Proibida a Venda
setembro/2013
Edição Especial nº 17
Como
diminu
desigu ir a
na escoaldade
la
melhor
a
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os
uma publicação
proibida a VEnda
Como
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na escuoaldade
la
melhora
o dese r
de tod mpenho
os alunos
os
Apresentação
sEtEmbro/2013
Edição EspEcial nº 17
Índice
uma publicação
Edição especial sobre a pesquisa da
Fundação Victor Civita (FVC) Análise
das Desigualdades Intraescolares no
Brasil, realizada em parceria com
o Itaú BBA e a Fundação Itaú Social
e concluída em setembro de 2013.
Coordenador
Romualdo Portela de Oliveira
Bom desempenho para
todos os alunos
Artigo
Elba Siqueira de Sá Barretto
Propostas para a escola
A equidade desde a sala de aula
Equipe
Adriana Bauer
Brunno Gastaldo
Carolina Caldeira
Carolina Mazzarello
Carolina Mie Takaya
Elaine Garcia Minuci
Fabio Lisauskas
Fernando Vizzotto
Gabriela Rossi Vianna
Malena Xavier Carvalho
Marcelo Fazolli
Maria Gabriela da Silva
Maria Paula Ferreira
Marina Biela
Nathalia Cassettari
Renata Zimbarg
Tais Koslakowski Patrício
4
9
10
Propostas para a Secretaria
Políticas que não deixam
ninguém para trás
Entrevista
Romualdo Portela de Oliveira
14
18
EDIÇÃO ESPECIAL COMO DIMINUIR A DESIGUALDADE NA ESCOLA
E MELHORAR O DESEMPENHO DE TODOS OS ALUNOS
Fundada em 1985
Victor Civita
(1907-1990)
ROBERTO Civita
(1936-2013)
Presidente: Victor Civita Neto
Diretora Executiva: Angela Dannemann
Conselheiros: Victor Civita Neto, Giancarlo Francesco
Civita, Roberta Anamaria Civita, Beatriz Gerdau Johannpeter,
Fábio Barbosa, Claudio de Moura Castro, Jorge Gerdau
Johannpeter, Manoel Amorim e Marcos Magalhães
Diretora de Redação: Maggi Krause
Diretora de Arte: Manuela Novais Coordenadora Pedagógica: Regina Scarpa
Editora: Paola Gentile Editora de arte: Renata Borges
Repórteres: Aurélio Amaral e Karina Padial Colaboraram nesta edição:
Bianca Bibiano (reportagem) e Sidney Cerchiaro (revisão) Gerente de Projetos:
Mauro Morellato Analista de Planejamento e Controle Operacional:
Kátia Gimenes Processos Gráficos: Vitor Nogueira
A edição especial COMO DIMINUIR A DESIGUALDADE NA ESCOLA
E MELHORAR O DESEMPENHO DE TODOS OS ALUNOS
é uma publicação da área de Estudos e Pesquisas da Fundação Victor Civita,
([email protected]).
A R Fernandez Gráfica Ltda.
Rua Dona Ana Neri, 768 - Cambuci - CEP 01522-000 - São Paulo / SP
Parceiros
3
Apresentação
4
0
1
2
3
4
número de alunos
5
número de alunos
É quando todos os alunos têm
resultados parecidos. Isso, na prática,
é impossível de acontecer, pois
sempre há algum grau de diferença.
6
7
8
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1
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10
nota
1
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3
10
nota
Enquanto os brancos têm nota 7, a maioria
dos negros não chega ao patamar desejado (5).
NSE alto
10
nota
9
10
1
2
3
4
5
6
7
8
9
Alguns alunos se destacam, mas isso não tem
relação com o NSE. Todos têm nota perto de 7.
10
nota
Homens
0
nota
NSE baixo
0
2
5
Há uma desigualdade pequena dentro dos grupos, mas a média entre eles é parecida.
Todos atingem os patamares mínimos. É o ideal a ser perseguido por todas as escolas.
É o que em geral acontece em escolas
cujo público tem características
socioeconômicas semelhantes. Apesar
de haver alguns alunos com bom
desempenho, um grupo grande
não atinge o mínimo estabelecido.
1
4
equidade
10
nota
Desigualdade em uma escola
homogênea
0
3
1
2
3
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5
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7
8
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nota
Mulheres
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9
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Gráficos Mário kanno
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2
número de alunos
2
1
Brancos
0
nota
Boa parte dos alunos com alto NSE tem nota 8,
mas a média dos mais pobres gira em torno de 4.
1
Negros
0
nota
NSE baixo
0
número de alunos
O
NSE alto
número de alunos
Igualdade
número de alunos
Não. A equidade admite desigualdade
desde que não provocada por fatores
externos. Entenda os conceitos com
base no seguintes exemplos:
0
que caracteriza uma boa escola? Antes
de tudo, ela cumpre com o compromisso de que os alunos aprendam. Com base nesse raciocínio, médias elevadas nas avaliações
seriam um bom termômetro da qualidade.
Mas, e se na composição da média houver alguns poucos com ótimas notas e muitos com
aprendizagem insatisfatória? Essa instituição
pode ser considerada tão boa quanto outra cuja
média é a mesma, porém sem grande variação
entre os estudantes? Provavelmente não. Afinal,
menores diferenças nos resultados internos são
também um indicador de qualidade na Educação, pois significa que nenhum aluno está
ficando para trás (veja os exemplos ao lado).
Acontece quando um grupo – do mesmo nível socioeconômico (NSE), raça, gênero ou outro –
tem desempenho semelhante, mas a comparação entre eles aponta disparidades.
número de alunos
Aurélio Amaral
desigualdade em uma escola heterogênea
número de alunos
Estudo aponta caminhos para
reduzir a desigualdade de
resultados na escola
Equidade
é o mesmo
que igualdade?
número de alunos
Bom
desempenho
para todos
os alunos
nota
O recorte por sexo não revela diferenças entre os
grupos. Ambos atingem as expectativas mínimas.
5
Apresentação
influências positivas
A pesquisa
está
disponível na
íntegra em
www.fvc.org.
br/estudos
É claro que sempre haverá aqueles que se
distanciarão da média, para mais ou para menos. O problema é que essas diferenças acontecem em grande número nas instituições
brasileiras e, pior, se devem a fatores externos
à escola, como gênero, raça e nível socioeconômico. As estatísticas confirmam que, no
país, estudantes brancos, do sexo feminino e
de famílias com mais renda e anos de estudo
se saem melhor do que negros, do sexo masculino e filhos de pobres e analfabetos. Isso
acontece porque não há equidade, ou seja,
não são dadas as oportunidades de aprendizagem adequadas a todos (leia ao longo da
reportagem algumas ideias sobre o conceito).
“Um sistema educacional
equitativo é aquele que possui
três características, a saber:
1) os estudantes são levados
a produzir de acordo com seu
potencial (independentemente
de sua classe social, lugar de
residência, gênero ou etnia);
2) as necessidades de todos
os estudantes são supridas; e
3) há suporte para que a maioria
dos estudantes alcance
resultados ‘robustos’. ”
Laura Perry, professora da
Universidade de Murdoch, na
Austrália, no artigo Características
de Sistemas Educacionais Equitativos:
uma Análise Transnacional
6
A proporção dos alunos
que atingem ou superam
os níveis adequados é maior
nas instituições em que:
As condições de ensino (acesso a
materiais, infraestrutura) são boas.
As famílias se envolvem na
rotina escolar.
40%
40%
35%
Más
condições
Boas
condições
Os alunos têm bom relacionamento
entre si e com os professores.
39%
Bom
relacionamento
36%
Mau
relacionamento
Para começar a entender essas desigualdades,
é preciso lembrar que crianças e jovens de nível
socioeconômico baixo já apresentam mais dificuldade de acesso à Educação. Além disso,
mesmo quando a matrícula é garantida, o aproveitamento do ensino é influenciado por fatores externos – como viver em ambiente de alta
vulnerabilidade e ter pouco contato com a
cultura escrita e com manifestações artísticas,
entre outros. Cientes dos fatores que levam a
um baixo desempenho, a escola e a rede devem
37%
Pouco
envolvimento
Bastante
envolvimento
Há critérios para alocar professores
nas turmas com mais dificuldades.
41%
38%
Com critério
Sem
critério
trabalhar para superá-los, fazendo com que os
menos favorecidos tenham condições de atingir o mesmo patamar de aprendizagem dos
mais privilegiados.
Quanto melhor a média,
maior a desigualdade
Mas como alcançar a equidade? Essa questão
norteou a pesquisa Análise das Desigualdades
Intraescolares no Brasil, coordenada por Romualdo Portela de Oliveira, professor da Fa-
“Um sistema justo garantiria
limites mínimos abaixo dos
quais ninguém deveria ficar:
é o caso do salário mínimo,
da assistência médica,
dos benefícios elementares
que protegem os mais fracos
da exclusão total. Na verdade,
essas garantias visam
limitar os efeitos dos
sistemas meritocráticos
cuja mecânica muitas
vezes leva à manutenção
ou mesmo à acentuação
das desigualdades.”
François Dubet, sociólogo
e professor da Universidade de
Bordeaux II, na França, no livro
O Que É uma Escola Justa
culdade de Educação da Universidade de São
Paulo (USP), e encomendada pela Fundação
Victor Civita (FVC), em parceria com a Fundação Itaú Social e o Itaú BBA. O estudo apontou que os critérios de alocação dos professores e o clima escolar estreitam a distância de
resultados, entre outros fatores (leia o quadro
ao lado). As conclusões são fruto da análise das
notas de Matemática da Prova Brasil de 2009
de escolas públicas urbanas e de um questionário aplicado em 252 instituições, sendo 108
no município de São Paulo, 53 na cidade do
Rio de Janeiro e 91 em outros municípios.
Nas duas capitais, os resultados também
foram filtrados segundo critérios geográficos.
Constatou-se que as instituições localizadas
na periferia apresentaram resultados mais
homogêneos, apesar de baixos. As localizadas
em regiões centrais ostentaram melhores no-
7
Apresentação
O termômetro
da desigualdade
A pesquisa usou como metodologia o Índice
de Homogeneidade entre Escolas (IHEE),
que leva em consideração a variância de
resultados dos estudantes em relação à média
da escola. Quanto maior o intervalo entre
os melhores e os piores alunos, mais alta
é a variância. Em seguida, compara-se a escola
à rede na qual está inserida. Se a relação
for menor que 1, ela terá menos desigualdade
que a rede. Caso contrário, será mais
heterogênea. O exemplo abaixo, do município
de São Paulo, mostra que as instituições
localizadas na periferia tendem a apresentar
menos desigualdade, porém piores resultados.
12,7%
Na
periferia
20,6%
66,8%
20,7%
Nas regiões
centrais
56,7%
Mais heterogêneas que a rede
(índice superior a 1,05)
Desigualdade semelhante
à da rede (índice entre 0,95 e 1,05)
Mais homogêneas que
a rede (índice inferior a 0,95)
8
22,7%
tas, porém mais desigualdade (leia o quadro ao
lado). Isso acontece porque longe do centro se
atende a um público de perfil semelhante –
que reúne as características de fragilidade citadas anteriormente –, enquanto nas unidades
das áreas mais privilegiadas há uma maior
mistura de status social.
“As disparidades entre bairros são muito
mais claras nas grandes concentrações urbanas.
Existe uma segregação tanto do ponto de vista da demanda – pois o público da periferia é
basicamente de nível socioeconômico baixo
– como do da oferta, já que a infraestrutura
em zonas periféricas tende a ser mais precária”,
afirma Mariane Koslinski, professora adjunta
da Faculdade de Educação da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisadora da rede Observatório das Metrópoles, na
capital fluminense.
De nada adianta resultados igualitários, porém medíocres. A equidade pressupõe também
uma perspectiva de melhoria dos indicadores.
“Se o desempenho é homogêneo, mas aquém
do esperado, isso significa que as oportunidades não estão sendo plenamente garantidas.
Os resultados encontrados nas escolas localizadas na periferia deixam isso bem claro”, afirma Romualdo (leia a entrevista na página 18).
Para alcançar uma Educação equitativa, as
Secretarias de Educação precisam investir em
políticas compensatórias, como a fixação de
professores e gestores experientes nas escolas
com notas mais baixas (conheça outras medidas
na reportagem na página 10). Cabe também aos
diretores e coordenadores pedagógicos promover as ações que estão a seu alcance, como
atribuir as turmas de acordo com o perfil dos
docentes (leia a reportagem na página 14).
Artigo
Elba Siqueira de Sá Barretto
é professora da Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo (USP) e consultora da
Fundação Carlos Chagas (FCC), em São Paulo
É preciso dar mais
a quem tem menos
O
Brasil tende a oferecer um ensino precário às populações com menor poder
de pressão social. Paradoxalmente, culpam-se
os alunos e suas famílias pelo desempenho
ruim, desconsiderando que a eles foi oferecida a mais pobre das educações. A demanda
por equidade nas políticas educacionais visa
reverter essa situação, de modo a oferecer
condições de aprendizagem segundo as necessidades de cada um. Isso significa dar mais
a quem tem menos.
Algumas providências têm sido tomadas,
como levar livros didáticos às escolas rurais e
à Educação de Jovens e Adultos (EJA). Projetos foram lançados para atender as demandas
educacionais de grupos menos favorecidos. É
o caso do Mais Educação – que dá incentivos
para a implementação da jornada integral em
instituições com baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) – e o programa que destina repasses à formação continuada e à melhoria da estrutura física das
escolas em comunidades quilombolas.
Porém há ainda um longo caminho a percorrer. Falta ousadia para destinar mais verbas
e recursos humanos para áreas vulneráveis.
Não faz sentido tratar todas as unidades da
rede igualmente, pois algumas sofrem mais
com carência e absenteísmo de professores e
uma rotina em que são frequentes os atrasos
e a dispensa de alunos. Nessas instituições,
dedica-se mais tempo à manutenção da disciplina do que ao ensino propriamente dito.
Não basta, portanto, ampliar o período de
permanência na escola: é preciso oferecer
boas condições de ensino.
Para tanto, as políticas compensatórias necessitam de coragem e de continuidade. Iniciativas como um adicional para quem trabalha em locais de risco ou com turmas com
defasagem de rendimento não costumam se
manter por muito tempo nem dar resultado.
Serão efetivas as que assegurarem o melhor
provimento e a estabilidade do corpo docente nas regiões vulneráveis e as que endossarem
um projeto consistente de valorização profissional, com planos de carreira e salarial.
Apesar da importância de dar atenção às
áreas excluídas, a formação de docentes e
gestores deve garantir oportunidades de
aprendizagem em todas as escolas, e não apenas em localidades mais pobres. Afinal, mesmo nas regiões de nível socioeconômico mais
elevado, os estudantes que povoam as classes
de recuperação têm o mesmo perfil: são do
sexo masculino, pobres e negros. Mudar esse
cenário é imprescindível para que o país tenha, de fato, uma Educação de qualidade.
foto marina piedade
9
Propostas para a escola
Garantir a formação
continuada
A equidade
desde a
sala de aula
Conheça as medidas que
garantem oportunidades de
aprendizagem para todos
Bianca Bibiano
A
lcançar a equidade é uma tarefa que
cabe a todos os educadores do sistema.
Parte dela, portanto, cai nas mãos dos gestores
escolares, que detectam, com base nas avaliações feitas pelos professores, as diferenças de
nível de aprendizagem.
Muitas iniciativas apontadas pela pesquisa
como eficientes se relacionam com processos
pedagógicos e não implicam gastos financeiros. Cultivar um ambiente propício à aprendizagem, combater as diferentes formas de
discriminação, incentivar a colaboração entre estudantes com bom desempenho e os
com dificuldade são medidas essenciais para
que as notas melhorem sem que ninguém
fique para trás. Algumas delas são bastante
eficientes e consistem em aproveitar melhor
os recursos materiais e humanos que toda
escola tem e as relações entre os alunos.
10
Designar o docente
de acordo com
o perfil da turma
A pesquisa mostrou que
os resultados tendem a ser
mais igualitários nas escolas
em que o diretor leva em
consideração o perfil e a
experiência do professor ao
designá-lo para determinada
turma. Infelizmente, o mais
comum é a atribuição ser
definida pela antiguidade:
quem tem mais tempo de
atividade profissional tem
preferência na escolha das
turmas – e optam pelas mais
“fáceis”. Com isso, os novatos
acabam assumindo desafios
para os quais nem sempre
estão preparados, o que vai
comprometer o desempenho
da turma no futuro. “Cabe ao
diretor tomar essas decisões
com base no perfil dos
profissionais que ele tem na
equipe. Os grupos em que há
mais alunos com dificuldades
devem ser assumidos pelos
professores com mais anos
de prática”, afirma Ocimar
Alavarse, professor da Faculdade
de Educação da Universidade
de São Paulo (USP). Uma turma
de 1º ano, por exemplo, requer
um professor especialista em
Alfabetização ou com bastante
experiência nessa área. Já um
grupo do 6º ano – em que a
tendência é ter alunos novos
chegando de outras instituições
por causa da mudança de
segmento – demanda um
professor com boa capacidade
de avaliação diagnóstica
para detectar lacunas na
aprendizagem que precisam ser
supridas. Em instituições onde
há alta rotatividade – problema
que foge da alçada
do diretor –, é mais difícil
mapear as características da
equipe para estabelecer os
critérios de atribuição. Ainda
assim, toda a documentação
sobre aprendizagem e o
histórico de evolução das turmas
pode ajudar na distribuição dos
profissionais entre as classes.
A experiência do docente
influencia no desempenho da
turma. Porém, é preciso refletir
constantemente sobre a prática
e os conhecimentos didáticos
conforme as necessidades dos
alunos vão aparecendo. Saber
ensinar de diferentes maneiras
quando parte da classe não
aprendeu, promover a inclusão
de todos nas atividades propostas
e dar atenção especial a quem
mais necessita são habilidades
que têm de ser repensadas e
compartilhadas com os novatos.
Essas orientações vêm do trabalho
atento de um coordenador
pedagógico bem formado
– tarefa que cabe à rede (leia
a reportagem da página 14).
Ele necessita do apoio do diretor
para garantir tempo e espaço
para o horário de trabalho coletivo
e assegurar a participação dos
professores. Nesses momentos
são discutidas as dificuldades
encontradas em sala de aula
e se buscam as soluções para
os problemas de ensino – o que
vai impactar no resultado final
de cada aluno. “Sem uma rotina
de reuniões de formação, fica
difícil lidar com a heterogeneidade
e elaborar estratégias para superar
o baixo desempenho”,
diz Elisangela Scaff, da Faculdade
de Educação da Universidade
Federal da Grande Dourados
(UFGD), no Mato Grosso do Sul.
11
Propostas para a escola
Tornar a lição de casa um hábito
Formar turmas diversificadas
A escola deve tomar cuidado especial
ao separar os alunos por turma, para não
acentuar as desigualdades. Usar a nota
como critério, por exemplo, leva
à criação de classes “fortes” e “fracas” – e
esse abismo tende só a aumentar quando
a escola deposita expectativas apenas nos
melhores. De acordo com Fátima Alves,
pesquisadora da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), a
divisão por idade também acaba revelando
uma segregação, considerando que uma
classe com concentração de alunos mais
velhos que a média da turma apresenta
mais problemas de desempenho.
Contudo, ter bons parâmetros para
nortear essa distribuição pode contribuir
para a equidade, já que a pesquisa prova
que em classes heterogêneas há mais
chance de todos avançarem.
Em vez de colocar os bons alunos e os que
necessitam de apoio em grupos distintos,
é mais proveitoso que eles trabalhem
juntos (leia o quadro abaixo).
Criar agrupamentos produtivos
Os critérios de divisão das turmas servem
também na organização da sala para
o trabalho em grupo. Para a socióloga
Maria Lígia de Oliveira Barbosa, autora
do livro Desigualdade e Desempenho: uma
Introdução à Sociologia da Escola Brasileira,
os docentes pecam ao desconsiderarem
a heterogeneidade, planejando a aula
em função apenas dos estudantes com
mais facilidade. Esses alunos geralmente
recebem mais atenção do que os com
baixo desempenho, que ocupam o fundo
da sala e fazem poucas perguntas. “Um
professor bem formado tem estratégias
12
A lição de casa tem um papel importante
no processo de aprendizagem.
É o momento em que o aluno, sem
a supervisão do professor, desenvolve
a autonomia, pratica as habilidades e
sistematiza os conhecimentos.
De acordo com Gisela Wajskop, consultora
em Educação, ela deve ser obrigatória e
corrigida em sala de aula, para ajudar a
consolidar a aprendizagem e contribuir
na socialização das soluções dos
problemas entre os colegas.
Além disso, as tarefas ajudam
os professores e coordenadores
pedagógicos a avaliar o ritmo em que
os alunos estão avançando e diagnosticar
aqueles que precisam de mais atenção.
Dessa forma, o professor, com a ajuda
do coordenador pedagógico, pode planejar
atividades específicas para que esse
grupo avance. Por ser realizado fora
da escola, o dever de casa deve também
ser pauta das reuniões de pais.
Esclarecer os objetivos, a quantidade
de atividades e a periodicidade ajuda
a envolver as famílias no processo.
Melhorar o clima escolar
para quebrar essa organização e incentivar
a participação de todos”, afirma a
pesquisadora. A sugestão é montar grupos
nos quais os alunos que já avançaram
em determinado conteúdo ajudem os
que ainda têm dúvidas. Essa formação
pode estar em constante mudança,
de acordo com os objetivos. Quando
a maioria já está segura em relação
aos conhecimentos, é possível oferecer
atividades para que eles trabalhem com
autonomia, enquanto se propõe reforço
para os que ainda apresentam dificuldade
– preferencialmente no contraturno.
Vítimas de qualquer tipo de preconceito
– social, racial ou de gênero – têm mais
dificuldade em se reconhecer como parte
do grupo, o que as desmotiva
e leva à reprovação e ao abandono.
“A discriminação é enraizada inclusive
nas práticas pedagógicas. Um exemplo:
os comportamentos esperados nas séries
iniciais – asseio, letra bonita, obediência –
privilegiam a socialização das meninas
e prejudicam os rapazes”, explica
Romualdo Portela de Oliveira,
coordenador da pesquisa. A solução é
investir em atividades que valorizem a
diversidade e a tolerância. Cabe ao gestor
dar o primeiro passo para melhorar as
relações interpessoais, demonstrando
confiança na capacidade profissional dos
docentes, acreditando no potencial dos
alunos e incentivando-os a alcançar novos
desafios. “Enquanto não se depositar altas
expectativas sobre todos, a parcela menos
privilegiada não conseguirá avançar”, diz
Ilona Becskeházy, consultora em Educação.
Ela aponta a infraestrutura como um fator
importante para o clima: “Um prédio
bem conservado e equipado faz com
que os estudantes se sintam acolhidos”.
13
Propostas para A SECRETARIA
Políticas que não deixam
ninguém para trás
É dever da rede criar
condições para combater
as desigualdades
Karina Padial
A
equipe gestora não está sozinha no esforço de reduzir a desigualdade de desempenho dos alunos. Essa responsabilidade
também cabe à Secretaria de Educação. Afinal,
ela tem o poder de tomar medidas que envolvem a aplicação de recursos e impactam todas
as escolas da rede.
Romualdo Portela de Oliveira, coordenador
da pesquisa, afirma que os investimentos financeiros são imprescindíveis para atingir a
equidade. Um exemplo: é impossível pensar
em medidas que visem a redução do número
de estudantes por classe – ação que favorece
um acompanhamento individualizado dos
alunos – e a promoção de atividades de reforço sem que o poder público aumente o orçamento e a rede contrate mais docentes ou amplie o número de estabelecimentos de ensino.
Outras decisões, no entanto, não exigem gastos, mas apenas uma reorganização da gestão
de recursos humanos. Conheça, a seguir, sete
iniciativas que podem ser tomadas pela rede.
14
Definir as expectativas
de aprendizagem
Quando a rede estabelece o que os alunos
precisam saber ao final de cada ano
ou ciclo e as habilidades essenciais a ser
desenvolvidas nas diversas disciplinas,
a escola tem mais clareza para construir
o projeto político-pedagógico (PPP),
que vai definir as prioridades do processo
de ensino e aprendizagem. Um PPP bem
executado ajuda a reduzir a desigualdade
de desempenho entre os alunos à medida
que serve de parâmetro para a atuação dos
professores e para discutir experiências e
ações de curto, médio e longo prazos que
impactam diretamente na aprendizagem
de todos. Para Binho Marques, secretário
de Articulação com os Sistemas de Ensino
do Ministério da Educação (MEC), além
das expectativas de aprendizagem, a rede
tem de formular um currículo comum,
com base no qual a escola define os
conteúdos que serão trabalhados, levando
em conta a realidade local.
Formar os coordenadores pedagógicos
A igualdade na oferta de oportunidades
de aprendizagem depende diretamente
da maneira como o professor ensina.
A formação continuada, portanto, é
indispensável para atingir a equidade.
Cabe à Secretaria de Educação garantir
a presença do coordenador pedagógico
nas instituições e dar as condições
para que ele exerça bem o cargo. A
pesquisa O Coordenador Pedagógico e
a Formação Continuada de Professores:
Intenções, Tensões e Contradições, da FVC
(disponível em abr.io/pesquisacp), revelou
que 31% dos coordenadores entrevistados
não conseguiam ajudar os professores
a cumprir as metas nem sabiam a
melhor maneira de se firmar como
líder. Tendo em vista essas dificuldades,
a rede deve planejar programas que
atendam as necessidades do dia a dia
desse profissional. São conteúdos para
essa formação a elaboração de pautas
produtivas para os horários de trabalho
coletivo e o aprimoramento de estratégias
que ele usa, como a observação da prática
docente. Cursos oferecidos pela rede são
bem-vindos, mas Patricia Mota Guedes,
especialista em Educação da Fundação
Itaú Social, em São Paulo, defende que
o acompanhamento seja feito por um
supervisor também na escola. “Assim,
os formadores identificam as demandas
e ajudam a promover intervenções
que impactem na aprendizagem.”
Qualificar os diretores
Quando um diretor assume o cargo,
ele tem na bagagem a experiência
pedagógica, porém nem sempre a
administrativa. Por isso, a rede tem
de desenvolver planos específicos
de formação para preencher essa
lacuna, contemplando conhecimentos
relacionados à liderança, à capacidade de
lidar com o coletivo e com a comunidade
em geral e à gestão de orçamento,
materiais e espaços. Devem constar dos
programas também as estratégias de
relacionamento com alunos, professores
e pais, favorecendo a melhoria do
clima escolar (leia a reportagem da
página 10) e o acompanhamento do
trabalho pedagógico desenvolvido pelo
coordenador e pelos docentes. Outra
sugestão é instituir grupos de estudos
e incentivar o compartilhamento de
experiências, a fim de difundir boas
estratégias para atenuar as desigualdades.
15
Propostas para A SECRETARIA
Instituir o reforço escolar
Fixar os professores e gestores nas escolas
A rotatividade do corpo docente preocupa
os gestores. Sem políticas para mantê-los
nas escolas, é muito difícil avançar
no programa de formação. Por isso,
Ocimar Munhoz Alavarse, professor da
Faculdade de Educação da Universidade
de São Paulo (USP), propõe políticas
de bônus salarial que beneficiem quem
está há mais tempo em uma instituição,
trabalha em regiões com baixo nível
socioeconômico ou com turmas que
apresentam desempenho precário.
Critérios de alocação com base na
experiência profissional também contam.
Escolas com turmas de alfabetização,
por exemplo, receberiam docentes mais
experientes. Outra medida interessante
é a implantação de tutoria em que
os profissionais veteranos são estimulados
a acompanhar os novatos por no mínimo
um ano, ajudando-os na elaboração do
planejamento, assistindo as aulas
e discutindo com eles questões relativas às
dificuldades dos alunos.
Fixar o gestor no cargo é igualmente
importante. Os pesquisadores norteamericanos Philip Hallinger e Ronald
Heck concluíram que quanto maior a
permanência do diretor na instituição,
mais democrático é o estilo de liderança
e menor é a variação dos índices de
aprendizagem dos alunos.
Não dá para esperar até o fim do ano
para ajudar os alunos com desempenho
abaixo do ideal. Por meio do reforço,
os estudantes que precisam de apoio
têm a oportunidade de retomar
os conteúdos com novas atividades
e estratégias de ensino. A instituição
é responsável por organizar esses
momentos. No entanto, a criação
de políticas e de estrutura para que os
alunos permaneçam mais tempo na escola
– no horário regular e no contraturno –
e a contratação de professores para atuar
nesse atendimento são iniciativas da
Secretaria de Educação para contemplar
todas as unidades. Sem esses
requisitos, corre-se o risco da implantação
de um esquema improvisado, com
docentes voluntários e sem capacitação
e a adesão opcional dos alunos – o que
não é eficaz. Já a seleção dos alunos
que participarão do reforço deve ser
feita pela escola, com base nas avaliações
internas e nos registros dos professores.
Rever os critérios de matrícula
Estender a jornada de trabalho
Em um cenário ideal, todas as Secretarias
teriam professores com regime de 40
horas semanais e dedicação exclusiva.
Na pesquisa Trabalho Docente na
Educação Básica no Brasil, realizada pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (Inep),
em 2010, um terço dos mais de 664 mil
docentes entrevistados avaliaram que a
extensão da carga horária contribuiria
para melhorar a qualidade do trabalho.
“Profissionais fixos têm horário previsto
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para participar da formação em serviço
e dos compromissos institucionais, além
de terem a oportunidade de conhecer
melhor a comunidade e as dificuldades
dos alunos”, observa Pedro Ganzeli,
diretor da Associação Nacional de Política
e Administração da Educação – Seção
São Paulo (Anpae/SP). Além disso, a
dedicação exclusiva facilita a implantação
do reforço escolar (leia o item a seguir),
que geralmente esbarra no desafio da
contratação de horistas para a função.
A pesquisa revelou que o desempenho
é pior em escolas nas quais os estudantes
têm um perfil socioeconômico mais
homogêneo. A diversidade cultural do
público atendido impacta positivamente
na redução da desigualdade de
desempenho. Isso acontece porque
bons alunos servem de exemplo à
turma, estimulam outros a melhorar
o rendimento e podem colaborar no
processo de aprendizagem dos colegas ao
serem estimulados a realizar monitoria e
participar de trabalhos em grupo. Mariane
Koslinski, professora da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), defende
que a diversidade seja garantida já no
processo de matrícula. Mas essa não é
uma equação fácil de resolver. Nas redes
onde os pais escolhem a instituição
de preferência, as famílias com mais acesso
à informação são favorecidas -- e isso
faz com que as unidades mais procuradas
criem mecanismos de seleção, velados
ou não, o que é proibido em algumas redes.
Nos sistemas em que a matrícula está
vinculada ao local de moradia,
a homogeneidade acontece principalmente
em regiões mais pobres – e é fato que
as localidades mais vulneráveis apresentam
resultados mais baixos nas avaliações.
Um formato misto, de escolha controlada,
seria uma solução possível. Os pais
listariam opções, mas a rede faria a
distribuição dos alunos com base também
em variáveis como a proximidade
geográfica e as condições socioeconômicas.
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entrevista Romualdo Portela de Oliveira
“Foco nas notas
acentua as
desigualdades”
Para melhorar a média nas avaliações externas,
a escola acaba priorizando – erradamente – os
alunos que já têm bons resultados
Bianca Bibiano
Q
uestões de gênero, classe social e raça
são consideradas predominantes quando se tenta explicar a diferença de níveis de
aprendizagem entre os alunos. A pesquisa
conduzida por Romualdo Portela de Oliveira,
professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), mostra que as
escolas que atendem a alunos de classes menos
favorecidas – e que apresentam, portanto, um
público de perfil semelhante – tendem a ter
desempenho pior e mais homogêneo. Já as que
recebem um alunado mais diversificado apresentam resultados melhores, porém mais desiguais. “Parece que o progresso nos indicadores acaba incrementando a desigualdade já
existente e, com isso, ampliando a perversidade social”, afirma Portela. Nesta entrevista, o
pesquisador explica por que as análises feitas
para detectar a qualidade de uma escola não
se devem restringir apenas a dados de avaliações
externas, como o Índice de Desenvolvimento
da Educação Básica (Ideb).
Em que medida a melhora na nota do Ideb
pode levar ao aumento da desigualdade?
Romualdo Portela de Oliveira Isso acontece
porque é mais fácil aumentar a média investindo só nos alunos melhores, já que eles aprendem mais rapidamente. Lidar com os estudantes com baixo desempenho, que é o necessário
para ter equidade, dá trabalho, pois exige reforço escolar, acompanhamento individual e formação para os professores lidarem com as particularidades, entre outras ações.
Como avançar na qualidade da Educação
sem que isso provoque disparidades?
Notas mais altas não devem ser o único objeti-
vo a ser perseguido. O Ideb, usado como régua
nacional de qualidade, só mede dois parâmetros: o índice de aprovação e o desempenho
na Prova Brasil em Matemática e Língua Portuguesa. Ao tomar por base apenas a média
nas avaliações, a instituição está desconsiderando o grupo de alunos que vai mal, pois ele
se dilui no número final. O problema é que
existe uma pressão pelo aumento do Ideb, pois
ele está ligado ao repasse de recursos das Secretarias de Educação, à inclusão em alguns
programas do governo federal e ao pagamento de bônus para professores e gestores.
Que critérios poderiam ser adotados?
Primeiramente, incorporar a equidade aos
indicadores. O Idesp (Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo) tem uma
iniciativa nesse sentido: as escolas com muitos
estudantes abaixo do patamares mínimos de
aprendizagem são penalizadas, motivando
assim os gestores a olhar para quem tem mais
dificuldade. Depois, criando processos que
levem a uma reflexão mais ampla de Educação.
Uma instituição que não educa o estudante
para a participação democrática, por exemplo,
não cumpre um de seus objetivos, que é formar
cidadãos. O respeito às diferenças e a capacidade de trabalhar em grupo são pré-requisitos
para o mercado de trabalho e para a vida social
– e não constam dos indicadores.
Como essas ações seriam avaliadas?
Todo padrão é um pouco arbitrário, inclusive
a nota: estipulou-se que uma determinada
pontuação é satisfatória e outra não. No caso
da equidade, é necessário discutir com as Secretarias de Educação para definir o que é a
“Sugiro que os
parâmetros de
qualidade levem
em conta, além
do desempenho,
o percurso para
chegar até ela.”
oferta de igualdade de oportunidades de aprendizagem e traçar objetivos a ser alcançados a
curto, médio e longo prazos. Sugiro que os
parâmetros de qualidade levem em conta, além
do desempenho, o percurso para chegar até
elas. Deve-se considerar a presença de insumos
– as condições oferecidas pela rede, que mudam
de acordo com cada realidade – e adotar processos avaliativos das ações empreendidas pela
equipe gestora, ou seja, o que ela faz para transformar os insumos em bons resultados.
Alguns autores afirmam que a desigualdade
é aceitável desde que um mínimo seja garantido a todos. O senhor concorda?
Sim, algum grau de diferença é tolerável, pelo
fato de que ter 100% de bom desempenho é
impossível. No âmbito escolar, entretanto, essa
diferença deve se apresentar de maneira aleatória. De forma alguma ela pode ser creditada
a características do indivíduo ou a fatores externos à instituição, mas apenas à capacidade
ou ao esforço de cada um.
foto marina piedade
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Como diminuir a desigualdade na escola melhorar o desempenho