SARTRE E VYGOTSKY: A COMPREENSÃO DOS PAIS SOBRE A INFÂNCIA DE
SEUS FILHOS1.
Vébora G. Duarte Antunes2; Zuleica Pretto, Msc.3
INTRODUÇÃO
Como expõe Ariès (1981) o final do sec. XIX e o sec. XX imprimiram uma
grande mudança na compreensão de infância. Com o processo de escolarização (separação da
criança e do adulto) e mudanças no entendimento de casamento e família (um lugar de
negociações e conveniência para um lugar de afeição e amor), a infância tomou outra
significação; de uma fase insignificante no decorrer da vida para uma fase fundamental na
constituição dos sujeitos e dos grupos, assumindo posição importante na organização social e
afetiva das pessoas. Tal centralidade foi reforçada pela explosão, no séc. XX, com um
crescente no séc. XXI, da produção de conhecimento científico sobre a infância, de profissões
voltadas a ela e de ações no âmbito legal e político na forma de políticas públicas e
legislações preocupadas com a infância. Compreende-se a infância como fase existencial em
que o sujeito se constitui e será parte integrante de suas ações no mundo, portanto, uma fase
importante a ser esclarecida tanto no senso comum como no âmbito de estudos científicos.
Pretendeu-se explorar conceitos de dois autores, Sartre e Vygotsky, que possibilitam pensar a
infância numa perspectiva do materialismo histórico dialético, entendendo-a como produto e
produtora da realidade social. Para Vygotsky (1989), o funcionamento psicológico humano é
construído ao longo da vida através de um processo de interação do homem com seu meio
físico e social, o qual lhe dá possibilidades de se apropriar dos significados culturais
elaborados pelas gerações anteriores. Isso faz da cultura parte constitutiva da natureza
humana, já que sua característica psicológica se dá através da internalização dos modos
historicamente determinados e culturalmente organizados. Para Sartre (1970), “somos o que
fizeram de nós”, cabe-nos então, fazermos uma escolha a respeito “do que fizeram de nós” o
que ocorre a partir das ações que o sujeito realizar no mundo (SCHNEIDER, 2002). Assim,
conforme o campo de possibilidades e a partir dele, dentro de um processo mediado pela
cultura, aparece o caráter psicológico de um ser, o qual busca por meio da reflexão de si,
crítica ou não, se posicionar diante das situações para ele apresentadas.
Palavras Chave: Infância. Sartre e Vygotsky. Materialismo histórico dialético.
1
Pesquisa desenvolvida a partir de recursos provenientes de bolsa de pesquisa e extensão art.170, do Governo
Estadual de Santa Catarina (Constituição Estadual).
2
Vébora G. Duarte Antunes - Graduanda do Curso de Psicologia (UNISUL) [email protected].
3
Zuleica Pretto – Professora, Ms e Psicóloga (UNISUL) [email protected].
MÉTODO
Com base numa metodologia qualitativa e de caráter explicativo, teve-se como
delineamento o estudo de caso, e como coleta de dados, realizou-se entrevistadas de livre
estruturação com quatro cuidadores, selecionados a partir de um levantamento das fichas de
atendimentos realizados no Serviço de Psicologia UNISUL de pais e mães de crianças que
estivessem em atendimento psicológico, independentes de comporem um casal. Os contatos
foram realizados na sala de espera do Serviço de Psicologia, onde quatro sujeitos, duas mães e
dois pais aceitaram o convite em participar do estudo. Utilizou-se a técnica de análise de
conteúdo, através da elaboração de categorias a posteriori, definidas conforme os objetivos da
pesquisa. Organizou-se categorias que versaram sobre constituição do sujeito a partir da
infância. As temáticas analisadas foram embasadas na fundamentação teórica já desenvolvida
e outros materiais pertinentes mantendo relação com os objetivos geral e específicos.
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Os resultados obtidos com a análise dos dados possibilitaram conhecer as
discussões da temática pesquisada tendo como objetivo principal a compreensão dos pais
sobre a infância vivida por seus filhos. Os principais aspectos identificados foram: “a
constituição das características psicológicas dos filhos”; “as questões de gênero em relação à
compreensão da infância dos filhos”; “as atividades consideradas importantes no cotidiano
dos filhos”; “a importância da família na infância dos filhos”; “a importância da rede social
(escola, amigos, comunidade) na infância de seus filhos” e “compreensão sobre paternidade e
maternidade”. Por fim foi possível investigar os fenômenos sociais presentes nas relações
familiares das figuras parentais sobre a compreensão da infância e as interpretações dos
sujeitos acerca desses fenômenos. As famílias, comumente representadas pelas figuras
paternas e maternas, tornam-se uma mediação fundamental na constituição da vida das
crianças, na medida em que possibilitam um campo de possibilidades existenciais de toda
ordem: orgânica, econômica, cultural, política, ideológica, comportamental e afetiva. As
teorias sartreana e vygotskyana proporcionaram relevantes subsídios para respaldar
intervenções e pesquisas na área da infância no complexo cenário da contemporaneidade.
CONCLUSÃO
A partir da fundamentação teórica desenvolvida e dos dados coletados para
análise foi possível compreender que os participantes pais e mães entrevistados tem
expectativas quanto ao papel desempenhado sócio-culturalmente pela mãe como cuidadora,
que está sempre presente, a que ama e ensina as principais coisas aos filhos. Enquanto o pai
tem o papel preponderante de provisão do lar e dos filhos. Entretanto, o que se verifica é que
tanto pais quanto mães precisam trabalhar fora de casa e esses papéis estão se modificando,
transcendendo. Como consequências disto, os filhos precisam de outros cuidadores, os quais
podem ser estendidos aos cuidados recebidos na escola. Verificou-se que com a entrada da
mulher no mercado de trabalho, o homem passou a se envolver com os afazeres domésticos e
o cuidado com os filhos e por isso transcendendo seu papel social. A atribuição dos pais a
constituição das características psicológicas dos filhos está relacionada às experiências
vivenciadas nas situações e também ao receber as mediações por parte dos pais, fatos que
marcam as ações do ser no mundo frente ao aprendizado que se apresenta sócio-culturalmente
e permeiam sua história de vida. Como sugestões para novas pesquisas, ressalta-se a
importância de continuar estudando as relações estabelecidas entre família e gênero, podendo
estender a outros integrantes da unidade familiar, como as crianças, para obter também o
olhar infantil e sua compreensão sobre sua infância e sobre as figuras paternas. Diante das
inúmeras configurações e organizações familiares, que ultrapasse os conceitos e estruturas de
noção de famílias como naturalizadas. O intuito em continuar a estudar sobre o tema é o de
promover preparo para pais e demais ciências, como medicina, pedagogia, direito e as demais
que fazem parte do cuidado de nossas crianças.
REFERÊNCIAS
ARIÉS, Philippe. História Social da Criança e da Família. 2a Edição. LTC: Rio de Janeiro,
1981.
SARTRE, Jean Paul; FERREIRA, Vergílio. O existencialismo é um humanismo. 3. ed.
Lisboa: Presença, 1970.
SCHNEIDER, D. R. A liberdade enquanto aspecto essencial do homem. In: Novas
Perspectivas para Psicologia Clínica em Estudo a partir da Obra “Saint Genet: Comedian Et
Marty” de Jean Paul Sartre. Tese de Doutorado defendida no Programa da Pós - graduação em
Psicologia Clínica da PUC-SP, São Paulo, 2002.
VIGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins fontes, 1989.
FOMENTO:
O trabalho teve a concessão com financiamento de recursos do programa de
Pesquisa de Iniciação Científica do Art.170, do Curso de graduação em Psicologia, da
Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL.
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