Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da Vara dos Feitos da Fazenda Pública e Acidentes de Trabalho da Comarca
da Capital
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por intermédio de seu Representante, no uso de suas
atribuições legais, com base nas peças de investigação anexas, oriundas do procedimento administrativo n º 010/2002/30ª
PJ, da Promotoria de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania e Fundações da Capital, vem perante Vossa Excelência
propor
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
contra
Dionísio Bressan Lemos, brasileiro, casado, Presidente da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de
Santa Catarina, podendo ser encontrado na Rodovia Admar Gonzaga, n º 1.347, no Itacorubi, em Florianópolis;
Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural – EPAGRI, sociedade de economia mista de capital fechado,
representada por seu Presidente, Dionísio Bressan Lemos, com domicílio na Rodovia Admar Gonzaga, n º 1.347, no
Itacorubi, em Florianópolis;
1- DA LEGITIMIDADE ATIVA
O Ministério Público, a par de seu conceito e área de atuação estabelecidos no art. 127, da Carta da República, tem, dentre
as funções institucionais por ela outorgadas, a contida no inciso III, do art. 129 – exercida por intermédio desta actio – , qual
seja:
“Art. 129 – São funções institucionais do Ministério Público:
...
III – Promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de
outros interesses difusos e coletivos;”(grifo nosso).
“Como se viu, a Constituição de 1988 quebrou o sistema anterior em que as ações civis públicas eram conferidas ao
Ministério Público caso a caso, por lei expressa. Em muito a nova Constituição ampliou a titularidade da ação civil pública
para o Ministério Público, destinando-a, agora, à proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros
interesses difusos e coletivos, em disciplina mais ampla do que a que lhe dera a própria Lei n º 7.347/85. A norma de
extensão da Lei n º 7.347/85, que tinha sido vetada, hoje acabou consagrada no texto constitucional, que permite a defesa,
pelo Ministério Público, de outros interesses difusos e coletivos, além dos que expressamente enumerou”(Hugo Nigro
Mazzili, Manual do Promotor de Justiça, 2 ª edição, Editora Saraiva, 1991, p. 498).
De outro lado, a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público tornou irrefutável a legitimação ministerial para a defesa dos
direitos difusos e coletivos, estabelecendo:
“Art. 25 – Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe,
ainda, ao Ministério Público:
...
IV – promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:
a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de
valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e
homogêneos;
b) para anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado
ou do Município, de suas administrações indiretas ou fundacionais ou de entidades privadas de que participem;”.
Neste diapasão, decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
“Processual Civil. Ação Civil Pública. Defesa do Patrimônio Público. Ministério Público. Legitimidade Ativa.
Inteligência do art. 129, III, da CF/88, c/c art. 1 º da Lei n º 7.347/85. Precedente. Recurso Especial não conhecido.
I – O campo de atuação do Ministério Público foi ampliado pela Constituição de 1988, cabendo ao Parquet a
promoção do inquérito civil e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio
ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, sem a limitação imposta no art. 1 º da Lei n º 7.347/85 (Resp n º
31.547-9-SP).
II – Recurso Especial não conhecido” (Resp n º 67.148-SP, Relator Min. Adhemar Maciel, DJU de 04.12.95).
Inarredável, pois, a legitimação do Ministério Público para figurar no pólo ativo da demanda.
2- DOS FATOS
No dia 31 de janeiro de 2002 o Presidente da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural – EPAGRI, Dionísio
Bressan Lemos, fez publicar pelo Órgão de Imprensa Oficial e pela Rede Mundial de Computadores – Internet o Edital de
Concurso Público n º 01/2002 para o preenchimento dos cargos de Agente Técnico Formação Superior III, com diversas
áreas de atuação; Agente Operacional Técnico III, com atuação na área de extensão rural e na de apoio à pesquisa
agropecuária; Agente Operacional Técnico II; Agente Operacional Administrativo I e Agente Operacional Agropecuário I,
relacionados na tabela em anexo, todos do quadro de pessoal da Empresa.
Várias, todavia, foram a ilegalidades que se fizeram introduzir no Instrumento Convocatório 01/2002. A primeira delas diz
respeito a exclusão dos deficientes visuais do processo de seleção.
O item 3.15 do Edital estabelecia:
“3.15 – Os candidatos que necessitarem de condições especiais para a realização de provas deverão protocolar, junto à
Gerência Regional da EPAGRI do Município onde foi realizada a inscrição, até o dia 22 de fevereiro de 2002, requerimento
dirigido a UDESC indicando as condições especiais que necessitam para a realização das provas, anexando ao pedido
cópia de sua ficha de inscrição. A decisão destes requerimentos caberá à própria UDESC.
Logo em seguida, no entanto, o item 3.16 estatuía:
“3.16 – Em função das tarefas a serem executadas pelos ocupantes dos cargos objeto deste Concurso Público, não serão
admitidos pedidos de provas em ´braille´ ou ´leitura de prova´”.
Com isso, o Presidente da EPAGRI subtraiu dos deficientes visuais a possibilidade de acessar aos cargos públicos
licitados, atentando violentamente contra o espírito do art. 37, VIII, da Constituição Federal, tudo sob a frágil alegação de
que há incompatibilidade entre as atividades funcionais relacionadas aos cargos oferecidos e a deficiência visual.
A justificativa em tela, no entanto, não acha amparo nos fatos. Tome-se como exemplo os cargos de Agente Técnico de
Formação Superior I e III, com funções ligadas à gestão e planejamento da informação, análise de sistemas e
administração de redes. De acordo com as informações prestadas pelo Presidente da EPAGRI, em expediente endereçado
a Promotoria de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania, o profissional a ser contratado pela empresa deve: 1) planejar e
estruturar banco de dados corporativos utilizando a modelagem dimensional; 2) dominar e adaptar técnicas para
modelagem da informação; 3) utilizar e adaptar técnicas para transformação, eliminação e organização de dados
operacionais visando atender as necessidades informacionais ou analíticas; 4) dominar técnicas de programação e
desenvolvimento de sistemas de gestão da informação integrada para dar suporte ao nível técnico/estratégico; 5) conhecer
técnicas de gestão de processos; 6) possuir uma visão sistêmica e integrada dos processos empresariais e institucionais; 7)
ter conhecimento sobre a arquitetura de informações da empresa; 8) conhecer e adaptar tecnologias de gestão do
conhecimento e 9) utilizar as tecnologias baseadas na WEB para facilitar a movimentação de informações para dentro e
fora da empresa.
Ora, de pronto se pode vislumbrar a possibilidade de desenvolvimento da função em tela pelos portadores de deficiência
visual. O manejo de todas as ferramentas elencadas pelo próprio demandado pode ser efetuada por deficientes, bastando
para tanto que se proceda as adaptações necessárias, algumas já legalmente obrigatórias. Inimaginável cogitar qualquer
impossibilidade desta estirpe na área da informática, frente a todos os avanços tecnológicos alcançados até aqui. Elenquese aí os computadores comandados pela voz e toda sorte de equipamentos e acessórios destinados a outorgar aos
portadores de necessidades especiais acesso ao mundo globalizado.
Outro exemplo emblemático é o cristalizado no cargo de Agente Operacional Administrativo I. Segundo o Presidente da
EPAGRI, são atividades inerentes à função de auxiliar de escritório: “Dar atendimento ao público; operar microcomputador;
receber, expedir, protocolar e efetuar controle de entrega de correspondências; organizar e manter atualizados os arquivos
de correspondências e documentos; efetuar e atender ligações telefônicas; elaborar material didático para reuniões e
treinamentos, tais como transparências, álbuns seriados e folders exigindo habilidades manuais e certas habilidade para o
desenho; elaborar prestação de contas e efetuar o controle financeiro do escritório; realizar atividades externas (banco,
correio, prefeitura municipal, cartório) (fls. ....)”
Tem-se, pois, também neste caso, que o desempenho das funções de auxiliar de escritório é perfeitamente compatível com
a deficiência visual, desde, é claro, que procedidas as devidas adaptações. Nada há que impeça um deficiente visual de
operar um microcomputador adaptado às suas necessidades ou de atender ligações telefônicas ou de atender ao público
ou de protocolar, expedir e remeter correspondências. O que há, sim, são os obstáculos inerentes à própria deficiência, com
as quais o portador é obrigado a conviver por toda a sua vida. Tais dificuldades, no entanto, quando não tiverem o condão
de inviabilizar o exercício da atividade laboral, não podem servir como escusa à exclusão. Trata-se de dar aplicação prática
às políticas públicas de inclusão dos deficientes no mercado de trabalho gravadas na Constituição Federal e em tantos
outros diplomas legais esparsos.
Mas as irregularidades editalícias não pararam por aí.
Consoante dispunha o item 5.2 do instrumento convocatório, os candidatos aos cargos de Agente Operacional
Administrativo I e Agente Operacional Agropecuário I, além da prova escrita, deveriam ser avaliados através de prova
prática.
De acordo com o item 5.4, as provas práticas seriam realizadas “em ambiente próprio de trabalho relacionado com o cargo,
onde o candidato será avaliado por suas habilidades e conhecimentos práticos para o desempenho do cargo”.
Por fim, o item 5.18 estabelecia:
“5.18. As provas práticas serão avaliadas pelos respectivos aplicadores através dos conceitos APTO ou INAPTO, sendo
considerados aprovados os candidatos que obtiverem o conceito APTO”.
Nenhum critério objetivo para que o candidato obtivesse o conceito apto foi definido pelo edital, de tal maneira que os
aspirantes aos cargos de Agente Agropecuário e Agente Administrativo não possuíam a menor noção dos requisitos que
precisavam preencher para atingir o conceito que lhes traria a aprovação definitiva. A situação assim posta permite afirmar
que toda sorte de subjetivismo na avaliação dos candidatos foi cometida, já que o concurso seguiu seu curso e já teve,
inclusive, publicada a lista de aprovados restando frustrados os objetivos finais do certame.
Tendo sido os deficientes visuais injustificadamente impedidos de participar do certame e não havendo o edital definido
critérios objetivos e rígidos de seleção, foram maculados os princípios da legalidade, igualdade, da impessoalidade e bem
assim da moralidade administrativa, ficando todo o processo eivado de vício insanável.
3 – DO DIREITO
O art. 37, II, da Constituição Federal estatui:
“Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte:
...
II – a investidura em cargo ou emprego público de pende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas
e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as
nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;”
A Magna Carta, em seu art. 37, VIII e a Constituição Estadual, em seu art. 21, V, dispõem, ainda, que “a lei reservará
percentual de cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua
admissão”.
O parágrafo único do art. 1 º da Lei Estadual n º 9.899/95, por sua vez, regulamentou a questão:
“Art. 1 º - ....
Parágrafo único: A deficiência física, auditiva, visual ou mental somente constituirá causa impeditiva para o ingresso no
serviço público estadual, quando se tratar de cargo ou função cujas atribuições essenciais forem consideradas
incompatíveis com o tipo e o grau de deficiência de que é portador o candidato” .
E para determinar a existência ou não de incompatibilidade entre as funções do cargo e o tipo e grau de deficiência de que
são portadores os candidatos, a Lei Estadual criou a Comissão de Assessoramento à seleção, órgão ligado à Secretaria
Estadual da Administração.
À Comissão de Assessoramento, então, guiada pelos critérios insertos no art. 3 º, I, a a d, da Lei n º 9.899/95, quais sejam
as informações prestadas pelo candidato no ato da inscrição; as condições individuais do candidato atestadas através de
perícia médica oficial; a natureza das tarefas e atribuições próprias do cargo e função e a introdução de adaptações no
ambiente de trabalho e nas tarefas a serem desempenhadas, bem como nos métodos, técnicas e instrumentos
empregados, pelos portadores de deficiências, no desempenho das funções inerentes ao cargo ou função, tocava o dever
de definir a compatibilidade entre as atribuições e tarefas inerentes aos cargos a serem providos e a espécie de deficiência
apresentada pelos candidatos do concurso n º 001/2002.
Mas ao invés de acionar a Comissão de Seleção para que a competente análise técnica fosse realizada, nada fizeram os
réus, preferindo inserir já no edital cláusula que, ao arrepio da legislação estadual, impedia injustificadamente o acesso dos
deficientes visuais ao processo público de seleção. Violaram, com isso, o princípio da legalidade.
É sempre bom lembrar a oportuna lição de Diógenes Gasparini: “O princípio da legalidade, resumido na proposição suporta
a lei que fizeste, significa estar a Administração Pública, em toda sua atividade, presa aos mandamentos da lei, deles não
se podendo afastar, sob pena de invalidade do ato e responsabilidade de seu autor. Qualquer ação estatal sem o
correspondente calço legal, ou que exceda ao âmbito demarcado pela lei, é injurídica e expõe-se à anulação" (Direito
Administrativo, 4ª ed., Saraiva, 1995, p. 06).
Maria Sylvia Zanella Di Pietro explica:
"Segundo o princípio da legalidade, a Administração Pública só pode fazer o que a
lei permite; no âmbito das relações entre particulares, o princípio aplicável é o da autonomia da vontade, que lhes permite
fazer tudo o que a lei não proíbe. Essa é a idéia expressa de forma lapidar por Hely Lopes Meirelles (1989:78) e
corresponde ao que já vinha explícito no art. 4º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789: ‘a liberdade
consiste em fazer tudo aquilo que não prejudica a outrem; assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem
outros limites que os que asseguram aos membros da sociedade o gozo desses mesmos direitos. Esses limites somente
podem ser estabelecidos em lei" (in Direito Administrativo, 5ª ed., Atlas, 1995, pág. 61).
E o mestre Hely conclui:
"A legalidade, como princípio de administração (Constituição da República, art. 37, caput), significa que o administrador
público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei, e às exigências do bem-comum, e deles
não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal,
conforme o caso" ((Direito Administrativo Brasileiro, 16ª ed., RT, 1991, p.78).
Ora, havendo os réus relegado os dispositivos insertos nas Cartas Federal, Estadual e na Lei Estadual n º 9.899/95,
vilipendiaram o princípio informador do próprio estado democrático de direito, o da legalidade, ficando estampada a
necessidade de anulação do certame.
Não fora a violação ao princípio da legalidade, há, ainda, o malferimento aos princípios da isonomia, imparcialidade e
moralidade administrativa. Sim, porque ao inserir no edital de Concurso da EPAGRI cláusula exigindo que os candidatos se
submetessem à prova prática, absolutamente órfã de critérios objetivos de avaliação, o Presidente da Epagri, Dionísio
Bressan Lemos, deu margem à perpetração de toda sorte de fraudes.
Como já ensinava Fábio Medina Osório, “Também decorre do controle da moralidade administrativa a exigência de que a
conduta administrativa ‘não deixe dúvidas acerca da conformidade à lei, entendida em seu aspecto substancial, isto é, em
relação à sua finalidade e não apenas à sua forma.
Exige-se, pela via da moralidade pública, não apenas a honestidade e lisura dos atos administrativos. Cobra-se
transparência da atividade pública e dos atos administrativos. A honestidade do administrador, no desempenho de suas
atribuições, deve revestir-se de formalidades tais que não permitam dúvidas a esse respeito.
Concursos públicos, por exemplo, devem ostentar plena aparência de legalidade.” E , mais adiante, conclui: “Não há espaço
para suspeitas nos procedimentos públicos. A mera suspeita, aliás, desde que respaldada em indícios mínimos, traduz
ofensa objetiva ao princípio da moralidade, ainda que o procedimento se adapte às exigências legais
específicas”(Improbidade Administrativa - Observações sobre a Lei n º 8.429/92, Editora Síntese, pág. 214)
E isto, porque o objetivo final do concurso é o de proporcionar a seleção dos melhores, conforme seqüência classificatória,
dentro do contingente de concorrentes habilitados. Para que assim seja, os critérios de avaliação devem ser objetivos e
tendentes a aferir a real aptidão profissional dos candidatos.
“Portanto o mandamento constitucional não é pura formalidade. Se determinado concurso público, ainda que atenda às
formalidade legalmente fixadas, não servir para mensurar e selecionar, não será materialmente um concurso, mas tãosomente aparência de processo seletivo, suscetível de caracterizar desvio de finalidade” (Improbidade Administrativa.
Aspectos Jurídicos da Defesa do Patrimônio Público, Editora Atlas, 3 ª edição, pág. 127).
Como os réus esquivaram-se de definir no seio da norma editalícia critérios objetivos que norteassem a avaliação das
provas práticas, além de impedirem o acesso dos deficientes visuais ao processo seletivo, tem-se que frustraram o objetivo
do processo público de seleção na forma como foi concebido pela Constituição Federal, razão pela qual impende a sua
anulação.
De outro lado, tem-se que o agente público em questão praticou ato de improbidade administrativa.
4 – DO ATO DE IMPROBIDADE
Visando a dar aplicabilidade ao preceito insculpido no art. 37, parágrafo quarto, da Magna Carta, o legislador ordinário
editou, em 02-6-92, a Lei nº 8.429, que "dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de
enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou
fundacional", estabelecendo sanções específicas aos atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento
ilícito (art. 9º), que causam prejuízo ao erário (art. 10) e que atentam contra os princípios da Administração Pública (art. 11).
Os fatos antes descritos amoldam-se às hipóteses de improbidade, dentre as que
atentam contra os princípios da Administração Pública.
O art. 11, V, da Lei Anticorrupção estabelece:
“Art. 11 - Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer
ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, e
notadamente:
...
V – frustrar a licitude de concurso público”
Ora, havendo os réus, como demonstrado acima, violado os princípios da legalidade e da imparcialidade, além de terem
frustrado a licitude de concurso público, mediante a não fixação de critérios objetivos para o exame das provas práticas,
praticaram ato de improbidade, ficando sujeitos à sanções correspondentes.
5- DA LIMINAR
Conforme dimana do disposto no artigo 11, da Lei nº 7.347/85, "Poderá o juiz
conceder mandado liminar com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo" .
In casu, os pressupostos jurídicos para a concessão da medida liminar initio litis, o fumus boni juris e o periculum in mora,
estão sobejamente esparramados nos autos.
Com efeito, o deferimento do pedido preambular, obstando a nomeação dos
candidatos, é medida premente, visto que, a admissão das pessoas aprovadas em certame eivado de incertezas consolida
situação que no futuro, com a eventual declaração de nulidade do concurso, ocasionará prejuízos de grande monta ao
erário com as indenizações àqueles que abandonaram suas antigas atividad es para integrarem-se ao quadro de pessoal
da Empresa. Além disso, a medida previne futura decomposição das atividades da EPAGRI e o tumulto funcional gerado
pela declaração tardia de nulidade do concurso.
A propósito :
"Mandado de segurança. Ação civil Pública. Denegação da liminar. Pressupostos para a sua concessão presentes. Ordem
concedida. "
Uma vez presentes o fumus boni juris e o periculum in mora, deve o julgador conceder liminar em ação civil pública" (Artigo
12, caput, da Lei 7.347/85).
Diante do quadro estampado, impende a concessão de medida liminar inaudita altera pars, a fim de que seja obstada a
nomeação dos candidatos que foram declarados aprovados no certame regido pelo Edital n º 01/2002 da EPAGRI.
6 - DOS PEDIDOS
Diante de todo exposto, REQUER o Ministério público, após o recebimento e a autuação:
a) a citação dos réus para, querendo, oferecer resposta, sob pena de revelia;
b) a produção de todas as provas em direito admitidas;
c) a concessão da medida liminar inaudita altera pars, a fim de que seja obstada a nomeação dos candidatos que foram
declarados aprovados no certame regido pelo Edital n º 01/2002 da EPAGRI;
d) seja ao final julgado procedente o pedido, a fim de que seja reconhecida a nulidade do certame, nos termos do art. 37,
caput, da Constituição Federal combinado com art. 25, IV, b, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, bem como
condenado o réu Dionísio Bressan Lemos nas sanções do art. 12, III, da Lei n º 8.429/92, quais sejam: ressarcimento
integral do dano, se houver, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e
proibição de contratar com o Poder Público ou receber incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que
por intermédio de pessoa jurídica da qual seja s ócio majoritário, pelo prazo de três anos;
e) a condenação do réu no pagamento das custas processuais e demais cominações de estilo.
Dá-se à causa o valor de R$ 200,00 (duzentos reais) para fins meramente fiscais.
Florianópolis, 10 de abril de 2002
Vanessa Wendhausen Cavallazzi Gomes
Promotora de Justiça Substituta
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Concurso público