Avaliação Nutricional de Crianças e Adolescentes
Sobrepeso e Obesidade
Sumário
Introdução ..................................................................................................................................... 1
Crescimento .................................................................................................................................. 2
Determinantes .......................................................................................................................... 2
Fases do crescimento ................................................................................................................ 2
Avaliação nutricional ..................................................................................................................... 3
Avaliação clínica ............................................................................................................................ 4
Anamnese.................................................................................................................................. 4
Dados antropométricos ............................................................................................................ 5
Peso ........................................................................................................................................... 5
Estatura ..................................................................................................................................... 5
Perímetro cefálico ..................................................................................................................... 6
Índice de Massa Corporal (IMC) ................................................................................................ 6
Exame físico................................................................................................................................... 9
Referenciais antropométricos ................................................................................................. 10
Avaliação complementar ............................................................................................................ 11
Perfil lipídico ............................................................................................................................ 11
Metabolismo dos carboidratos ............................................................................................... 11
Outros exames ........................................................................................................................ 12
Avaliação da composição corporal.......................................................................................... 12
Conclusão .................................................................................................................................... 13
ANEXOS ..................................................................................................................................... 144
Introdução*
Crescer significa aumentar progressivamente a dimensão física – altura, peso, volume,
e crescimento, o ato, o efeito ou o processo de crescer.1 Assim, desde a concepção, o
ser humano vive um processo constante de crescimento até se tornar adulto. Para que
esse processo tenha êxito, fatores genéticos e ambientais devem atuar em sintonia.
Anomalias genéticas e agravos ambientais podem, isoladamente ou em conjunto,
comprometer esse processo natural.2
Avaliar e acompanhar o crescimento são atribuição fundamental daqueles que cuidam
da saúde da criança e do adolescente. Desvios do padrão de crescimento podem ser
manifestação de várias doenças e condições mórbidas. A identificação precoce e a
correção de fatores ou situações que possam comprometer a evolução do processo de
crescer têm impacto individual e coletivo, representando, portanto, um ganho social.
Assim, aplica-se, com a avaliação do crescimento, a essência da pediatria – a
prevenção como estratégia de promoção da saúde e do bem-estar.
É necessário ressaltar que a população brasileira passa por um fenômeno
denominado transição nutricional, resultante da urbanização acelerada e das
consequentes mudanças dos padrões de vida e, em especial, da alimentação. Essa
transição nutricional caracteriza-se pela redução da prevalência da subnutrição e do
aumento expressivo da prevalência do excesso de peso em todas as faixas etárias e
classes sociais. Provas dessa tendência são estudos populacionais reveladores das
altas taxas de sobrepeso e obesidade: a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF)3 e
a Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito
Telefônico (Vigitel) Brasil 2009.4
A POF 2008-2009 analisou dados de mais de 118 mil pessoas em 55.970 domicílios.
Comparados aos dados de 1974-75, os resultados de 2008-2009 evidenciaram uma
redução da prevalência de desnutrição de 29,3% para 7,2% entre meninos e de 26,7%
para 6,3% entre meninas. No mesmo período, houve aumento da prevalência de
excesso de peso: de 10,9% para 34,8% entre meninos e de 8,6% para 37,5% entre
meninas. A Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas
por Inquérito Telefônico/ Ministério da Saúde, 2013) revelou que, na população
brasileira acima de 18 anos, 47,4%dos indivíduos apresentam excesso de peso e
17,5% de obesidade. Somam-se, ainda, a esses dados por si só alarmantes, como
agravantes individuais e coletivos, os danos orgânicos consequentes ao ganho
* A UNIMED –BH disponibiliza um programa de Reeducação Alimentar Infantil, cujos objetivos são promover a
conscientização para hábitos saudáveis alimentares, acompanhar o estado nutricional e a prevenção de futuras
doenças crônicas. A equipe é formada por nutricionista, pediatra, psicólogo e realiza seu trabalho por meio de
atividades em grupo, nos Centros de Promoção da Saúde (CPS) localizados no Barro Preto, Betim, Contagem,
Gonçalves Dias e Pedro I. Informações pelo telefone: 4020- 4020.
1 Houaiss A, Villar MS. Dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro. Objetiva, 2009.
2Michaeson KF. Child growth. In: Kolestko B. Pediatric Nutrition in Practice. Basel; S Karger,2008.
3 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Estatística. [Acesso em 2 jul. 2014]. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/estatistica/populacao/condicaodevid/pof/2008_2009_encaa/pof
4
Brasil.
Ministério
da
Saúde.
Dados
2013.
[Acesso
em
2
jul.
2014].
Disponível
em:
http://www.saude.gov.br/portal/vigitel_2013_preliminar_web
1
excessivo de peso, que podem ser manifestos já na infância e têm repercussões por
toda a vida – as doenças crônicas não transmissíveis – sendo responsáveis por altas
taxas de morbimortalidade entre os adultos.
É imprescindível ao pediatra, portanto, como um dever de ofício, o conhecimento e a
aplicação cotidiana das estratégias que possibilitem a avaliação do padrão nutricional
de seus pacientes no intuito de identificar desvios e prevenir danos potenciais.
Crescimento
Determinantes
O crescimento é um processo constante iniciado na concepção e encerrado ao final da
puberdade, quando o indivíduo pode ser considerado adulto. Com determinantes de
ordem genética, o processo de crescimento sofre a ação do meio ambiente de formas
variadas.
O potencial e o ritmo de maturação são fixados biologicamente, conforme o padrão de
crescimento familiar transgeracional. O resultado final decorre da interação de fatores
externos. Alimentação, saneamento básico, acesso aos serviços de saúde, exposição
a situações de violência, condições de educação familiar e pessoal, situação afetiva e
estabilidade dos vínculos familiares influenciam sobremaneira o processo que, para
ser exitoso, deve ter uma sequência natural, concluindo cada uma de suas fases,
conforme se descreverá a seguir.
Fases do crescimento
Em uma gestação sem problemas, o feto cresce, nos primeiros meses de vida
intrauterina, entre 1,2 e 1,5 cm por semana, com aumento do ritmo para,
aproximadamente, 2,5 cm por semana na metade da gravidez, e redução para 0,5cm
a cada semana no final. Nessa última fase, há maior ganho ponderal. O recémnascido pesa, em média, 3 kg e mede 50 cm.
O lactente, durante o primeiro ano, mantém ritmo ascendente de crescimento, apesar
de menos acelerado, triplicando seu peso e crescendo 50% da sua estatura de
nascimento até completar 12 meses de idade. Durante o segundo ano, há redução do
ritmo de crescimento, que fica em aproximadamente 15 cm na estatura eem2kg no
peso, em média, nos doze meses seguintes. Nessa fase, a criança acumula gordura,
ganhando, proporcionalmente, mais em peso que em altura, apresentando dobras
cutâneas e panículo adiposo mais volumoso. É a chamada primeira repleção.
A partir dos três anos até os 6-7 anos, ou um pouco mais, o crescimento é mais
estável. A estatura aumenta entre 5 e 7 cm, e o peso, 2 kg ao ano, em média. O
2
aspecto físico da criança aparenta menor quantidade de gordura corpórea por
terpanículo adiposo menos evidente e perda das dobras características do lactente.
Essa mudança corporal, associada à diminuição da necessidade de ingestão de
alimentos, ocasiona ansiedade nos familiares, o que pode determinar ações
inadequadas em relação aos hábitos alimentares. Entre 3 e 6 anos, na fase préescolar, tem-se o primeiro estirão.
Dos sete anos em diante, a criança mantém um ritmo estável de crescimento, mas já
são perceptíveis as diferenças entre os sexos: ambos ganham mais peso, mas as
meninas tendem a acumular mais gordura. É a segunda repleção, que termina com o
início da puberdade. De 12 kg aos dois anos a criança alcança, aproximadamente, 30
kg aos dez anos, quando, em geral, aparecem os primeiros caracteres puberais.
Na puberdade, nova aceleração do ritmo de crescimento, mais precoce entre as
meninas, é determinada por influência dos hormônios do crescimento e sexuais. Não é
infrequente, nesse período, o ganho superior a 10 cm de estatura em um ano. Em
geral, por influência hormonal, as meninas ganham mais peso em gordura, que se
acumula particularmente em torno dos quadris, e os meninos ganham mais em
musculatura. Essa é a fase do segundo estirão. A partir de então, o ritmo de ganho de
peso deve se estabilizar.
A fase seguinte, puberdade final, o ganho de altura tem ritmo mais lento (1 a 1,5
cm/ano), dá-se principalmente pelo aumento do tronco e tem duração média de três
anos. O peso deverá permanecer estável.
O acompanhamento dessas fases, por meio de gráficos e tabelas de referência, em
avaliações seriadas, é fundamental para a identificação de anormalidades e para a
introdução de intervenções que promovam a reversão ou a estabilização de agravos
que comprometam o pleno crescimento do indivíduo.
Avaliação nutricional
A avaliação nutricional, em especial a avaliação clínica do crescimento, deve ser parte
de toda consulta médica e, em particular, da consulta pediátrica. Em pediatria, essa
avaliação é reveladora das condições da criança. Por meio da utilização de métodos
simples como a anamnese e a determinação da antropometria, pode ser efetivamente
determinado o padrão de crescimento e, consequentemente, de saúde. A avaliação
longitudinal das medidas antropométricas possibilita o acompanhamento adequado do
crescimento e a adoção das intervenções que se fizerem necessárias.
Há uma variedade de medidas antropométricas, determinações da composição
corporal, métodos bioquímicos e até de imagem que fornecem informações sobre o
estado nutricional do indivíduo. A escolha do(s) método(s) de avaliação dependerá do
objetivo e da população-alvo, todos eles com suas vantagens e desvantagens.5
5Corsi DJ, Subramanyan MA, Subramanyan SV. Commentary: measuring nutritional status of children. International
Journal of Epidemiology 2011; 49:1030 - 36.
3
Os principais critérios para avaliar o crescimento e o estado nutricional de crianças são
as medidas antropométricas. Para que os dados sejam comparáveis, utilizam-se
gráficos e tabelas de referência.
Avaliação clínica
A avaliação clínica, fundamental na análise individual do crescimento, compreende a
anamnese, a determinação dos dados antropométricos e o exame físico.
Anamnese
A anamnese é parte integrante e a base clínica de qualquer consulta médica. No
atendimento da criança e do adolescente, tem importância a queixa principal da família
ou do paciente, que deve ser adequadamente explorada. Devem ser investigadas as
condições de gestação, parto, nascimento, peso, estatura e perímetro cefálico, ao
nascer, e medidas posteriores porventura existentes, vacinação, alimentação atual e
pregressa, doenças atuais e pregressas. Além das condições de saúde da família,
devem ser investigados o ambiente domiciliar, a situação afetiva e a situação
socioeconômica.
Sendo um ser em evolução e modificação constantes, a criança sofre o impacto de
quaisquer agravos orgânicos ou emocionais, que possam repercutir sobre o estado de
nutrição.
A história alimentar envolverá questões específicas aos grupos etários e tipos de dieta.
Devem ser obrigatórias as seguintes perguntas ajustadas a cada condição6:
 Lactentes em aleitamento materno: qual é a frequência da amamentação; qual
é o tempo de aleitamento em cada seio; há concomitância de aleitamento
artificial.
 Lactentes em aleitamento artificial: qual é o tipo de leite usado; como é
preparada a mamadeira; qual é o volume de cada mamadeira; quantas
mamadeiras são oferecidas por dia e de quanto em quanto tempo; se há
ingestão de algum outro alimento, como é oferecido e com que frequência; há
ingestão de água e com qual frequência.
 Crianças mais velhas: quantas refeições são oferecidas por dia; o que é
ingerido por dia; onde a criança se alimenta; como os pais classificam o apetite
da criança.
6Puntis JWL. Clinical evaluation and anthropometry. In: Koletsko B. Pediatric Nutritionin Practice. Basel, S Karger,
2009.
4
Existem várias formas para aferir a ingestão média de alimentos, cada qual com suas
vantagens e desvantagens7:
Método recordatório de 24 horas, no qual a criança e/ou seu responsável deve listar
todos os alimentos, porções e número de porções ingeridas nas últimas 24 horas.
Registro prospectivo de 3 a 7 dias de ingestão, no qual tudo o que for ingerido deve
ser anotado.
Inquérito de frequência alimentar, no qual o paciente marca em uma lista de alimentos
e porções aquilo que foi ingerido, por exemplo, durante uma semana.
Checklist alimentar, comparável ao anterior, mas com menor número de opções
disponíveis.
Dados antropométricos
As medidas antropométricas são procedimentos simples, não invasivos, de baixo
custo e fornecem informações fundamentais sobre a saúde e a adequação do
crescimento.
Devem
ser
aplicadas
cuidadosamente
conforme
padrões
predeterminados e utilização de instrumentos adequados. Em pediatria, as medidas
usadas com mais frequência são o peso, a estatura, o perímetro cefálico e a
circunferência abdominal.
A padronização da aferição de medidas antropométricas foi revista pelo Ministério da
Saúde8. Os procedimentos devem ser realizados em ambiente adequado, com o uso
de equipamentos ajustados, aferidos e pela técnica correta.
A interpretação das medidas antropométricas deve ser ajustada à faixa etária, ao sexo
e à idade gestacional. Crianças prematuras, por exemplo, devem ter as medidas
ajustados à idade corrigida até os 24 meses.
Peso
Até os dois anos de idade, o peso deve ser obtido em balança de mesa mecânica ou
eletrônica. A criança deve estar totalmente despida e descalça. Para crianças com
idade superior a 24 meses são usadas balanças do tipo plataforma. A criança deve
estar ereta, no centro do equipamento, de costas para o medidor, descalça, com o
mínimo possível de roupas, os pés juntos e os braços estendidos ao longo do corpo.
Estatura
Até os 24meses de idade, a aferição do comprimento deve ser realizada com o auxílio
de régua antropométrica sobre uma superfície plana horizontal. A criança deve estar
despida e descalça. Duas pessoas devem colaborar para o posicionamento do
7Valdes-Ramos R. History and Dietary Intake. In: Koletsko B. Pediatric Nutritionin Practice. Basel, S Karger, 2009.
8 Ministério da Saúde. Coordenação Geral da Política de Alimentação e Nutrição (CGPAN). Antropometria: como pesar
e medir. [Acesso em 2 jul. 2014]. Disponível em: http://nutricao.saude.gov.br/documentos/album_antopometria.pdf.
5
paciente: a cabeça deverá ser apoiada no equipamento, a região cervical retificada e
centralizada, o queixo afastado do peito, os ombros, nádegas e os calcanhares em
contato com a superfície de apoio, braços estendidos ao longo do corpo, joelhos
estendidos, e os pés, em ângulo reto com as pernas. Assim, a parte móvel do
equipamento será levada até a planta dos pés para a leitura da medida.
Crianças com mais de dois anos são medidas em estadiômetros de parede. Devem
estar usando o mínimo possível de roupas, descalças e posicionados de costas, com
braços estendidos ao longo do corpo. A cabeça, o tronco, as nádegas e os
calcanhares devem estar apoiados na régua vertical, os joelhos e os pés, paralelos e
unidos. É preciso atenção para a posição da cabeça, que deve estar reta com a
criança olhando para um ponto fixo à frente, com o plano transversal na altura dos
olhos, paralelo ao piso do ambiente. Assim, a parte móvel do equipamento deve ser
posicionada sobre o ponto mais alto da cabeça para que se proceda à leitura.
Perímetro cefálico
A medida do perímetro cefálico permite a avaliação indireta do crescimento do
encéfalo nos dois primeiros anos de vida. Determinado geneticamente, o crescimento
encefálico nessa fase é vulnerável a agravos ambientais, em especial aos danos
infecciosos e nutricionais. Por essa razão, a sua medida deve ser sempre avaliada,
tendo-se como referência o desenvolvimento neuropsicomotor.
A medida é realizada com uma fita métrica, inelástica, posicionada na porção posterior
mais proeminente do crânio (occipício) e na parte frontal da cabeça (glabela).
Índice de Massa Corporal (IMC)
O IMC é um indicador da proporção entre peso e altura e pode ser calculado pela
fórmula:
IMC = peso (kg)/ altura
(m)
2
Os resultados podem ser analisados pela aplicação dos gráficos da Organização
Mundial de Saúde.9
Em crianças e adolescentes, a avaliação do IMC deve ser feita por meio de gráficos de
referência, os quais definem as seguintes condições nutricionais10:




Magreza ou desnutrição: IMC < percentil 5
Peso adequado ou eutrofia: percentil 5 < IMC < percentil 85
Sobrepeso: percentil 85 <IMC < percentil 95
Obesidade: IMC > percentil 95.
Medidas das circunferências
9World Health Organization - WHO. Growth Charts. [Acesso em 2 jul. 2014]. Disponível em: http://www.who.int/childgrowth/standards/
10 Sociedade Brasileira de Pediatria. Avaliação nutricional da criança e do adolescente. Manual de Orientação .
Departamento de Nutrologia. – São Paulo: Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento de Nutrologia, 2009. 112 p.
6
- Circunferência abdominal
De forma indireta, a medida da circunferência abdominal fornece informação sobre a
adiposidade corporal. Tem sido relacionada ao risco de doenças crônicas não
transmissíveis em adultos. Na infância, embora ainda sejam escassos, estudos com
crianças obesas têm demonstrado associação de aumento da circunferência
abdominal com hiperinsulinemia e elevação das concentrações das lipoproteínas
plasmáticas. É uma medida que permite, de forma simples, a estimativa da
composição corporal. Freedmanet al (1999)11 definiram os pontos de corte para
medidas da circunferência abdominal de crianças e adolescentes, considerando o
percentil 90.
A medida da circunferência abdominal deve ser tomada com o paciente em pé. O
examinador deverá marcar o ponto médio entre a borda da última costela e a crista
ilíaca superior, em ambos os lados do corpo e aplicar a fita métrica sobre os pontos
marcados, procedendo à leitura da medida ao final de uma expiração normal.
- Circunferência do braço
A circunferência do braço representa a soma das áreas constituídas pelos tecidos
ósseo, muscular e gorduroso. É uma medida complementar e deve ser tomada no
braço direito, que deve estar relaxado em flexão até formar um ângulo reto com o
antebraço. Marca-se o ponto médio entre o acrômio e o olécrano. Depois, o paciente
estende o braço ao longo do corpo, com a palma da mão voltada para a coxa.
Contorna-se o braço no ponto marcado, com fita métrica inelástica, e procede-se a
leitura.Frisancho (1981)12 determinou os pontos de corte para essas medidas. Valores
abaixo do percentil 5 indicam risco de doenças e distúrbios associados à desnutrição
e, acima do percentil 95, risco de doenças relacionadas ao excesso de peso.
- Circunferência muscular do braço (CMB)
A circunferência muscular do braço (CMB) é uma medida derivada da circunferência
do braço e da dobra cutânea tricipital (DCT),usada para estimar a massa muscular do
braço:
CMB (cm) = circunferência do braço (cm) – (0,314 x dobra cutânea tricipital / 10)
Os valores de referência são os propostos por Frisancho (1981).12
A tabela 1 apresenta os valores das medidas da circunferência do braço e da
circunferência muscular do braço, para meninos e meninas, conforme as faixas
etárias, no percentil 90.
11Freedman DS et al. Relation of circumferences and skinfold thicknesses to lipid and insulin concentrations in children
and adolescents: the Bogalusa Heart Study.Am J ClinNutr 1999; 69:308-17.
12Frisancho AR. New norms of upper limb fat and muscle areas for assessment of nutritional status.Am J ClinNutr
1981, 34: 2540-2545.
7
TABELA 1: Medidas da circunferência do braço e da circunferência muscular do braço,
para meninos e meninas, conforme as faixas etárias, no percentil 90
Circunferência do braço
Circunferência muscular do
braço
Valores do percentil 90
(mm)
Valores
(mm)
do
percentil
Idade (anos)
Meninos
Meninas
Meninos
Meninas
1-1,9
176
172
144
139
2-2,9
178
176
146
142
3-3,9
184
183
148
146
4-4,9
186
184
156
152
5-5,9
194
203
162
159
6-6,9
209
204
170
166
7-7,9
223
216
177
171
8-8,9
220
247
182
183
9-9,9
249
251
196
194
10-10,9
262
276
209
190
11-11,9
261
282
205
217
12-12,9
282
301
223
214
13-13,9
286
304
238
226
14-14,9
303
300
260
232
15-15,9
311
318
266
228
16-16,9
324
324
287
234
17-17,9
336
312
294
239
90
Adaptado de: Frisancho AR. New norms of upper limb fat and muscle areas for assessment of nutritional
status.Am J ClinNutr 1981, 34: 2540-2545.
8
Medidas das dobras cutâneas
A medida das dobras cutâneas é utilizada para estimar a adiposidade corporal. Deve
ser feita com equipamento adequado: adipômetro, paquímetro ou plicômetro.
A OMS13 disponibiliza medidas de dobras cutâneas (tricipital e subescapular) em
tabelas e gráficos para crianças de três meses a 5 anos de idade.
- Dobra cutânea tricipital (DCT)
No mesmo ponto médio utilizado para realizar a medida da circunferência do braço,
separar levemente a dobra cutânea (pele mais gordura subcutânea), desprendendo-a
do tecido muscular, e aplicar o calibrador formando um ângulo reto. O braço deve
estar relaxado e solto ao lado do corpo.
- Dobra cutânea subescapular (DCS)
Marcar o ponto imediatamente abaixo do ângulo inferior da escápula. A pele deve ser
levantada1 cm abaixo do ângulo inferior da escápula, de tal forma que se possa
observar um ângulo de 45° entre esta e a coluna vertebral. O aparelho deve ser
aplicado, estando o indivíduo com braços e ombros relaxados.
Exame físico
O exame físico visa identificar alterações relacionadas, ou não, à queixa principal e
aos eventuais distúrbios nutricionais associados. Além da ectoscopia, que evidencia o
aspecto geral do paciente, o exame detalhado dos diversos aparelhos complementa a
consulta e permite a elaboração do diagnóstico presuntivo - clínico e nutricional.
Alterações específicas do exame clínico podem ser a chave para o diagnóstico
nutricional. Desse modo, a magreza excessiva com hipotrofia muscular sugere
desnutrição primária, por baixa ingestão, ou secundária, associada a enfermidades
graves. No outro extremo, aumento de panículo adiposo com estrias,
acanthosisnigricans e limitações articulares são alterações associadas à obesidade.
13World Health Organization - WHO. Growth Charts. [Acesso em 2 jul. 2014]. Disponível em: http://www.who.int/childgrowth/standards/
9
Referenciais antropométricos
Os referenciais antropométricos são tabelas e gráficos construídos com base em
medidas corpóreas de populações saudáveis e representativas para o parâmetro que
se quer avaliar. Esses instrumentos permitem a classificação nutricional de um
indivíduo em relação a uma população de referência, conforme o sexo e a idade.
O principal objetivo para a aplicação das curvas de referência é a definição da
normalidade, ou da possibilidade de anormalidade das medidas de um determinado
indivíduo.
As curvas e os gráficos podem ser construídos em sistema de percentil ou de escores
Z:
- Percentis
Por sua praticidade e facilidade de interpretação, esse sistema é largamente utilizado.
Como a distribuição dos parâmetros antropométricos é sempre normal (acompanha a
curva Gauss), os valores de tendência central (próximos ao percentil 50) são também
os mais frequentemente observados na população normal, enquanto os de extremos
são os mais raros. Essa característica demonstra, com facilidade, riscos de
anormalidade. Desse modo, a interpretação para uma criança com percentil de peso
95 é que ela é mais pesada que 95% das crianças de mesma idade e sexo.
- Escores z
Os escores z apresentam os valores de cada parâmetro de acordo com a sua
diferença em relação ao valor mediano estimado para determinado sexo e idade. Essa
distância da mediana é avaliada em unidades (ou frações) de desvios-padrão,
considerando-se que cada desvio-padrão de diferença da mediana corresponde a uma
unidade de escore z.
Para calcular o escore z, utiliza-se a seguinte fórmula:
Escore z =valor medido na criança – valor da mediana/ valor do desvio-padrão
O Ministério da Saúde recomenda a utilização das curvas publicadas pela
Organização Mundial de Saúde (OMS ).
10
Avaliação complementar
Perfil lipídico
O perfil lipídico pode ser realizado em crianças a partir de dois anos, idade em que já
estão estabelecidos pontos de corte e sempre que se fizer necessário, sendo
mandatório em casos de história familiar de dislipidemia. Considera-se risco
cardiovascular familiar a história de doença cardiovascular em parentes do sexo
masculino com menos de 55 anos e do sexo feminino com menos de 65 anos O perfil
lipídico deve contemplar a avaliação do colesterol total e frações (HDL-C, LDL-C,
VLDL-C) e dos triglicerídeos. Para a correta interpretação dos valores, a coleta de
sangue deve respeitar um período de 12 horas de jejum.
TABELA 2: Valores de perfil lipídico em crianças e adolescentes (acima de dois anos)
Lipoproteínas (mg/dL)
Colesterol total
LDL-C
HDL-C
Triglicerídeos
Desejáveis
< 150
<100
≥45
<100
Limítrofes
150-169
100-129
100-129
Aumentados
>170
≥130
≥130
Fonte: I Diretriz de prevenção da aterosclerose na infância e adolescência, 2005
Metabolismo dos carboidratos
A resistência insulínica é o mecanismo central responsável pelo desenvolvimento de
diversas doenças associadas ao sobrepeso e à obesidade. Desse modo, o
metabolismo dos carboidratos deve ser avaliado quando os indicadores clínicos
apontam para essas condições. Com esse objetivo, devem ser obtidas a glicose
sanguínea em jejum e a glicemia 2 horas após 75 g de glicose VOe a hemoglobina
glicosilada.
Também pode ser calculado o HOMA – HomeostaticModelAssessment -, indicador de
resistência à insulina, calculado pela fórmula:
HOMA = insulina de jejum (mU/ mL) x glicose de jejum (mmol/ L)*/ 22,5
*Para conversão de mg/dL em mmol/L, multiplica-se o valorem mg/dL por 0,0555
Recentemente a Academia Americana de Diabetes publicou o que chamou de
Critérios para testar diabetes em pacientes assintomáticos. Esses critérios
recomendam que indivíduos assintomáticos, mas que tenham sobrepeso e fatores de
risco adicional como inatividade física, história familiar, dislipidemia, hipertensão
arterial, mulheres com ovários policísticos ou que tenham tido diabetes gestacional,
11
devem ser submetidos à avaliação do metabolismo de carboidratos por meio das
determinações da glicose sanguínea, da tolerância à glicose e do teste A1C.14
Outros exames
Em geral, não são necessários outros exames bioquímicos para a avaliação
nutricional. Exames específicos guiados por suspeitas diagnósticas de deficiências
menos comuns, associadas ao quadro clínico geral e, principalmente, para o
acompanhamento do tratamento instituído, podem ser solicitados.
Avaliação da composição corporal
A composição corporal pode ser estimada por medidas de circunferências e de dobras
corporais ou determinada pela utilização de técnicas que envolvem desde a utilização
de aparelhos de bioimpedância até os radioisótopos. Informações sobre a composição
corporal têm importância na avaliação do diagnóstico nutricional e na orientação de
condutas para o controle de peso. Esses métodos de avaliação da composição
descritos a seguir têm vantagens e desvantagens e, em geral, não são utilizados na
avaliação de rotina.
- Bioimpedância elétrica
A bioimpedância elétrica é um método simples, rápido, não invasivo e barato. O
equipamento utilizado é de fácil transporte e permite a determinação da massa livre de
gordura e da quantidade de água corporal. Fundamenta-se nas propriedades
condutoras e dielétricas para correntes elétricas de frequências distintas dos diferentes
tecidos biológicos. Os tecidos livres de gordura, pela sua composição em água e
eletrólitos, são altamente condutores e apresentam baixa resistência à passagem da
corrente elétrica, enquanto os tecidos adiposo e ósseo são dielétricos ou muito
resistentes.
- DXA - Absorciometria por Dupla Emissão de Raios X ou Densitometria
de Corpo Inteiro
A DXA (Dual energy X-rayabsorptionmetry) é um método não invasivo com mínima
dose de radiação (inferior a 10 µSv) e tempo curto de execução, podendo ser aplicada
em indivíduos de todas as idades, exceto gestantes. É considerada padrão ouro de
avaliação dos compartimentos corporais, por realizar a medida direta da massa
muscular, do tecido adiposo e da densidade óssea com precisão e acurácia. Estudos
que compararam a DXA com outras técnicas de avaliação da composição corporal,
como a bioimpedância elétrica, a pesagem hidrostática e as dobras cutâneas, em
diferentes populações, faixas etárias e raças, mostraram, de modo geral, que a DXA
14ADA .Standards of Medical Care in Diabetes.Diabetes Care. 2014(37):S14-S80
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tem boa correlação com os outros métodos avaliados e trata-se de uma técnica de
utilização restrita.
- Diluição de isótopos e ativação de nêutrons. Hidrodensitometria, tomografia computadorizada e ressonância magnética
Diluição de isótopos e ativação de nêutrons
A avaliação da composição corporal obtida pela hidrodensitometria – obtenção
do peso corporal imerso em água – apresenta como principal restrição, nas faixas
etárias aqui consideradas, a necessidade de se conhecer a densidade específica de
cada um dos componentes corporais avaliados, quais sejam, a gordura e a massa livre
de gordura. A razão para tal necessidade encontra-se nas diferenças devido ao sexo,
à etnia e aos estágios puberais e ao fato de que a massa magra adquire maior e
progressiva densidade desde o nascimento até o final da adolescência. Não tem sido
empregado de rotina.
Tanto a tomografia computadorizada quanto a ressonância magnética não são
usadas de rotina na avaliação da composição corporal, não só por serem exames de
alto custo, mas, em particular, pela exposição a doses elevadas de radiação e por
exigirem, muitas vezes, sedação do paciente.
Conclusão
Avaliar e acompanhar o crescimento, da concepção à vida adulta, é atribuição
fundamental daqueles que cuidam da saúde da criança e do adolescente. A
multiplicidade de medidas e de exames para a avaliação do estado nutricional deixa
clara a necessidade de seleção adequada ao que se quer analisar ou estudar. Embora
todos tenham a sua importância, o fator determinante da escolha será o objetivo a ser
atingido – se uma avaliação individual ou coletiva, se uma avaliação de crianças
saudáveis ou com doenças crônicas. Em todos os casos, são imprescindíveis as
bases da consulta clínica: anamnese e exame físico, sem as quais quaisquer outras
avaliações estarão sujeitas a análises equivocadas. Vale ressaltar que, na prática
clínica ambulatorial de rotina, as medidas antropométricas são imprescindíveis e
suficientes para uma adequada avaliação do estado nutricional de uma criança ou de
um adolescente.
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ANEXOS
IMC – VALORES DE REFERÊNCIA
Pontos de corte de IMC para diagnóstico de excesso de peso e obesidade em crianças de 2 a 5,5
anos15
*A idade completa é considerada até 5 meses e 29 dias. Por exemplo, uma criança com 3 anos 5 meses e 29 dias
deve entrar na faixa de 3 anos, e uma criança com 3 anos e 6 meses deve entrar na faixa de 3,5 anos.
Pontos de corte de IMC para diagnóstico de excesso de peso e obesidade em crianças de 10 a 15
anos15
*A idade completa é considerada até 5 meses e 29 dias, por exemplo, uma adolescente com 15 anos 5
meses e 29 dias deve entrar na faixa de 15 anos, e uma adolescente com 15 anos e 7 meses deve
entrar na faixa de 15,5.
15 Brasil. Ministério da Saúde. Cadernos da Atenção Básica – Estratégias para o cuidado da pessoa com doença
crônica obesidade. Cadernos da Atenção Básica nº 38. Ministério da Saúde. Brasília. 2014. [Acesso
em 02 jul. 2014].Disponível em:
http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/caderno_38.pdf
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Avaliação Nutricional de Crianças e Adolescentes: Sobrepeso e