Vasco António da Cruz Gonçalves Catequese de Adultos para repensar a pastoral da Igreja em Portugal Lisboa Universidade Católica Editora 2011 Índice Prefácio................................................................................................................ 7 Introdução............................................................................................................ 9 A Catequese de Adultos num mundo em mudança. Desafios à Igreja Portuguesa................. 15 1.A Catequese de Adultos em tempos de mudança.............. 15 Capítulo 1 1.1.A mudança sociocultural e novos tempos................. 15 1.2.A nova autocompreensão eclesial. O Vaticano II e a Catequese de Adultos.................... 44 2.A perda do contexto propício à evangelização. Desafios à mudança............................................................ 64 3.A Catequese de Adultos na Igreja portuguesa após o Vaticano II................................................................ 67 3.1.Os documentos do magistério português sobre a catequese e formação cristã dos adultos....... 71 3.2.O variado panorama das formas e modelos de Catequese de Adultos em Portugal....................... 74 4. Prioridade à Catequese de Adultos..................................... 79 Capítulo 2 Os documentos da CEP e a reflexão teológico-pastoral sobre a Catequese de Adultos............................................. 83 1. À procura de um novo modelo de Catequese de Adultos...... 84 1.1.A mobilidade como desafio à catequese 2.Os documentos da Conferência Episcopal Portuguesa....... 88 2.1.Análise dos documentos no quadro de um novo modelo de pastoral............... 84 1.2. À procura de uma verdadeira conversão pastoral...... 86 da Conferência Episcopal Portuguesa........................ 91 3. Reflexão teológico-pastoral sobre a Catequese................. 116 3.1. José Policarpo, a reforma catequética em Portugal e a conversão missionária da catequese................... 117 3.2. Sergio Lanza e a perspectiva «cultural»................... 121 3.3.André Fossion e a inculturação da catequese.......... 128 3.4. Emilio Alberich e a comunicação da fé hoje............ 132 4 | Catequese de Adultos 3.5. Propostas e experiências que realizam 3.6. Perspectivas para um novo modelo o novo paradigma de catequese............................... 135 de Catequese de Adultos.......................................... 145 4. Coordenadas fundamentais............................................... 148 4.1.A Catequese de Adultos num novo modelo pastoral..148 4.2.A Catequese de Adultos deve pressupor uma primeira evangelização..................................... 150 4.3.Uma Catequese de Adultos de iniciação................. 152 4.4. Catequese de Adultos centrada na Comunidade Cristã............................................. 154 4.5.A Catequese de Adultos num Projecto Pastoral da educação cristã em perspectiva evangelizadora..... 157 4.6.Outras perspectivas.................................................. 161 4.7. Catequese de Adultos, terminologia e identidade... 161 Para uma reflexão teológico-pastoral sobre a Catequese de Adultos......................................... 165 1.Uma fundamentação da Teologia Pastoral....................... 165 Capítulo 3 1.1.A incidência do Concílio Vaticano II....................... 166 1.2.O objecto da Teologia Pastoral................................. 170 1.3.O método de discernimento teológico-pastoral...... 191 2.A Catequese de Adultos na acção evangelizadora da Igreja............................................................................. 206 2.1. Natureza e funções no âmbito do processo de evangelização................................... 209 3.A Catequese de Adultos como tema teológico-pastoral... 213 3.1.Um caminho de reflexão.......................................... 218 3.2.A Catequese de Adultos e a projectualidade pastoral..................................... 238 Capítulo 4 A Catequese de Adultos e a Família............................. 245 1.A família num novo modelo de pastoral e catequese....... 245 1.1.As condições culturais e sociais em que vivem as famílias......................................... 247 1.2.A transmissão da fé na família: a tradição e os documentos do magistério................................ 253 1.3.A família, lugar da transmissão da fé....................... 268 1.4. Formas de Catequese Familiar................................. 273 Índice | 5 2. Catequese Familiar, características e perspectivas............ 277 2.1. Experiências de Catequese Familiar......................... 278 2.2.Uma catequese com adultos, enquanto pais........... 281 2.3. Catequese Familiar, uma forma de Iniciação Cristã....284 3. Para uma Catequese Familiar em Portugal....................... 290 3.1. Motivar e evangelizar os pais................................... 292 3.2. Por ocasião da preparação para a Primeira Comunhão...................................... 294 3.3. Estruturada em quatro tempos................................ 294 3.4. Segue o ritmo dos catecismos nacionais da Iniciação Cristã da Infância................................ 296 3.5. Critérios para um novo modelo de catequese......... 304 Conclusão......................................................................................................... 307 Bibliografia....................................................................................................... 313 Anexo 1............................................................................................................ 333 Anexo 2............................................................................................................ 341 Prefácio A Catequese de Adultos, como nos recorda o P. Vasco António da Cruz Gonçalves, vigário episcopal da diocese de Viana do Castelo para a catequese, é hoje um elemento chave da nova evangelização. Para o observador atento, a cultura religiosa em Portugal sofreu ao longo das últimas décadas, um abalo tectónico. Deslocaram-se ou desapareceram referências multisseculares à mensagem evangélica e, para largos sectores da população, a mundividência católica deixou de coincidir com a identidade e o projecto da Nação. As razões são múltiplas, mas entre elas contam-se a mudança de regime político, o alargamento da escolaridade obrigatória, o fortalecimento do tecido industrial, o crescimento da malha urbana e o impacto dos meios informáticos e de comunicação. O país vê-se hoje secularizado e plural. As alterações estruturais introduzidas nas relações comunitárias e familiares acabaram por fragilizar os processos tradicionais de transmissão da fé, nomeadamente o contacto prolongado da criança com o seu ambiente familiar e paroquial. São cada vez mais os adultos, portanto, que não têm senão um conhecimento rudimentar da fé cristã – e mesmo esse sujeito à erosão de mediáticas contestações em nome da literatura e da ciência. Cresce por isso a urgência de uma séria formação dos leigos. Não só porque muitos não tiveram acesso a uma catequese de infância, mas porque sem essa formação dificilmente se entabulará um diálogo fecundo com a cultura ambiente, cada vez mais fragmentada em campos especializados. No contexto actual, a palavra do Magistério da Igreja é inaudível e praticamente incompreensível para grande parte da população. O cidadão comum desconhece o nome do seu pároco e até mesmo do bispo da sua diocese, e se algum contacto afectivo mantém com a comunidade cristã, é com o santuário religioso que visita em peregrinação, com o colega de trabalho que o deu apoio num momento difícil, ou com a professora da escola ou o dirigente do movimento juvenil frequentados pelo filho. 8 | Catequese de Adultos A relação capilar do laicado com a sociedade envolvente, vivida como desafio humano e espiritual, é o lugar por excelência por onde encarna, em sentido próprio, a fé cristã. Mas sem uma inteligência da fé que acompanhe a evolução psicológica, familiar e profissional, o compromisso pessoal ou comunitário do crente, sacudido pelos critérios dominantes e as modas de feição religiosa, em vez de transfigurar a cultura à luz do Evangelho – evangelizando-a “não de maneira decorativa, como que aplicando um verniz superficial, mas de maneira vital, em profundidade, isto é até às suas raízes”1 –, será sujeito a uma gradual assimilação pelo espírito do mundo, presente dentro e fora da Igreja. Mas como organizar uma Catequeses de Adultos que responda a estes desafios? Mal nos debruçamos sobre a questão, logo nos apercebemos da sua imensa dificuldade, a começar pelo carácter diversificado do públicoalvo. Melhor será falarmos de Catequeses de Adultos, no plural, ou de “uma multiplicidade de itinerários diferenciados” que respeite e responda “ao multiforme e complexo mundo dos adultos”, como certeiramente nos lembra o P. Vasco António Gonçalves nesta sua tese de doutoramento apresentada à Universidade Lateranense. Com efeito, há um imenso trabalho a empreender em ordem a uma efectiva renovação da pastoral da Igreja Católica no nosso país. Qualquer renovação, no entanto, para ser eficaz, carece de um apuramento de critérios, de uma recolha cuidadosa de dados sobre a realidade visada e os meios disponíveis, e de uma análise e reflexão sistemáticas desses elementos em ordem a uma intervenção pastoral de precisão cirúrgica e efeitos multiplicadores – veja-se a proposta sugestiva, no capítulo IV desta obra, de uma Catequese Familiar. Há, pois, que saudar a publicação desta obra e agradecer ao P. Vasco António da Cruz Gonçalves o enorme esforço investido. Ela vem chamar a atenção para a grave lacuna existente, em Portugal, de uma reflexão académica sobre a catequese e representa, por isso, um relevante contributo para “repensar a pastoral da Igreja em Portugal”. Lisboa, 28 de Novembro de 2011 P. Peter Stilwell Vice-Reitor Universidade Católica Portuguesa 1 Paulo VI, Exortação Apostólica “Evangelii nuntiandi” (1975), 20. Introdução A necessidade de novas formas e modelos de Catequese de Adultos (CA) deriva de uma realidade pastoral marcada pela mudança sociocultural, assim como por uma nova forma de ser Igreja. Neste contexto, e em tempos de profundas e rápidas mudanças, a CA torna-se uma expressão essencial da acção de nova evangelização e uma das actividades mais fecundas na renovação das comunidades eclesiais. A questão da urgência, da tipicidade (no sentido em que comporta todas as dimensões e componentes constituintes de uma autêntica catequese) e da prioridade pastoral da CA, despertou-nos para abordarmos esta problemática a nível nacional1. Tal opção vem reforçada pela ausência, em Portugal, de uma reflexão séria sobre esta temática, assim como de um projecto nacional de CA. E ganha pertinência pelo simples facto de, por um lado, no ano de 2009, a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) ter criado um grupo constituído pelos responsáveis da pastoral nas dioceses para «Repensar a Pastoral da Igreja em Portugal» que presentemente elabora um projecto de caminhada sinodal cujo início de execução será em 2011. Desta forma, é bem patente a urgente necessidade que o episcopado português manifesta em discernir novos caminhos que abandonem uma acção eclesial classificada de «tridentina» ou de socialização, para investir numa pastoral missionária, capaz de ir ao encontro da vida concreta das pessoas, aos espaços da mentalidade que tornem o evangelho significativo e eficaz na experiência diária dos homens. É uma questão de mentalidade, de conversão pastoral. A demanda de um novo modelo coloca em estado de êxodo a reflexão sobre a acção eclesial na sua totalidade e, nesta, a incontornável questão da 1 O presente texto trata-se da tese de doutoramento em TP, especialização Teologia da Evangelização, apresentada pelo autor no Instituto Pastoral Redemptor Hominis, da Pontifícia Universidade Lateranense, em Roma. 10 | Catequese de Adultos catequese que, permanecendo fechada em si, vive a ansiedade de uma morte anunciada. Portanto, um novo rosto de catequese que procura sair de si e ir além do que muitos cristãos, incluindo agentes de pastoral, consideram «catequese». É no contexto desta mudança de modelo, não só pastoral, mas também, e sobretudo, de catequese, que queremos centrar a nossa atenção, porque é aí onde a CA se manifesta como forma típica, a partir da qual se estruturam as outras formas de catequese, de forma orgânica e determinadas pela vivência da comunidade eclesial. Alguns esclarecimentos terminológicos Ao iniciarmos este estudo, que se debruça sobre a CA, é útil fazer um esclarecimento terminológico que, se por um lado pode parecer óbvio, por outro, permite uma maior precisão a quem elabora um estudo como o que nos propomos. Poderíamos optar pela designação Formação cristã dos adultos, aliás termo mais usado na área francófona para indicar a CA em sentido próprio, sobretudo na fórmula «formation chrétienne des adultes», porque refere o amadurecimento global da pessoa à luz do projecto cristão, com vista à responsabilidade a assumir na comunidade e no mundo. Porém, estamos conscientes de que frequentemente se distingue formação e catequese: o âmbito da formação aparece sempre mais amplo do que o da CA e compreende sobretudo três tipos de actividade – formação dos agentes pastorais, ensino da teologia e catequese de adultos – para além de outras iniciativas ocasionais. Esta é uma das razões que nos levou a optar pela terminologia «Catequese de Adultos», apesar de considerarmos que, na generalidade, o termo «catequese» tem uma conotação infantil; porém, também encontramos aqui a desejável mudança de modelo, porque deveria ser precisamente ao contrário: tendo uma conotação de adultez, seria referência também para as outras idades. Noutros contextos, também para indicar CA, usam-se as expressões «educação cristã dos adultos», «educação da fé» e «educação religiosa»; porém o termo «educação» recebe um significado que vai para além da catequese propriamente dita, indicando um âmbito mais vasto e acentuando a conotação cultural e civil. A expressão «catequese de adultos» usa-se frequentemente para indicar outras formas formativas, quer no âmbito do serviço da Palavra, quer noutros âmbitos da acção eclesial (liturgia, celebrações, grupos de espiritualidade, Introdução | 11 actividades educativas dentro de associações e movimentos, conferências para adultos, solidariedade, etc.). Contudo, não se pode falar de «catequese» em sentido próprio quando estamos perante a «dimensão catequética» de outras acções pastorais. A terminologia «Catequese de Adultos» é a que adoptamos para o nosso estudo, não só por ser a usada pelos documentos oficiais da Igreja, mas também porque é frequentemente visitada pelos especialistas neste âmbito da pastoral. Constitui um «momento significativo no processo global de evangelização» (DGC 49) e tem como objectivo o amadurecimento na fé do crente, mas, para tal, deve integrar-se com outras experiências da vida eclesial (primeira evangelização, liturgia, comunidade, família, etc.). Quando dizemos «Catequese de Adultos», nem a consideramos como uma extensão da catequese infantil e adolescente, nem como uma única proposta, mas como uma acção só possível através de uma multiplicidade de itinerários diferenciados, respeitando e respondendo ao multiforme e complexo mundo dos adultos. Portanto, a expressão «Catequese de Adultos» traz em si a exigência de uma acção pastoral articulada e diferenciada que se poderia traduzir na expressão «As catequeses de adultos», porque diz uma acção plural. É esta realidade complexa da CA que leva, frequentemente, a que este tema seja tratado de modo genérico, ficando-se apenas pela proclamação da sua exigência e urgência, sem se passar à determinação de decisões eclesiais concretas e eficazes. Não pretendemos cair nesse erro e, de entre as inúmeras «catequeses de adultos», procuraremos propor, a partir da realidade portuguesa e seguindo o método do discernimento teológico-pastoral, um itinerário específico de CA. Catequese de Adultos: objecto da Teologia Pastoral A catequese é acção eclesial e o seu estatuto é determinado no âmbito disciplinar da Teologia Pastoral2. Desde o início é importante recordar que, quando nesta tese tratamos da CA, o fazemos do ponto de vista da TP, disciplina esta que faz parte de uma área teológica mais ampla, a da teologia prática. Trata-se de uma reflexão teológica, realizada em sintonia com os princípios que caracterizam toda a ciência teológica e que tem como objecto material a acção da Igreja, sendo o objecto formal a sua concretização aqui 2 Para «Teologia Pastoral» usaremos a sigla TP. 12 | Catequese de Adultos e agora. Pois, se considerarmos a CA enquanto objecto material, torna-se comum a outras áreas teológicas, mas, se a considerarmos enquanto objecto formal, é uma reflexão teológica capaz de conduzir a uma acção concreta com adultos, articulada com a ampla acção eclesial, é própria da TP. Desde o início, é preciso recordar que, se por um lado, a reflexão sobre a CA deve estar dentro do quadro mais amplo da catequese, por outro, do ponto de vista teológico-pastoral, a CA só pode ser compreendida dentro do quadro mais amplo da estrutura da Igreja e de toda a sua acção pastoral. É por isso que o nosso objectivo é o de, perante a realidade sociocultural e eclesial de Portugal, colhendo a frescura do Concílio Vaticano II e o que desde então motivou os bispos portugueses nesta matéria, pensar a CA no contexto de um novo modelo, face a uma acção pastoral que teima em responder a uma realidade que já não existe. A catequese tem, como função principal, não transmitir um mero conhecimento acerca de Jesus Cristo e das verdades da fé, mas despertar em cada pessoa concreta a beleza da comunhão e da intimidade com Jesus Cristo (cf. CT 5). Porém, hoje, a catequese encontra-se numa situação muito problemática, porque, num tempo de mudança, a pastoral tradicional entra inevitavelmente em crise, assim como a transmissão da mensagem cristã aos homens do nosso tempo. Perante a realidade que nos envolve, a catequese não consegue ser credível, atraente, significativa, embora se perceba na nossa sociedade a efervescência duma nostalgia do sagrado. É mais que evidente que o «sistema» tradicional de catequese faliu, e a fé é irrelevante e, muitas vezes, alheia à vida e cultura do nosso tempo. Daí o desafio: repensar a acção da Igreja numa perspectiva envangelizadora, procurando passar de uma pastoral de conservação a uma pastoral missionária. É no contexto desta preocupação que, nos últimos anos, se vem afirmando o interesse sempre crescente pela CA, por parte da Igreja, considerando-a uma urgente e importante prioridade pastoral no contexto da missão evangelizadora da Igreja de hoje. A metodologia Em toda e qualquer reflexão, é fundamental um método. Para nós, esse método deve possibilitar o desenvolvimento de uma reflexão teológica capaz de concretizar, teologicamente, a acção eclesial. Assumimos a abordagem metodológica da escola lateranense (Instituto Pastoral Redemptor hominis da Pontifícia Universidade Lateranense): método do discernimento teológico-pastoral. Neste método, o percurso reflexivo é marcado pela presença constante de três dimensões: kairológica, indicando a relação constitutiva do pensamento Introdução | 13 teológico-pastoral com a situação, compreendida teologicamente como kairós; criteriológica, garantindo a especificidade científica e teológica da TP, o que dá a referência normativa (critérios); operativa, garantindo a intencionalidade operativa durante todo o processo metodológico. O método, marcado pela presença constitutiva destas três dimensões, desenvolve-se em três fases sequenciais: análise e avaliação da realidade, decisão e projectação, execução e verificação. Ao assumirmos este método, não pretendemos estruturar a nossa reflexão segundo as diversas fases do método, porque se trata de uma tese que, por si só, tem um carácter mais criteriológico e não de um projecto concreto de CA, cuja finalidade é a execução. Portanto, o método de discernimento teológico-pastoral estará na base da nossa reflexão e como caminho para a proposta de CA que procuraremos fazer. A estrutura É nossa intenção estruturar esta reflexão em quatro capítulos. No primeiro capítulo, faremos uma análise da situação da CA no contexto sociocultural e eclesial português, a partir do Vaticano II. A «mudança» é a ideia base que nos ajudará a analisar as profundas transformações na sociedade e na mentalidade dos homens de hoje, bem como a nova consciência do que é ser Igreja à luz do Concílio e suas implicações na construção de uma nova imagem de Igreja e de cristão, vivendo a sua corresponsabilidade apostólica na comunidade e no mundo. Procuraremos evidenciar a situação eclesial vigente, onde uma pastoral predominantemente tridentina ou tradicional parece favorecer a crescente indiferença religiosa, a crise de identidade e de credibilidade da Igreja, o divórcio entre fé e vida, e entre fé e cultura. Daí a necessária conversão pastoral de uma Igreja que quer ser capaz de ir ao encontro da vida quotidiana das pessoas. A CA, se bem projectada, poderá ser o motor privilegiado para uma verdadeira renovação da Igreja, num mundo em mudança, sobretudo de mentalidades. No segundo capítulo, aprofundaremos a reflexão teológico-pastoral sobre esta temática presente nos documentos da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP). Porém, para uma coerente leitura dos documentos em questão no discernimento de um novo modelo de CA no contexto actual, procuraremos vislumbrar o horizonte que alguns catequetas e teólogos pastoralistas actuais nos apontam. A leitura dos autores ajudar-nos-á a apurar critérios fundamentais no discernimento de um novo modelo, de uma catequese «adulta» que considere os adultos como espaço prioritário de missão. Considerando o 14 | Catequese de Adultos quadro geral que referiremos no primeiro capítulo, a análise dos autores é com o intuito, não de apresentar as suas ideias, mas de observar, na sua reflexão, a perspectiva teológico-pastoral e os critérios que apontam para uma nova catequese, libertando-se de um modelo «tridentino» e configurando-se no desafio de uma nova evangelização: factores que desafiam a assumir um novo perfil pastoral, missionário e evangelizador. Portanto, não faremos uma leitura crítica dos autores e dos seus conteúdos, mas apenas nos serviremos de alguns critérios da sua reflexão que, na nossa perspectiva, se tornem úteis no caminho para uma adequada reflexão (teológico-pastoral) sobre a CA. Mostraremos, assim, como, perante a necessidade de uma conversão e de um projecto pastoral de evangelização, a CA se torna um desafio urgente nos documentos do Magistério da Igreja, especialmente nos documentos da CEP. No terceiro capítulo, entendendo a CA como tema (objecto) teológico-pastoral, procuraremos fazer uma breve fundamentação da TP, delimitando o seu objecto e determinando o seu método mais próprio: o método do discernimento teológico-pastoral, capaz de permitir uma reflexão coerente sobre a CA. No contexto de um processo de evangelização, apresentaremos alguns critérios fundamentais para uma programação de CA, isto é, apontaremos um caminho de reflexão que tenha presente alguns critérios que permitam a elaboração de um projecto eficaz a nível eclesial. Ou seja, uma CA ao serviço do processo de evangelização, capaz de se envolver num projecto orgânico e em estreita correlação com uma acção de primeira evangelização, capaz de ir ao encontro do espaço humano envolvente. No quarto e último capítulo, apresentaremos uma proposta concreta de Catequese Familiar (CF). Trata-se de um modelo de CA já experimentado noutros contextos da Igreja universal, mas que, em Portugal, tal como a CA em geral, carece de uma reflexão e projectação. A nossa opção por este modelo de CF deve-se, entre outros, a vários factores: é um modelo de catequese que condensa um conjunto de critérios próprios de um novo modelo de catequese; valoriza a família, também no centro das preocupações pastorais da Igreja; é uma proposta nova para a Igreja portuguesa; permite uma «transição» prudente de um modelo de catequese, centrado nas crianças, para um modelo de catequese, centrado nos adultos. Partiremos da análise da situação actual da família, faremos uma reflexão teológico-pastoral sobre o seu papel na transmissão da fé e apresentaremos uma proposta para Portugal, a partir do projecto nacional de catequese para a infância e adolescência: CA aos pais, por ocasião da primeira fase da iniciação cristã da infância, culminando com a Primeira Comunhão.