Oficina de Teatro da Escola E.B. 2 e 3 da Gafanha da Encarnação
Frei João sem Cuidados (adaptado)
Personagens (14)
Costureiro
Frei João
Moleiro
Capuchinho Vermelho
Lobo Mau
Anões
Rei
Rainha
Princesa
Pajem
Ministro
Aias
I acto
No palácio real, na sala do trono.
Rei (falando só) – Só tenho preocupações... Isto de ser Rei tem muito que se lhe diga...Ufa!...
Ninguém está satisfeito...Finalmente tenho um pouco de sossego para reflectir... Falaram-me
dum homem, um tal Frei João... que...
Rainha (entrando nervosíssima, acompanhada das suas Aias)- Chamai o costureiro da corte, senhor
meu marido! Depressa! Não tenho nada para vestir!...Por favor, senhor, não tenho roupa que
me sirva!... O costureiro, o costureiro! Há dois dias que não vem ao palácio, assim não pode
ser!...
1ªAia – Ai, minha rica Senhora!... Acalmai-vos! Sois tão elegante!...
2ªAia – Não vos enerveis, Senhora, o stress não é nada bom para a pele...
Rainha – Stress? Stress? Isso é moda no reino de Inglaterra? Onde aprendeste isso, criatura?
1ªAia – Saiba Vossa Senhoria que é um mal que só afecta as grandes Damas da
Corte...(orgulhosa) Lemos na “Rainha Activa”, página 14, se não me engano...
2ª Aia – É super-interessante, é. Vossa Senhoria devia ler a “Rainha Activa”... Mas só lê a
“Caras Reais”...
Rainha (interrompendo)– Bem, bem, isso agora não interessa. O costureiro, Senhor meu
esposo! O costureiro!
1ª aia – Talvez puxando aqui e esticando deste lado...
2ª aia – Sim... Encurtando aqui e alargando aqui...
Rainha – Deixai-me em paz, criaturas! Ide já tratar dos meus aposentos! (Aias saem) O
costureiro! O costureiro!
Rei – Ai, ai...Lá vêm os problemas do costume... Calma, senhora! Aguardai, que mandarei
chamar imediatamente o costureiro da corte. Pajem!
Pajem – Sim, Majestade?
Rei – Chama o costureiro! Que venha imediatamente, temos um assunto gravíssimo para ele.
Pajem – Sim, Majestade...
Rainha – Que não tarde! Que não tarde!
Princesa – Minha mãe, andava à vossa procura para que me tirásseis uma dúvida de FísicoQuímica...
Rainha – Ai, minha filha, agora não tenho tempo. É precisamente por causa da Física que me
aflijo... O calor dilata os corpos e o meu físico precisa de cuidados...
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Princesa – Bem, vou perguntar ao Aladino... Talvez com a sua lâmpada... me ilumine as
ideias.
(entra o costureiro)
Costureiro(efeminado)– Vossa Senhoria mandou chamar-me? Ai, que vida a minha! Não tenho
1 minuto de descanso...
Rainha – Claro que vos mandei chamar! Não vedes como está este vestido?
Costureiro – Tratarei imediatamente do assunto, Real Senhora. Que belas cores tendes
hoje!(à parte) Se emagrecesse uns quilitos seria mais fácil, mas enfim...
Rainha – Que dizeis??
Costureiro (disfarçando)– Nada, nada, Real Senhora, falava com os meus botões...
Rei – Pois... Defeito de profissão...
Rainha – Acompanhai-me aos meus aposentos. Vinde.
(A Rainha e costureiro saem)
Rei – Quando acabarão as minhas aflições?!... Preciso de falar com o tal Frei João que,
segundo dizem, não se aflige com nada. Pajem! Paaa... (é interrompido pela chegada dum dos
seus ministros)
Ministro (vénia) – Permiti-me, Alteza.(esfregando as mãos, preocupado) Temos problemas no
reino.
Rei – Mais um problema, só me faltava mais isto... Dizei...
Ministro – São os impostos! O povo está descontente, embora eu não perceba porquê... Cada
vez têm melhores serviços de carruagens e carroças e nunca estão satisfeitos!...
Rei – Mas de que se queixam, ministro?
Ministro – Do imposto para passar duma aldeia para outra... Onde já se viu? Uma
ninhariazita... Só têm de pagar 200 quilos de feijão e 200 de batata...
Rei – De facto... Não me parece nada de importante... Além disso, podem sempre atravessar o
rio a nado ou às costas das mulas...
Ministro – Exactamente, Alteza! Povo ignorante, é o que é... Até do aumento do preço da
palha se queixam...
Rei - Agora deixai-me que estou à espera da solução para todas estas aflições.
Ministro – Sim, Alteza. (Sai, com uma vénia)
Rei (passeando dum lado para o outro) - Um homem que não se aflige com coisa nenhuma!
Sempre quero ver! Evitava-me rugas e cabelos brancos, olarila! Oxalá não demore.
Princesa – Meu pai, vede que bela maçã me ofereceu uma simpática velhinha que encontrei.
Rei – Minha filha, já sabes que essas maçãs te fazem mal...Põem-te a dormir durante 100 anos
e agora não dá jeito nenhum. Não podes faltar à escola, já devias saber.
( a Princesa olha para a maçã e, encolhendo os ombros, dá uma trinca e sai, saboreando com agrado)
Pajem – Majestade, chegou Frei João Sem Cuidados...
Rei – Manda-o entrar, manda-o entrar, imediatamente!
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Pajem – Sim, Majestade.
Frei João (inclinando-se) – Aqui estou, Real senhor!
Rei – Sabes porque te mandei chamar ao meu palácio?
Frei João – Eu não, Majestade! (admirado) Não imagino o que possa querer de mim, um
humilde frade. Mas estou às suas ordens, Majestade!
Rei – E vieste assim descontraído?...Sem aflições?
Frei João – Quem não deve não teme, porque havia eu de afligir-me?!
Rei (aparte) – Começo a acreditar que temos homem! (dirigindo-se a Frei João) Então és tu a
criatura que não se aflige com coisa nenhuma, não é verdade?
Frei João – Bem... tenho resolvido todos os problemas que me surgem... Não tenho
preocupações...
Rei – Homem feliz! Outro tanto não posso eu dizer...
Frei João – O quê?! Vossa Majestade não é feliz?...
Rei – Neste palácio só há aflições. A rainha aflige-se, porque engordou com a idade e nada lhe
serve. Os meus ministros afligem-se, porque o povo não quer pagar mais impostos. Como vês,
estou entalado entre aflitos e aflições...
Frei João – Não fazia ideia, mas começo a perceber...
Rei – Por isso te mandei chamar. Queria conhecer o homem que não se aflige com coisa
nenhuma...Mas vamos a ver, vamos a ver...Preciso de tirar a prova dos nove!
(Rainha entra de repente)
Rainha – A prova? Sim, sim, preciso provar o meu manto novo! Mas esse costureiro foi ao
palácio aqui ao lado... e nunca mais chega!...
Rei – Senhora minha esposa, estais a interromper assuntos de Estado.
Rainha – Mas... as minhas vestes são assuntos de Estado! E o meu stress? Sabeis o que é
andar em stress?
Rei (impaciente)– Senhora...
Rainha – Parece-me que ouço uma carruagem, tenho de ir, tenho de ir! (sai)
Frei João – A prova dos nove, Majestade?
Rei – Sim, a prova dos nove. Preciso de ter a certeza que isso não é só fama. Que é mesmo
verdade! E vou propor-te um enigma.
Frei João – Sou todo ouvidos, Majestade!
Rei – Assim espero! Assim espero, porque se não mo souberes decifrar no prazo de três dias...
(ligeira pausa) Mando-te matar!
Frei João – Matar?!...A mim?!
Rei – Sim, a ti, se não souberes: 1º- quanto pesa a Lua; 2º - quanta água tem o mar; 3º - o que
é que eu penso.
Frei João (gaguejando) – S-sim, Sim, Majestade, c-com certeza, m-Majestade!
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Rei – E agora podes retirar-te. Daqui a três dias espero-te com a resposta. Lembra-te que o
caso é de vida ou de morte! (dirigindo-se ao pajem) Pajem! Acompanha Frei João!
Pajem – Sim, Majestade.
II Acto
(Rei fica imóvel e surge um cartaz onde se lê: “NA ALDEIA”)
Frei João (pensativo e falando para si próprio) – Vivia eu feliz sem preocupações e agora uma
destas!... Ora a minha vida! Eu sei lá quanto pesa a Lua e o que é que o Rei pensa. Pensa em
dar-me cabo do canastro, é o que é...
Capuchinho Vermelho – Olá! O senhor sabe dizer-me o caminho para casa da minha avó?
Acho que me perdi...
Frei João (confuso) – Desculpe, minha menina...mas... mas...
Lobo Mau – Ó miúda, vamos embora daqui. Nós não somos desta história! Que trapalhona!...
(saem e entra a Moleiro)
Moleiro (satisfeita) – Boas tardes, senhor Frei João! Mas... que é isso? Que tem vossa senhoria
que está com cara de quem tirou nível 2 no teste de Matemática?!
Frei João – Se lhe parece! Nascem-me aflições debaixo dos pés!
Moleiro– Ora essa! Então como é isso, senhor Frei João? Que lhe aconteceu?
Frei João – Ai, deixe-me cá, homem! Imagine que o Rei me mandou chamar para me propor
um enigma...e, se no prazo de 3 dias, não o adivinhar, manda-me...MATAR!
Moleiro– Ora, ora, senhor Frei João, o mundo é uma bola, em 3 dias dá muita volta... Mas
afinal qual é o enigma?
Frei João – Olhe, não sei se é enigma se é sentença de morte...
Moleiro– Pelos vistos o caso é sério e está metido em trabalhos!...
Dois anões(cantando) – “Eu vou...Eu vou...Pró trabalho agora eu vou...”
Frei – Mas que trabalhos! E para perceber esta peça ainda pior... Mas como é que eu hei-de
saber, se não sou sábio, nem bruxo, nem andei na E.B. 2 / 3 da Gaf. da Encarnação, quanto
pesa a Lua, quanta água tem o mar e o que é que ele pensa?!
Moleiro– Ah! Ah! Ah! Deixa-me rir!... E com isso se aflige, senhor Frei João?! Ah! Ah! Ah!
(aparte) Na E.B. 2/3 ando eu, ora…
Frei – Então não havia de me afligir, homem? (aborrecido) Páre lá com a risota, porque a mim o
caso não me parece para rir, mas para chorar!
Moleiro– Qual chorar, nem meio chorar! Nem pense nisso! E deixe as aflições para trás das
costas que quem vai ao palácio sou eu. Daqui a três dias, só tem de me emprestar o seu
hábito, e pode ficar descansado que para isto é que eu tenho aulas de Teatro...
Frei – Ó homem, mas você sabe ao que se arrisca?! Não, não posso consentir!
Moleiro– Não arrisco coisa nenhuma. Tenha confiança! Vá à sua vida, vá à sua vida, senhor
Frei João, que eu vou à minha!
Frei – Mas...
Moleiro– Aqui não há mas, nem meio mas. E nada de aflições, deixe isso comigo. Santas
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tardes, senhor Frei João, santas tardes! (Saem os dois)
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III Acto
(Cartaz onde se lê: 3 DIAS DEPOIS...NO PALÁCIO
O Rei move-se novamente)
Rei (impaciente e dirigindo-se ao pajem) – Então, ainda não chegou Frei João Sem Cuidados?!
Pajem – Ainda não, Majestade...
Rei – Já tarda... já tarda! E queria eu uma receita para aflições! Deve estar encolhido a um
canto, cheio de medo!... Um homem que não se aflige com coisa nenhuma é algo que nunca
se viu...
Princesa – Meu pai, quero mostrar-lhe as minhas notas. Vede, por favor!
Rei – Ai, minha filha, tu és a única que não me dá preocupações. Mas agora deixa-me falar
com Frei João, sim?
Princesa – Claro, meu pai. Vou estudar para subir (apontando para a folha) este nível 5!! (sai)
Pajem (introduzindo o Moleiro vestido de frade) – Majestade, está aqui Frei João.
Rei – Ah!... Que entre! Que entre! (dirigindo-se à Moleiro) Gosto de te ver com esse ar tão
satisfeito! Vejo que não te dei dores de cabeça!
Moleiro– Real Senhor, toda a meada tem uma ponta...a questão é saber-lha encontrar...
Rei – Bem, bem...Já vejo que não deixas créditos por mãos alheias! Lábia tens tu... Mas vamos
ao que importa. Vamos lá a saber quanto pesa a Lua...
Moleiro–Todos sabem que tem quatro quartos. Ora ¼ são 250 gramas, por isso não pode
pesar mais de 1 quilo.
Rei – Boa resposta, sim senhor! Mas... não estás ainda livre de trabalhos... Quero, agora, que
me digas quanta água tem o mar...
Moleiro– Isso é muito fácil de saber. Mas como Vossa Majestade só está interessado em água
salgada, primeiro tem que mandar tapar todos os rios, porque sem isso nada feito.
Rei – Finório, espertalhão me saíste, Frei João! Mas não está tudo resolvido!... Não me digas
que a última pergunta não te deu cuidados?!
(Rainha entra de repente, com as vestes curtas ou muito apertadas)
Rainha – Senhor meu esposo, vede em que estado me deixou o costureiro!... Vede! Como não
hei-de eu andar mal dos nervos?...
Rei – Senhora, perdoai, mas agora não. Estou a tratar de assuntos importantíssimos.
Rainha – Mais importantes do que o meu visual? Não acredito no que ouço...Não acredito...
(retira-se, resmungando)
Rei – Voltemos ao nosso assunto: a última pergunta não te deu cuidados?
Moleiro– Cuidados?! Não me deu cuidados nenhuns. Tenho a resposta na ponta da língua!
Rei – Ai sim? Garganta não te falta... Pois sempre quero ver isso! Vamos lá então saber o que
é que eu penso?
Moleiro(rindo) – Ora, que há-de Vossa Majestade pensar?!... Pensa que está a falar com Frei
João Sem Cuidados e tem estado a falar com o Moleiro!
Rei – Bem, pelo menos, não estou a falar com os Anões nem com o Capuchinho Vermelho ou
o Lobo Mau... Sabe-se lá quem mais entraria na nossa história... (saem os 2, rindo, abraçados)
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