4 Diário Económico Quarta-feira 29 Março 2006
■ Défice externo em alta
Depois de uma redução registada em
2003, o desequilíbrio externo voltou a recuperar no ano seguinte, estando previsto
um défice de 8,2% do PIB em 2005. Este
agravamento resulta da escalada dos preços do petróleo. Em 2006, o défice deverá
chegar aos 8,8% do PIB.
DESTAQUE
Integração
na união monetária
■ Crescimento induz importações
Entre 2004 e 2005, as importações cresceram acima das exportações. Em 2005,
as compras subiram 2,4%, estando prevista uma aceleração, que resulta da recuperação da economia e do facto de esta
estar assente no investimento, com elevada componente importada.
Reuters
NOTA
ALAN AHEARNE
Investigador do Bruegel
e vice-Dean da Cairnes
School, Universidade
Nacional da Irlanda
Constâncio tem
culpa na crise
Ahearne faz um retrato demolidor da economia portuguesa e diz
que as autoridades, Banco de
Portugal incluído, têm grandes
responsabilidades na crise actual.
No seu ‘paper’ avisa que uma pequena economia como Portugal pode pôr em risco a
zona euro pois os restantes parceiros detém
cerca de 70 mil milhões de euros em activos
nacionais. O risco é assim tão elevado?
Um declínio dos preços dos activos portugueses não ameaça necessariamente a sustentabilidade da União Económica e Monetária. Mas considero que os investidores dos
outros países do euro têm, de facto, uma exposição significativa a Portugal e serão prejudicados no caso de uma grande queda dos
preços dos activos portugueses. Além do
mais, este grau de exposição aumentou de
forma pronunciada após 1999. O que acontece em Portugal importa a toda a zona euro.
Apesar do Plano Tecnológico e da Agenda
de Lisboa, a sua análise sugere que Portugal
vai percorrer um caminho muito difícil nos
próximos anos. Porquê?
A realidade é dura. O restabelecimento da
competitividade internacional é algo que leva
um tempo considerável, por isso o sector ex-
“O ajustamento das contas
públicas e do endividamento
dos privados vai continuar
a deprimir a economia”.
terno vai continuar a arrastar o crescimento
no curto prazo. O necessário ajustamento das
contas públicas e a consolidação do endividamento do sector privado vão continuar a deprimir a economia. Temo que não haja uma
cura mágica. A medicina do ajustamento é
algo que apenas funciona de forma gradual e
requer esforço e compromisso significativos.
Não há outra alternativa.
Frisa que “é desejável uma regulação mais
apertada” nos empréstimos às famílias. As
autoridades, no caso concreto o Banco de
Portugal, poderiam ter ido mais longe nesse trabalho preventivo?
Uma regulação mais forte nos empréstimos poderia ter desempenhado um papel
mais útil na altura da entrada na UEM, quando as taxas de juro reais estavam a cair para os
níveis da zona euro. Esta redução de taxas aumenta o risco de bolha no crédito como, retrospectivamente, parece ter acontecido em
Portugal. As autoridades teriam agido bem
se tivessem lutado contra esses ‘booms’, ainda que, claro, seja notoriamente difícil identificar a formação dessas bolhas. Políticas mais
restritivas e prudentes de regulação poderiam ter impedido o forte crescimento do
crédito que Portugal experimentou após a entrada no euro e o consequente ajustamento.
Mas hoje, felizmente, a situação está a evoluir
no bom sentido. ■ L.R.R.
Como Portugal
foi o país mais
prejudicado da
zona euro com
a subida da taxa
de câmbio real,
o início do ajustamento terá de
ser via preços.
Portugal é um risco
sério para o euro
INVESTIDORES DO RESTO da zona euro detém 70 mil milhões de
euros em activos nacionais, uma “exposição” que disparou desde 1999.
Luís Reis Ribeiro
[email protected]
Aeconomiaportuguesaconstitui um risco significativo e
crescente para os restantes países da zona euro na medida em
que os investidores dessas economias detém qualquer coisa
como 70 mil milhões de euros
emactivosnacionais,comopor
exemplo depósitos ou obrigações (dívida externa líquida). A
conclusão é de Alan Ahearne,
investigador do Bruegel, um
dos centros de estudos económicos mais influentes junto da
Comissão Europeia, que, em
entrevista ao DE (ver ao lado),
não iliba sequer o Banco de
Portugal da actual situação de
sobreendividamento da economia e avisa que a recuperação
da competitividade vai ser um
processo duro e prolongado.
Em Fevereiro, o economista irlandês assinou, juntamente
com Jean Pisani-Ferry, o director do Bruegel, um ‘paper’ intitulado “The Euro: only for the
agile”, onde conclui que, no
curto prazo, Portugal só tem
uma saída para restaurar a
competitividade internacional
e sair da actual crise: como foi o
país mais prejudicado da zona
euro com a subida da taxa de
câmbio real (crescimento no-
O que pode fazer o Plano
Tecnológico pela economia?
■ A principal bandeira eleitoral
EXPORTAÇÕES
de José Sócrates – o Plano
de produtos de alta tecnologia
Tecnológico – não deve ser
suficiente para colocar a
economia portuguesa numa rota
de crescimento. Esta é a opinião
do professor de Economia do
MIT, Olivier Blanchard. Para este investigador, o Plano
Tecnológico é pouco eficaz para que o país atinja as metas
desejadas de maior crescimento da produtividade e da
competitividade. Esta posição crítica, transmitida por Olivier
Blanchard, contrasta com a opinião de Vítor Constâncio, que
defende a inovação tecnológica como forma de resolver
aqueles problemas. O governador do Banco de Portugal e o
investigador do MIT não se entenderam também quanto à
solução dos salários nominais, que Olivier quer ver reduzidos.
11,4%
minalmaisoefeitodainflação),
o início do ajustamento terá de
ser via preços – moderação salarial – e através de um aumento da concorrência nos mercados de bens e serviços de forma a que a inflação nacional
caia para um nível inferior ao
da média da zona euro.
Tal como defendeu recentemente o economista do MIT,
Olivier Blanchard, a situação é
tão grave que a resposta imediata à crise não pode passar
por medidas de mudança es-
trutural, como as que figuram
no Plano Tecnológico e na Estratégia de Lisboa.
Em todo o caso, argumentam
os autores do Bruegel, “não
pode haver outra solução que
não seja o longo e duro golpe
do ajustamento estrutural”.
Alan Ahearne, que também é
professor de Economia da
Universidade National da Irlanda, responsabiliza depois os
decisores nacionais por alguns
erros cometidos. Segundo o
investigador, as autoridades,
como o Banco de Portugal, deveriam ter enveredado por
“políticas mais restritivas e
prudentes de regulação” para
“impedir o forte crescimento
do crédito que Portugal experimentou após a entrada no
euro”, factor que contribuiu
para agravar o desequilíbrio
externo da economia”. O saldo
negativo das balanças corrente
e de capital (défice externo)
está a caminho de 9% doPIB,
segundo as últimas previsões
do Banco de Portugal. Para
Ahearne, a componente da dívida externa líquida é um bom
indicador do grau de exposição dos restantes países do euro face a Portugal. E frisou que
este aumentou de forma notória desde 1999, ano em que o
escudo ficou irrevogavelmente ancorado ao euro.
No ‘paper’, os dois economistas observam que as dificuldades de um país individual da
zona euro, mesmo de uma pequena economia como Portugal, “afectam” os restantes parceiros. Tendo em conta o nível
de integração dos mercados financeiros, se o risco de um
país sobe, a “riqueza” detida
por terceiros (neste caso, os 70
mil milhões de euros), no exterior, sairá significativamente
prejudicada. ■
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