ID: 62026876
26-11-2015
Tiragem: 27481
Pág: 14
País: Portugal
Cores: Preto e Branco
Period.: Diária
Área: 25,50 x 30,00 cm²
Âmbito: Informação Geral
Corte: 1 de 1
Barrigas de aluguer de volta
ao Parlamento. Será desta?
Joana quer ser
mãe. Se for em
Portugal, será
ainda melhor
Saúde. Proposta de alteração à lei apresentada pelo Bloco de Esquerda é discutida hoje
UEOISLAÇÃO Se lei for aprova-
e votada amanhã. Mas ainda há dúvidas. Partido Comunista não tem decisão tomada
ANA MAIA
Em banho-maria há três anos, a
decisão de legalizar a gestação de
substituição -as chamadas barrigas de aluguer-vai hoje a discussão no Parlamento e será votada
amanhã. Esta alteração à lei da
procriação medicamente assistida
(PMA) foi apresentada pelo Bloco
de Esquerda (BE). Será desta que as
mulheres que não podem gerar
uma gravidez por motivos de
doença terão direito a realizar, em
Portugal, o sonho de ser mães?
A resposta é nim. O PS vai apoiar a
proposta do BE, o PSD terá liberdade de voto e a grande dúvida é o
PCP. Até ontem os comunistas ainda não tinham uma posição assumida e podem ter um papel importante na aprovação ou não da proposta.
"Estou na expectativa, mas cautelosa. Se for aprovado será um
passo gigante. Este é um momento
decisivo. Cabe aos deputados arranjar uma solução e não se refugiarem em questões culturais.
O projeto do BE é muito claro: a
gestação de substituição é para
pessoas que precisam por questões
de doença. Há urna solução possível. É como estar doente, haver um
medicamento e não nos darem
acesso a ele. Temos o direito de ser
mães, de ter uma família como os
outros", diz Joana Freire.
Foi ela e uma amiga que no início
do ano passado voltaram a pôr na
agenda a gestação de substituição,
na altura parada há dois anos. Enviaram uma carta para a Comissão
Parlamentar de Saúde, partidos,
Conselho Nacional de PMA.As propostas do PS e do PSD apresentadas
em 2012 acabaram por dar origem a
um texto conjunto, discutido durante meses num grupo de trabalho
criado para o efeito e que contou
como contributo de todos os partidos. Quando deveria ir a votação, o
PSD recuou e o tema foi atirado para
esta legislatura.
Proposta que o PS não apresenta
É esta proposta que o BE leva hoje a
discussão que inclui o alargamento das técnicas de PMA a todas as
mulheres. Esta última seguida pelo
PS, partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) e "Os Verdes" (PEV). A alteração, que apenas o Bloco apresenta, estabelece o recurso apenas
no caso de mulheres sem útero,
como Joana Freire (serão cerca de
1100 nesta situação em Portugal),
ou em casos de doença ou lesão
da, Conselho Nacional de
Procriação Medicamente
Assistida vai acompanhar
o processo das gravidezes
Joana tem 29 anos e nasceu sem
útero. Muitas emoções para gerir,
um processo longo de aceitação. A
expectativa sobre a aprovação da alteração à lei é gerida com enorme
cautela. Explica-se pelos avanços e
recuos dos últimos três anos, que já
a fizeram chorar muitas vezes, mas
nunca desistir de ser mãe. "Há uma
solução para o nosso problema e
não se percebe porque não está disponível. Ter um filho é algo muito
pensado. Estabeleci como limite os
35 anos. Depois dependerá de
como estiver profissional e pessoalmente. Mas se for preciso e tiver dinheiro, vou lá fora. Se fosse em Portugal seria melhor ainda e poderia
ser a minha irmã", diz Joana Freire.
A sua história vai-se cruzando
com a de outras mulheres. Algumas
que aguardam a decisão em Portugal, outras que encontraram lá fora
a solução para realizar o sonho de
ser mães, em clínicas nos Estados
Unidos e na índia. Há outros países
onde é possível recorrer a barrigas
Celebridades colocaram tema na agenda do dia
SERVIÇO Nos Estados Unidos, o recurso à gestação de
substituição é uma das ofertas das clínicas que oferecem serviços para casais heterossexuais ou homossexuais que querem ter filhos. Têm por norma listas de mulheres disponíveis para prestar um serviço
que naquele país é pago. A atriz Sarah Jessica Pinicar
que impeçam a gestação como
adenomiose, cancro, miomas, entre outras situações (ver texto ao
lado). "Queremos ter a certeza de
que a gestação de substituição para
estes casos deixa de ser ilegal em
Portugal. Estamos a propor o alargamento das técnicas de PMA, mas
para algumas mulheres não resolve se quiserem ter um filho biológico. Alterara vai permitir responder
a esta questão dramática", diz ao
DN Moisés Ferreira.
O deputado do BE acredita que
o projeto vai ser aprovado. Mas se
baixar à comissão de saúde antes
de ser votado, possibilidade que
não recusam, garante que não será
outra vez um empurrar para baixo
do tapete. "Os outros partidos têm-se mostrado recetivos a acompanhar o projeto do BE e o PSD trabalhou esta formulação no grupo de
trabalho, pelo que não vejo porque
votará contra. Não fechamos a
(no foto), Nicole Kldman ou Elizabeth Banks são alguns dos nomes famosos que recorreram a barrigas
de aluguer por terem problemas de fertilidade. O cantor Ricky Martin, mesmo antes de assumir que era homossexual, também recorreu à gestação de maternidade, de que resultaram gémeos.
porta de baixar à comissão de saúde sem votação, embora preferíssemos que fosse já votado. Mas se
baixar, o BE quererá colocar um
prazo máximo para voltar a plenário. Não queremos que essa seja
uma técnica para varrer para baixo
do tapete", afirma.
O PSD já fez saber que vai dar liberdade de voto. Tal como o PS,
embora a indicação dada à bancada é que vote a favor de um projeto
que teve origem numa proposta
socialistas e que o PS não quis agora incluir no projeto de alteração à
lei da PMA. "O consenso alargado
diz respeito a quem deve beneficiar
das técnicas de PMA. Esta e a gestação de substituição são duas questão diferentes e quisemos apresentar aquela que acreditamos será
aprovada de imediato. A gestação
de substituição faz parte da proposta do BE, não deixará de ser discutida, e o PS votará a favor. Foi
esta a indicação dada à bancada,
mas há liberdade de voto", diz Pedro Delgado, deputado do PS.
À questão da liberdade de voto
- de que poderá resultar votação a
favor e contra no interior dos dois
maiores partidos na Assembleia junta-se a maior dúvida o que fará
o PCP? Ao DN, a assessoria dos comunistas afirma que "ainda não há
uma posição tomada". O partido
tem votado contra a alteração
à lei sobre o alargamento das técnicas de PMA a todas as mulheres,
mas na última votação sobre gestação de substituição, em fevereiro, quando o PS apresentou a proposta, absteve-se.
Se o PCP votar contra, a iniciativa chumba. Se se abstiver, a porta
fica aberta a qualquer uma das
possibilidades e mais dependente
das decisões individuais de alguns
deputados socialistas e sociais-democratas.
de aluguer. Caso do Brasil, onde a
questão está regulamentada numa
resolução de 1992, ou de Israel, legislada desde 1996, embora falte regulamentação.
A alteração legislativa do BE refere que na gestação de substituição
é proibido qualquer tipo de pagamento à gestante - está prevista
uma pena de prisão até dois anosa não ser compensação de despesas de atos médicos. Tem de haver
uma audição da Ordem dos Médicos e a provação do Conselho Nacional de PMA, que acompanha
todo o processo. O bebé é considerado filho dos beneficiários e um
dos membros do casal tem de dar
material genético. Haverá recurso
a doação, caso seja necessário.
Eurico Reis, presidente do Conselho Nacional de PMA, explica que
"os critérios de escolha da mulher
que suportará a gravidez, assim
como o contrato-tipo que irá estabelecer responsabilidades de decisão, poderá ser feito num despacho
à parte ou pelo Conselho Nacional,
que irá acompanhar todo o processo". Quanto à aprovação, o juiz espera que seja desta. "Esta solução
visa dar resposta a problemas dramáticos, a mulheres que nasceram
sem útero ou que têm um útero disfuncional. Serem privadas da satisfação de ser mães é moralmente
inaceitável. Que solidariedade é
esta das pessoas que recusam?",
questiona.
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Barrigas de aluguer de volta ao Parlamento. Será desta?