Prólogo
nada mais dormir
(memórias do paraíso)
impossível não nascer toda hora e a cada instante
nunca me dei bem com gatos
ágil
não gosto de gatos
só volto em casa pra dormir e talvez comer um pouco
me invento gato
me morro gato
mesmo é comer na rua
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hoje confesso
hoje confesso
sou
me vejo gato
me acho bonito
bom
durmo muito pouco
a primeira vez que me vi tava chovendo
a chuva
a terra
o lixo
passando o lixo
muita lama
fiquei me olhando só pra mim
chamava em mim
sei lá
eu mesmo
sei tinha um na água todo distorção
fiquei lá
e eram tantos que eu mesmo nem
meio avermelhado
tijolo tinha outro mais envergado que brilhava mais
eu era outra cor
outros poucos
alguma coisa me
tava meio prateado
meio barro meio
tinha o duma lata onde
muito pouco enferrujado
muitos
eu era variadas outras cores
alguma coisa me chamava
não os muitos
verdade eu mesmo me chamava a todos
esse que sou só eu
na
acontece que ainda sobrava
sempre sobra alguém
nunca sobrava ninguém
chuva
muita água
um passando
afundei
quer dizer
só alguém senão nada mais
muita terra
muita lama
me larguei
aceitei
muita
eu era só mais
eu passando eu junto com o lixo que não é ninguém
9 sempre preservei minha dignidade
ser verdade
a verdade não se preserva por ai
instante sim
coisa
ouvi muito disso
o vício
gosto de chuva
se chovo, não molho
todas dignas
o feio
sustenta o que
a mentira que repete
por isso não
se deito, não durmo
se acordo, é porque não morri
nem todas vivas
por um
sobra sempre alguma
vira herói do que sobrou
não preservou
não acordo
não faz sentido
tento ainda repetir esse que sobra
pior pro que não sobra
hoje repito apesar de
se durmo,
tenho muitas vidas
nem
vivo a que sobra feio e viciado
nunca
morri
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acordo toda hora e a cada instante
afundado pensei muito
pensei tanto ao ponto de não pensar
penso pra não pensar
dá muito trabalho isso de pensar
mais ainda ter que pensar dobrado
de não pensar dá
o melhor é nem pensar nem não pensar
de repente eu tava me mexendo braço e perna pra todos lados
dançar achei o chão
as piores
lixo é lixo e chão é chão
lixo e pouco chão é sempre uma dúvida onde colocar o pé
levantei mentindo que tava mentindo
ou céu
agora o mundo era todo aquilo
todo mesma cor ou cor nenhuma
passei a ser chuva
mesmo jeito do gato
sou chuva
quando chovo sou só eu
mesmo jeito do gato
chuva é a mesma merda
só lixo
muito
mesmo assim
inventando chão no lixo
invento chuva depois
confesso
sem saber
pensei o pé
tem mentira que não mente
diferença
até hoje:
já não faz
eu ou chão ou chuva
tudo branco
por isso não gosto de chuva do
gosto de vento que me leve
não tem essa de duas chuvas
não tem esse de dois
hoje
do
na verdade mesmo gato e
por isso um não gosta do outro
nem eu
10 acordo variado durante as cores de acordo com diversas chuvas
escapo em vidas
sempre morri
dessa vez o todo que era lixo viveu chão
como todo aquilo que de outro foi mesmo
e tudo vai mesmo do jeito que ia
quando morri lama e nasci pé pisando
forte
sempre
de passando virei passado
fixo
reto quase tudo guardado o devido torto de se equilibrar
tipo
algumas pernas quando só pernas tipo algumas costas encostadas que me
custavam o olhar
olhos
a água desviava o quase todo menos me atrair quando só
sem pontos e sem costas
e não havia outros
todo
só ilhas sem mar
pontos sem vista
um ponto sem outros é o mundo
ali passado parado nascido e morrido só via mundo sem poder tirar
lama dos olhos
mundo todo
pior que vi tudo
todos aqueles e todos aquilos
pouco ali passado
na verdade fiquei mais um
o mundo todo era pra mim que eu olhava
tantos outros todos mundos que aprendi a pular
melhor do que a frase
melhor mesmo de tudo que pular consta de pular mais alto ainda
claro
pra baixo é sempre cair como pra frente é sempre passar
passa pra trás e do mesmo passa o passado
não sabe voltar
pulando
Já viu chuva pular?
tempo sim é coisa de não passar
pra cima,
o futuro
a chuva
aprendi do tempo
passa chuva, passa mundo, passa gente e passa todas as coisas
até hoje ainda desconfio que tempo não é coisa e mais
e bicho
o
aqueles que se pega na pegada e aquilos que se perde na sacada
aquilos onde se passa e aqueles quando se fica
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só um ponto de olhos
pular tudo é mais alto ainda pra cima
não tem lugar
só existe coisa, gente
é depois cair
nem coisa nem gente nem bicho nem dá pra passar
coisa de tempo que não confio nem desconfio nunca mais
em cima
cima é
gente é muito e
bicho pode ser gato
deixo a chuva e caio as coisas
só lugar
muito e rasteiro gosto de coisa que me faça bicho que me passa lixo que me
seja chão que me caia chuva que não possa voltar
fui a muitos lugares e
11 conheço todos os lugares
todos iguais
não fui a lugar nenhum
algum espaço sem lugar
não sei porque e confesso nunca sabia porque
todos os lugares onde fui era só andar não existe o lugar
muito
sendo muito rastejei
andei, pulei, passei, caí
porque também é lugar nenhum
deste lugar aqui
sendo gente andei
só cheguei até aqui
aqui não sei se ando ou me perco
continuar sem me perder pra nunca chegar
só
nunca me perdi
queria
nunca saí
sempre espaços e passos leves pisando chão pegando coisas
poucas no pulo
é pouco nunca voar
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tanto lugar e pulo aprendi a dançar
enquanto dançar
de pisar
é até possível inventar pé, inventar gato, inventar chuva
se afogar das coisas
é até
daí se achar ilhado
impossível é pisar quando chão
pelo mar nada mais importa
não mais vi ponto algum
agora já é agora já era
aquilos onde me via outros
pela ilha tudo é mar
todo o que era antes, agora será depois
aliás
aliás agora ainda segue sendo e vindo a ser todos
só movimento e posição
momento ou sigo em qualquer parada
aquilo
morri
sem falsas e farsas, chão nunca existiu e nada das coisas é
possível das coisas se molhar
se perder
larguei do chão e dancei tanto
paro em qualquer
já não existe limite entre isso ou
eu ou você não me faz diferença agora existe só diferença e vontade
chuva, gato, terra, lixo, cores, lama, morte, vento, sobra, mentira, chão, pé,
sentido, herói, ilha, gente, coisa, bicho, mundo todo
o nada mais só importa o mar dançando nunca igual
impossível não nascer toda hora e a cada instante
agora eu quero
para
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Prólogo nada mais dormir (memórias do paraíso) impossível não