INTERTEXTUALIDADE
(no ENEM)
Prof. Vinicius Rodrigues
Intertextualidade – esse palavrão...
“(...) todo o texto é absorção e transformação de outro texto. (...) a linguagem
poética se lê, pelo menos como dupla.” (KRISTEVA in CARVALHAL, 1992, p. 50.)
“(...) não é possível ler senão comparativamente (ou seja, racionalmente) (...)
não se trata tanto da opção entre comprar e não comparar... Não há de fato
como não comparar. Toda leitura é ativação, partilha e ‘cooperação
interpretativa’(...).” (BUESCU, 2001, p. 23.)
“A noção de intertextualidade abre um campo novo e sugere modos de atuação
diferentes ao comparativista (...). Principalmente, as novas noções sobre a
produtividade dos textos literários comprometem a também ‘velha’ concepção
de originalidade.” (CARVALHAL, 1992, p. 53.)
Intertextualidade – esse palavrão...
INTERTEXTUALIDADE nada mais é do que o conceito mais importante
nos dias de hoje quando falamos sobre criação artística – colocando,
então, nesse “caldo” de arte, a literatura. É muito difícil nos depararmos
com algo realmente original atualmente no meio da cultura e do
entretenimento. E isso se deve ao exercício constante da comparação,
onde estabelecemos, quase sempre, aproximações entre uma criação e
outra. Quando percebemos que um texto usa outro texto em sua
construção, mesmo que sem a intenção do autor, o que estamos fazendo é
comprovar a ocorrência de INTERTEXTUALIDADE.
Intertextualidade – esse palavrão...
Sendo assim, INTERTEXTUALIDADE nada mais é do que o
cruzamento de um texto com outro (ou outros), muitas vezes
utilizado conscientemente, sendo parte fundamental da criação do
autor; comporta-se não como plágio involuntário, mas,
frequentemente, é um dos objetivos de determinada obra a
CITAÇÃO explícita para fins de REFERÊNCIA, HOMENAGEM ou,
ainda, PARÓDIA.
Intertextualidade – esse palavrão...
Na prova do ENEM, na maneira como são explicitados seus conteúdos e
habilidades, fala-se muito sobre questões como “DIVERSIDADE DE GÊNEROS
TEXTUAIS”, “O TEXTO EM INTERAÇÃO COM DIVERSOS CONTEXTOS” e
“COMPREENSÃO DE DIVERSAS LINGUAGENS TEXTUAIS E ARTÍSTICAS”
(onde devemos, portanto, compreender que um texto pode expressar-se como
imagem, propaganda, palavra escrita ou símbolo). Logo, compreender a forma
como um texto (artístico ou não) comporta-se na sua composição é uma habilidade
importante, pois perceber a INTERTEXTUALIDADE denota CONHECIMENTO DA
CULTURA e de como o SENSO COMUM influencia nossa LEITURA DE MUNDO.
INTERTEXTUALIDADE
Há, basicamente, duas maneiras de se perceber a intertextualidade...
•
Uma explícita, facilmente notada e parte do corpo do texto (geralmente apoiando-se justamente
no conhecimento do senso comum por parte do leitor/espectador).
Na série cinematográfica Shrek, por exemplo...
...Temos o Gato de Botas...
...É fundamental a
presença de diversas
referências dos
contos de fadas (ou
contos infantis)...
...Sobra espaço até para outras
citações, como o filme Matrix,
lendas medievais, etc, até
mesmo em cenas “soltas”...
... Há personagens importantes na
trama, como Rapunzel, Branca de
Neve, Cinderela e muitos outros,
todos misturados...
INTERTEXTUALIDADE
•
O outro caso de ocorrência de INTERTEXTO é quando este está implícito, mais subjetivo, portanto,
dependendo muito do olhar do leitor/espectador para ser encontrado e, muitas vezes, colocado de
forma inconsciente pelo autor, justamente pelo fato de certas INFLUÊNCIAS ou REFERÊNCIAS de
senso comum estarem tão dispersas no mundo que essas acabam surgindo naturalmente.
A história da saga Crepúsculo, por exemplo, tenta renovar os mitos vampíricos tão presentes na
cultura de massa...
...Ainda que não
se consigam
evitar outras
referências
clássicas do
gênero, como
Drácula.
...Abrindo espaço para a
velha história do “amor
proibido”, que remete a
Romeu e Julieta, Tristão e
Isolda...
...Com
direito a
referências
como A Bela
e a Fera...
Semana que vem
Pitty
Amanhã eu vou revelar
Depois eu penso em aprender
Daqui a uns dias eu vou dizer
O que me faz querer gritar
No mês que vem tudo vai melhorar
Só mais alguns anos e o mundo vai mudar
Ainda temos tempo até tudo explodir
Quem sabe quanto vai durar
Não deixe nada pra depois
Não deixe o tempo passar
Não deixe nada pra semana que vem
Porque semana que vem pode nem chegar
A partir de amanhã eu vou discutir
Da próxima vez eu vou questionar
Na segunda eu começo a agir
Só mais duas horas pra eu decidir (...)
Carpe Diem
Horácio
Não indagues muito: é cruel querer saber
Que fim nos reservaram os deuses; nem
Fiques consultando os números babilônios.
Pode ser que Júpiter te conceda muitos
[invernos,
Ou somente este último, como expressa
[agora
o mar tirreno ao bater nas rochas.
Sê sensato, bebe teu vinho e abrevia as
[longas esperanças,
Pois o tempo foge enquanto aqui parlamos.
Curte o dia de hoje – não te fies no futuro!
INTERTEXTUALIDADE não demonstra falta de originalidade, necessariamente, mas, muitas
vezes, uma nova noção sobre o que é originalidade. Inferir que um texto utiliza outro texto na
sua construção é um exercício comparativo comum do ser humano; está muito evidente na
propaganda (no uso de símbolos de marcas, por exemplo) e, no texto artístico, apóia-se no
conhecimento dos clássicos.
Canção do Exílio
Gonçalves Dias
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar –sozinho, à noite–
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
HINO
NACIONAL
BRASILEIRO
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que disfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as
palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Canção do Exílio Facilitada
José Paulo Paes
lá?
ah!
sabiá...
papá...
maná...
sofá...
sinhá...
cá?
bah!
Nova Canção do Exílio
Carlos Drummond de Andrade
Um sabiá na
palmeira, longe.
Estas aves cantam
um outro canto.
O céu cintila
sobre flores úmidas.
Vozes na mata, e o maior amor.
Só, na noite,
seria feliz:
um sabiá,
na palmeira, longe.
Onde tudo é belo
e fantástico,
só, na noite,
seria feliz.
(Um sabiá,
na palmeira, longe.)
Ainda um grito de vida
e voltar
para onde tudo é belo
e fantástico:
a palmeira, o sabiá,
o longe.
Quando falamos sobre ENEM, há um termo
importantíssimo que é sempre lembrado:
INTERDISCIPLINARIDADE. A possibilidade de, por
exemplo, poder ler um texto a partir de perspectivas
diversas pode vir a ser um indício de
INTERTEXTUALIDADE.
QUESTÕES – ENEM
1) Quem não passou pela experiência de estar lendo um texto e defrontar-se com passagens já
lidas em outros? Os textos conversam entre si em um diálogo constante. Esse fenômeno tem a
denominação de intertextualidade. Leia os seguintes textos:
I.
Quando nasci, um anjo torto
Desses que vivem na sombra
Disse: Vai Carlos! Ser “gauche” na vida
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Alguma poesia. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1964)
II. Quando nasci veio um anjo safado
O chato dum querubim
E decretou que eu tava predestinado
A ser errado assim
Já de saída a minha estrada entortou
Mas vou até o fim.
(BUARQUE, Chico. Letra e Música. São Paulo: Cia das Letras, 1989)
III. Quando nasci um anjo esbelto
Desses que tocam trombeta, anunciou:
Vai carregar bandeira.
Carga muito pesada pra mulher
Esta espécie ainda envergonhada.
(PRADO, Adélia. Bagagem. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986)
Adélia Prado e Chico Buarque estabelecem intertextualidade, em relação a Carlos
Drummond de Andrade, por
(A) reiteração de imagens.
(B) oposição de idéias.
(C) falta de criatividade.
(D) negação dos versos.
(E) ausência de recursos
 Deve ser observado que a questão relaciona os dois textos,
concomitantemente, ao original, de Drummond – não apenas
um deles. As imagens repetidas (reiteradas) não
necessariamente concordam com o poema de Carlos
Drummond de Andrade, mas convém ressaltar que os versos
de “Até o Fim”, de Chico Buarque, utilizam plenamente o
sentido do primeiro texto; diferentemente de Adélia Prado que,
isoladamente, e só dessa forma, traz sentidos opostos à
imagens de Drummond. Somados (unidos), os dois textos são
apenas reiterações.
2) Cândido Portinari (1903-1962), um dos mais importantes artistas brasileiros do século XX,
tratou de diferentes aspectos da nossa realidade em seus quadros.
3.
1.
2.
4.
Sobre a temática dos retirantes, Portinari também escreveu o seguinte poema:
(….)
Os retirantes vêm vindo com trouxas e embrulhos
Vêm das terras secas e escuras; pedregulhos
Doloridos como fagulhas de carvão aceso
Corpos disformes, uns panos sujos,
Rasgados e sem cor, dependurados
Homens de enorme ventre bojudo
Mulheres com trouxas caídas para o lado
Pançudas, carregando ao colo um garoto
Choramingando, remelento
(….)
(PORTINARI, Cândido. Poemas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1964.)
Das quatro obras reproduzidas, assinale aquelas que abordam a problemática que é tema do
poema.
(A) 1 e 2
(B) 1 e 3
(C) 2 e 3
(D) 3 e 4
(E) 2 e 4
 Para esta questão, um breve conhecimento da obra de Portinari
seria interessante. A obra “Retirantes” (imagem 2) é um de
seus clássicos e traz, povoado pela referência expressionista,
dramaticidade, tristeza e terror à imagem da seca e desses
indivíduos que migram pelos espaços miseráveis do interior
nordestino. A imagem 1 faz referência aos salões de baile
aristocráticos do início do século, enquanto a imagem 4 traz a
figura de um cangaceiro, um habitante típico da “mitologia”
nordestina, mas que foge à temática do retirante, sempre
associada à miséria e ao sofrimento. A imagem 3 é uma outra
versão da mesma obra, sem a presença tão marcante do horror
que está expresso na imagem 2, influenciado por certas
marcas cubistas, mas, ainda assim, com a presença dos
mesmos temas.
3)
Texto 1: "Mulher, Irmã, escuta-me: não ames,
Quando a teus pés um homem terno e curvo
jurar amor, chorar pranto de sangue,
Não creias, não, mulher: ele te engana!
As lágrimas são gotas da mentira
E o juramento manto da perfídia."
Joaquim Manoel de Macedo
Texto 2: "Teresa, se algum sujeito bancar o
sentimental em cima de você
E te jurar uma paixão do tamanho de um
bonde
Se ele chorar
Se ele ajoelhar
Se ele se rasgar todo
Não acredite não Teresa
É lágrima de cinema
É tapeação
Mentira
CAI FORA"
Manuel Bandeira
Os autores, ao fazerem alusão às imagens da lágrima sugerem que:
(A) há um tratamento idealizado da relação homem/mulher.
(B) há um tratamento realista da relação homem/mulher.
(C) a relação familiar é idealizada.
(D) a mulher é superior ao homem.
(E) a mulher é igual ao homem.
 A questão guarda a particularidade da referência à lágrima
indicada no enunciado. Fora isso, poderia ser dito, de fato, que
há um tratamento realista e até irônico, por parte dos autores,
sobre as relações amorosas; mas é a imagem da lágrima que
nos importa e, nesse sentido, há uma negação da mesma,
mostrando o quanto o exagero está expresso no ato de chorar
em frente à pessoa amada quando o homem o faz (“lágrima de
cinema”, como dito por Manuel Bandeira). A sutileza está no
fato de que tanto Bandeira quanto Joaquim Manuel de Macedo
indicam que há, no senso comum, idealização nas relações,
não realismo, veracidade. É a idealização que é, portanto,
negada por eles.
4) Os transgênicos vêm ocupando parte da imprensa com opiniões ora favoráveis ora desfavoráveis. Um
organismo, ao receber material genético de outra espécie, ou modificado da mesma espécie, passa a
apresentar novas características. Assim, por exemplo, já temos bactérias fabricando hormônios humanos,
algodão colorido e cabras que produzem fatores de coagulação sangüínea humana. O belga René Magritte
(1896 – 1967), um dos pintores surrealistas mais importantes, deixou obras enigmáticas.
Caso você fosse escolher uma ilustração para um artigo sobre os transgênicos, qual das obras de Magritte,
abaixo, estaria mais de acordo com esse tema tão polêmico?
(A)
(B)
(C)
(D)
(E)
 A questão da transgenia apontada nesta questão está
particularmente associada ao trecho que afirma que “Um
organismo, ao receber material genético de outra espécie, ou
modificado da mesma espécie, passa a apresentar novas
características”. Logo, devemos estar atentos a ideia da
mistura, da fusão de elementos diferentes que forma algo
novo, talvez até híbrido – visivelmente percebido na imagem do
“homem-peixe” da opção B
5) Cândido Portinari (1903-1962), em seu livro Retalhos de Minha Vida de Infância,
descreve os pés dos trabalhadores.
Pés disformes. Pés que podem contar uma história. Confundiam-se com as pedras e os
espinhos. Pés semelhantes aos mapas: com montes e vales, vincos como rios. (...) Pés
sofridos com muitos e muitos quilômetros de marcha. Pés que só os santos têm. Sobre a
terra, difícil era distingui-los. Agarrados ao solo, eram como alicerces, muitas vezes
suportavam apenas um corpo franzino e doente.
(PORTINARI, Cândido. Retrospectiva. Catálogo MASP)
As fantasias sobre o Novo Mundo, a diversidade da natureza e do homem americano e a
crítica social foram temas que inspiraram muitos artistas ao longo de nossa História. Dentre
estas imagens, a que melhor caracteriza a crítica social contida no texto de Portinari é
(A)
(D)
(B)
(C)
(E)
 Uma questão simples, que exige um nível de leitura bastante
superficial. Como é comum no ENEM, a relação entre texto e
imagem, em nível intertextual, é solicitada, principalmente
quanto à sensibilidade do leitor – poder observar uma imagem
sem estar isento de emoção. São apenas as opções D e E que
causam alguma dúvida, pelo uso da fotografia, o que dá
alguma percepção de verossimilhança; mas é na opção E que
encontra-se a relação com trechos como “Pés disformes. Pés
que podem contar uma história”, “Pés sofridos com muitos e
muitos quilômetros de marcha”, que “Confundiam-se com as
pedras”, uma provocação que a imagem indica, pois, pela
deformidade e visíveis marcas da idade, do trabalho, etc,
“difícil era distingui-los”.
OUTRAS QUESTÕES
1) (FUVEST)
Chega!
Meus olhos brasileiros se fecham saudosos.
Minha boca procura a Canção do Exílio..
Como era mesmo a Canção do Exílio.?
Eu tão esquecido de minha terra ...
Ai terra que tem palmeiras
onde canta o sabiá!
(ANDRADE, Carlos Drummond de. “Europa, França e Bahia”. In:
Alguma Poesia. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1964)
Neste excerto, a citação e a presença de trechos ........ constituem um caso de ........ .
Os espaços pontilhados da frase acima deverão ser preenchidos, respectivamente, com o
que está em:
a) do famoso poema de Álvares de Azevedo / discurso indireto.
b) da conhecida canção de Noel Rosa / paródia.
c) do célebre poema de Gonçalves Dias / intertextualidade.
d) da célebre composição de Villa-Lobos / ironia.
e) do famoso poema de Mário de Andrade / metalinguagem.
 Mais uma vez, Drummond retoma o clássico de Gonçalves
Dias, citado nominalmente nos versos. Tal como no ENEM, a
Fuvest aposta, aqui, no conhecimento do senso comum, obtido
através de um texto fundamental para a construção da própria
brasilidade. A intextualidade é um conceito genérico que, aqui,
seria o mais bem aplicado, pois, ainda que abarque questões
como metalinguagem, paródia, entre outros, não aplica
nenhum desses nesta questão.
2) (UNICAMP-SP)
Leia com atenção esse poema de Carlos de Oliveira e responda às questões que seguem.
Lavoisier
Na poesia,
natureza variável
das palavras,
nada se perde
ou cria,
tudo se transforma:
cada poema,
no seu perfil
incerto
e calígrafo,
já sonha
outra forma.
O princípio enunciado por Lavoisier, na Química, diz que “na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se
transforma”.
a) O que teria levado Carlos de Oliveira a dar a esse poema o título de “Lavoisier”?
b) Como podem ser interpretados seus versos finais (“cada poema / no seu perfil / incerto / e calígrafo, / já
sonha / outra forma.”)?
 Um exemplo de uma típica questão interdisciplinar que aposta
na interdisciplinaridade. Sem os conhecimentos obtidos nas
áreas de Química e Biologia, ficaria bem mais difícil interpretar
o poema e o sentido brincalhão do seu título.
A REDAÇÃO DO ENEM
Caracterizada por sempre abordar temáticas de cunho políticosocial, uma das particularidades da prova de Redação do ENEM é
embasar a proposta em algo que flutue em torno de políticas
públicas relacionadas ao tema – um caso bastante visível em
algumas questões dentro das outras provas também.
Na proposta de 2009, solicitou-se que o candidato refletisse sobre a
seguinte questão: O INDIVÍDUO FRENTE À ÉTICA NACIONAL.
Trata-se de uma oportunidade de questionar – “sem ferir os direitos
humanos”, como sempre lembra a prova – aspectos cruciais da
própria brasilidade. O que salta aos olhos é a presença constante,
nas redações do Exame Nacional do Ensino Médio, de discutir os
efeitos e consequências que certas práticas sociais têm na vida do
cidadão brasileiro, preservando o caráter de unidade nacional
que a prova, como um todo, guarda.
Apesar da impressão generalista que o tema nos impõe, é
importante perceber que a exigência da habilidade de leitura do
ENEM é solicitada, inclusive, na prova de Redação (que, em princípio,
é apenas uma avaliação de produção textual). Isso é notável na
organização da proposta de redação, que pede para que se inspire
nos textos de apoio
TEXTO 1:
Millôr Fernandes
TEXTO 2:
Lya Luft (adaptado)
TEXTO 3:
Contardo Calligaris (adaptado)
Os textos de apoio indicam, por sua vez, uma redução do
tema ao sub-tema “honestidade” que, teoricamente,
deveria nortear a questão da “ética nacional” apontada no
enunciado da proposta.
A seguir, veremos um texto modelar quanto à abordagem
da proposta. Bastante consciente de seu posicionamento,
o autor manipula muito bem as informações, produzindo
um texto crítico, porém equilibrado.
Uma redação modelo*:
Na década de 80, foi veiculado, em canais abertos da TV, uma propaganda de cigarros
que usava como ícone um jogador da seleção brasileira: o Gerson. Versava essa propaganda sobre o
certo e errado. O certo seria o sujeito sempre tirar vantagem, em qualquer situação em que estivesse.
Essa ideia, a de que é correto sempre “se dar bem”, tem muito a ver com o caráter do
político brasileiro e vai de encontro a questões elementares de ética. Se a tendência é sempre tirar
proveito da situação para benefício próprio, como pode o indivíduo representar alguma parcela da
população, por exemplo? A grande questão é que por mais que condenemos esse tipo de atitude,
quando ela acaba sendo personificada através de alguma pessoa pública, temos uma forte tendência
a fazer vista grossa em situações em que os dilemas morais corriqueiros se apresentam – o troco do
pão que foi dado a mais e não o devolvemos; o “gato” na luz, na TV, na água; da fila “furada” nos
bancos.
Talvez a nossa indignação frente às atitudes não éticas exercidas por toda a classe política
seja velada, porque sabemos que, no fundo, o político é, antes de sua função, um cidadão com os
mesmos princípios que a maioria de nós. A grande diferença é que ele está mais exposto. Muito antes
de pôr milhões de dólares na cueca, ele afanava algumas inocentes balinhas na fila do caixa do
supermercado.
Com certeza, a máquina pública facilita a vida do malandro. Mas o malandro só se torna
um político corrupto porque, quando jovem, os preceitos éticos jamais lhe foram suficientes para
moldar o seu caráter.
*Texto de autoria de um vestibulando. Escrito em 2010.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES:
Na década de 80, foi veiculado, em canais abertos da TV, uma propaganda de
cigarros que usava como ícone um jogador da seleção brasileira: o Gerson. Versava essa
propaganda sobre o certo e errado. O certo seria o sujeito sempre tirar vantagem, em qualquer
situação em que estivesse.
DEVE-SE TOMAR CUIDADO
COM GENERALIZAÇÕES!
(NESTE CASO, POSTERIORMENTE,
O TEXTO CONSEGUE ARGUMENTAR
DE FORMA COERENTE)
EXEMPLOS INTEGRADOS
COM O CONTEXTO NACIONAL
DETERMINADOS TERMOS
SUAVIZAM A POSTURA DO
ESCRITOR, TORNANDO O
TEXTO MENOS REDUCIONISTA.
Essa ideia, a de que é correto sempre “se dar bem”, tem muito a ver com o caráter do
político brasileiro e vai de encontro a questões elementares de ética. Se a tendência é sempre
tirar proveito da situação para benefício próprio, como pode o indivíduo representar alguma
parcela da população, por exemplo? A grande questão é que por mais que condenemos esse
tipo de atitude, quando ela acaba sendo personificada através de alguma pessoa pública, temos
uma forte tendência a fazer vista grossa em situações em que os dilemas morais corriqueiros se
apresentam – o troco do pão que foi dado a mais e não o devolvemos; o “gato” na luz, na TV,
na água; da fila “furada” nos bancos. (...)
“DA” NO LUGAR DE “A”:
FALTA DE
COESÃO/PARALELISMO
USO REDUNDANTE DO
PRONOME OBLÍQUO
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