos laços afetivos, das
carências do senso de humanidade. Todos os conceitos florescem do retorcido
49
entendimento de valor que se aplica aos dias de hoje, a ideologia cultural da
atualidade social desconhece concepções de solidariedade.
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CONCLUSÃO
O homem que acompanha a evolução desatinada da ordem, também sofre e
se corrompe com as mazelas rotineiras, visto, que com a globalização, conquistou o
poder de estar em diversos lugares ao mesmo tempo, haja vista, as mais
sofisticadas tecnologias existentes, porém, fatores de desvio, impõem abismo entre
a sociedade e o Direito, que assola com burocratização e morosidade. No
acompanhar do descompasso cientifico e a evolução social, algumas ciências foram
deixadas de lado para após ressurgirem do clamor que quase está se concretizando
no “ciclo” natural de Platão. Nesta ótica, requer-se o ensejo de ordenar metas
eficazes que sirvam de provocações para novas políticas de combate a violência.
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